terça-feira, 13 de junho de 2023

João Feres Júnior * - A guerra pela democracia

O Globo

Imaginemos uma campanha política inundada por vídeos falsos, em que o eleitor não pode ter certeza de que a informação é minimamente confiável

A batalha em torno do Projeto de Lei 2.630 — conhecido como PL das Fake News — é somente a primeira parte de um capítulo decisivo de nossa História democrática. O vertiginoso desenvolvimento da comunicação digital tem afetado seriamente o processo político democrático brasileiro há pelo menos uma década. Junho de 2013, a organização política da extrema direita e a consequente vitória de Bolsonaro em 2018 foram somente os marcadores mais visíveis dessa História recente.

Em 2022, uma nova catástrofe foi por pouco evitada, mas isso se deveu mais à virtude de alguns atores políticos, notadamente à determinação do ministro Alexandre de Moraes no comando do Tribunal Superior Eleitoral e à imensa popularidade e habilidade política de Lula, do que propriamente à solidez de nossas instituições perante as ameaças postas pela manipulação dessas novas tecnologias da comunicação.

Míriam Leitão - Banco Central começa a corrigir a rota

O Globo

Cenário de desinflação estava posto, mas só agora BC trabalha até com a possibilidade de a meta ser cumprida

A declaração de ontem do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, é uma correção de rumo. Está ficando difícil para o Banco Central encontrar argumentos para manter a taxa de juros no ponto em que está. As projeções do Boletim Focus para a inflação de 2024 e 2025 estão em 4% e 3,9%. Como o BC diz que leva em conta o Focus e olha para o “horizonte relevante”, está observando esses dois números, entre outros. Em evento em São Paulo, o presidente do BC falou da inflação presente, admitindo que junho provavelmente terá inflação negativa, e que o índice de preços vai terminar o ano entre 4,5% e 5%.

O número 4,5% para o final do ano ainda não tinha aparecido na mesa. A previsão de ontem do Focus para 2023 foi de 5,42%. A diferença entre um e outro é que o número aventado por Roberto Campos significa ficar no intervalo de flutuação da meta para este ano, ou seja, o presidente do BC trabalha até com a possibilidade de a meta ser cumprida este ano.

Merval Pereira - Exposto a chantagens

O Globo

A disposição de Lula de não resistir a pressões dirigidas por interesses particulares mostra como é difícil controlar o Congresso com um governo minoritário e sem projeto, a não ser o personalismo petista

O presidente Lula está tentando organizar seu ministério de acordo com os partidos que teoricamente o apoiam na Câmara, mas o episódio da substituição da ministra do Turismo é exemplar. Nomeada como Daniela do Waguinho, por ser casada com o prefeito de Belford Roxo, logo nos primeiros dias ela pediu para ser chamada de Daniela Carneiro. Muito justo, queria mostrar sua independência política. Mas a vontade não era tanta assim, pois, logo que seu próprio partido, o União Brasil, resolveu trocá-la por outro integrante, eis que entra em campo o mesmo Waguinho, para defender a permanência no cargo de sua mulher.

Os petistas reclamam das críticas feitas a Lula por aceitar as chantagens parlamentares do União Brasil e, sobretudo, do presidente da Câmara, Arthur Lira. Recebem-nas como apoio aos chantagistas. Mas quem se colocou nessa posição foi o próprio Lula, que venceu a eleição sem programa de governo e foi preenchendo os cargos sem a menor lógica. Essa falta de sensatez aparece no comentário do próprio Waguinho, que terá um encontro com Lula provavelmente hoje: “Trocar uma evangélica por um bolsonarista não tem sentido”.

Carlos Andreazza – Desdenunciando

O Globo

Assessor de Arthur Lira — então em primeiro mandato — foi interceptado com R$ 106 mil no aeroporto de Congonhas

Há uma hipótese para explicação do Brasil na história de Arthur Lira afinal desdenunciado — expressão que tomo de Marcelo Godoy, no Estadão. Trama de 2012, contemporânea do mensalão televisionado, quase década anterior à era do orçamento secreto e seus kits de robótica, concluída somente neste 2023. Mais uma década perdida. Também a de ascensão de Lira.

É o caso em que assessor do deputado federal alagoano — então em primeiro mandato — foi interceptado com R$ 106 mil no aeroporto de Congonhas; a caminho de Brasília. Grana que o delator profissional Alberto Youssef afirmaria ser para Lira, propina — a acusação — paga por dirigente da CBTU em troca de se manter no cargo. (O atual presidente da estatal, órgão federal que administra trens urbanos, é apadrinhado por Lira e está ali desde 2016).

