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O Globo
O discurso de Bolsonaro é tão mentiroso que talvez nem ele
acredite
A
tese da conspiração internacional contra o Brasil foi ressuscitada pelo
discurso de Bolsonaro na ONU. Ela vem acompanhada de um lamento pela ajuda de
maus brasileiros aos que conspiram contra o país.
Modestamente,
tenho sido um desses maus brasileiros, ao longo de meio século. Relato algumas
memórias, comemorando bodas de ouro.
Na
década de 70, a conspiração contra o Brasil consistia em divulgar notícias
sobre torturas e assassinatos sob o governo militar. Usávamos lembranças
pessoais, relatos dos presídios e até documentos levados ao exterior por
abnegados diplomatas.
Com
esse material, construímos uma teia na qual a ditadura se enredou, caiu no
isolamento e foi estigmatizada. O ponto alto desse trabalho foi o Tribunal
Bertrand Russell, em Roma, onde foram denunciadas as agressões aos direitos
humanos no Brasil.
Contamos
com notáveis conspiradores sul-americanos: o colombiano Gabriel García Márquez
e o argentino Julio Cortázar.
As
atividades conspiratórias ressurgiram após o assassinato de Chico Mendes.
Outros seringueiros morreram antes dele. Chico Mendes era um líder
extraordinário, e sua morte coincidiu com uma crescente consciência ecológica
mundial e, dentro dela, o reconhecimento do singular papel da Amazônia.
No
embalo desse movimento, houve o encontro dos povos indígenas em Altamira.
Inúmeros conspiradores internacionais presentes. Entre eles, Sting e Anita
Roddick, dona da Body Shop.
O
tema: construção da Usina de Belo Monte, mais tarde concluída por um governo de
esquerda, sinal de que a conspiração não respeita os parâmetros ideológicos.
Semana
passada, em Nova York, em campanha pela Amazônia, Harrison Ford lembrou que o
primeiro grande concerto pela Amazônia foi de Sting, há 30 anos.
Ford
não mencionou, mas de lá para cá a floresta perdeu 300 mil quilômetros
quadrados de vegetação. Novas vozes surgiram espontaneamente: Brad Pitt visitou
a Amazônia, Gisele Bündchen pediu pela floresta.