quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Opinião do dia – Karl Marx

Não se considera a eleição filosoficamente, que dizer, em sua essência peculiar, quando ela é compreendida imediatamente em relação ao poder soberano ou ao poder governamental. A eleição é a relação real da sociedade civil real com a sociedade civil do poder legislativo, com o elemento representativo. Ou seja, a eleição é a relação imediata, direta, não meramente representativa, mas real, da sociedade civil com o Estado político. É evidente, por isso, que a eleição constitui o interesse político fundamental da sociedade civil real. É somente na eleição ilimitada, tanto ativa quanto passiva, que a sociedade civil se eleva realmente à abstração de se mesma, à existência política como sua verdadeira existência universal, essencial. Mas o acabamento dessa abstração é imediatamente a superação da abstração. Quando a sociedade civil pôs sua existência política realmente como sua verdadeira existência, pôs concomitantemente como inessencial sua existência social, em sua diferença com a sua existência política, e com uma das partes separadas cai a outra, o seu contrário. A reforma eleitoral é, portanto, no interior do Estado político abstrato, a exigência de sua dissolução, mas igualmente da dissolução da sociedade civil.

Encontraremos, mais tarde, a questão da reforma eleitoral sob uma outra forma, isto é, o aspecto dos interesses. Do mesmo modo, discutiremos os outros conflitos, que derivam da dupla determinação do poder legislativo (de ser, de um lado, deputado, mandatário da sociedade civil e, do outro, simplesmente sua existência política, e uma peculiar existência dentro do formalismo político do Estado).

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Karl Marx (1818-1883), ‘Critica da filosofia do direito de Hegel’, p.135. Boitempo Editorial, São Paulo, 2005.

Julgamento final começa, e Temer já prepara posse

• Após nove meses, etapa decisiva do processo pode durar sete dias

Conclusão da ação no Senado terá depoimento da petista e de testemunhas

Nove meses depois de a Câmara abrir o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o Senado inicia hoje o julgamento final da petista no mesmo plenário onde Fernando Collor foi cassado há 24 anos. O capítulo decisivo, que começa com o depoimento de testemunhas, deve terminar na terça ou quarta que vem. Certo de que Dilma será condenada, auxiliares do presidente interino, Michel Temer, já preparam sua posse.

O capítulo final

• Até aliados de Dilma admitem que impeachment deverá passar; Temer já prepara posse

Júnia gama, Cristiane Jungblut e Eduardo Bresciani - O Globo

-BRASÍLIA- Nove meses após o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ter aceitado a denúncia com o pedido de impeachment de Dilma Rousseff, o Senado inciará hoje o julgamento que deverá consolidar, definitivamente, a troca de comando no país. Caso se confirme a condenação, Dilma, afastada do cargo desde 12 de maio, quando o Senado aceitou o processo contra ela, será a segunda presidente na história republicana brasileira a sofrer impeachment — 24 anos depois de Fernando Collor de Mello ter o mandato abreviado em meio a denúncias de corrupção.

Governo avalia que votos estão consolidados e não deve haver surpresa

• Ponto alto do julgamento deverá ser presença de Dilma no Congresso, na segunda-feira

Júnia Gama, Cristiane Jungblut e Eduardo Bresciani - O Globo

-BRASÍLIA- Apesar do cuidado no governo para não ser surpreendido por reviravoltas de última hora, as contas no Palácio do Planalto são otimistas sobre a cassação do mandato de Dilma Rousseff. Auxiliares do presidente interino, Michel Temer, dizem já ter recebido a garantia de que 61 senadores votarão a favor do processo.

Esses auxiliares creem que, a esta altura, há pouco a se fazer para mudar votos, contra ou a favor do impeachment. A bancada do Maranhão, por exemplo, decidiu que votará unida, o que significa dizer a favor de Temer: Edison Lobão, Roberto Rocha e João Alberto.

— Não tem mais muito o que fazer. Os cargos que o governo podia negociar, as nomeações que podiam acontecer, as conversas que tinham para ter já ocorreram nesses meses. Agora, é só monitorar — afirmou um assessor de Temer.

‘Só tem um jeito: temos que ter esperança’, afirma Dilma

• Presidente afastada diz que lutará até o fim para ser absolvida no Senado

Catarina Alencastro - O Globo

-BRASÍLIA- Em sua última aparição pública antes do início do julgamento do impeachment, no “Ato em Defesa da Democracia” em Brasília, a presidente afastada, Dilma Rousseff, afirmou ontem que na próxima segunda-feira irá ao Senado “defender a democracia” e o projeto político que representa. Ela disse que tem esperança de reverter o impeachment e que continuará lutando.

— Só tem um jeito: nós temos que ter esperança. Nesse processo nós já ganhamos. Vamos ter que saber que vamos ter que continuar lutando. Podem contar comigo. Sei que eu sou a primeira mulher eleita presidente da República, sei que as mulheres têm se afirmado. Tenho certeza de que eu serei a primeira de muitas mulheres presidentas deste país.

Senado começa a julgar cassação de Dilma

• Análise final do pedido de afastamento definitivo da presidente se inicia na manhã desta quinta-feira, 25; previsão é de que sessões se estendam até terça ou quarta-feira da próxima semana

Ricardo Brito - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O Senado, em sessão comandada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, começa a julgar nesta quinta-feira, 25, a presidente afastada Dilma Rousseff por crime de responsabilidade fiscal. A sessão dá início à fase final do processo de impeachment. A petista é acusada de ter cometido irregularidades na gestão do Orçamento.

Dilma – que foi afastada da Presidência em maio, após a primeira votação na Casa –, será condenada se ao menos 54 dos 81 senadores considerarem que ela é culpada por ter editado três decretos de suplementação orçamentária sem o aval do Congresso e por ter cometido as chamadas pedaladas fiscais ao atrasar o pagamento de repasses pela União ao Plano Safra, do Banco do Brasil.

Temer já se comporta como efetivo

• Com atenção voltada ao placar do impeachment de Dilma Rousseff no Senado, presidente em exercício atendeu parlamentares e comandou solenidade no salão nobre do Palácio do Planalto, na qual distribuiu afagos e usou seu discurso para fazer promessas

Tânia Monteiro e Carla Araújo - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Com atenção voltada ao placar do impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff no Senado, o presidente em exercício Michel Temer atendeu nesta quarta-feira, 24, parlamentares e comandou uma solenidade no salão nobre do Palácio do Planalto, na qual distribuiu afagos e usou seu discurso para fazer promessas, se comportando como se já estivesse efetivado no cargo. O julgamento final da petista começa nesta quinta-feira, 25, no Senado.

O dia e as negociações para consolidar o placar do impeachment, no entanto, acabaram sendo atropelados pela animosidade criada com o PSDB e o DEM, que se rebelaram contra o aumento do Judiciário e exigiram do Planalto um posicionamento contra o reajuste de salários dos servidores. Ao fim da tarde, porém, o governo obteve uma vitória no Senado, com a aprovação, em segundo turno, por 54 votos, da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que recria a Desvinculação de Receitas da União (DRU).

Em uma demonstração clara de sua preocupação com o futuro, Temer permaneceu no Palácio do Planalto até a madrugada desta quarta-feira acompanhando a aprovação do texto-base da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2017 no Congresso, que incluía o teto de gastos, considerada peça fundamental para o ajuste fiscal.

Dilma diz que fará defesa no Senado em nome da democracia

• Durante ato com apoiadores em Brasília, presidente afastada afirma que vai ao Senado na segunda-feira ‘para que um golpe nunca mais aconteça no País’

Vera Rosa e Rafael Moraes Moura - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Na véspera do início de seu julgamento, a presidente afastada Dilma Rousseff disse que irá se defender no Senado, na segunda-feira, para que “um golpe nunca mais aconteça” no País. Num ato público que pode ser o último antes do impeachment, Dilma lembrou o suicídio de Getúlio Vargas, que tirou a própria vida sob pressão para renunciar, e também o exílio de João Goulart no Uruguai para dizer que não desistirá da luta.

“O que eu vou fazer lá no Senado? Eu vou defender a democracia, os interesses legítimos do povo e, sobretudo, construir os instrumentos para permitir que um golpe nunca mais aconteça em nosso País”, disse.

Temer diz já ter os votos para ser confirmado presidente

Gabriel Mascarenhas, Mariana Haubert e Gustavo Uribe – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Na véspera do início do julgamento final doimpeachment de Dilma Rousseff, o presidente interino, Michel Temer, deu pela primeira vez uma declaração pública em que indica estar seguro de que já tem os votos necessários para que assuma definitivamente o poder.

Questionado pela Folha nesta quarta (24) na saída de um evento sobre quantos votos acredita ter a seu favor, Temer foi direto e sucinto: "Cinquenta e quatro".

Para que Dilma tenha o mandato cassado, é necessário o voto de pelo menos 54 dos 81 senadores no julgamento que começa na quinta (25) e deve ser concluído no dia 30 ou na madrugada do dia 31.

Apesar de trabalhar intensamente pela aprovação do impeachment, e nos bastidores contar com um apoio maior do que os 54 votos necessários, o peemedebista nunca havia explicitado a certeza da vitória.

Temer também negou estar ansioso: "Agora é esperar, com tranquilidade", disse.

A expectativa do Planalto, nos bastidores, é ter até 63 votos pelo impeachment -quatro a mais em relação à votação que deu aval para o julgamento da petista.

Dilma diz que vai ao Senado para que 'golpe nunca mais aconteça no país'

Marina Dias – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Dilma Rousseff chegou pouco depois das 20h desta quarta-feira (24) a um teatro em Brasília, naquele que seria seu último ato público antes do início do julgamento final de seu impeachment.

Da linha de frente de seu governo, contava apenas com a companhia do ex-ministro da Casa Civil Jaques Wagner. Ambos com o semblante bastante cansado.

Vestindo calça preta e camisa vermelha, Dilma ensaiou sorrisos, recebeu flores da plateia de cerca de 500 pessoas e disse vai se defender no plenário do Senado, na próxima segunda (29), para que o que chama de golpe "nunca mais aconteça no país".

Em seu discurso de pouco mais de meia hora, Dilma disse ainda que vive um "outro momento histórico" e, por isso, não precisará "renunciar", se "suicidar" ou "fugir para o Uruguai" para lutar pela democracia. Assim como havia feito em um evento nesta terça (23), em São Paulo, ela se referiu ao suicídio do ex-presidente Getúlio Vargas e ao exílio de João Goulart.

"Getúlio Vargas suicidou-se porque queria preservar a democracia e conseguiu adiar o golpe. Hoje eu não tenho que renunciar, não tenho que me suicidar, não tenho que fugir para o Uruguai. É um outro momento histórico", afirmou a presidente afastada.

Isolada, Dilma vai a julgamento

Na reta final, Dilma perde mais do que ganha

Por Vandson Lima e Thiago Resende – Valor Econômico

BRASÍLIA - Sem apoio da cúpula do seu próprio partido, o PT, no principal argumento que pretende apresentar aos senadores para tentar salvar seu mandato - de realização de um plebiscito para novas eleições - a presidente afastada Dilma Rousseff chega ao julgamento final do impeachment em um cenário que indica ter mais votos a perder do que a ganhar.

Outrora seu aliado mais poderoso, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), já mudou de lado: acertou-se com o presidente interino, Michel Temer, passou a defender medidas caras ao governo e acompanhará o correligionário na viagem à China, para participar da reunião da cúpula do G-20.

Renan, que não votou em fases anteriores do processo, avalia agora a conveniência de depositar ou não um voto em favor de Temer. Há um descontentamento no Planalto com o simbolismo de sua possível abstenção, que na prática seria um voto pró-Dilma. Além disso, cobram o acerto já desenhado, no qual o deputado Marx Beltrão (PMDB-AL), aliado de Renan, assumirá o Ministério do Turismo quando Temer voltar da China.

Temer prepara pronunciamento à Nação

Por Andrea Jubé, Cristiano Zaia e Bruno Peres – Valor Econômico

BRASÍLIA - O presidente interino Michel Temer já começou a redigir o seu pronunciamento à Nação, caso seja efetivado no cargo nos próximos dias, após a conclusão do julgamento do impeachment. O discurso, em tom otimista, será veiculado em cadeia nacional de rádio e televisão logo após a posse e juramento de Temer em sessão do Congresso Nacional. A expectativa do Palácio do Planalto é que o impedimento da presidente afastada Dilma Rousseff seja confirmado pelos senadores, ainda no dia 30 de agosto, com um placar de no mínimo 61 votos - sete além do necessário.

A equipe de Temer planeja o governo efetivo. Depois de participar da cúpula do G-20 na China, Temer comandará o desfile de 7 de Setembro e participará da abertura dos Jogos Paralímpicos no Rio de Janeiro. Em contrapartida, sob pressão da Frente Parlamentar da Agropecuária, Temer deve rever a decisão de recriar o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), já anunciada pela Casa Civil.

Temer começou a escrever sua fala aos brasileiros, que terá um tom mais popular, em contraposição aos discursos que fez até agora como interino. Ele já mostrou esboços do texto aos ministros mais próximos. Um dos auxiliares mais ouvido nessa missão é o ministro da Transparência, Fiscalização e Controle, Torquato Jardim.

Renan diz a Temer que fim do impeachment pode ser antecipado

Gustavo Uribe, Mariana Haubert – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA- O presidente do Senado Federal, Renan Calheiros (PMDB-AL), afirmou ao presidente interino, Michel Temer, que o processo de impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff pode ser concluído na madrugada da próxima terça-feira (30), um dia antes do estimado em cronograma fechado na semana passada.

A hipótese foi considerada em jantar na residência oficial do presidente da Câmara dos Deputados e atende a desejo do presidente interino, que pretende viajar na noite de terça-feira (30) para a China para participar de reunião do G-20. A convite do peemedebista, o presidente do Senado Federal o acompanhará na viagem ao país asiático.

O julgamento – Editorial / O Estado de S. Paulo

Oito meses depois do início do processo, começa hoje no Senado o julgamento final do impeachment da presidente Dilma Rousseff. De acordo com o cronograma estabelecido pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski – que preside também o julgamento desde a fase da pronúncia –, tudo será decidido até o dia 31. Os votos de pelo menos 54 dos 81 senadores decretarão a perda definitiva do mandato de Dilma e a suspensão de seus direitos políticos por 8 anos. Se o impeachment não atingir o quórum qualificado, o processo será arquivado e Dilma Rousseff reassumirá imediatamente a Presidência da República.

De acordo com todos os prognósticos, inclusive de quem se opõe ao impeachment, a condenação de Dilma Rousseff é líquida e certa. De pouco adiantará, para efeitos práticos, que à acusada seja permitido apresentar suas razões, agora pessoalmente, em atendimento ao princípio constitucional da ampla defesa.

Não faltam provas para o impeachment de Dilma

• Processo chega à fase final, tendo sido dado todo espaço à defesa, mas que não consegue responder, sem deixar dúvidas, às acusações de crimes de responsabilidade

O processo de impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff, entra hoje na fase final, sem que o lulopetismo e o advogado da presidente, José Eduardo Cardozo, sejam convincentes ao rebater a acusação de que ela cometeu crimes de responsabilidade no campo fiscal, como definidos pela lei 1.079, de 1950, e estabelecidos na Constituição. E foram muitas as etapas de debates e votações, garantida liberdade absoluta à defesa.

E muito menos convence a delirante acusação de que há um “golpe”. Ela serve apenas para animar militantes, quase sempre sectários, e simpatizantes estrangeiros desinformados. Influentes estes são, pois até conseguiram induzir organismos multilaterais a encaminhar formalmente perguntas sobre a legalidade do processo, respondidas pelo Congresso sem sobressaltos. A própria Dilma ajuda a desfazer a farsa do “golpe” ao comparecer livremente ao Senado, para se defender, em sessão conduzida pelo presidente do Supremo, ministro Ricardo Lewandowski. Seria um golpe dentro do estado democrático de direito, uma contradição em termos. Uma bizarrice.

Sem tempo a perder – Editorial / Folha de S. Paulo

Com o início do julgamento do impeachment nesta quinta-feira (25) e a iminência de um desfecho com a efetivação de Michel Temer (PMDB) na Presidência, torna-se mais aguda a percepção de que o Planalto precisa avançar em suas negociações com o Congresso.

É exíguo, com efeito, o calendário disponível para discussão de pontos nevrálgicos da gestão das finanças federais. A campanha eleitoral nas prefeituras tende a esvaziar o Legislativo nas próximas semanas, ademais de torná-lo ainda menos propenso do que de costume a aprovar medidas de controle dos gastos públicos.

Em pauta estaria, entre outras, a proposta de emenda constitucional (PEC) que limita de forma rigorosa o aumento das despesas governamentais por vários anos, restringindo-o à taxa de inflação do ano anterior.

Senado discute reforma política e fim de coligação

• Proposta também restringe acesso de siglas a Fundo Partidário e tempo de TV

Isabel Braga - O Globo

-BRASÍLIA- O senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) apresentou ontem na Comissão de Constituição do Senado o relatório favorável à aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que estabelece o fim das coligações nas eleições proporcionais a partir de 2022. A PEC também cria uma cláusula de desempenho para acesso das legendas ao Fundo Partidário e ao tempo de propaganda gratuita de rádio e TV. A proposta, de autoria dos senadores tucanos Ricardo Ferraço (ES) e Aécio Neves (MG), tem por finalidade conter a proliferação de partidos no país. O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) pediu vista, adiando a votação da matéria para a próxima semana.

A aprovação na CCJ é o primeiro passo no trâmite da proposta. No Senado, a PEC ainda terá que ser submetida ao plenário e, se aprovada, seguirá para a Câmara dos Deputados, onde o tema deverá encontrar mais resistência, especialmente entre os partidos pequenos e médios. Aloysio Nunes defendeu a medida, argumentando que nenhum país pode conviver com uma pulverização tão elevada de partidos com representação no Congresso Nacional. Atualmente, 27 partidos têm representantes na Câmara.

Presente na CCJ, o senador Ferraço propôs emenda ao projeto para incluir a possibilidade de criação da federação de partidos, uma maneira de tentar vencer a resistência dos chamados partidos ideológicos ao fim das coligações proporcionais. Pela proposta, dois ou mais partidos poderão se reunir em uma federação, atuando como uma única unidade partidária para funcionamento parlamentar. Ou seja, os partidos concorrem juntos, mas têm que permanecer atuando juntos, por quatro anos, durante o mandato parlamentar.

Em pequenas cidades, disputa é bipartidária

Por Estevão Taiar – Valor Econômico

SÃO PAULO - Em 2 de outubro, dia do primeiro turno das eleições, eleitores de quase metade das cidades do Brasil terão apenas duas opções para escolherem quem comandará o seu município, apesar de existirem 35 partidos na disputa deste ano. A chance de enfrentar essa situação é ainda maior se o eleitor for habitante de uma cidade pequena.

É mais provável que esse candidato seja do PMDB do que de qualquer outro partido. Essas são algumas das conclusões de três estudos da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) divulgados ontem e baseados em informações do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Tarso diz que PT precisa promover troca de comando

Por Fernando Taquari - Valor Econômico

PORTO ALEGRE - O PT deve estabelecer um pacto interno para abrir espaço a novos dirigentes e promover uma renovação programática no médio e longo prazo. Para Tarso Genro, ex-governador do Rio Grande do Sul, autor da frustrada proposta de " refundação" da sigla em 2005, no auge do período do mensalão, época em que foi presidente do partido por alguns meses, essa é a única alternativa ao partido para superar sua pior crise em 36 anos de história.

O sucesso de uma refundação a partir do impeachment, cuja fase final se inicia hoje, passa pela criação de uma ampla frente de esquerda, composta não apenas por filiados e militantes do PT. Nesse período, segundo o petista, a sigla não tem que se preocupar com o "imediatismo" das eleições.

"O PT precisa abrir seu núcleo para a nova geração que não tem relação com essa crise que está aí. Devemos buscar um pacto político interno capaz de dar estabilidade a uma nova direção do partido", diz Tarso. O ex-governador entende que uma mudança no programa partidário deve levar em conta a relação de interdependência entre o Brasil e a economia financeira global. "Isso requer um exame completo de como funciona a economia brasileira e como ela pode funcionar em um novo ciclo de desenvolvimento", afirma. "Não estou falando em nacionalismos e autossuficiência. Isso não existe mais. O Brasil deve ter mais presença no comércio mundial e nas relações internacionais para se equiparar aos seus parceiros nesse mundo multipolar", acrescenta.

Loucura com método - Merval Pereira

- O Globo

O interessante nesse embate entre os procuradores da Lava-Jato e ministros do Supremo Tribunal Federal é que todos têm razão em pontos específicos e estão errados em outros tantos, refletindo a complexa transição que estamos vivendo, de um país em que o patrimonialismo ainda prevalece, mas está sendo duramente combatido, para outro, mais amadurecido politicamente, em que a Justiça pode atingir a todos, e em que os direitos do cidadão são mais respeitados.

Já não somos o país em que cidadãos “acima de qualquer suspeita” estão fora do alcance da lei, mas ainda não somos o país em que todos são iguais perante a lei. A imensa desigualdade social persiste, como pano de fundo dessa mudança que se deseja, mas que ainda é inalcançável, dando margem a que populistas de todos os calibres se ofereçam como salvadores da pátria.

Temer longe da urna - José Roberto de Toledo

- O Estado de S. Paulo

Às vésperas de perder o “interino” de seu título, e em tempo de estrear na política internacional em viagem à China, Michel Temer deve manter-se longe da política local – dos palanques, ao menos. O presidente em exercício anunciou que não fará campanha nas eleições municipais. Foi uma decisão esperta. A julgar pelos resultados das pesquisas Ibope em 22 grandes e médias cidades divulgados esta semana, seria, sim, por falta de convite.

Temer tem saldo negativo de popularidade em 22 das 22 cidades pesquisadas. Em todos elas, as taxas de ótimo e bom atribuídas ao seu governo são menores do que as taxas de ruim e péssimo. O tamanho do buraco varia de município para município, de região para região, mas, sem exceção, mais eleitores desaprovam a gestão Temer do que a elogiam. Logo, sua presença em palanques teria mais chance de atrapalhar do que ajudar um candidato.

PMDB e PSDB em rota de colisão - Luiz Carlos Azedo

• Começou a contagem regressiva para que Temer assuma o poder em caráter definitivo, o que mudará a relação entre os aliados

- Correio Braziliense

Quando a marcação é constante e a distância diminui, diz uma boa e velha regra de navegação, a rota é de colisão. Alguém tem que corrigir o curso para evitar o desastre. É o que está acontecendo entre o PMDB e o PSDB no Congresso, onde as velhas contradições entre os dois partidos afloram. As tensões entre as duas bancadas são ainda mais acirradas porque os dois partidos disputam o espaço vazio deixado pelo PT nas eleições municipais, a começar pelas eleições de São Paulo. Na capital paulista, o PMDB pode renascer das cinzas, graças à candidatura de Marta Suplicy, que larga com quase o dobro de intenções de votos do candidato tucano João Doria. Se não houver alteração no quadro, irá para o segundo turno contra Celso Russomano (PRB), líder folgado da disputa.

O PT rasga a bandeira de Dilma – Bernardo Mello Franco

- Folha de S. Paulo

Às vésperas do julgamento final do impeachment, a direção do PT rasgou a última bandeira de Dilma Rousseff: a realização de um plebiscito para antecipar as eleições presidenciais de 2018.

A presidente afastada levou meses para encampar a ideia levada por senadores amigos. Quando finalmente decidiu aceitá-la, foi sabotada por seu próprio partido. A executiva petista rejeitou a proposta por ampla maioria : 14 votos a 2.

A decisão é um presente para os escudeiros de Michel Temer. Na próxima segunda, quando Dilma enfrentar o plenário do Senado, eles poderão fazer uma pergunta irrespondível: "Como a senhora vem cobrar nossa adesão a uma ideia que nem o seu partido apoia?".

O estrume do futuro - Maria Cristina Fernandes

• Gilmar Mendes se credencia para controlar a porteira

- Valor Econômico

O ministro do Supremo Tribunal Federal José Antonio Dias Toffoli ofereceu uma oportunidade ímpar a Gilmar Mendes. Ao defender o colega, alvo de uma acusação sem provas ou evidências que extrapolem a delação de um empreiteiro, o ministro blindou-se de críticas de partidarismo, sensibilizou o corporativismo da Corte e credenciou-se como líder da tropa que enfrentará o Ministério Público para conter a Lava-Jato.

A força-tarefa de Curitiba foi, até outro dia, alvo da admiração de Mendes. Na condução coercitiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, fez uma piada - "Antes batiam à nossa porta e a gente sabia que era o leiteiro, não a polícia" - antes de sair em defesa da ação: "Não tenho elementos para avaliar a decisão do juiz Sergio Moro, mas certamente ele deve ter tomado todas as cautelas". Foi dele a liminar, depois confirmada pela Corte, que sustou a ida do ex-presidente para a Casa Civil.

Muito além do impeachment - Demétrio Magnoli

• Ascensão de Temer, o terceiro vice afortunado numa linhagem que abrange Itamar Franco, não assinala um novo começo, mas um desfalecimento

- O Globo

“Não celebramos, hoje, uma vitória política. Esta solenidade não é a do júbilo de uma facção que tenha submetido a outra, mas festa da conciliação nacional, em torno de um programa político amplo, destinado a abrir novo e fecundo tempo ao nosso país.” Três décadas atrás, em março de 1985, estas frases, escritas pelo presidente Tancredo Neves para seu discurso de posse, foram lidas pelo vice José Sarney, que subia a rampa do Planalto e proclamava o ano zero da “Nova República”. Michel Temer, o sapo transformado em príncipe, logo as ecoará, com alguma variação retórica, marcando a conclusão do impeachment de Dilma Rousseff. Como quem sacode o paletó, expurgando-o de impurezas, o presidente se libertará do rótulo de “interino” invocando a “conciliação nacional” e anunciado a aurora de um “novo tempo”. A história se repetirá, mas como farsa. De fato, isso é um epílogo, não uma introdução.

Aperfeiçoamentos na PEC do teto do gasto - Ribamar Oliveira

• Judiciário poderá estourar o teto já no primeiro ano

- Valor Econômico

Há uma intensa negociação no Congresso Nacional em torno da proposta de emenda constitucional (PEC) 241, que institui um teto para o gasto da União. O próprio governo já está convencido de que é preciso fazer "alguns aperfeiçoamentos" no texto para torná-lo exequível. O primeiro problema que surgiu está relacionado ao Judiciário, que teria que entrar em um processo de ajuste rigoroso para não estourar o seu limite, já no primeiro ano de vigência do novo regime fiscal.

A PEC prevê a fixação, para cada exercício, de um limite individual da despesa por Poder e para os órgãos autônomos. A despesa de cada um em 2017 será a mesma verificada neste ano, corrigida pelo IPCA de 2016. Um gasto que vai aumentar muito no próximo ano é com pessoal, pois a maior parte dos servidores recebeu reajuste salarial.

A carga mais pesada - Míriam Leitão

- O Globo

Um brasileiro pode viver num país com taxa de desemprego de 20,6% ou no Brasil de apenas 1,9% de desempregados. Depende da renda. A primeira é a taxa de desemprego dos 10% mais pobres; a segunda, dos 10% mais ricos. Foi o que mostrou ontem o ministro Henrique Meirelles. Com isso, ele comprova de forma eloquente a perversidade da crise econômica que desabou sobre o país.

O ministro da Fazenda e o ministro Dyogo de Oliveira, do Planejamento, foram ontem à Câmara para tentar convencer os parlamentares a votar a favor da Proposta de Emenda Constitucional que estabelece que os gastos públicos só poderão ser reajustados de acordo com a inflação do ano anterior. Para começar, eles traçaram o tamanho da crise provocada internamente pela política econômica que levou à desorganização fiscal. O Brasil perdeu 16% de PIB per capita. Era R$ 30,5 mil, em 2013, eé R$ 25,7 mil, em 2016. Por isso, eles chamam a crise de “sem precedentes”.

Exige-se serenidade – Editorial / O Estado de S. Paulo

Não será com insinuações, disse que disse e maledicências que as autoridades farão o saneamento da profunda crise moral que atinge o País. A desavença entre o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, não produziu outra coisa senão desconfiança na capacidade das instituições – ou de seus dirigentes – de conduzir com a serenidade necessária o processo de depuração que os brasileiros de bem tanto exigem.

No fim de semana passado, a revista Veja publicou uma reportagem que relatava ter sido o ministro do STF Dias Toffoli citado na proposta de delação premiada de Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS. O vazamento dessa informação, cujo teor ainda carece de confirmação, levou Janot a mandar suspender as negociações para a delação de Pinheiro. A Procuradoria-Geral considerou que a publicação teve o propósito de pressionar os procuradores a fechar o acordo com Pinheiro. É uma versão cuja lógica é difícil de acompanhar, pois não é possível dizer o que Léo Pinheiro ganharia mandando vazar eventual menção a um ministro do Supremo no âmbito de um acordo de delação que ele se empenhava tanto em obter.

Conter a violência eleitoral deve ser ação estratégica – Editorial / O Globo

A informação do ministro da Defesa, Raul Jungmann, de que as Forças Armadas reforçarão a segurança no município do Rio até outubro, numa extensão, em menor escala, do dispositivo policial militar montado para Olimpíada/Paralimpíada, é um sinal importante de que o governo federal se movimenta para assegurar tranquilidade nas eleições deste ano. A presença de efetivos militares, em especial no dia do pleito, é inegável fator de intimidação contra atos de violência em regiões em que ameaças de crimes com motivação política são uma inquietante realidade, principalmente em zonas eleitorais pressionadas pela ação do crime organizado (tráfico/milícias).

Pontualmente, a presença de tropas durante o processo eleitoral é positiva pelos resultados mais imediatos (proteção a candidatos, segurança das urnas, garantia ao cidadão para exercer seu direito de voto etc.) que se podem esperar dessa providência. Mas o caráter circunstancial da medida não responde ao desafio mais amplo de o Estado dar termo, definitivo, a situações crônicas de insegurança política.

Mais planos ruins ameaçam as agências reguladoras – Editorial / Valor Econômico

O governo interino de Michel Temer parecia ter dado um passo à frente no fortalecimento das agências reguladoras, ao incentivar projetos no Legislativo que as tornem de fato independentes financeiramente e ao estabelecer as qualificações mínimas para o exercício de seus postos de direção. Essas medidas auxiliam a impedir a praga da traficância política direta no comando da operação dos órgãos reguladores. Entretanto, dá vários passos rumo ao retrocesso ao pretender limitar a função dessas autarquias, de maneira semelhante à do projeto patrocinado em 2003 por José Dirceu, então ministro-chefe da Casa Civil do primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

O objetivo aparente de retirar das agências a preparação de editais e a organização de leilões é fortalecer o poder da secretaria do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), comandada por Moreira Franco, um dos mais próximos colaboradores de Temer. A intenção é limitar o âmbito de atuação dos órgãos reguladores à fiscalização, o que é apenas uma de suas importantes funções. O diagnóstico ventilado é que as autarquias acabaram se tornando uma "espécie de Procon" e agindo como se fossem órgãos de defesa do consumidor (Valor, ontem).

O teu riso - Pablo Neruda

Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar, mas não
me tires o teu riso.

Não me tires a rosa,
a lança que desfolhas,
a água que de súbito
brota da tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.

A minha luta é dura e regresso
com os olhos cansados
às vezes por ver
que a terra não muda,
mas ao entrar teu riso
sobe ao céu a procurar-me
e abre-me todas
as portas da vida.

Meu amor, nos momentos
mais escuros solta
o teu riso e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,
ri, porque o teu riso
será para as minhas mãos
como uma espada fresca.

