segunda-feira, 26 de março de 2012

OPINIÃO DO DIA – Gramsci: hegemonia

Pode-se dizer concretamente que Croce em sua atividade histórico-política põe a tônica unicamente naquele momento que em política se chama “hegemonia”, do consenso, da orientação cultural, para distingui-lo do momento da força, da coerção, da intervenção legislativa e estatal ou policial. Em verdade não se compreende porque é que Croce acredita na capacidade desta sua colocação da teoria da história liquidar definitivamente toda a filosofia da práxis. Ocorreu justamente que no mesmo período em que Croce elaborava esta sua soidisant clava, a filosofia da práxis, através dos seus maiores teóricos modernos, era elaborada no mesmo sentido, e o momento da “hegemonia” ou da orientação cultural era então sistematicamente reavaliado em oposição às concepções mecanicistas e fatalistas do economismo. Tornou-se antes possível afirmar que o traço essencial da mais moderna filosofia da práxis consiste justamente no conceito histórico-político de “hegemonia”.

GRAMSCI, Antonio, (22/1/1891-27/4/1937). Cartas do Cárcere, p.287. Civilização Brasileira, 3ª Edição, Rio de Janeiro, 1987.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Mesmo extinta, CPMF rende R$ 1,7 bilhão ao governo
Além da propina, superfaturamento
Serra vence prévia do PSDB com pouca folga

FOLHA DE S. PAULO
Serra tem vitória magra e é candidato a prefeito
Capital da morte

O ESTADO DE S. PAULO
Serra vence prévia com 52% dos votos e PSDB prega união
CNJ vai ao Rio investigar folha salarial de juízes
Governo edita 40 medidas protecionistas
Anvisa não tem como coibir aditivo de cigarro

VALOR ECONÔMICO
BC rastreia crédito fora do balanço dos bancos
Rombo do Portus já é de R$ 2,7 milhões
FGTS banca empresas com prejuízo
EAS renegocia prazos com Transpetro
Relator do Código Florestal repassa decisões a Estados
Brasil busca na OMC opção de alívio cambial
Serra vence prévias e será o candidato do PSDB à prefeitura de São Paulo
Mais recursos à Finep
Anac confirma Viracopos

CORREIO BRAZILIENSE
Internet, terra sem lei dos pedófilos
Serra ganha as prévias

ESTADO DE MINAS
Mais fraudes em Ministérios
PT renova a aliança pró-Lacerda
Serra disputará Prefeitura de SP
Usuários de planos de saúde sofrem na fila
Norte gera mais emprego do que o país

ZERO HORA (RS)
Piratini admite enviar projeto que autoriza bebida durante a Copa
Importações impedem criação de 15 mil vagas

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Dilma admite que País tem capacidade limitada para enfrentar a crise
João da Costa se queixa da "violência" que sofre dentro do próprio PT

O que pensa a mídia - editoriais dos principais jornais do Brasil

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

Um lugar no mundo pela via da democracia:: Alberto Aggio

Em 1990, o cientista político Francisco Weffort publicou um artigo cujo titulo manifestava uma avaliação terrível sobre o continente que convencionalmente é identificado como América Latina: “A América errada”. Era um o texto contundente e suas palavras finais anunciavam um temerário juízo a respeito da situação da América Latina naquela conjuntura que abria a última década do século XX. De acordo com Weffort, para os latino-americanos, pior do que a dependência — que caracterizara toda a sua história — seria o abandono, e, por esse último se deveria entender a “lamentável condição de ‘pueblos olvidados’ que sempre os horrorizou” [1].

O argumento tinha conexão com os tempos triunfantes da atual globalização que impunha sem reservas os termos pelos quais seria possível integrar-se a ela: mais mercado menos Estado e sobretudo menos política; mais empresa menos direitos, mais individuo menos “sociedade organizada”, predomínio integral do mundo financeiro sobre o da produção, e assim por diante. Em paralelo ocorria uma mudança profunda do padrão tecnológico na produção e circulação econômica, não verificada desde os primórdios do industrialismo moderno. Emergia então o que passou a ser conhecido como “economia da informação”, um dos pilares da chamada “sociedade do conhecimento”. Um mundo em profunda transformação e mais uma vez, a América de colonização ibérica teria que se orientar no sentido de um novo aggiornamento ao seu novo andamento. Se aquela “América errada” não buscasse alterar a sua forma ser estaria inapelavelmente condenada.

Como das outras vezes, um enorme desafio colocava-se à inteligência e à imaginação política dos latino-americanos. Prescrevia-se, para o caso, a formação de blocos econômicos para enfrentar essa nova situação. O Mercosul (Mercado Comum do Sul), de 1991, uma iniciativa inovadora que nasce em meados da década de 1980 num contexto de transição à democracia no Cone Sul, apresentava-se como vital ao continente mas se mostrava pouco crível para ser assumido como um projeto que pudesse, por meio da unificação, alterar profundamente os fundamentos estruturais das sociedades latino-americanas e lhe fornecer uma via de passagem para os circuitos da globalização. O estabelecimento do Nafta (North American Free Trade Agreement), em 1994, indicava direção semelhante mas, diante dos problemas ideológicos envolvidos em razão da presença norte-americana, foi incapaz de produzir um consenso positivo na opinião pública latino-americana.

O desafio era real e não se mostrava nem simples nem fácil. Que referências mobilizar para superar o que dificultava a atualização da América Latina a um mundo que se transformava rapidamente? Que caminhos percorrer e onde aportar? É certo que na sua história, a América Latina sempre foi pensada a partir de diversos paradigmas. Como se sabe, o primeiro deles foi o europeu, visto como um modelo a ser atingido e também como aquele responsável pelos históricos problemas que assolam a região. Por essa razão, a Europa foi invariavelmente uma referência contestada, emergindo daí, em algumas épocas e ambientes, uma persistente atitude antieuropeia. Desde o século XIX, o paradigma europeu ganhou a companhia e a concorrência do norte-americano. Mas foi após a II Guerra Mundial que o modelo norte-americano passou a exercer influência e mesmo um poder expressivo nas sociedades latino-americanas, cumprindo até com maior rigor do que o modelo europeu a sina de adesão calorosa e repugnante rechaço. Mais recentemente é o modelo oriental que alcançou um inaudito prestígio, primeiramente como referência em relação à dimensão organizativa do mundo produtivo e empresarial. Depois será a China o grande exemplo a ser quotidianamente mobilizado diante dos dilemas de inserção competitiva enfrentados pelas economias latino-americanas. Mesmo assim, a sua capacidade de assimilação cultural ainda é reconhecidamente limitada.

Um segundo aspecto importante é o reconhecimento de que as sociedades latino-americanas construíram-se historicamente a partir da tradutibilidade de valores e paradigmas da modernidade ocidental. Uma tradutibilidade que viria a condicionar sua ocidentalização e estabelecer os referenciais em torno dos quais as estratégias políticas seriam projetadas e colocadas em prática por diversos setores sociais. Na América Latina, como afirmou José Aricó, a ocidentalização é “o reflexo do desenvolvimento internacional, que manda à periferia suas correntes ideológicas, nascidas sobre a base do desenvolvimento produtivo dos países mais avançados” [2]. Mediante tais processos, não isentos de conflituosidade, organizou-se na América Latina, especialmente durante os séculos XIX e XX, uma sociedade cada vez mais complexa que sempre se compreendeu como parte dessa história mais ampla.

Ao final do século XX, as exigências da globalização demandariam mais uma vez que os latino-americanos mobilizassem a experiência cultural da tradutibilidade em um contexto novo. Além da dura luta contra os regimes autoritários que vicejavam no continente desde meados da década de 1960 e do passivo social que a economia da chamada “década perdida” (1980) havia deixado como seu elemento mais dramático, a questão que se colocava era a de empreender um profundo repensar sobre a América Latina para saber, enfim, a que herança se deveria renunciar, quais preservar e especialmente quais deveriam ser renovadas.

Seria preciso antes de tudo superar visões dogmáticas a respeito do continente. O contexto era novo e seria importante, em primeiro lugar, vencer as velhas orientações de ruptura com o colonialismo ou com a dependência que faziam parte de uma forma de compreender a América Latina própria das décadas de 1950 e 1960. Não fazia mais sentido ver os problemas latino-americanos como decorrentes exclusivamente da subordinação externa, cujo resultado antitético seria, por meio de uma radicalização nacionalista, desvincular a América Latina da própria modernidade. Por outro lado, em razão do predomínio mundial da cultura política de matriz anglo-saxônica, liberal e individualista, a sedução por uma condenação integral do passado latino-americano, visto como estatista e patrimonialista, recolocava em sentido inverso o tema da ruptura. Nessa leitura, a América Latina não era mais do que a consagração de um atraso integral, sem nenhuma condição para acompanhar os passos da nova modernização pós-industrial.

Essas orientações de ruptura ficaram, por assim dizer, a meio caminho. Nem a perspectiva de ruptura protagonizada pela Revolução Cubana conseguiu se generalizar nem o “programa” neoliberal — primeiramente imposto ao Chile depois da derrubada de Allende e que perduraria, com modificações, nos 20 anos de governos da Concertación — tornaram-se vetores integralmente assimiláveis para o conjunto do continente. É certo que ambas permanecem latentes e às vezes são mobilizadas conforme a avaliação que os atores políticos mais inclinados a um ou outro polo fazem da correlação de forças interna e externa. O fenômeno Hugo Chávez na Venezuela não deixa de ser uma das expressões dessa situação, assim como, inversamente, a política atual do governo mexicano, no mesmo sentido do que provavelmente parece indicar o retorno da direita ao governo do Chile depois da vitória eleitoral de Sebastián Piñera, no final de 2009.

Em segundo lugar, haveria que se fazer também um inventário da trajetória de construção da modernidade latino-americana cujo maior déficit continua a ser a fratura entre democracia política e democracia social. Apenas a título de exemplo, pode-se dizer que nenhum dos grandes paises latino-americanos, Argentina, Brasil e México, conseguiu encontrar a justa relação entre política democrática e sociedade democrática, isto é, a “vigência de um sistema de governo baseado em ampla representação e exercido em ambiente de liberdade” com uma sociedade na qual “as desigualdades sociais são reduzidas e em que há uma ampla mobilidade social” [3]. Com dificuldades históricas para estabelecer no país uma política democrática, a Argentina conseguiu organizar uma sociedade democrática que ainda se vê ameaçada depois da crise que a devastou no inicio do século. O México chegou tardiamente à política democrática e, da mesma forma que o Brasil, avança na sua construção, ainda que ambos padeçam a mesma desigualdade social tão comum ao continente.

Em meio ao turbilhão de orientações entrecruzadas, acrescida pela vertigem derivada da emergência e do prolongamento da chamada crise dos grandes paradigmas, a América Latina foi impingida a buscar recursos conceituais e analíticos para compreender os traços essenciais que a caracterizam bem como enfrentar os bloqueios e limites que se acumularam na sua trajetória de construção da sua modernidade. Tratava-se de extrair dessa busca uma reorientação que comportasse, ao mesmo tempo, realismo, capacidade de ação e visão de futuro com vistas a estabelecer para a América Latina um lugar no mundo.

É nesse sentido que se desautoriza, para a América Latina dos últimos anos, o diagnóstico da paralisia. Em todos os planos da vida social verificam-se mudanças significativas. Os desafios que o combate ao autoritarismo colocou acabaram por promover uma virada duradoura e profunda que teria repercussões generalizadas, tanto políticas como simbólicas, particularmente dentre os setores de pensamento democrático e progressista. Do fato e da sedução pela revolução, tão poderosa nas décadas de 1960 e 1970, passou-se à tematização da democracia, em suas diversas dimensões, ainda que no início ela fosse percebida mais como uma esperança difusa do que como uma realidade política complexa. A partir dessa clivagem, pela primeira vez na história do continente, a democracia ganha centralidade, superando o tratamento instrumental que lhe foi historicamente dedicado tanto à direita quanto à esquerda. Pelo menos duas conseqüências podem ser extraídas dessa mudança. Em primeiro lugar, foi possível superar a muralha que existia entre as temáticas do socialismo e do liberalismo político, possibilitando um dialogo produtivo e inovador entre esses dois campos, ainda que alguns setores políticos resistam a essa aproximação e outros a rechacem. Ao nosso ver, ambos se equivocam ao identificarem liberalismo político com oligarquias e ao desvincularem socialismo de qualquer relação com instituições políticas de caráter liberal-democrático. Por essa razão, é importante afirmar que o nexo entre liberalismo e socialismo produziu não apenas a renovação do pensamento político latino-americano como foi fundamental para a formação de alianças políticas de centro-esquerda antes e depois da vitória sobre os regimes autoritários. Em segundo lugar e como parte do mesmo processo, o fracasso das guerrilhas das décadas de 1960 e 1970 suscitou a abertura de uma reflexão crítica sobre a Revolução Cubana, identificada como um paradigma consagrado. Mediante essa reflexão, o imaginário da revolução perdeu energia e vitalidade, o que vem possibilitando uma via de superação frente a décadas de atraso da esquerda latino-americana, abrindo-se a perspectiva de se projetar para o continente uma esquerda com vocação de governo, identificada como democrática, moderna e reformista.

Mas é sobretudo a ebulição, o movimento e as alternâncias de cenários que marcam esse período recente da história política latino-americana. Essas sociedades em “movimento democrático” superaram os regimes autoritários e investiram no aprofundamento da sua democratização. Pode-se afirmar que foi o movimento democrático mais geral que abriu a possibilidade para se avançar em direção a uma cidadania mais alargada, com “velhos” e novos direitos se estabelecendo no âmbito do Estado e da sociedade civil. O caso brasileiro apresenta a mais expressiva conquista nesse sentido em razão da promulgação da Constituição de 1988, considerada a mais democrática de toda a história do país. A democracia política ensejou e deu a orientação precisa para que mesmo atores étnicos e culturais historicamente excluídos viessem à luz em alguns paises, por meio de movimentos sociais vigorosos, e postulassem uma outra organização estatal e civil, reconfigurando ou mesmo reinventando a Nação, como no recente caso boliviano. Se a Bolívia caminhará rumo a um “socialismo comunitário dos movimentos sociais”, de duvidosa inspiração gramsciana, ao cancelar as fronteiras entre sociedade política e sociedade civil, essa é uma questão a ser acompanhada com toda atenção. Contrariu sensu, países que não viveram essa dinâmica, nos quais sobreveio a falência da classe política nacional, afogada na corrupção, emergiram situações dicotômicas nas quais a política é vista como soma zero, com base na lógica amigo/inimigo. Não sem razão, o espectro de um novo autoritarismo volta a rondar estes países.

No seu conjunto, a conquista da democracia política parece ser efetivamente o mais extraordinário e histórico movimento que as sociedades latino-americanas realizaram nessa quadra. Como afirmou o cientista político norte-americano, Peter H. Smith, as massas latino-americanas “não estão pegando em armas, fugindo para as montanhas, colocando bombas ou participando de conspirações terroristas. Estão votando. Apesar do amplo ceticismo, não rechaçam a política democrática. Pelo contrário, empregam os instrumentos mais básicos da democracia para expressar suas demandas e buscar uma reforma de amplo alcance” [4]. Em seu dialogo com o mundo, os latino-americanos sabem que a esse movimento juntam-se novas e antigas questões como os temas da integração continental bem como a manutenção da estabilidade econômica aliada a uma perspectiva de desenvolvimento sustentável.

É parte da vocação latino-americana a ideia de que pensar para onde se caminha indica também a forma de como ela se vê e toma consciência do que é. Talvez essa América não possa mais ser vista como uma “América errada”. Frente a frente consigo mesma, a América Latina descobriu e assimilou, pela primeira vez em sua história, o fato de que a democracia pode e deve ser um elemento intrínseco à modernidade que a constituiu e que historicamente se projetou como um destino a ser perseguido. Na América Latina, a democracia não é, portanto, um fato importado. O desafio da sua construção ainda orienta o seu “movimento” e parece ser cada vez mais forte o reconhecimento de que não poderá haver sociedade democrática sem política democrática.

Depois de tanto andar é aqui que chegamos e nada indica que essa situação não seja irreversível. Por isso, resta a confirmação, hodierna e futura, de que aquilo que se construiu já pode ser catalogado não somente como um patrimônio de idéias e convicções compartilhadas mas também como uma realidade efetiva.

Alberto Aggio é professor da Faculdade de Ciências Humanas e Socais da Unesp, Câmpus de Franca. Esta conferência foi proferida pelo canal on-line do Centro de Estudios Brasileños da Universidade de Salamanca em 17/02/2012.

Notas

[1] WEFFORT, Francisco. “A América errada”. Lua Nova, São Paulo, n. 21, 1990, p. 5-40. Francisco Weffort é professor aposentado da Universidade de São Paulo (USP), foi um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores (PT) e seu secretário geral durante a década de 1980. Afastou-se do partido e, depois de 1994, após a vitória de Fernando Henrique Cardoso (PSDB, Partido da Social-Democracia Brasileira) nas eleições presidenciais, foi Ministro da Cultura por dois mandatos consecutivos.

[2] ARICÓ, J. La cola del diablo. Caracas: Nueva Sociedad, 1988, p. 99. Ao reproduzir quase integralmente o texto gramciano, Aricó está buscando aqui dar viabilidade analítica à noção de revolução passiva para se pensar a história e a política da América Latina.

[3] CARVALHO, José Murilo. “Do patético ao tragicômico”. Folha de S. Paulo (Caderno Mais), 11 ago. 2002.

[4] SMITH, P. H. La democracia en América Latina. Madrid: Marcial Pons, 2009, p. 17.

FONTE: GRAMSCI E O BRASIL.

Serra vence prévia com 52% dos votos e PSDB prega união

Ex-governador recebe votação abaixo da prevista, mas diz que partido terá agora "uma só voz, um só trabalho"

O ex-governador José Serra venceu ontem a prévia tucana e foi escolhido pré-candidato a prefeito de São Paulo pelo PSDB. Serra ficou com 52,1% dos votos dos 6.229 eleitores. Em segundo lugar, ficou o secretário José Aníbal, com 31,2% dos votos, seguido pelo deputado Ricardo Tripoli, com 16,7%. A disputa foi mais acirrada do que se previa. Coordenadores da campanha de Serra esperavam, no mínimo, 55% dos votos. Serra contou com a apoio do governador Geraldo Alckmin e do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Ao lado de Aníbal e Tripoli, Serra destacou a unidade do partido. "A partir de hoje, uma só voz, um só trabalho e a vitória para o povo de São Paulo", declarou. Fernando Henrique disse que, se o governo federal entrar de cabeça na campanha para defender o candidato do PT, pode se "quebrar".

Serra vence prévia do PSDB com 52% dos votos e dirigentes pedem unidade

Bruno Boghossian, Julia Duailibi

O ex-governador José Serra venceu ontem a prévia tucana e será o candidato a prefeito de São Paulo pelo PSDB. A disputa interna mostrou um partido dividido: Serra teve 52,1% dos votos dos 6.229 filiados. Em segundo lugar ficou o secretário estadual José Aníbal (Energia), com 31,2% dos votos, seguido pelo deputado federal Ricardo Tripoli, com 16,7%. Foi a primeira vez que o partido fez prévia para escolher um candidato a prefeito.

A votação de Serra, que já foi prefeito, governador e candidato a presidente da República pelo PSDB duas vezes, frustrou os coordenadores da sua campanha, que esperavam, no pior cenário, pelo menos 55% dos votos. O tucano obteve 3.176 votos, uma diferença de apenas 256 votos dos outros dois adversários somados. O partido conta com cerca de 21 mil filiados, mas os próprios dirigentes não esperavam mais do que 5 mil votantes.

A articulação feita pelos serristas, com o apoio do governo do Estado - secretários do governador Geraldo Alckmin estavam envolvidos diretamente na disputa pró Serra -, almejava chegar a 80% dos votos. Alckmin declarou voto a Serra há duas semanas e ontem o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso também declarou apoio a ele. Nas últimas semanas, no entanto, diante da força de Aníbal na zona sul, o porcentual começou a ser revisto para cerca de 65%.

Análises. Enquanto aliados de Aníbal e Tripoli apontavam um partido dividido, os serristas justificavam a votação abaixo do esperado alegando que faltou tempo para que pudessem convencer a militância de que Serra era o melhor candidato. "Poderia ter sido melhor", admitiu um dos coordenadores da campanha. "Aníbal e Tripoli fizeram campanha por quase um ano e o Serra por um mês."

Após a divulgação do resultado, Serra destacou a unidade do PSDB, ao lado de Aníbal e Tripoli. "Saímos desse processo unidos. A partir de hoje, uma só voz, um só trabalho e a vitória para o povo de São Paulo", declarou.

De mãos dadas com o ex-governador, Tripoli e Aníbal, publicamente, exaltaram a unidade do partido. "No início do processo de prévia, disse que aquele que vencesse teria o apoio dos demais. Promessa feita, promessa cumprida", afirmou Tripoli. "O partido sai muito fortalecido da prévia, inclusive e, principalmente, na sua unidade", declarou Aníbal. Nos bastidores, porém, parte dos tucanos admite que há riscos de os dois se afastarem da campanha de Serra.

Dirigentes do PSDB negaram que o placar tenha sido ruim para Serra. "Sempre alguém vai ter mais voto ou menos voto. É por isso que você faz a prévia", disse Alckmin. "O número não é o problema. A prévia cumpriu seu papel, o de promover a unidade do partido", minimizou o presidente do PSDB, Sérgio Guerra.

Serra disputará a Prefeitura pela quarta vez. Foi candidato em 1988, 1996 e 2004. Eleito prefeito, renunciou ao cargo um ano e três meses depois para disputar o governo do Estado.

O tucano não pretendia concorrer à Prefeitura, mas se viu pressionado a entrar na disputa depois que um de seus principais aliados, o prefeito Gilberto Kassab, ameaçou apoiar o candidato do PT, Fernando Haddad. Também pesou na sua decisão o então isolamento que vivia no partido, desde a derrota na corrida presidencial em 2010.

Kassab telefonou para Serra ontem à noite e o parabenizou. "Agora, devemos ter um prazo de cerca de 45 dias pra definir o nome do vice",disse o prefeito.

Críticas ao PT. Em seu discurso, Serra criticou indiretamente o PT e a gestão de Marta Suplicy (2001-2004), evidenciando uma das linhas que adotará na campanha. "Eles se especializaram em gritaria, conversa mole, cooptação e no uso da máquina pública para servir aos interesses de um partido", disse. O tucano falou que ao assumir a Prefeitura, em 2005, a cidade estava "falida" e que havia "fila de credores" para receber pagamentos. "Vamos ter que mostrar, não atacando, mas para deixar claro a diferença entre nós e eles."

O ex-governador tentou destacar a parceria com Alckmin. "Como prefeito, a parceria principal, fundamental, é com o governo do Estado", disse ele.

Alckmin chancelou o discurso de Serra. "Vamos fazer uma boa dobradinha: o Marcos ou Neymar. Luis Fabiano ou Liédson. Podem escolher. Serra está preparado para ser o melhor prefeito da história de São Paulo", afirmou, citando nomes de jogadores de clubes paulistas.

Criticado por adversários por "nacionalizar" a disputa na capital, Serra deu enfoque local ao discursar, citando números e bairros da cidade. "É uma eleição local. Muitos tentarão fugir disso", declarou, ao mencionar a "folha de serviços" prestados à cidade na sua gestão.

Colaboraram Isadora Peron e Felipe Frazão

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

FH nega divisão e sugere prévia em 2014

Ex-presidente, que votou em Serra, diz que disputa não rachou PSDB na capital e, se necessário, sigla repetirá processo para Presidência

Julia Duailibi

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso descartou ontem um racha no PSDB depois da prévia que definiu o ex-governador José Serra pré-candidato do partido à Prefeitura de São Paulo. Disse ainda que, se o governo federal entrar de cabeça na campanha para defender o candidato do PT, pode se "quebrar".

FHC voltou a defender prévia para a escolha do candidato a presidente do PSDB em 2014. Apesar de dizer que Serra estará focado na administração da cidade, ele não o descartou como presidenciável.

"Nomes naturais no PSDB não há. Estamos longe de 2014. Se não houver nome natural, prévias e pronto. A vida democrática é assim", disse ao ser questionado se Serra era o nome natural para a corrida presidencial - o senador mineiro Aécio Neves também está na disputa e FHC já chegou a dizer que ele era o candidato óbvio para o cargo.

"Sempre que houver mais de um candidato, o PSDB deve usar o sistema de prévias, primárias", completou. Indagado se Aécio era quem mais ganhava com a indicação de Serra para concorrer à Prefeitura, FHC desconversou: "Quem ganha mais é a cidade de São Paulo".

O ex-presidente negou um processo de divisão no PSDB paulista com a prévia. "O que divide o processo é quando tem um afastamento de alguém por força de um poder maior. Quando não tem, quando se dá numa disputa que todos concordaram em disputar, eles automaticamente estão comprometidos, fica muito mais difícil você criar uma dificuldade", afirmou FHC, que votou ontem em Serra.

"No PT, Lula manda". Ao defender as prévias, FHC criticou o PT. "No PT é tudo imposição. O Lula vai lá e manda. Vai ser a Dilma, vai ser o (Fernando) Haddad. O PSDB está se aperfeiçoando para ser mais aberto."

Fernando Henrique criticou ainda uma eventual entrada do governo federal na campanha em São Paulo para ajudar Haddad. "Se entrar de cabeça, pode quebrar a cabeça. Quando eu fui presidente, tinha um cuidado de nas eleições municipais apenas manifestar o meu voto, na minha cidade."

A presidente Dilma Rousseff já declarou que manterá a isenção nas eleições municipais de outubro, particularmente nas cidades em que os partidos da base aliada, como é o caso de São Paulo, terão mais de um candidato.

Currículo. FHC negou que o PSDB tenha temido a renovação ao escolher Serra candidato. "Quando um partido tem um candidato mais forte, prefere o candidato mais forte." FHC afirmou que votou o ex-governador porque ele teria "mais currículo". "Mas não é só por isso. Todos os candidatos têm. É que tenho uma relação histórica com o Serra, de mais de 40 anos."

O ex-presidente minimizou a rejeição a Serra, que atinge cerca de 30% do eleitorado. "No processo, diminui. Ele ainda deu um conselho ao ex-governador sobre os questionamentos a respeito da renúncia à Prefeitura em 2006 para disputar o governo do Estado. "Eu, se fosse ele, não responderia mais. Porque vocês vão perguntar o tempo todo. Os eleitores já sabem. Sabem em que circunstâncias ele saiu, pressionado pelo próprio eleitorado que o elegeu governador, portanto aprovou o gesto."

O tucano afirmou ainda que não cabe agora a Serra pensar em deixar o mandato. "Ele sabe disso, todos sabemos. Ele não está fazendo manobra para deixar São Paulo na mão. Ele realmente está disposto a governar."

Governo. Ao comentar a crise na base aliada do governo federal no Congresso, o ex-presidente declarou que trocar "seis por meia dúzia" não adianta.

Há dez dias, a presidente Dilma Rousseff trocou os líderes do governo no Congresso, o que contribuiu para aumentar o clima de insatisfação entre partidos que apoiam o governo, especialmente o PMDB.

"Há um processo de distribuição do poder no governo que deste jeito não vai. Não sei se ela vai conseguir. Às vezes, não adianta trocar seis por meia dúzia. Ela está sentindo as dificuldades de uma montagem política que não está baseada nos interesses de um programa, mas nos interesses de partidos e, eventualmente, de balcões nos ministérios."

Fernando Henrique evitou críticas diretas à presidente e disse que não gostaria de comentar muito o assunto, pois está "alheio" a ele. "Eu estou longe de Brasília, agora você está vendo por aí o que está acontecendo", disse o ex-presidente.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Objetivo de tucanos agora é aumentar leque de alianças

Para conseguir apoio do DEM, pode sair até contrapartida na BA

Gustavo Uribe e Sérgio Roxo

SÃO PAULO. Com a vitória na prévia do PSDB, o objetivo dos aliados de José Serra passa a ser a busca por alianças. O próprio candidato tucano deve deixar de lado as agendas públicas, nos próximos dias, para se dedicar a essa tarefa.

- A prioridade será buscar o maior leque possível de alianças - afirmou o secretário estadual de Desenvolvimento Metropolitano, Edson Aparecido, um dos coordenadores da campanha de Serra.

Os apoios do PSD e do PP já estão garantidos. O objetivo é tentar também uma aliança com o DEM, mas o partido tem exigido em contrapartida apoio tucano à candidatura do deputado federal ACM Neto à prefeitura de Salvador. O pré-candidato tucano na capital baiana é o deputado Antonio Imbassahy, que esteve ontem na cerimônia de anuncio da vitória de Serra, num indicativo de que deve seguir o pedido do ex-governador.

O PV é outro alvo dos tucanos, assim como o PDT, o PPS e o PR. De olho nisso, Serra aproveitou para criticar o governo federal por causa da crise com a base aliada.

- Temos de prestar agora muita atenção, estar muito abertos para alianças. Mas aliança de verdade, não aliança em torno de interesses imediatos que levam à paralisia da administração, como ameaça acontecer na esfera federal.

A escolha do vice de Serra depende das costuras políticas. O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, presidente nacional do PSD, sugeriu os nomes de seus secretários municipais Alexandre Schneider (PSD) e Eduardo Jorge (PV) e da atual vice-prefeita da cidade, Alda Marco Antonio (PSD).

O ex-governador deve se dedicar ainda à estruturação da sua equipe de campanha, da qual farão parte, além de Aparecido, o ex-governo Alberto Goldman, o senador Aloysio Nunes (SP), o deputado federal Walter Feldman, o deputado estadual Orlando Morando e o vice-governador de São Paulo, Guilherme Afif Domingos (PSD).

A equipe deve traçar uma estratégia para evitar as criticas dos adversários por ter deixado a prefeitura em 2006 para disputar o governo do estado, um ano e três meses após eleito, mesmo tendo assinado um compromisso se comprometendo a cumprir o mandato.

FONTE: O GLOBO

Para Guerra, decisão paulistana fortalece projeções do partido

Raymundo Costa

BRASÍLIA - A candidatura de José Serra a prefeito de São Paulo deu um novo ânimo ao PSDB e às oposições, ameaçadas de perder, em conjunto, cerca de mil prefeituras nas próximas eleições municipais, segundo projeções preliminares feitas nesses partidos. "O problema do PSDB era não ser competitivo em São Paulo, pois, em geral, estamos bem resolvidos em todo o país", diz o presidente nacional tucano, deputado Sérgio Guerra (PE).

O PSDB espera crescer sobretudo nos oito Estados governados por tucanos: São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Goiás, Alagoas, Pará, Tocantins e Roraima. Nas avaliações do PSDB, o PT e o PSB são os dois partidos da base aliada que mais devem crescer, sobretudo em cima dos partidos da base aliada, como o PMDB. Um fato que pode provocar uma reestruturação na relação de forças partidárias em nível nacional. Um pouco maior ou menor, o PSDB continuará sendo a alternativa de poder ao PT, na opinião de Sérgio Guerra.

São Paulo, o maior colégio eleitoral do país, é o principal reduto eleitoral dos tucanos, sobretudo depois de 2004, quando o PSDB desbancou o PT da prefeitura da capital - o atual prefeito, Gilberto Kassab, é aliado de Serra mas considera a administração da cidade, nas gestões dele e de Serra, uma coisa só. O risco, agora, era o PSDB entrar na eleição de São Paulo com um candidato sem condições de ameaçar a chapa que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está montando justamente para desalojar os tucanos de sua principal base eleitoral, tendo à frente o ex-ministro Fernando Haddad.

Na opinião de Sérgio Guerra, a candidatura de José Serra surpreendeu o PT, tanto que o partido preferiu apostar na formação de um novo nome para a competição. Com Serra, ex-prefeito, governador e candidato derrotado em duas eleições presidenciais, o presidente do PSDB acredita que a tendência da candidatura Fernando Haddad é de "isolamento" - PSB e PCdoB, por exemplo, integram a base governista nacional do PT, mas não são peças certas na composição da chapa de Fernando Haddad.

Guerra também acredita que a candidatura de Serra pode ajudar a pacificar o partido. "A candidatura do Serra é necessária para o PSDB de São Paulo e é necessária para o PSDB de todo o país", afirmou o presidente do PSDB. Guerra é reconhecidamente um aliado da candidatura do senador Aécio Neves (MG) a presidente da República, em 2014, mas também dúvidas que o PSDB pareceria um partido menor, se não se apresentasse um nome de peso nacional em São Paulo - isso sem emitir nenhum juízo de valor sobre os demais candidatos às prévias.

O PSDB espera chegar em 2014 com pelo menos 80% do cadastro de filiados do partido em ordem, a fim de que os tucanos possam realizar prévias efetivamente representativas. Ele nega que a direção nacional esteja pensando em antecipar a prévia para a indicação do candidato presidencial para o primeiro semestre de 2013, o que os aliados de Serra consideram que seria um golpe para neutralizar qualquer veleidade do tucano em disputar novamente no Palácio do Planalto em 2014. Se for eleito em outubro, ele mal terá se instalado na cadeira de prefeito, no primeiro semestre de 2013.

Guerra acha que a eleição de outubro terá um caráter marcadamente municipal e nem terá influência no resultado da eleição presidencial, dois anos depois. "Elas não são relevantes para a eleição de governador e de presidente da República", diz. São inúmeros os exemplos de governadores que perderam a eleição mesmo tendo a maioria dos prefeitos. A influência de 2012, segundo o presidente tucano, será no desempenho do partido nas eleições proporcionais: quanto mais prefeitos e vereadores o partido eleger, maior pode ser o tamanho da bancada de deputados federais.

O tamanho da bancada federal dos partidos é o que determina, segundo a legislação eleitoral, o tempo de rádio e televisão que cada sigla terá no horário eleitoral gratuito e seu percentual do fundo partidário. São dois dos principais fatores para o crescimento de um partido.

Nas avaliações feitas pelo PSDB, na região Sul o partido deve permanecer mais ou menos como está no Rio Grande do Sul, diminuir em Santa Catarina e crescer no Paraná. O problema em Santa Catarina é que os tucanos perderam gente para o PSD do prefeito Gilberto Kassab.

No Sudeste, a expectativa também é de crescimento em Minas Gerais (cerca de mais 40 prefeitos), São Paulo (mais ou menos 10 a mais) e no Espírito Santo (cerca de 10). Nesses três Estados, o PSDB entra com candidatos competitivos na capitais, muito embora em minas o nome seja o do atual prefeito, Marcio Lacerda, que é do PSB. Na região, o Rio de Janeiro continua sendo o calcanhar de aquiles do PSDB.

No Centro-Oeste a projeção é de crescimento em Goiás, governado por um tucano, no Tocantins e nos dois Mato Grosso. No Nordeste, existe uma aposta na aliança com o DFM de Antonio Carlos Magalhães Neto (ACM Neto), na Bahia, ou a candidatura própria de Antonio Imbassahy. As oposições estão um pouco mais confiantes em Salvador, por causa do bom desempenho na pesquisa de ACM Neto e de Imbassahy.

Em Pernambuco, outro colégio eleitoral importante, as melhores chances estão no entorno de Recife. Se João Alves conseguir passar ileso de uma denúncia de crime eleitoral, é favorito em Aracaju (SER). Espera também ficar com a prefeitura de Teresina, onde sempre foi forte. No Norte, aposta em Belém, capital do Pará, Estado governado pelo partido.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

PT renova a aliança pró-Lacerda

Em reunião tensa e com votação apertada, petistas de BH decidem reeditar dobradinha com o PSB para tentar reeleger Marcio Lacerda. Sem veto à coligação com tucanos, a briga agora é pela escolha do vice.

A briga agora é pelo vice

PT decide reeditar a aliança com o PSB sem vetar a presença dos tucanos na coligação. Candidatos a formar chapa com Lacerda não perdem tempo e já começam as articulações


Alice Maciel e Bertha Maakaroun

O PT chegou ao fim de sua primeira batalha interna. Numa votação apertada – 255 a 224 votos, o equivalente a 53% contra 47%, dentro de um colégio eleitoral de 479 delegados presentes –, os petistas de Belo Horizonte decidiram ontem, durante o tenso Encontro de Tática Eleitoral, reeditar a aliança com o PSB, do prefeito Marcio Lacerda. Apesar do forte tom crítico do apoio, que também recomenda aos socialistas a exclusão dos tucanos, na prática os delegados do PT entregaram ao PSB – que já confirmou a participação formal do PSDB – a construção da aliança. A resolução aprovada pelos delegados em votação direta ainda apresenta como pontos importantes da aliança com os socialistas a coligação proporcional e a ênfase no programa de governo às questões sociais, culturais e habitacionais, com maior participação popular num eventual futuro mandato.

Ao apontar para a reedição da aliança, o PT indicará o candidato a vice-prefeito. Será o início da segunda grande batalha interna, anunciada para 15 de abril, quando o mesmo colégio de delegados eleitos em 18 de março voltará a se reunir para homologar o candidato a vice da legenda. Tão logo os votos foram conferidos, ao pé de ouvido as novas articulações se iniciaram. Estão colocados na disputa o deputado federal Miguel Corrêa Júnior, o deputado estadual André Quintão e o ex-deputado federal Virgílio Guimarães, que poderá ainda tentar emplacar algum nome técnico. Entre eles, o procurador geral do município, Marco Antônio Rezende Teixeira, a secretária municipal de Educação, Macaé, o secretário municipal de Obras e Infraestrutura, Murilo Valadares, ou até mesmo o secretário nacional de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde, Helvécio Magalhães, que já disse que não deixará o cargo.

O apoio do vice-prefeito e presidente municipal do PT, Roberto Carvalho – que tem 35% dos delegados –, será disputado, ainda que um provável racha interno se anuncie com a formalização do PSDB na aliança. "Ninguém tem relação tão estreita com Roberto como eu", disse ontem Miguel Corrêa, que tem 23% dos votos dos delegados. Segundo Miguel Corrêa, a escolha do vice se dará da mesma forma que a decisão de ontem. "O vice será votação em turno único, pelos mesmos delegados. É o mesmo colégio e o mesmo quórum", acrescentou Corrêa. Por enquanto, Roberto Carvalho não quis se pronunciar: "Há muita coisa para discutir antes de discutir o vice".

Maioria Dentro do grupo de petistas que defendeu a candidatura própria à Prefeitura de Belo Horizonte está o vereador Arnaldo Godoy, que pertence à corrente Articulação, de Patrus Ananias. "Para vice votarei em André Quintão", anunciou ontem o vereador, que conta com 5% das indicações de delegados. Diferentemente de Corrêa, André Quintão defende a escolha do vice não a partir da maioria eleitoral, mas como resultado de uma construção. "Será muito ruim se a definição for pela simples regra da maioria. É importante discutirmos o papel do vice, assim como um nome que reflita um conjunto ampliado de forças do PT e que represente o conteúdo programático do ideário do PT", acrescentou André Quintão.

André Quintão terá o apoio de Patrus Ananias, que deseja um compromisso programático firme da chapa de Lacerda. "O importante é que seja um nome que traduza os compromissos históricos do PT com ênfase no campo das políticas públicas sociais", disse o ex-ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Já Virgílio Guimarães, que tem 12% dos delegados, desconversa sobre o vice: "Ainda não é o momento para tratarmos disso".

Satisfeito com a decisão dos delegados do PT, o prefeito Marcio Lacerda evitou se pronunciar sobre o processo interno do partido que indicará o vice em sua chapa. "Respeito o PT e o seu processo de decisão interna, embora sempre tenha desejado a reedição da aliança e acreditado nisso", afirmou Lacerda.

FONTE: ESTADO DE MINAS

PT sai rachado de encontro

Defensor da candidatura própria, Roberto Carvalho ainda acredita na exclusão dos tucanos de aliança. Se isso não ocorrer, ele estima que parte da militância não vai participar da campanha

Alice Maciel

A reunião começou com discursos de união, mas o que se viu durante todo o processo de votação no encontro de Tática Eleitoral do PT – que definiu o destino da legenda em Belo Horizonte nas eleições municipais – mostrou que o partido está longe de chegar a um consenso. O vice-prefeito Roberto Carvalho, que sempre defendeu a candidatura própria, já deu o recado: se o PSB decidir pela aliança com o PSDB, os 224 delegados que foram contrários à aliança com os socialistas não vão participar da campanha . "A maneira de unificar o PT é uma chapa sem a presença dos tucanos", reforçou.

Apesar de a resolução aprovada ontem no partido ter jogado para o PSB, do prefeito Marcio Lacerda, a decisão a respeito da participação dos tucanos na chapa, o vice-prefeito acredita que cabe agora aos petistas que defenderam a tese da aliança com os socialistas convencer o outro partido a tirar o PSDB da jogada. "Nós vamos dar até o dia 14 para que os companheiros das outras chapas retirem o PSDB da aliança. Se o PSDB não estiver, nós marcharemos juntos. Se estiver, não participaremos", ressaltou, acrescentando que a posição dos tucanos não é problema do PSB, mas do PT.

Para Roberto Carvalho, ainda não há racha no partido, já que todas as alas da legenda defendem a exclusão do PSDB. Os militantes, entretanto, dizem que há divisão e demonstraram isso durante todo o encontro. A ala que defendeu a candidatura própria pretende fazer uma reunião na terça-feira para formular um manifesto contra a decisão. A questão é que, de acordo com a resolução aprovada ontem, não foi colocada como condição à aliança com os socialistas a não participação dos tucanos na chapa, mas apenas uma indicação de rejeição. E, se depender do PSB, como o próprio prefeito já afirmou em várias entrevistas, o PSDB já está dentro.

O presidente estadual petista, Reginaldo Lopes (PT), um dos responsáveis por defender a bandeira da aliança com o PSB, acredita que, diferentemente de 2008, o partido agora vai se unir. De acordo com ele, desta vez a decisão combinou a condição política com a aprovação da maioria dos militantes. "Em 2008 nós erramos, despolitizamos a política, nós fizemos uma geleia, deixando parecer que o Aécio era um bom moço que dialogava com o PT", afirmou.

Ele continuou defendendo que desta vez os petistas estão deixando claro que os tucanos são um desconforto nessa aliança. "Se eles quiserem entrar, eles estão aderindo a um projeto iniciado pelo PT. O projeto em que o PT é majoritário. Então eles fazem um favor ao Marcio, não a nós. Nós não dialogamos com eles, nós não vamos participar da campanha. Onde eles estiverem, nós vamos para o outro lado", disse o deputado, observando que o veto do partido foi político e não legal.

Linha O ex-ministro Patrus Ananias, que antes colocava como crucial a exclusão do PSDB para a união com o PSB, reforçou o discurso aliancista, defendendo que o que o partido definiu ele vai seguir. "Nós queremos, até por questões nacionais, fazer a aliança com o PSB, essa foi a escolha que o PT fez. Quando a gente define por uma linha de aliança, a gente também não pode impor", disse quando questionado sobre a participação dos tucanos na chapa. Segundo Patrus, o mais importante neste momento é o compromisso com Belo Horizonte e os petistas querem ampliar e melhorar as políticas sociais.

FONTE: ESTADO DE MINAS

João da Costa se queixa da "violência" que sofre dentro do próprio PT

Prefeito se diz vítima de "violência" do PT

PT X PT João da Costa tem encontro casual com Maurício Rands e, visivelmente irritado, reclama do processo de lançamento do nome do correligionário à sua revelia e "na surdina"

Álvaro Filho

Após o primeiro encontro que teve com o deputado federal Maurício Rands (PT) depois que o parlamentar anunciou sua disposição de disputar a indicação do PT como candidato à Prefeitura do Recife, o prefeito João da Costa classificou como inadmissível a "violência" com que vem sendo tratado pelo próprio partido. Ele avisou que não vai correr da briga e seguirá até o fim, dando a impressão que ser candidato à reeleição, agora, é uma questão de honra. "E eu vou ganhar a prévia, pois há um sentimento entre os filiados e que o que estão fazendo comigo não é justo", afirmou, convicto. João da Costa também contou que sua indignação foi tão grande que ele procurou pessoalmente o presidente estadual do PT, deputado Pedro Eugênio, para revelar seu descontentamento sobre o lançamento de outro nome sem o partido ter a "decência" de informá-lo.

O encontro entre Costa e Rands aconteceu no sábado, durante a festa de aniversário do empresário Janguiê Diniz, no seu apartamento, em Boa Viagem. E deixou claro que a disputa pelo poder no ninho petista – e por uma receita na ordem de R$ 5 bilhões que deve "pingar" nos cofres da PCR – não vai ser nada amistosa. Foi uma conversa breve, mas intensa. Pouco antes do prefeito e do deputado, outros dois nomes petistas cotados para a PCR – o senador Humberto Costa e o deputado federal João Paulo – estiveram no local, mas talvez farejando o cheiro de pólvora, passaram pouco tempo e saíram de fininho.

Rands chegou primeiro e circulou pelo salão com pinta de candidato, entre abraços, beijos e sessões de fotos, sem mostrar pudor com o "prefeito" com o qual as pessoas o tratavam. Até a esposa do petista, Patrícia, foi insistentemente chamada de "primeira-dama". Preso à agenda administrativa, Costa chegou pouco mais tarde. Após um primeiro contato visivelmente constrangedor com Rands, um arremedo de abraço, cada um foi para um lado.

Pouco depois, Rands tomou a iniciativa da aproximação. Num cantinho do salão, o que se viu por cerca de dez minutos foi um indignado João da Costa se queixar sobre o lançamento de um nome alternativo à sua revelia e, segundo ele, na surdina. Ao ponto de ter sido "informado" do fato pela imprensa. "Quem tem que avaliar minha gestão não é PT, mas o povo", ponderou. Rands tentou retrucar. Disse a decisão não era uma crítica ao trabalho do prefeito, mas uma forma de buscar unidade no PT e na Frente Popular. Costa não engoliu a conversa. Com o rosto avermelhado e gesticulando a mão que segurava um copo de caipirosca, continuou o sermão. Quando as primeiras máquinas fotográficas e celulares começaram a registrar o encontro, ele se desfez.

Na saída, Rands tentou desfazer a impressão de embate público. Mas deixou claro que, ao contrário do que dizem, é um político cunhado para o confronto. "O nosso campo deu todo o apoio para o prefeito construir a união, mas ele não conseguiu. Agora, o sentimento é que eu sou o nome para isso. Não propus a candidatura, ela foi conclamada e vou lutar por ela", avisou.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Governo edita 40 medidas protecionistas

O governo da presidente Dilma Rousseff prepara, ou já baixou, 40 medidas para proteger a indústria nacional contra importados. O protecionismo brasileiro provoca apreensão nos parceiros comerciais, mas os empresários reclamam que é pouco.

Dilma baixa 40 medidas protecionistas e os empresários querem bem mais

Raquel Landim

A presidente Dilma Rousseff já adotou uma avalanche de iniciativas para proteger a indústria nacional da invasão dos importados. Levantamento feito pelo "Estado" identificou 40 medidas aplicadas ou em análise. O protecionismo brasileiro provoca apreensão nos parceiros comerciais, mas os empresários reclamam que as medidas são pontuais e não resolvem o problema.

O esforço engloba desde medidas abrangentes como intervenção no câmbio, maior fiscalização nos portos e preferência a produtos nacionais em licitações, até sobretaxas para produtos específicos, elevação de impostos só para importados e a renegociação do acordo automotivo com o México.

Desde o início da crise em 2008, o ministério da Fazenda já alterou 13 vezes a alíquota e/ou o prazo do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para frear a entrada de dólares - seis só no governo Dilma. O Banco Central também intervém rotineiramente no mercado de câmbio para impedir a alta do real.

A equipe do ministro Guido Mantega adotou medidas heterodoxas no comércio exterior como a alta de 30 pontos porcentuais do IPI dos carros importados ou a transformação do imposto de importação do vestuário em valor fixo (a medida já é lei, mas não foi regulamentada).

A Receita Federal se tornou protagonista no esforço de defender a indústria. Na semana passada, deflagrou a operação Maré Vermelha, que torna mais rigorosa a importação de vários bens de consumo. "Com 200 servidores envolvidos, a mobilização da operação é histórica", disse Ernani Argolo Checcucci Filho, subsecretário de aduanas e relações internacionais.

O órgão discute convênio com o Inmetro para verificar se os produtos importados respeitam normas de qualidade e segurança. Importadores temem que fiscalização vire barreira técnica.

Reforço. Os mecanismos de defesa comercial tradicionais foram reforçados. O governo Dilma aplicou 14 taxas antidumping e outras 11 investigações estão em curso. Também retomou a utilização das salvaguardas e implementou novos instrumentos, como combate a triangulação e investigação de subsídios.

Para Rubens Ricupero, ex-secretário-geral da Unctad, "o Brasil segue o caminho da Argentina" - país criticado pelo protecionismo. Ele diz que a desindustrialização é grave e que as medidas seriam aceitáveis se fossem temporárias e acompanhadas de reformas estruturais.

Vera Thorstensen, professora da Fundação Getúlio Vargas (FGV), argumenta que o Brasil não é protecionista, porque utiliza mecanismos previstos nas regras internacionais. Além disso, a valorização do real anula as tarifas de importação. "A não ser que se discuta a manipulação do câmbio na OMC, o País vai ter que inventar medidas cinzentas para se defender".

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Fraudes em mais quatro ministérios

Justiça, Saúde, Pesca e Meio Ambiente assinaram convênios de R$ 47,8 milhões com ONGs suspeitas de irregularidades. Pastas tentam recuperar dinheiro desviado

Vinicius Sassine

Quatro ministérios que passaram ao largo das demissões em série no governo da presidente Dilma Rousseff assinaram convênios de R$ 47,8 milhões com entidades suspeitas de fraudes. Contratos fechados pelos ministérios da Justiça, da Saúde, da Pesca e Aquicultura e do Meio Ambiente, para os mais diversos programas de governo, foram considerados irregulares pelas próprias pastas e resultaram na inclusão das ONGs num cadastro alimentado pela Controladoria-Geral da União (CGU). As entidades relacionadas estão impedidas há menos de um mês de assinar novos convênios com o governo federal.

Dilma demitiu quatro ministros, numa conturbada crise política, em razão de incontáveis fraudes em convênios firmados entre as pastas e as ONGs. Foi esse o pano de fundo das trocas de comando dos ministérios do Esporte; do Turismo; das Cidades; e do Trabalho e Emprego. Em nenhum momento, as outras quatro pastas entraram no foco da crise. As irregularidades passaram batido, até o Palácio do Planalto determinar um pente-fino em todos os contratos do governo com entidades sem fins lucrativos, em outubro do ano passado. O resultado da investigação, concluída há poucas semanas, apontou fraudes em ministérios até então incólumes à crise.

As irregularidades são as mais diversas e foram constatadas em tomadas de contas especiais, determinadas pelos ministérios a partir da publicação do decreto da presidente Dilma. A tentativa, agora, é de reaver o dinheiro desviado. A CGU criou o Cadastro de Entidades Privadas sem Fins Lucrativos Impedidas (Cepim), no qual estão lançados os nomes das 164 ONGs impossibilitadas de fazer novos convênios com o governo.

A lista é encabeçada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, que direcionou dinheiro para entidades comandadas pelo PDT, partido presidido pelo ministro demitido Carlos Lupi. O pente-fino encontrou 39 contratos com fraudes e outras irregularidades, que resultaram na proibição de as ONGs firmarem novos convênios para capacitação profissional. No topo da lista, na segunda posição, aparece o Ministério da Justiça: foram identificados 36 contratos irregulares, que deixaram de ser executados por entidades que ficaram proibidas de receber novos repasses da União. Os convênios sob suspeita de fraude somam R$ 33,4 milhões.

Pronasci

Os maiores repasses foram feitos a entidades contratadas para o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), vitrine do governo da presidente Dilma na área de segurança. As fraudes envolvem projetos de apoio à implementação do Pronasci em algumas regiões do país. O Centro de Estudos Sociais Contemporâneos, por exemplo, recebeu quase R$ 4 milhões em 2009 para implementar o núcleo local de gestão do Pronasci na região metropolitana de Porto Alegre. A ONG foi incluída no cadastro de entidades impedidas de novos contratos com o governo federal.

Entidades parceiras da Fundação Nacional do Índio (Funai), subordinada ao Ministério da Justiça, também aparecem no cadastro. É o caso da Associação de Cultura e Meio Ambiente (ACMA), que assinou um convênio de R$ 6,5 milhões com a Funai para implantar um programa cultural em comunidades indígenas da Amazônia. O Ministério da Justiça quer reaver o dinheiro destinado à entidade: R$ 5,7 milhões.

"O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, solicitou o máximo de rigor nas análises", informa a assessoria de imprensa do Ministério da Justiça ao Correio. A pasta calcula o valor do dano ao erário e "identifica de quem esse valor será cobrado", segundo a assessoria. "Em busca da boa condução do serviço público, foram determinadas todas as medidas para identificar as irregularidades em convênios firmados. Enquanto a situação não for regularizada, todas as entidades não receberão transferências."

164

Quantidade de ONGs proibidas de firmar contratos com o poder público pela CGU

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Suspeita de fraude na Paraíba envolve ministro

Ministro das Cidades, Aguinaldo Ribeiro convive agora com suspeitas de irregularidades do período em que foi secretário de Ciência e Tecnologia de João Pessoa. Um projeto para oferecer banda larga grátis em parte da cidade de João Pessoa, inaugurado por ele em março de 2010, não funciona. Um representante da empresa Ideia Digital, que venceu a licitação para fornecer o serviço na capital paraibana, foi filmado supostamente oferecendo propina, conforme reportagem do Fantástico, da Rede Globo.

Conforme o programa, há indícios de que equipamentos foram comprados por preços acima do usual no mercado. Sem saber que era gravado e na expectativa de fechar novo negócio, o representante da empresa falou em propina a um produtor do programa.

– O que vem sendo praticado é 5% a 10% (de desvio) – disse ele.

– Dos negócios em que atuei, foi mais ou menos isso – completou.

Aguinaldo Ribeiro se elegeu duas vezes deputado estadual pelo PP. Em dezembro de 2009, Ribeiro assumiu a secretaria. Dez dias depois da inauguração, lembra o Fantástico, ele deixou a secretaria para entrar na campanha que o elegeria deputado federal. Um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão ligado ao Ministério da Fazenda, aponta movimentações atípicas em contas bancárias de Ribeiro.

De acordo com o documento, essas transações aconteceram em agosto de 2006, setembro de 2007, agosto de 2008 e entre janeiro e outubro de 2009 – o que, por enquanto, não configura ilegalidade. O relatório foi entregue a procuradores e à Polícia Federal. Em nota, a assessoria do ministro afirma que há mais de 20 anos ele exerce atividade empresarial e que sua movimentação financeira é compatível com o patrimônio declarado à Receita.

FONTE: ZERO HORA (RS)

Dilma espera que crise esfrie enquanto viaja

Se aliados partirem para enfrentamento, Planalto já cogita vetos ao Código Florestal

Gerson Camarotti

BRASÍLIA. A presidente Dilma Rousseff embarcou ontem à noite para viagem de cinco dias à Índia na expectativa de que os ânimos se acalmem no Congresso, mesmo com o recado expresso de que não cederá às pressões. Diante do impasse com a base governista, o Planalto admite vetos a artigos do Código Florestal, caso seja derrotado, numa sinalização clara de que a presidente não está disposta a ceder na votação da Lei Geral da Copa - aliados rebelados condicionam a aprovação desta lei à votação do código.

Com a forte pressão para votar e modificar o texto do Código Florestal aprovado no Senado, vetos pontuais seriam para evitar descaracterização do acordo original entre governo, ruralistas e ambientalistas. O veto evitaria a anistia aos desmatadores - um constrangimento para Dilma na Rio + 20, em junho.

Essa estratégia foi discutida entre Dilma e articuladores políticos do governo na sexta-feira. Para ela, o desgaste de não votar a Lei Geral da Copa seria do Congresso e não do Planalto. Esse seria também o tom da conversa de Dilma com o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS).

Para Dilma, dificilmente os deputados teriam coragem de contrariar o torcedor, comprometendo a Copa. Em caso extremo, Dilma estaria disposta a editar medida provisória liberando bebidas alcoólicas na Copa.

- Não acredito que os deputados ficarão contra a Copa do Mundo no Brasil. É preciso ter responsabilidade. Caso contrário, eles serão cobrados - advertiu o líder do governo, deputado Arlindo Chináglia (PT-SP).

O tom ameno da entrevista da presidente à revista "Veja" - na qual considerou que não há crise e que são naturais as discordâncias - favorece a estratégia governista de tentar esvaziar a rebelião de setores da base.

Os líderes governistas e os operadores políticos do Planalto reconhecem que Marco Maia não terá condições de segurar por muito tempo a pressão dos ruralistas para pôr o Código Florestal em votação. Como Dilma tem sinalizado que não vai aceitar ameaças, o veto já é visto como um "Plano B" para que Dilma não fique refém do Congresso.

- A presidente Dilma não vai aceitar que a Copa do Mundo seja usada numa chantagem explícita para votar o Código Florestal. A base aliada e os ruralistas querem usar a Copa para emparedar o Brasil. Querem testar o limite da presidente nessa negociação. Vai chegar o momento em que ela vai reagir publicamente e nominar tudo o que está acontecendo - disse um auxiliar da presidente ao GLOBO.

Com a viagem da presidente, a estratégia governista é tentar resolver logo a principal pendência no Senado - a aprovação do Fundo de Previdência Complementar do Servidor Público (Funpresp). E, a partir daí, concentrar o enfrentamento na Câmara. O líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM), foi orientado a tentar votar o Funpresp nesta quarta-feira.

FONTE: O GLOBO

Guerra do Contestado é tema de debate

Sociólogo José de Souza Martins vai discutir conflito com repórteres do "Estado" na 5ª-feira

A Guerra do Contestado (1912-1916), ocorrida na divisa entre Santa Catarina e Paraná e considerada a maior rebelião civil do País no século 20, será tema de um debate promovido pelo Estado nesta quinta-feira, dia 29, das 12h às 14h, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional. O debate ocorrerá no Teatro Eva Herz e a entrada é franca. O auditório tem capacidade para receber 200 pessoas.

O debate Meninos do Contestado terá a participação do professor de Sociologia José de Souza Martins, titular da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP) e estudioso de movimentos sociais, e dos repórteres Leonencio Nossa e Celso Junior, que contarão os bastidores do caderno especial Meninos do Contestado, publicado pelo Estado em fevereiro para marcar os 100 anos do início da guerra. Também será exibido um vídeo produzido pelos dois jornalistas em Santa Catarina, região do conflito, com depoimentos de sobreviventes e reprodução de fotos da época.

As origens da guerra remontam a 1910, quando a Brazil Railway, subsidiária da Lumber Company, concluía a construção do trecho da ferrovia São Paulo-Rio Grande do Sul no território disputado por Santa Catarina e Paraná, o Contestado. A Lumber conseguiu concessão do governo para explorar pinhos e imbuias nos 15 quilômetros de cada lado da ferrovia.

Com isso, 4 mil trabalhadores recrutados em outros Estados para as obras foram demitidos e expulsos de cabanas levantadas nas margens da estrada. A eles se juntaram andarilhos messiânicos que viviam em terras entregues à Lumber e federalistas foragidos do Rio Grande do Sul.

Cenário. O Brasil de 1912 ainda vivia sob o impacto da proclamação da República, duas décadas antes. Representantes do setor agrário de São Paulo e Minas e militares eram os protagonistas de um regime com instituições tomadas pela corrupção e que não conseguia evitar rebeliões nas cidades e no interior.

O presidente Hermes da Fonseca, um militar de carreira, mantinha a política do tio, Deodoro, proclamador da República, e de Floriano Peixoto de aniquilar defensores da monarquia. A presença de federalistas, adversários de Floriano, no movimento do Contestado foi usado pelo governo para esquecer o desastre de Canudos, de 1897, e enviar o Exército para mais uma batalha no sertão, dessa vez no Sul do País. Mesmo deixando 10 mil mortos e um rastro de destruição, o conflito segue pouco conhecido pela maioria dos brasileiros.

Martins vai abordar as causas e o contexto político do País na época da guerra. Colunista do Estado, Martins pesquisou movimentos milenaristas no Brasil, dentre eles o do Contestado - em 1979, ele visitou a região e conheceu cenários de episódios da guerra. Dentre outros livros relativos ao tema escreveu Os Camponeses e a Política no Brasil (Editora Vozes) e O Sujeito Oculto (Editora da UFRGS).

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Um novo retrato de Jango

Quase meio século depois do golpe de 1964, João Goulart começa a vencer o estereótipo do presidente que só tinha defeitos

Paulo Moreira Leite

Os brasileiros deveriam aproveitar o próximo sábado, 31 de março, para uma reflexão histórica. Por uma questão de bom-senso democrático, a data, que marca o 48º aniversário do golpe militar de 1964, foi retirada do calendário das comemorações oficiais. É bom que seja assim. A derrota de 31 de março foi absoluta e completa. Embora seja possível recordar bons números de crescimento econômico e apontar várias medidas que modernizaram o país, a essência da questão é outra. Nenhum país tem o direito de celebrar o fim da própria democracia. É útil, porém, tentar entender o que houve.

É compreensível que até hoje o país não tenha sido capaz de fazer o necessário ajuste de contas com João Belchior Marques Goulart, o Jango. Riquíssimo, por herança e pela competência em multiplicar o patrimônio familiar, Jango foi um dos mais populares políticos brasileiros. Nas eleições de 1955, quando candidatos a vice e a presidente recebiam votos em separado, ele conseguiu 3,5 milhões de votos para vice-presidente, contra 3 milhões conferidos ao titular, Juscelino Kubitschek. Poderia ter sido um candidato competitivo contra o furacão Jânio Quadros, em 1960, se JK não tivesse tido o receio de lançar uma criatura capaz de tornar-se maior que o criador. Herdeiro do PTB por decisão de Getúlio Vargas, Jango coordenou os trabalhos dos sindicalistas e estudiosos que formularam as Reformas de Base, o único programa de um partido brasileiro que se tornou motivo de debates entre os eleitores de cima, de baixo e do meio. Carro-chefe do programa, a reforma agrária era apoiada por 72% da população. Num país rural e de agricultura atrasada, distribuição de terra parecia sinônimo de distribuição de renda.

Jango tinha 42 anos de idade quando assumiu a Presidência, 45 quando a perdeu e 57 quando morreu de infarto no interior da Argentina. Naquele momento, deprimido e preocupado, fazia tratativas para voltar ao Brasil. Em Buenos Aires, o ex-presidente da Bolívia Juan Jose Torres e o general Carlos Pratz, ligado ao presidente Salvador Allende, do Chile, haviam sido assassinados. No Uruguai, a ditadura local prestava qualquer serviço como prova de amizade com a instalada em Brasília, de quem dependia. Depois da morte de Jango, foi preciso pedir autorização ao governo militar para que o corpo fosse enterrado em São Borja, no Rio Grande do Sul. A censura proibiu que emissoras de TV transmitissem reportagens sobre Jango, autorizando somente uma "nota de falecimento", desde que ela não fosse "repetida sucessivamente".

O mistério em torno de Jango diz respeito a seu lugar na história. Com uma unanimidade suspeitíssima, típica de quem busca desdenhar o gaúcho barrigudo, que adorava uísque, mulheres e carne vermelha, além de ser uma chaminé ambulante, aliados e inimigos o descrevem como "fraco", "demagogo", "despreparado", "acomodado" e "incompetente". Como se fosse possível colocar o golpe nas costas de um bode expiatório.

Quando Jango caiu, uma parcela considerável de seus aliados queria fechar o Congresso e convocar uma Constituinte. Outra parcela o considerava moderado demais, um estorvo para o avanço de reivindicações. Os adversários de Jango, que tentaram impedir sua posse, em 1961, depois da renúncia de Jânio, enfim podiam sentir-se vitoriosos. Desde o primeiro dia, articularam um movimento golpista para arrancá-lo do Palácio à força. A Casa Branca, potência que na ocasião era mais que hegemônica nessa parte do mundo, apoiara o golpe com dinheiro, conselhos e, na hora necessária, uma frota de embarcações de guerra.

Jango herdou uma democracia tão enfraquecida que, nos 20 anos anteriores, ocorrera uma tentativa de golpe de Estado a cada triênio. A "incompetência", a "fraqueza" e o "despreparo" do presidente são apenas uma forma de aludir à dificuldade política para remediar a agonia final daquele regime que, na vida real, poucos estavam empenhados em defender. É sintomático que, em 1961, quando três ministros militares anunciaram que não permitiriam a posse de Jango, o país inteiro tivesse reagido como se fosse a coisa mais natural do mundo. Teria sido mesmo, se Leonel Brizola, o então governador do Rio Grande do Sul, não tivesse organizado a resistência com o apoio de generais que comandavam o Exército na região e da própria população civil, que fez fila na porta do Palácio do Piratini, em Porto Alegre, para levar fuzis para casa.

Naquele ponto cruzado da história, Jango sofreu uma derrota decisiva por causa da incapacidade de controlar a economia, num surto inflacionário que alimentava a crise política. O economista Celso Furtado fez um Plano Trienal para tentar arrumar o aparato produtivo, derrubar os preços e retomar o crescimento. Jango nomeou um político conservador, Carvalho Pinto, para assumir o Ministério da Fazenda e acalmar os empresários. Não adiantou. Era preciso convencer os sindicatos a abrir mão de reajustes nos salários num primeiro momento para recuperar os ganhos mais tarde. Isso nunca ocorreu. Jango construíra sua popularidade como ministro do Trabalho de Vargas e era um presidente muito generoso em negociações sindicais. Quando tudo terminou e todos os seus aliados lamentavam a derrota, ele foi acusado pelo líder comunista Luís Carlos Prestes de despertar tendências direitistas no Partido Comunista Brasileiro (PCB) com a distribuição exagerada de concessões "capitalistas".

No Brasil periférico, dependente e agrário dos anos 1960, tomava-se por força do presidente o que era na verdade uma posição de fraqueza. O Estado ruía. Os mesmos adversários que acusaram Jango de provocar a anarquia foram os primeiros a ajudar a produzi-la. Os oposicionistas do governo infiltraram agentes disfarçados entre os militantes de esquerda para ampliar a baderna e produzir, assim, uma sensação dobrada de medo e temor. Nas jornadas do fim do governo, encontravam-se lado a lado militantes do PCB, guerrilheiros em treinamento, sindicalistas do PTB, além de agentes da CIA e do Centro de Informações da Marinha (Cenimar), órgão que trabalhava contra Jango e transformara o cabo Ancelmo em líder de marinheiros rebelados.

Ao deixar o governo, Jango foi retratado como o mais perfeito político populista, aquele que promete o paraíso, mas entrega menos que o purgatório, não tem propostas consistentes para alcançar o que pretende e tenta vender ilusões que jamais serão atendidas. Trabalhando nessa perspectiva, o professor Octávio Ianni, autor do clássico O colapso do populismo no Brasil, condenou Jango, Vargas e também Juscelino como variantes de um mesmo sistema de governo que manipulava o eleitorado para deixá-lo submetido a "mudanças bruscas, golpes de Estado, oportunidades perdidas". Com um olhar assumidamente marxista, a análise de Octávio Ianni alimentou adversários de Jango à direita e à esquerda. Ianni criticou o "populismo" como um desvio condenável no caminho da revolução socialista.

