Rosângela Bittar
DEU NO VALOR ECONÔMICO
O PT, em São Paulo, arma-se de argumentos às vésperas de, provavelmente, ter que engolir mais um sapo intragável. Acredita o partido que é devedor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em cuja popularidade pode buscar seu único lenitivo para manter o poder. Sabe que não tem, no momento, um candidato a presidente em melhores condições de sucesso que a candidata imposta por Lula, e aceitou facilmente a opção presidencial por Dilma Rousseff. No jogo parlamentar e relações políticas fora do plano federal, porém, imaginava preservar ideias próprias e alternativas para contrapor-se ao que lhe fosse apresentado como prato feito. É o que tenta fazer.
Depois do humilhante enquadramento da bancada no Senado, obrigada a apoiar o flechado presidente da Casa, senador José Sarney, em nome da preservação dos que usaram a maior estatal brasileira como instrumento de política partidária, aqui denominada de "governabilidade", o PT sabe que o desconforto seguinte será a imposição ao partido do apoio a um candidato não petista ao governo de São Paulo.
O deputado Ciro Gomes já preparou todos os requisitos para transferir domicílio eleitoral e ser candidato em São Paulo, mas tem dito que nada definiu sobre a que se candidatar, nem se vai mesmo disputar. Está ganhando tempo para conquistar a adesão do PT e é este produto que boa parte da cúpula acredita estar sendo embrulhado no Palácio do Planalto para enviar ao partido.
A discussão interna que o PT de São Paulo promove, no momento, é que a candidatura Ciro Gomes em SP poderia até ser lançada, mas pelo seu partido, o PSB, sem substituir a candidatura petista. A votação dos partidos do bloquinho e a do PT se somariam para levar algum candidato da aliança lulista ao segundo turno.
O que emerge da argumentação de cúpula são numerosas razões para que o PT não abdique da candidatura própria ao governo, mesmo que não tenha nenhum nome previamente favorito. A força do PT no Estado é uma dessas razões e seria desperdiçá-la não lançar um candidato. O partido avalia que já venceu na capital. Tem o comando de prefeituras em muitas cidades importantes. Quando foi candidato ao governo, o senador Aloizio Mercadante, com escândalo de armação do falso dossiê contra adversários e tudo o mais, teve 35% dos votos na disputa de 2006. Pergunta-se o PT: Vai conseguir transferir isto para algum aliado? Vai jogar fora?
Outro argumento: As pesquisas qualitativas apontam ao partido que o eleitorado quer "o novo", ou seja, um candidato sem o desgaste dos que têm sido historicamente candidatos. Além disso, gostaria agora o eleitor de saber, de quem pede o seu voto, não apenas o que o candidato fará, mas o que já fez. Neste quesito, acredita o partido poder apresentar duas candidaturas com grande potencial: Emídio de Souza, prefeito de Osasco, com um trabalho de gestão já realizado, e Fernando Haddad, ministro da Educação.
O partido atribui às pesquisas quantitativas, hoje, uma desimportância total para as decisões pois, segundo análises produzidas internamente, elas estão apenas registrando o recall dos candidatos. Por isto não importa se Emídio, por exemplo, aparece com 3%. José Genoíno, quando foi candidato ao governo, começou com 3% e terminou com 22%; Marta Suplicy começou com 3% e terminou com 18%.
Tanto Emídio quanto Haddad enquadram-se no critério do "novo", aquele de quem o eleitor ainda não enjoou. O PT acha que entre seus adversários, inclusive no principal deles, o PSDB, não existe um que não esteja exaurido. Não seria hora, portanto, de perder a oportunidade de aumentar o eleitorado cativo do PT.
A argumentação partidária prossegue com a afeição que a militância tem pelo partido, seu enraizamento popular nas camadas mais pobres e a necessidade de ter um candidato que possa mobilizar isto, contagiar, fortificar a relação com os diretórios, acender a rede de campanha eleitoral. Neste ponto, os dois candidatos que atendem às exigências de novo e realizador se distanciam. Emídio continua a ter força nas avaliações, mas Haddad, não. Sua relação com o partido é fria, encabulada, apolítica. Segundo análise de um integrante da cúpula, esta seria a razão de, a cada tentativa de ressurreição de seu nome para alguma candidatura, os ânimos se arrefecerem com uma rapidez espantosa.
Ficou notório, no PT, seu desempenho na definição e anúncio dos municípios que receberiam Escolas Técnicas: simplesmente baixou uma lista e impôs sua própria geopolítica. Não dividiu a idéia, a decisão, os louros.
O melhor candidato, mesmo, segundo avalia o PT, ainda é o deputado Antonio Palocci. Acredita-se ser ele o único capaz de reunir todas as qualidades expostas ao mesmo tempo: representa o novo, teve experiência de gestão bem sucedida no Ministério da Fazenda, contagia a militância, tem relações com os diretórios e, principalmente, é capaz de ampliar o eleitorado do PT, levando ao partido conservadores que nunca votaram com ele mas apreciam o governo Lula, de que Palocci é considerado "a cara". Sim, porque para o PT será importante que o candidato tenha a cara do governo Lula.
Há, na cúpula partidária, quem defenda que Palocci já deveria estar em campanha há muito tempo, encerrando mais cedo esta fase de recuo em que se colocou para esperar a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o crime de quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa. "Palocci está encolhido, não se movimenta, não vai a reuniões", queixa-se um dos políticos do comando que gostaria de vê-lo consolidar a candidatura.
Na argumentação do PT, uma candidatura própria também daria ao governo condições excepcionais para tentar melhorar a votação de Dilma Rousseff no Estado. A eleição em São Paulo, segundo esta avaliação, exigirá do governo federal uma estratégia específica, bem delineada, principalmente para divulgar o que faz no Estado que, segundo registram no PT, é infinitamente mais e melhor do que parece.
Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras