• Convenção do partido, marcada para março, pode ser antecipada
• Segundo Eliseu Padilha, com a decisão, legenda ficaria liberada sobre afastamento de Dilma
O ex-ministro Eliseu Padilha — principal aliado do vicepresidente Michel Temer — afirmou, em entrevista a Júnia Gama, que a decisão de antecipar a convenção do PMDB será tomada se o governo interferir na disputa pela liderança do partido na Câmara e ajudar Leonardo Picciani (PMDB-Rio) a retomar o posto. “Na base do partido, a diferença é muito grande a favor de sair do governo. A maioria absoluta é pela saída”, diz Padilha.
‘A diferença é muito grande a favor de sair do governo’
• Braço-direito do vice Michel Temer, o ex-ministro de Dilma Rousseff diz que, se a decisão do PMDB for por deixar a base aliada — o que para ele hoje é a posição majoritária —, é natural que o partido fique liberado para apoiar o impeachment. Padilha, no entanto, acredita que não haverá unanimidade no partido
Júnia Gama - O Globo
-BRASÍLIA- O ex-ministro Eliseu Padilha, que deixou o cargo há cerca de dez dias — logo após a deflagração do processo de impeachment da presidente Dilma Rouseff — disse ao GLOBO que a decisão sobre quando o PMDB deve deixar o governo será tomada na convenção do partido, marcada para março. Ele alertou, no entanto, que ela pode ser antecipada, ainda esta semana, caso o governo interfira na disputa pela liderança do PMDB na Câmara e ajude Leonardo Picciani (PMDBRJ) a retomar o posto. O ex-ministro nega que o grupo ligado a Michel Temer esteja trabalhando pelo impeachment, mas admite que o vice-presidente e seus aliados têm mantido conversas com lideranças políticas e setores do empresariado. Segundo Padilha, nestas conversas, Temer se coloca como um “legalista” e diz que não adotará medidas para “impulsionar ou não” o impeachment.
A convenção do partido será antecipada?
Para haver convocação, são necessários nove diretórios concordando, e isso já existe. No começo desta semana, a gente vai ver. A convocação pode ser feita de três formas: com os nove diretórios, com uma decisão da Executiva ou diretamente pelo presidente do partido. A única hipótese de analisarmos logo isso esta semana é se o governo forçar a volta do (Leonardo) Picciani à liderança do PMDB (na Câmara).
Pode haver uma decisão sobre impeachment?
Antes da convenção, acho muito difícil. Vamos admitir que na convenção o PMDB decida ficar no governo: claro que, neste caso, é contra o impeachment. Se a decisão for sair do governo, é natural que o partido fique liberado desse compromisso. Não é que todo mundo vai ser contra ou a favor do impeachment, não pense que vai ter unanimidade no PMDB.
O que defende a maioria no PMDB hoje?
Na base do partido, a diferença é muito grande a favor de sair do governo. A maioria absoluta é pela saída.
O senhor é a favor da saída?
Essa é uma questão maior do partido. Minha opinião é a que menos conta. O que tenho que fazer é ouvir e procurar construir a unidade.
E Temer?
Michel é o maior trabalhador da unidade do partido, se encontra realmente dividido. Ele tem que se guardar para ver onde ele pode ajudar e aumentar o sentido da unidade.
Sair do governo e defender o impeachment são coisas distintas?
Temer deixou claro que nunca se envolverá diretamente nesse processo de impeachment. Não dá para confundir saída do governo com defesa do impeachment. Uma coisa é o PMDB, por que vai ter candidatura própria em 2018, querer deixar o governo. Outra coisa totalmente diferente é o impeachment. A cada dia, sua agonia. Vamos aguardar março e ver qual será a situação reinante para saber o que vai acontecer.
Não é o momento de discutir isso?
Pelo fato de ter sido ministro até ontem, entendo que não tenho condições de participar desse tipo de discussão sobre futuro governo. Minha missão agora é ajudar a ter a máxima unidade possível no PMDB. Unidade absoluta no PMDB é quase sonho, mas tentaremos ficar o mais próximo possível da unidade do partido para sustentar bem o projeto de 2016, de 2018, e de contribuir para que o Brasil consiga sair da crise política, que é a única forma de iniciar a saída da crise econômica.
Qual sua participação nas conversas com lideranças partidárias sobre um eventual governo Temer num cenário pós-impeachment?
Eu não falei com nenhum parlamentar pedindo qualquer adesão ao impeachment. Este é um processo sobre o qual eu me defini como alguém que vai acompanhar a posição tomada coletivamente pelo partido. Em relação a mim, não existe esse tipo de conversa. Se existe, não é da minha parte, não tenho participado de nada que diga respeito a futuro governo. O que falei com alguns deputados foi sobre a questão da liderança, onde se estabeleceu uma disputa entre o então líder Picciani e a direção do partido. Mas essa é uma questão que não diz respeito ao processo de impeachment diretamente.
O senhor tem conhecimento dessas conversas?
Ouço dizer que pessoas conversam.
Temer tem discutido isso?
Eu sei que ele conversa com muita gente, mas não sei o teor. Muita gente veio conversar com o Michel depois de ter sido lançado o programa “Ponte para o futuro”, que aponta para soluções que possam ser adotadas pelo atual governo e pelo PMDB na sua campanha de 2018.
Como o vice-presidente se coloca em relação ao impeachment?
Sempre que o Michel fala conosco sobre esse tema, ele diz que, como alguém que fez a vida como constitucionalista, como legalista, como alguém que observa a absoluta legalidade, ninguém pode esperar que ele adote qualquer medida no rumo de impulsionar ou não o impeachment.
Há relatos de que hoje Temer se mostra como uma alternativa de forma mais assertiva que antes...
Depois que nós deixamos a articulação política, ele ficou mais distante do governo, só tem comparecido quando é chamado pela presidente. Houve um distanciamento. Mas quem colocou o presidente do PMDB e vicepresidente da República como alternativa foi a eleição dele como vice-presidente e o texto da Constituição Federal. Essa previsão é da Constituição: o vice-presidente é a alternativa natural.
A interferência de aliados de Temer na destituição de Picciani foi lida pelo Palácio do Planalto como um movimento pró-impeachment.
Muitos deputados que são contra o impeachment, a começar pelo próprio novo líder Leonardo Quintão (PMDB-MG), entenderam que era melhor trocar o líder. Não pode ser esquecido que, enquanto o Leonardo Quintão trabalhava muito em Minas Gerais pela eleição de Dilma e do vice Michel, Picciani comandou uma verdadeira guerra contra eles, a favor do seu principal adversário, Aécio Neves. Quem afirmar que quem apoia o presidente do PMDB nesta disputa é a favor do impeachment está querendo fazer com que os peemedebistas que seguem a orientação do partido se convertam em atores próimpeachment, o que é muito ruim para o governo.
Mas Picciani foi destituído justamente porque queria indicar apenas deputados contrários ao impeachment para a comissão que analisará o processo...
Pode até majoritariamente ter sido assim, mas existem muitos deputados contra o impeachment e que decretaram a destituição. Há a intenção de confundir a questão da liderança com o impeachment para criar um claro benefício para quem postula a liderança. Inclusive alertei ao ministro Jaques Wagner que havia esse movimento pela substituição do líder na segunda-feira e disse que eu era favorável porque ele tinha entrado em choque contra Temer.
O governo erra ao apoiar Picciani?
É um equívoco do Planalto porque vai forçar o partido a tomar uma posição oficial sobre a saída do governo, o que está previsto para acontecer apenas em março.