O drama é que, mesmo cercado por aliados radicais, Jango não era nem pretendia ser um revolucionário, diz o professor Jorge Ferreira, autor de João Goulart, uma equilibrada biografia do presidente. "Chamar Jango de populista é uma forma de despolitizar a discussão. Ele falava em humanizar o capitalismo. Era um político de centro-esquerda, um social-democrata nas condições brasileiras. Pensava numa economia pactuada entre empresários e trabalhadores, onde se respeitaria a propriedade privada, com uma melhor distribuição de renda." Para quem gosta de associar Jango à demagogia mais marota, não custa lembrar que ele colocava a mão no bolso. Incluiu uma de suas grandes fazendas de Mato Grosso no primeiro lote passível de reforma agrária. Para o professor Ferreira, "a crítica permanente ao populismo desqualifica o processo democrático, sugere que o eleitor não sabe escolher corretamente". Não por acaso, afirma Ferreira, "populista é sempre o outro". Mas não um outro qualquer. É o outro que tem votos.

O marechal Castello Branco, que arrebanhou apoio para a queda de Jango na liderança de um movimento que condenava o "populismo carismático", como se dizia na ocasião, proibiu eleições diretas e permaneceu na Presidência até 1967. O governador da Guanabara, Carlos Lacerda, imaginava que o golpe abriria um atalho para ele chegar ao Planalto sem que fosse obrigado a enfrentar adversários melhores de urna. Acabou cassado dois anos depois, da mesma forma que Ademar de Barros, o governador de São Paulo que tinha a mesma ambição. Quando o fim da democracia parecia uma festa, um grupo de generais tentou assumir os governos estaduais.

Entre tantos personagens desastrados, iludidos, destemperados, trapalhões, Jango emerge como o mais triste. Desarticulado, enfraquecido, não foi herói nem político providencial. Chegou a imaginar que se salvaria nos braços das 200 mil pessoas reunidas no comício de 13 de março, no Rio de Janeiro. O plano era fazer dez comícios assim, no país inteiro, para culminar no 1º de maio, em São Paulo. Jango sonhava terminar o mandato. Caiu exatamente um mês antes. O golpe militar tinha pressa. Se Jango sobrevivesse até 1965, a luta política entraria no calendário da sucessão presidencial, em que JK era um nome imbatível. Isso criaria circunstâncias mais difíceis para uma ruptura.

No dia 31 de março, Jango fez movimentos contra o golpe, enquanto eles pareciam úteis. Informado de que uma frota americana estava próxima de Vitória, concluiu que não havia mais o que fazer. Era o lance final de uma convivência tensa e difícil com o governo americano, então numa fase de radicalização com a União Soviética por causa da crise dos mísseis, que deixou o mundo à beira da Terceira Guerra Mundial em 1962.

Durante o governo Jango, as grandes engrenagens da Guerra Fria elevaram o clima de tensão e confronto. Criada pelos EUA como promessa de fomentar na América Latina o desenvolvimento econômico e alternativas democráticas ao regime comunista instaurado por Fidel Castro em Cuba, a Aliança para o Progresso aos poucos abandonou a cláusula que repudiava governos nascidos de golpes de Estado. Passou a tolerar rupturas que beneficiavam os aliados dos EUA e abriram as portas para um ciclo militar no continente.

Ainda em 1962, aceitou-se uma intervenção que mudou o resultado de uma eleição presidencial no Peru. Em 1963, com receio de que a Guatemala fosse governada por um aliado secreto de Fidel Castro, a Casa Branca fechou os olhos para um golpe. No mesmo ano, Juan Bosch, presidente da República Dominicana, foi deposto por militares que o acusavam de cumplicidade com "os comunistas." Em 1962, quando o embaixador dos EUA no Brasil, Lincoln Gordon, pediu ajuda para a oposição brasileira nas eleições legislativas, o presidente John Kennedy autorizou a CIA a contribuir com US$ 5 milhões. Kennedy também deixou registrado nas gravações da Casa Branca seu apoio à conspiração militar contra Jango. No fim de 1963, os programas de ajuda dos EUA ao Brasil foram suspensos. Só recebiam recursos, entregues diretamente, os governadores que faziam oposição a Jango.

Em 31 de março, Jango recebeu por telefone três ofertas para render-se e ficar no cargo, subjugado. Com poucas variações, elas propunham o fechamento do Comando-Geral dos Trabalhadores (CGT) e o abandono do projeto de legalização do PCB, clandestino. Recusou as três. "Jango não quis diminuir-se. Preferiu ser leal aos aliados e aos próprios valores", afirma Luiz Alberto Moniz Bandeira, autor de O governo Goulart. Outros presidentes sul-americanos cederam e foram humilhados. Em 1973, apenas no primeiro ano do mandato, o presidente do Uruguai, Juan Maria Bordaberry, fechou o Congresso e abriu as prisões para adversários. Não foi submisso o suficiente e acabou colocado para fora do cargo em 1976. Na democratização, Bordaberry foi levado ao banco dos réus e condenado a 30 anos de prisão, responsabilizado, entre outras coisas, por 14 assassinatos. Presidente da Argentina entre 1958 e 1962, Arturo Frondizi foi destituído por um golpe de Estado. Ao sair da prisão, envolveu-se em várias conspirações contra a democracia e chegou a apoiar o tenebroso regime de Rafael Videla de 1976, responsável pelo morticínio que traumatiza a Argentina até hoje.

Na comparação entre derrotados, Jango deixou uma lição indiscutível: há circunstâncias em que é melhor perder com a democracia que imaginar que é possível vencer uma guerra contra ela.

FONTE: REVISTA ÉPOCA

Gal Costa e Caetano Veloso - Tá combinado

E Demóstenes, hein?:: Ricardo Noblat

"A tudo suporto porque nada fiz para envergonhar meu partido, o Senado, Goiás e o Brasil" (Demóstenes Torres)

O que espera Roberto Gurgel, Procurador Geral da República, para pedir ao Supremo Tribunal Federal a abertura de inquérito contra Demóstenes Torres, líder do DEM no Senado, acusado de ser sócio do empresário Carlinhos Cachoeira na exploração de jogos ilegais em Goiás? O próprio Demóstenes quer ser investigado. Cumpra-se a sua vontade, ora!

Foi em setembro de 2009 que Gurgel recebeu da Polícia Federal o primeiro relatório com gravações e outras provas da ligação de Cachoeira com Demóstenes. Cabia-lhe pedir ao Supremo que investigasse o senador. Ou então arquivar o caso alegando insuficiência de provas. Gurgel não fez nem uma coisa nem outra.

Em 29 de fevereiro último, a Polícia Federal (PF) deflagrou a Operação Monte Carlo para desmontar a quadrilha comandada por Cachoeira e integrada, no mínimo, por 82 pessoas — entre elas dois delegados da própria PF, seis da Polícia Civil e 29 policiais militares, todos de Goiás.

A quem lhe perguntou por que não agiu ao receber em 2009 o primeiro relatório da PF, Gurgel respondeu que preferira esperar os resultados da Operação Monte Carlo. Esperar como, se ele não sabia à época que três anos depois uma operação com esse ou outro nome seria executada?

A desculpa rota foi corrigida em seguida por Gurgel. Ele não agiu "por uma questão de estratégia", disse. Teria sido mais honesto admitir que não agiu porque não quis. Demóstenes integra o Ministério Público de Goiás desde 1983. Gurgel é chefe do Ministério Público Federal. Sabe como é...

Os partidos esperam um sinal de Gurgel para decidir o futuro de Demóstenes. Alastra- se entre eles a vontade de cassar-lhe o mandato por quebra de decoro. Imaginam assim fazer Justiça e se redimir do vexame coletivo que marcou a sessão do Senado destinada a proclamar a inocência de Demóstenes.

Do alto da tribuna do Senado, depois de se defender com meia dúzia de argumentos capengas, Demóstenes ouviu com prazer a fala de 44 dos seus pares. Na tarde de 7 de março passado, com a solenidade requerida pela ocasião, os senadores esgotaram seu estoque de lisonjas em favor de um deles.

O mínimo que chamaram Demóstenes foi de amigo, companheiro legal, competente e verdadeiro homem público. Pedro Simon (PMDB-RS): "Vossa Excelência é uma das pessoas mais competentes e que atuaram com bravura em toda sua vida". Aécio Neves (PSDBMG): "Vossa Excelência é um dos homens públicos mais preparados que há".

Não estava em questão o companheirismo de Demóstenes, nem a sua competência. Os senadores estavam obrigados a ouvir a defesa dele. Mas a prudência aconselhava que esperassem os desdobramentos da operação policial responsável pela prisão de Cachoeira e de mais 30 pessoas. Só então poderiam absolver ou condenar Demóstenes.

De resto, àquela altura, os senadores conheciam em detalhes uma série de fatos que tornavam Demóstenes suspeito da autoria de vários crimes. Há quase 300 gravações de telefonemas trocados entre Demóstenes e Cachoeira. A partir de certo momento, os dois passaram a se falar por meio de um aparelho de telefone imune a grampos. Por quê?

Em uma das gravações, o senador pede R$ 3 mil a Cachoeira para pagar o aluguel de um jatinho. Em outra, pede um jatinho emprestado. Numa terceira, queixa-se do seu iPad que deixou de funcionar. Cachoeira providenciou outro. Antes, presenteara Demóstenes com um fogão e uma geladeira no valor de R$ 30 mil.

Relatórios da PF informam que Cachoeira e Demóstenes são parceiros desde 2006. O império do jogo de Cachoeira se amparava em oito mil máquinas caça-níqueis e 1,5 mil pontos de bingos. Arrecadou nos últimos seis anos R$ 170 milhões. Um terço da dinheirama ficou com o senador, que fez do combate à corrupção seu filão eleitoral.

Há políticos de sobra dispostos a chafurdar na lama com gente como Cachoeira. Demóstenes nem de longe parecia ser um deles. É isso, afinal, o que mais surpreende.

FONTE: O GLOBO