quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Ao aceitar corte de gastos, Haddad revela sensatez

O Globo

Para cumprir meta fiscal e aumentar credibilidade, ministro deveria adotar plano de contenção de despesas

É conhecida a resistência do PT a cortar gastos para equilibrar as contas públicas. A ideia de que “gasto é vida” e a dívida pública apenas uma distração infelizmente continua a ter adeptos com gabinetes na Esplanada dos Ministérios ou acesso ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Felizmente, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem demonstrado bom senso em relação à questão. Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, Haddad afirmou haver espaço para corte de gastos na máquina pública — necessidade há muito evidente para cumprir a meta de déficit fiscal zero.

Ao explicar não haver incongruência entre ser de esquerda e a favor do equilíbrio das contas públicas, Haddad diz uma obviedade, é certo, mas trata-se de mensagem necessária em Brasília — e mais importante neste ano de teste do novo arcabouço fiscal. Ainda que de forma oblíqua e cautelosa, Haddad demonstrou ter noção de que, com toda a cooperação do Congresso no ano passado aprovando diversas medidas para aumentar a arrecadação, não haverá como equilibrar as contas apenas pela via das receitas. Será preciso cortar.

Ele disse acreditar ser possível haver consenso no tema, tendo como ponto de partida a redução ou a extinção de despesas que não despertam controvérsia. “Tem de começar pelo que ninguém vai discutir se é justo”, disse. “Um pacto a começar de cima para baixo, e aí cortando com racionalidade, levando em consideração justiça social, desigualdade, princípios com os quais todo mundo é capaz de concordar.”

Vera Magalhães – Acabou a lua de mel?

O Globo

Atritos e falta de interlocução ameaçam tanto investimentos do PAC quanto pauta arrecadatória

O casamento entre o governo Lula e o Congresso nunca foi convencional. Interesses mútuos ditaram uma lua de mel pragmática, sem amor, que durou da PEC da Transição à reforma tributária. Agora, a relação entrará numa nova fase na volta do recesso, e, por ora, os sinais são de crise.

Arthur Lira precisava do governo para se reeleger sem sustos. O governo precisava de Lira para colocar as promessas de campanha de Lula no Orçamento de Bolsonaro. Esses foram os termos que ditaram a união nada estável. O 8 de Janeiro acabou reforçando os laços que ainda eram bem tênues. A governabilidade trôpega foi construída a partir desse pacto fundador, e graças a ela foram aprovadas medidas como o marco fiscal e a reforma tributária.

Mas para que os votos sejam renovados há algumas dificuldades adicionais. A começar pelo fato de a agenda do governo não ser única. Há o projeto de Fernando Haddad de colocar as contas públicas nos eixos aumentando a arrecadação, para o qual ele depende do Congresso. E existe a outra plataforma, de Lula e Rui Costa, que é fazer deslanchar o canteiro de obras, para a qual o governo e o Congresso competem por recursos na inflada coluna do gasto. Haja DR para compatibilizar tantos interesses dispersos.

Bernardo Mello Franco - Todos querem ser frente ampla

O Globo

Campanhas de Guilherme Boulos e Ricardo Nunes disputam mesmo rótulo em SP; na esquerda e na direita, propaganda tenta dar verniz de nobreza à negociação de palanques

Frente ampla virou a expressão da moda na eleição de São Paulo. A ex-prefeita Marta Suplicy reivindicou o termo ao anunciar o apoio a Guilherme Boulos. Na segunda-feira, o governador Tarcísio de Freitas discordou. Disse que ampla mesmo é a frente do prefeito Ricardo Nunes.

A propaganda mastiga as palavras até esvaziar seu sentido. Na disputa paulistana, a ordem é dar verniz de nobreza à velha negociação de palanques.

Líder das pesquisas, Boulos mostrou força ao tirar Marta da gestão do rival. A ex-prefeita abandonou um cargo no governo para se juntar ao candidato da oposição. Daí a falar em frente ampla, é outra história. A chapa terá titular do PSOL e vice do PT. As siglas pertencem ao mesmo campo político e já são aliadas no plano federal.

Elio Gaspari - Sem metas, a Nova Indústria é velha

O Globo

Como disse Lula, 'que a gente possa cumprir isso que a gente escreveu no papel'

Faz tempo, quando o governo do presidente Ernesto Geisel divulgou seu Plano Nacional de Desenvolvimento, o professor Mário Henrique Simonsen, seu ministro da Fazenda, comentou:

— Não leio obras de ficção.

Quem as lê pode perder algum tempo com o programa Nova Indústria Brasil e suas “metas aspiracionais”, com seis missões. Provável mesmo é que a Viúva colocará na mesa créditos de R$ 300 bilhões até 2026.

(Durante a fala de Geraldo Alckmin, ministro do Desenvolvimento e vice-presidente, a câmera percorreu parte da audiência, e pelo menos nove convidados — três dos quais colegas de ministério — liam papéis ou mensagens nos celulares.)

Louvem-se os autores. Eles chamaram as metas de “aspiracionais”. Enunciaram desejos, em vez de cravar promessas. Na Missão 3 aspira-se a “reduzir em 20% o tempo de deslocamento de casa para o trabalho” (atualmente, esse tempo médio é de 4,8 horas semanais).

Na defesa dessa nova política industrial, os doutores repetiram que países como Coreia e Japão cresceram porque suas indústrias foram amparadas pelo governo. Deixando de lado o fato de lá empresários larápios irem para a cadeia e não receberem alívio do Supremo Tribunal Federal, essa é uma velha questão. No Japão e na Coreia havia metas, compromissos e penalizações. Quais serão as metas que as empresas se obrigam a cumprir com a Nova Indústria? Por enquanto, nem uma palavra.

Zeina Latif - Política industrial: use com muita moderação

O Globo

Poderia haver a seguinte regra: para cada nova política proposta, outra ineficiente precisa ser eliminada

Políticas industriais (PIs) visam compensar falhas de mercado prejudiciais ao investimento em setores que geram externalidade ou benefício público superior ao ganho privado. Alguns exemplos são o apoio à indústria nascente e às atividades de pesquisa e inovação.

No entanto, há uma grande distância entre a intenção e a entrega.

A questão é se, na prática, há governança e instrumentos adequados para o governo identificar corretamente o setor a ser contemplado, e desenhar e implementar boas políticas. Isso inclui suspender a PI que fracassou ou não fez bom uso do recurso público.

Apesar da maior quantidade de iniciativas em países desenvolvidos, isso não significa que lá são mais utilizadas – elas tampouco escapam de questionamentos de sua efetividade. O correto é considerar os recursos dispendidos como proporção do PIB dos países (um retrato ainda parcial pela dificuldade de incluir as proteções regulatórias).

Fernando Exman - Segue a marcha da impositividade orçamentária

Valor Econômico

Processo foi iniciado durante o governo Dilma, passou pelas administrações seguintes e agora tenta dar novos saltos

O ano começa com mais um capítulo da disputa entre governo e Centrão em torno do controle do Orçamento. Existe, na visão de integrantes do Executivo, uma “marcha” do Congresso em busca da impositividade da execução das emendas parlamentares. Um processo iniciado durante o governo Dilma Rousseff que, com “galopes trienais”, passou pelas administrações seguintes e agora tenta dar novos saltos.

O movimento teve início a partir de 2013. Candidato a presidente da Câmara, o ex-deputado Henrique Eduardo Alves (MDB-RN) prometeu aos seus pares durante a campanha pelo comando da Casa aprovar o orçamento impositivo para emendas parlamentares individuais.

Ele argumentava que era preciso acabar com a “humilhação do conta-gotas”, numa referência ao esforço empreendido pelos deputados junto ao Executivo para a liberação das emendas. Nas palavras de Alves, que foi eleito presidente da Câmara e depois conseguiu emplacar uma emenda constitucional nesse sentido no ano seguinte, buscava-se um Orçamento “respeitosamente” impositivo.

Nilson Teixeira* - Projeções do PIB são pouco confiáveis

Valor Econômico

Sem ação bem coordenada nos próximos anos, cenário dominante é o de manutenção de baixo crescimento de longo prazo com eventuais surtos de expansão seguidos por períodos recessivos

O erro absoluto da média diária das projeções de crescimento do PIB formadas em dezembro do ano anterior na série do Focus iniciada em 2000 varia entre 0,3 ponto percentual (pp) em 2005 e 5,5 pp em 2019, sendo o erro mediano de 1,4 pp. Das 24 observações disponíveis, as projeções subestimam o crescimento em 11 anos, com mediana de 1,5 pp, e o superestimam em 13 anos, com mediana de 1,3 pp.

De forma simplificada, assume-se que a realização do crescimento do PIB no ano é distribuída de acordo com uma curva normal, com o centro sendo o resultado mais provável e a probabilidade dos outros possíveis valores diminuindo à medida que esses se afastam do centro da distribuição. Apesar de curta, a série não sugere que essa hipótese seja razoável até, pelo menos, a divulgação em março dos resultados do PIB do 4º trimestre do ano anterior.

A mediana das projeções de mercado do Focus de 19 de janeiro para o crescimento do PIB em 2024 foi de 1,6%, com o mínimo de 0,0% e o máximo de 2,5%. A análise dos dados não descarta a hipótese de distribuição uniforme para valores distantes da mediana das previsões em cerca de um ponto percentual. Assim, a projeção máxima do Focus para 2024 de 2,5% ou uma expansão de apenas 0,5% não deve ser lida como mais improvável do que a chance de ocorrer um crescimento similar à atual mediana das previsões de 1,6%.

Martin Wolf* - Os perigos de um mundo imprevisível

Valor Econômico

Fragilidades do sistema econômico global são reais e devem ser enfrentadas

Na semana passada, discuti cinco motores de longo prazo da economia mundial - demografia, mudanças climáticas, avanço tecnológico, difusão mundial do conhecimentos e o próprio crescimento econômico. Esta semana analisarei choques, riscos e fragilidades. Eu sugiro que, juntos, todos eles moldam a economia em que vivemos.

Um “choque” é um risco que se concretiza. Riscos, por sua vez, são quase todos imagináveis. Na fraseologia útil de Donald Rumsfeld, eles são “desconhecidos conhecidos”. Mas a probabilidade de que aconteçam e sua gravidade são desconhecidas. Estamos rodeados por tais riscos - novas pandemias, instabilidade social, revoluções, guerras (inclusive guerras civis), megaterrorismo, crises financeiras, colapsos do crescimento econômico, reversões na integração econômica mundial, transtornos cibernéticos, fenômenos climáticos extremos, colapsos ecológicos, terremotos muito fortes ou erupções de supervulcões. Todos são imagináveis. Que um deles se concretize aumenta a probabilidade de que pelo menos alguns dos outros também aconteçam. Além disso, as fragilidades conhecidas tornam maiores as chances desses choques, ou no mínimo sua provável gravidade.

Luiz Carlos Azedo - Novo cenário frustra a política externa de Lula

Correio Braziliense

O presidente brasileiro vive um dilema na escolha entre a audácia e a prudência ante a mudança de conjuntura mundial. Duas guerras impactaram a política e a economia global

“De quanto pode a fortuna nas coisas humanas e de que modo se lhe deva resistir” (Quantum fortuna in rebus humanis possit, et quomodo illis sit occurren dum) é um capítulo de O Príncipe, de Nicolau Maquiavel, que trata das virtudes e da fortuna dos governantes. Tem mais a ver com as contingências do que com o acaso ou a sorte propriamente. “Muitos têm tido e têm a opinião de que as coisas do mundo sejam governadas pela fortuna e por Deus (…) Essa opinião se tornou mais aceita nos nossos tempos pela grande modificação das coisas que foi vista e que se observa todos os dias, independentemente de qualquer conjectura humana”, disse Maquiavel.

“Contudo, para que o nosso livre arbítrio não seja extinto, julgo poder ser verdade que a sorte seja o árbitro da metade das nossas ações, mas que ainda nos deixe governar a outra metade, ou quase”, concluiu. A releitura de Maquiavel nos faz refletir sobre as mudanças que ocorreram na política mundial desde a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que assumiu o poder com a memória de quem foi considerado “o cara” por Barack Obama e amplo apoio internacional, sobretudo depois do 8 de janeiro, quando se completou o diagnóstico das principais chancelarias do Ocidente de que o ex-presidente Jair Bolsonaro seria mesmo uma ameaça à democracia.

Vera Rosa - O dia em que dona Marta do PT gritou

O Estado de S. Paulo

Ex-prefeita já mandou Maluf calar a boca e não tem perfil para vice decorativa

O debate estava tenso quando, de repente, um grito ecoou no auditório da TV Bandeirantes: “Cala a boca, Maluf!”. A “ordem” partiu da psicóloga Marta Suplicy, que, dias antes, havia ensaiado aquela forma impactante de interromper Paulo Maluf, seu adversário no segundo turno da disputa pela Prefeitura de São Paulo. Era outubro de 2000.

Durante a campanha, marqueteiros apresentavam Marta como uma mulher que não levava desaforo para casa. Mas pesquisas mostravam que São Paulo era uma capital conservadora. A estratégia foi traçada, então, para buscar um meio-termo, na tentativa de não colar o nome da candidata ao PT de Luiz Inácio Lula da Silva.

Fábio Alves - Dilma, é você?

O Estado de S. Paulo

O novo plano industrial do governo gerou receios de volta de fantasmas fiscais

O primeiro impacto do plano Nova Indústria Brasil poderá ser um indigesto aperto das condições financeiras, apesar de o Banco Central estar no meio de um ciclo de corte de juros, diante dos temores de investidores e analistas de que o governo Lula irá ressuscitar os fantasmas fiscais e parafiscais da gestão da ex-presidente Dilma Rousseff.

Um pacote de R$ 300 bilhões até 2026, sem transparência suficiente sobre como os gastos serão financiados – com aumento do crédito subsidiado –, tampouco metas concretas de avaliação da sua eficiência em termos de política pública, lançado num momento em que a política fiscal do governo Lula sofre uma grave crise de credibilidade com a ameaça de mudança da meta de déficit primário zero já no primeiro ano de vigência do novo arcabouço fiscal.

Cláudio Carraly* - Obsolescência programada - um crime premeditado

A obsolescência programada, estratégia em que fabricantes limitam deliberadamente a vida útil de produtos para impulsionar o consumo, é uma questão complexa e multifacetada, essa prática tem suas raízes no início do século XX, quando as empresas perceberam que podiam aumentar suas vendas limitando a vida útil dos seus produtos, analisando as teorias estratégias que impulsionaram esse fenômeno, é possível entender como a busca incessante pelo lucro moldou esse modelo econômico perverso. Vários países e entidades internacionais, buscam um aparato jurídico para  enfrentamento da obsolescência programada evidenciando a complexidade do problema, enquanto alguns Estados estão na vanguarda dessa discussão, adotando medidas rigorosas, como a França que criou a lei de transição energética, outros países ainda carecem de regulamentações específicas, a análise de tratados internacionais e as propostas de padronização legal são cruciais para o enfrentamento dessa questão, compreender como diferentes nações buscaram soluções e unificar essas abordagens é fundamental para resolução definitiva desse problema. 

Bruno Boghossian - Anabolizante nacional

Folha de S. Paulo

Petista enxerga nacionalização como oportunidade para recuperar terreno e manter viva rejeição a Bolsonaro

Apesar de conhecer as contraindicações, Lula aplicou um anabolizante nacional nas eleições municipais. O presidente definiu a disputa pela Prefeitura de São Paulo como "uma confrontação direta" entre ele e Jair Bolsonaro. Na sequência, estendeu a lógica para o restante do país.

"A disputa é entre um governo que coloca o povo em primeiro lugar, para tentar resolver os problemas dele, e o governo das fake news", disse o petista à rádio Metrópole.

Nenhum político desafia à toa a máxima de que, na hora de votar para prefeito, o eleitor está mais preocupado com buracos nas ruas do que com embates partidários. Mas Lula parece enxergar a nacionalização como uma oportunidade.

Vinicius Torres Freire - Plano Lula 3 para a indústria

Folha de S. Paulo

Crítica foi precipitada e estereotipada; há defeitos velhos e novidades interessantes

O plano de reindustrialização de Lula 3 não é tudo isso que dele estão dizendo. Em particular, não é tudo isso de ruim, segundo a opinião mais comum do economista padrão, "mainstream".

As reações ao anúncio do Nova Indústria Brasil (NIB) foram estereotipadas. Pouca gente leu as 102 páginas muito resumidas do projeto; pelo menos este jornalista não conhece quem seja capaz de avaliar o conjunto de tantas providências relativas a aspectos diversos dos setores público e privado.

Não se trata de reedição de políticas de Lula 2 e Dilma 1. Quanto a dinheiro, por exemplo, não está previsto endividamento exorbitante do governo a fim de inflar os fundos de empréstimo do BNDES.

O NIB terá recursos de uns R$ 300 bilhões em quatro anos (2023-2026), dos quais R$ 250 bilhões em empréstimos do BNDES.

São R$ 62,5 bilhões por ano, menos do que os R$ 100 bilhões dos desembolsos anuais do banco de 2022 e 2023.

Tostão - Existe uma inversão no aprendizado esportivo

Folha de S. Paulo

Crianças precisam se divertir com a bola antes de aprender técnica e regras

Na quinta-feira, dia 25, aniversário de São Paulo, que fará 470 anos, haverá a final da Copinha entre Cruzeiro e Corinthians. Seria aniversário de Tom Jobim, um dos maiores craques da história da música brasileira. É também aniversário de um grande número de cidadãos brasileiros, como este colunista, um idoso de 77 anos, racional, sonhador e independente.

Quero ver ainda a seleção brasileira ganhar mais uma Copa do Mundo e o Cruzeiro ser campeão do Brasileirão, da Libertadores ou da Copa do Brasil. Quero ver ainda o Brasil melhor, trocar muitas benesses, subsídios, fortunas em emendas parlamentares e fundos eleitorais por uma ação mais rápida e eficiente para diminuir os graves problemas sociais, como a violência, a má educação e a falta de saneamento básico e de água potável em quase metade das residências brasileiras, uma vergonha.

Poesia | Dois e dois são quatro - Ferreira Gullar com Narração de Mundo dos Poemas

 

Música | Xodó do Caboclinho - Nonô Germano (Sérgio Kirillos/Joca Leão/Jairo Gonçalves)