Supremo tem 2.632 ações
ainda sem acórdão
Sem a publicação do
documento com o detalhamento das sentenças, decisões tomadas por ministros não
têm efeito
Mesmo condenados, réus
do mensalão poderão esperar muito para cumprir suas penas. A demora na
publicação dos acórdãos, com o detalhamento das sentenças do Supremo Tribunal
Federal (STF), faz com que as decisões tomadas pelos ministros em 2.632 ações
não tenham efeito prático até hoje.
Sem a publicação do
acórdão, necessária para que advogados possam recorrer, condenados não podem
ser presos nem pagam multas. O regimento da Corte prevê prazo de 60 dias para a
publicação, mas há casos julgados há dois anos e meio ainda pendentes. Acúmulo
de trabalho é a justificativa.
Sentenças no limbo
Sem acórdãos publicados, decisões do STF tomadas em 2.632 ações ficam em
suspenso
Carolina Brígido
Atraso. O ministro Ayres Britto, presidente do STF, seguido por Marco
Aurélio de Mello e Celso de Melo, os dois magistrados com maior número de
acórdãos pendentes
UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA
BRASÍLIA - Para que a Ação Penal 470 - conhecida como a do mensalão - ou
qualquer outra que tramite no Supremo Tribunal Federal (STF) seja dada por
concluída, é indispensável a publicação do acórdão do julgamento no Diário da
Justiça. Segundo o regulamento interno da Corte, 60 dias é o prazo máximo entre
a decisão dos ministros e a publicação desse texto. A realidade no dia a dia do
Supremo é, no entanto, bem diferente. Um total de 2.632 ações aguarda a
publicação de seus respectivos acórdãos. Entre elas, há pelo menos uma que data
de maio de 2010. Os ministros explicam o atraso, afirmando que o volume de
trabalho em seus gabinetes é muito grande.
Por lei, sem o acórdão, documento que resume os debates travados em
plenário, todas as decisões dos ministros do STF ficam em suspenso - entre elas
as penas de prisão. Isso significa que, até que o Diário da Justiça torne
público o desfecho do julgamento do mensalão, nenhum dos 25 condenados poderá
ser preso ou pagar multa.
- Isso (o atraso na publicação dos acórdãos) é inacreditável - afirma o
ministro Marco Aurélio Mello. - Temos uma regra no regimento interno
assinalando prazos para o ministro liberar o voto, sob pena de o voto ser
encartado no acórdão com a tarja não revisão. O novo presidente (o ministro
Joaquim Barbosa, que assume a presidência da Corte no dia 22) deveria empunhar
essa bandeira. Todos aplaudiríamos.
Defesa pode apresentar embargos
Além de dar validade à decisão do tribunal, o acórdão é necessário para que
as partes envolvidas no processo possam recorrer das decisões, apresentando
embargos. Assim como em outros casos, no do mensalão, os réus e o Ministério
Público só poderão recorrer depois de terem acesso ao texto publicado. E os
mandados de prisão dos condenados só serão expedidos depois que o Supremo
julgar cada um dos recursos apresentados.
Antes de 2008, a regra no STF era outra: o relator redigia o acórdão e,
depois, os demais ministros o revisavam. Processos julgados antes da mudança do
regimento ainda obedecem a esse rito. Atualmente, o prazo é de 60 dias para a
publicação do documento final, mas o regimento prevê exceções ante "motivo
justificado". Vale ressaltar que não existe fila ou ordem de chegada a ser
respeitada no que diz respeito à publicação de acórdãos. Assim, o documento
relativo ao julgamento do mensalão poderia passar na frente e sair antes dos
demais.
Para que a Corte consiga cumprir o prazo previsto em seu regimento interno,
no caso da Ação Penal 470, no entanto, é bem provável que Barbosa tenha que
trabalhar de casa no recesso de fim de ano. O STF não computa os dias de férias
na observação do cumprimento do prazo.
Em 2007, a denúncia do Ministério Público Federal contra os investigados no
processo do mensalão terminou de ser julgada em 28 de agosto. O respectivo
acórdão, porém, só foi publicado em 9 de novembro do mesmo ano, mais de dois
meses após a decisão. Como o julgamento final do processo é mais complexo,
espera-se que a demora desta vez seja bem maior.
Ministro alega acúmulo de trabalho
Entre as 2.632 ações que aguardam acórdãos estão a de número 503, de maio de
2010, e a que, em maio, autorizou a adoção de cotas para minorias em
instituições de ensino superior. A primeira está há mais de dois anos numa
espécie de limbo. A segunda já cumpre mais de seis meses na mesma situação.
Costumam ser mais rápidos os acórdãos oriundos de decisões tomadas pelas
turmas do Supremo. Nesses casos, em vez de 11 ministros enviando votos ao
relator, são apenas cinco.
Normalmente, após um julgamento, se a posição do relator for vitoriosa, cabe
a ele redigir o acórdão. Mas, se outro ministro discordar dele e tiver sua
posição adotada pela maioria, fica responsável pelo texto. Portanto, o atraso
na publicação não pode ser atribuído apenas ao relator do acórdão, já que ele
depende da revisão dos demais.
Segundo estatísticas do próprio Supremo, o gabinete com maior número de
acórdãos pendentes é o do ministro Celso de Mello, decano da Corte: com 689.
Seu gabinete informou que está priorizando a liberação dos acórdãos e que o
motivo do acúmulo é o volume de trabalho. O gabinete do ministro Marco Aurélio
está em segundo, com 372 ações. Um dos mais vazios é o do ministro Joaquim
Barbosa, com 107.
Marco Aurélio diz que costuma liberar seus votos com prioridade para a
Secretaria Judiciária do tribunal, órgão responsável pela publicação dos
textos. Segundo o ministro, o problema é que nem todos os magistrados agem
dessa maneira:
- Não é por minha causa (o atraso na publicação dos acórdãos). Quando vou à
sessão, já levo relatório, voto e ementa. Os outros ministros demoram a liberar
- declarou.
Hoje há no Supremo 67.890 processos aguardando julgamento.