À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer
sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero teu riso como
a flor que esperava,
a flor azul, a rosa
da minha pátria sonora.

Ri-te da noite,
do dia, da lua,
ri-te das ruas
tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro
rapaz que te ama,
mas quando abro
os olhos e os fecho,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.

Cartola, no moinho do mundo – Carlos Drummond de Andrade

Você vai pela rua, distraído ou preocupado, não importa. Vai a determinado lugar para fazer qualquer coisa que está escrita em sua agenda. Nem é preciso que tenha agenda. Você tem um destino qualquer, e a rua é só a passagem entre sua casa e a pessoa que vai procurar. De repente estaca. Estaca e fica ouvindo.

Eu fiz o ninho.
Te ensinei o bom caminho.
Mas quando a mulher não tem brio,
é malhar em ferro frio.

Aí você fica parado, escutando até o fim o som que vem da loja de discos, onde alguém se lembrou de reviver o velho samba de Cartola; Na Floresta (música de Sílvio Caldas).

Esse Cartola! Desta vez, está desiludido e zangado, mas em geral a atitude dele é de franco romantismo, e tudo se resume num título: Sei Sentir. Cartola sabe sentir com a suavidade dos que amam pela vocação de amar, e se renovam amando. Assim, quando ele nos anuncia: “Tenho um novo amor”, é como se desse a senha pela renovação geral da vida, a germinação de outras flores no eterno jardim. O sol nascerá, com a garantia de Cartola. E com o sol, a incessante primavera.

A delicadeza visceral de Angenor de Oliveira (e não Agenor, como dizem os descuidados) é patente quer na composição, quer na execução. Como bem me observou Jota Efegê, seu padrinho de casamento, trata-se de um distinto senhor emoldurado pelo Morro da Mangueira. A imagem do malandro não coincide com a sua. A dura experiência de viver como pedreiro, tipógrafo e lavador de carros, desconhecido e trazendo consigo o dom musical, a centelha, não o afetou, não fez dele um homem ácido e revoltado. A fama chegou até sua porta sem ser procurada. O discreto Cartola recebeu-a com cortesia. Os dois convivem civilizadamente. Ele tem a elegância moral de Pixinguinha, outro a quem a natureza privilegiou com a sensibilidade criativa, e que também soube ser mestre de delicadeza.

Em Tempos Idos, o divino Cartola, como o qualificou Lúcio Rangel, faz o histórico poético da evolução do samba, que se processou, aliás, com a sua participação eficiente:

Com a mesma roupagem
que saiu daqui
exibiu-se para a Duquesa de Kent
no Itamaraty.

Pode-se dizer que esta foi também a caminhada de Cartola. Nascido no Catete, sua grande experiência humana se desenvolveu no Morro da Mangueira, mas hoje ele é aceito como valor cultural brasileiro, representativo do que há de melhor e mais autêntico na música popular. Ao gravar o seu samba Quem Me Vê Sorrir (com Carlos Cachaça), o maestro Leopold Stockowski não lhe fez nenhum favor: reconheceu, apenas, o que há de inventividade musical nas camadas mais humildes de nossa população. Coisa que contagiou a ilustre Duquesa.

* * *
Mas então eu fiquei parado, ouvindo a filosofia céptica do Mestre Cartola, na voz de Sílvio Caldas. Já não me lembrava o compromisso que tinha de cumprir, que compromisso? Na floresta, o homem fizera um ninho de amor, e a mulher não soubera corresponder à sua dedicação. Inutilmente ele a amara e orientara, mulher sem brio não tem jeito não. Cartola devia estar muito ferido para dizer coisas tão amargas. Hoje não está. Forma um par feliz com Zica, e às vezes a televisão vai até a casa deles, mostra o casal tranqüilo, Cartola discorrendo com modéstia e sabedoria sobre coisas da vida. O mundo é um moinho...” O moleiro não é ele, Angenor, nem eu, nem qualquer um de nós, igualmente moídos no eterno girar da roda, trigo ou milho que se deixa pulverizar. Alguns, como Cartola, são trigo de qualidade especial. Servem de alimento constante. A gente fica sentindo e pensamenteando sempre o gosto dessa comida. O nobre, o simples, não direi o divino, mas o humano Cartola, que se apaixonou pelo samba e fez do samba o mensageiro de sua alma delicada. O som calou-se, e “fui à vida”, como ele gosta de dizer, isto é, à obrigação daquele dia. Mas levava uma companhia, uma amizade de espírito, o jeito de Cartola botar em lirismo a sua vida, os seus amores, o seu sentimento do mundo, esse moinho, e da poesia, essa iluminação.

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In Jornal do Brasil,27/11/1980

Beth Carvalho - O Mundo é um Moinho & As Rosas não falam