A Procuradoria-Geral da República denunciou Lira em 2018. Por corrupção passiva. Denúncia aceita pelo Supremo — por sua Primeira Turma — em 2019. Lira, então, tornado réu. A defesa recorreu.

Em 2020, o colegiado formou maioria contra a apelação — com votos de Marco Aurélio Mello, o relator, Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes. Dias Toffoli pediu vista. Julgamento interrompido. Por três anos. Retomado — e finalizado — na semana passada. O deputado alagoano ora presidente da Câmara.

Dora Kramer - Um novo amigo

Folha de S. Paulo

Espaço de interlocução alternativo a Lira pode ser caminho para Lula na Câmara

O presidente da República entrou em campo e supostamente deu uma arrumada no jogo. Resta saber se daqui para frente será realmente tudo diferente do que foi a difícil convivência com o Poder Legislativo nestes meses iniciais de governo.

Lula fez o certo? Depende do ponto de vista. Se o posto de observação for o Palácio do Planalto, no momento é o que tinha para ser feito: não ceder aos apelos por uma reforma ministerial ampla, ajustar a equipe aqui e ali sem mexer em cargos mais caros ao presidente, manter azeitado o fluxo de liberação de emendas e calibrar as pautas para reduzir confrontos inúteis no Parlamento.

Andrea Jubé - Governo acalma União e cozinha Lira

Valor Econômico

Após renovar o fôlego durante o feriado na base naval de Aratu, na Bahia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva convocou seus conselheiros nessa segunda-feira para discutir saídas para os impasses com o União Brasil, com o grupo político do prefeito de Belford Roxo (RJ), Waguinho (Republicanos) - de quem precisará no futuro para garantir votos na Baixada Fluminense, um feudo bolsonarista -, e com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (Progressistas-AL).

Um ministro a par das negociações disse à coluna que a iminente substituição da ministra do Turismo, Daniela Carneiro - esposa de Waguinho e deputada federal mais votada do Rio de Janeiro - pelo deputado Celso Sabino (PA) tem força para pacificar a bancada do União.

Admitiu, todavia, que a mudança não conterá a ofensiva do grupo de Arthur Lira, que mira o Ministério da Saúde para onde são direcionadas, por força de lei, 50% das emendas parlamentares.

Pedro Cafardo - Dólar barato nem sempre é boa notícia

Valor Econômico

Dólar a R$ 4,50 é boa notícia para quem pretende viajar ao exterior ou para quem importa; e para o país?

A taxa de câmbio brasileira estava em R$ 5,45 por dólar no início de janeiro e ontem fechou a R$ 4,87, a menor cotação em um ano. Tudo indica que o real, como se diz no economês, vai continuar a se “apreciar” em relação à moeda americana e pode chegar a R$ 4,50. Essa apreciação, seguindo tendência cíclica e crônica da moeda brasileira, seria hoje decorrente de notícias otimistas dos últimos dias, como o crescimento do PIB, a inflação em queda, com possível redução dos juros, e até a aprovação do novo marco fiscal pela Câmara.

Dólar a R$ 4,50 ou menos é uma boa notícia? Para o senso comum, sim. Para quem pretende viajar ao exterior ou para quem importa, também. E para o país?

O ex-ministro da Fazenda Luiz Carlos Bresser-Pereira tem a convicção de que a apreciação do real é perversa para o país. Aos 88 anos ele continua sendo um dedicado estudioso da economia e está indignado porque a política cambial não é sequer discutida atualmente.

Nas últimas semanas, ao mesmo tempo em que finaliza dois livros sobre macroeconomia, Bresser prepara artigo acadêmico com propostas de política cambial para o governo. Em ambiente privado, ele tem discutido o tema com seus pares, economistas adeptos da Teoria Novo-Desenvolvimentista (TND).

Maria Clara R. M. do Prado - Menos inflação, mais juro real

Valor Econômico

A definição da meta de inflação no Brasil funciona como se fosse uma espécie de roleta russa tupiniquim

Ao contrário do que se faz crer, a inflação não é um fenômeno homogêneo único nem autônomo. Tem características próprias que podem variar em momentos distintos de uma mesma economia, sem ignorar que não é passível de ser comparada entre países.

A retomada da inflação imediatamente pós pandemia foi praticamente universal e os motivos são fartamente conhecidos. Hoje, as taxas de juros praticadas pelos bancos centrais variam muito em termos nominais, mas têm se mantido, em média, ao redor de 2% em termos reais (depois de descontada variação dos índices de preços).

Nos países em desenvolvimento, a discrepância é maior. Há juros reais praticados por bancos centrais no patamar de 6% e 5%, em especial na América Latina.

O Brasil, sabe-se, é uma exceção. Não só a taxa de juro real de curto prazo é a mais alta do mundo, como continua a aumentar. Esta é uma constatação irrefutável, concorde-se ou não com a atuação da autoridade monetária brasileira. Pior é que a despeito de manter por dez meses seguidos o juro de curto prazo ao nível de 13,75%, o BC não conseguiu até agora trazer a inflação para a meta de 3,5% fixada para 2023.

Yascha Mounk - Berlusconi é prova da capacidade da Itália de antecipar política global

Folha de S. Paulo

Ex-premiê morre como cofundador da tradição que dominou discurso político na Turquia, no Brasil, na Índia e nos EUA

O ex-líder de uma grande democracia que usou seus bilhões para adquirir vasta influência política, possuía capacidade surpreendente para utilizar a mídia em busca de mudar sua cultura, era infame por uma sequência de casos sexuais sórdidos, foi processado múltiplas vezes e enfraqueceu o Estado de Direito por não respeitar os limites constitucionais de seu próprio poder, personalizando o conflito político até que o país pareceu ficar dividido entre apoiadores e adversários, morreu nesta segunda-feira (12).

Não, o nome do falecido não é Donald Trump –é Silvio Berlusconi.

Quando Berlusconi ingressou na política italiana, na esteira de um grande escândalo de corrupção que no início da década de 1990 pulverizou os partidos políticos italianos que duravam havia anos, observadores externos o encararam com um misto de preocupação e perplexidade. Com atitude machista e piadas sexistas, passado de crooner em navios de cruzeiro e presente de mulherengo inveterado, ele parecia um personagem anacrônico: um membro do elenco de uma ópera-bufa do século 18 que se transportara de alguma maneira para o final do século 20 e agora estava representando um ato extenso de arte cênica.

Durante a primeira década de sua ascensão política, a cobertura de Berlusconi pela mídia internacional tendeu a tratá-lo como uma figura ao mesmo tempo retrógrada e especificamente italiana. A ideia de que ele pudesse ser o precursor de coisas que viriam a acontecer fora da Itália parece nunca ter passado pela cabeça de correspondentes estrangeiros que descreviam os escândalos do então primeiro-ministro em despachos espirituosos em jornais como Le Monde ou The New York Times.

Alvaro Costa e Silva - O golpista vaidoso

Folha de S. Paulo

Enquanto isso, a CPI do 8 de Janeiro está em banho-maria

O celular de Mauro Cid continua entregando a rapadura. Depois do desvio de dinheiro, das investidas antidemocráticas no 7 de setembro de 2021 e no 8 de janeiro de 2023 e da fraude no sistema de vacinação, a Polícia Federal encontrou no aparelho do ajudante de ordens de Bolsonaro uma minuta golpista e estudos para dar suporte jurídico a um golpe de Estado.

A perícia na nuvem do Google Drive e do iCloud do tenente-coronel identificou um esboço para decretação da Garantia da Lei e da Ordem, que permite ao presidente da República convocar as Forças Armadas em caso de esgotamento das tropas de segurança em graves perturbações. Exatamente o que se viu na invasão das sedes dos Três Poderes. A instalação da GLO, segundo investigações da PF, poderia facilitar a decretação da minuta golpista –mais uma!– escondida na casa de Anderson Torres, ex-ministro de Bolsonaro.

Hélio Schwartsman - Bolsonaro, o imitador

Folha de S. Paulo

Mesmo na derrota, ex-presidentes causam danos à democracia

Jair Bolsonaro não é nem mesmo original. Vários de seus ataques à ciência e às instituições são cópias pioradas de investidas ensaiadas por Donald Trump. O caso mais emblemático é o 8/1, reprodução do assalto ao Capitólio patrocinado pelo ex-inquilino da Casa Branca. Outras "coincidências" incluem o negacionismo climático e vacinal, as agressões ao sistema eleitoral, o apreço pelas fake news. Até a tentativa de pôr as mãos em presentes de Estado os irmana.

Se isso configura um padrão, temos motivos para preocupação. Trump está mostrando que, mesmo fora do poder, ainda é capaz de impor desgastes às instituições. Aliados do republicano pintam sua denúncia pelo Departamento de Justiça como uma declaração de guerra e conclamam seus apoiadores a revidar. Eles próprios fazem questão de lembrar que o público trumpista inclui 75 milhões de portadores de armas.

Eliane Cantanhêde - A trama golpista

O Estado de S. Paulo

Quem terá prioridade nos depoimentos na CPI do Golpe? Mauro Cid e Anderson Torres

A CPMI do Golpe começa a definir hoje quais serão os primeiros depoentes e a oposição bolsonarista terá ainda mais motivos para se arrepender de ter insistido tanto nessa comissão para investigar, divulgar e mostrar ao Brasil e ao mundo quem tentou dar um golpe no dia 8 de janeiro. Alguma dúvida? Zero.

Os dois mais cotados para abrir os trabalhos são o ex-ministro da Justiça Anderson Torres e o ajudante de ordens do então presidente Jair Bolsonaro, o tenente-coronel da ativa Mauro Cid. Ambos foram presos, sabem de tudo e são o que se chama de “batom na cueca” de Bolsonaro.

Luiz Carlos Azedo - Ninguém briga para participar de governo fraco

Correio Braziliense

Lula não gosta de mexer em ministro sob pressão política. Mas terá que abrir mais espaço para os deputados do Centrão, para manter a governabilidade, é uma questão de tempo.

O título, tomei emprestado do Ilimar Franco, escolado repórter de política, a propósito da briga do União Brasil pelo cargo da ministra do Turismo, Daniela Carneiro, cuja permanência no ministério subiu no telhado da Câmara. Lembrei-me de uma tese do jurista italiano Norberto Bobbio, ponto de referência para análises de conjuntura política. Todo governo, mesmo o pior, é a forma mais concentrada de poder. Quando nada funciona, as tarefas essenciais do Estado são mantidas: arrecadar, normatizar e coagir. Somente quando perde a capacidade de se manter financeiramente e garantir a ordem pública vira desgoverno.

É muito cedo para conclusões definitivas, mas Lula não faz um mau governo, no sentido de que perdera o foco no bem comum. Independentemente da areia movediça que é obrigado a atravessar ao se relacionar com um Congresso conservador, capaz, inclusive, de tomar decisões reacionárias. Lula vem mantendo a iniciativa política, ainda que algumas delas sejam muito polêmicas, como a obsessão de negociar a paz na guerra da Ucrânia ou a decisão de turbinar a indústria automobilística com incentivos para carros populares movidos a carbono.

Cristovam Buarque* - E agora, Nabuco?

Correio Braziliense

Faz 135 anos que o deputado pernambucano Joaquim Nabuco, da janela do Paço Imperial, gritou para a multidão reunida: "Não há mais escravos no Brasil"

Faz 135 anos que o deputado pernambucano Joaquim Nabuco, da janela do Paço Imperial, gritou para a multidão reunida: "Não há mais escravos no Brasil". Na sala ao lado, a princesa regente acabava de sancionar a Lei Áurea, aprovada na Câmara e no Senado, depois de 10 dias de debates parlamentares. Tudo indicava que chegaram ao fim os 350 anos do mais brutal sistema social adotado pela humanidade: a escravidão industrial que trouxe mais de 4 milhões de africanos, inclusive 800 mil mulheres, e produziu um número até hoje desconhecido de escravos nascidos no território brasileiro para serem vendidos, sujeitos a todo tipo de maus-tratos e exploração.

Eufóricos com a conquista do fim da escravidão, os abolicionistas não imaginavam que atravessaríamos do século 19 ao 20 e deste ao 21 com pessoas em condições servis. Não mais vendidas e compradas, porque os escravos estão disponíveis nas esquinas das cidades e se submetem a esses trabalhos como forma para subsistir. Nabuco e outros alertaram que, sem distribuição de terra e escolas, a abolição não estaria completa, mas dificilmente imaginariam o quadro de pobreza e a consequente escravidão que ainda temos, quase um século e meio depois daquele grito, desde a varanda do Paço.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Pressões do novo regime fiscal não reduzem subsídios

Valor Econômico

Na visão da Unafisco, o governo deixará de arrecadar R$ 641,5 bilhões neste ano

O governo promete divulgar em julho o resultado de oito programas que sobrevivem graças a subsídios concedidos pela União. São vantagens na forma de descontos ou isenções de impostos, juros subsidiados ou equalizados ou perdão de dívidas. A tarefa está a cargo do Ministério do Planejamento, que ressalta a intenção de melhorar a qualidade do gasto público, sem necessariamente cortar programas. Não há como negar, porém, que o ajuste ou a simples extinção de programas ineficientes poderiam ajudar o governo na dura missão de cumprir as promessas do novo regime fiscal, que depende fortemente do aumento da arrecadação.

Os programas que estão sendo escrutinados inicialmente são o Fundo da Marinha Mercante, o Fundo de Terras, que financia a reordenação fundiária e os assentamentos rurais, o Programa de Financiamento às Exportações, a desoneração do biodiesel, o Programa Nacional de Apoio à Cultura, o Programa Universidade Para Todos (Prouni) e as deduções do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) das despesas com ciência e tecnologia, e o Fundo de Aposentadoria Programada Individual (FAPI).

Poesia | Fernando Pessoa - Se eu pudesse

Música | Luiz Gonzaga, Gonzaguinha - A Vida de Viajante (Festival da Canção)