sábado, 3 de junho de 2023

Oscar Vilhena Vieira* - Os guardiões da floresta

Folha de S. Paulo

Supremo estará dando uma enorme contribuição para a contenção do desmatamento se derrubar a tese do marco temporal

A tese do marco temporal, criada e patrocinada por setores predatórios do meio ambiente, que cobiçam explorar as terras indígenas, nada mais é do que uma tentativa inconstitucional de restringir os direitos dos povos indígenas à própria sobrevivência.

recente aprovação do PL 490, na Câmara dos Deputados, em nada muda a natureza inconstitucional da malfadada tese. Como já explicou o ministro Edson Fachin, em seu voto, os direitos originários dos povos indígenas compõem o rol das cláusulas pétreas da Constituição, não podendo ser abolidos, sequer por emenda constitucional. O movimento legislativo, portanto, é apenas uma estratégia para tentar constranger o Supremo, que reiniciará o julgamento do marco temporal na próxima semana.

George Gurgel de Oliveira* - Brasil, dia mundial do meio ambiente e os desafios para a sustentabilidade

Vivemos um processo de mundialização que foi transformando a humanidade nas suas relações entre si e com a própria natureza, impactando, como nunca antes na história, a biodiversidade planetária, colocando em risco a sobrevivência da própria humanidade.

No Brasil, o Governo Lula está desafiado a garantir e ampliar a democracia brasileira, em uma outra perspectiva frente à nossa difícil realidade política, econômica, social e ambiental e às mudanças em andamento no cenário internacional, onde a guerra Rússia-Ucrânia com a participação efetiva da OTAN e dos EUA, traduz a complexidade do mundo em que vivemos, com um maior protagonismo do mundo oriental, tendo a China como a expressão maior desse complexo cenário internacional.   

Os conflitos e as contradições econômicas, sociais e ambientais gerados ao longo da história da sociedade brasileira permanecem como resultado das relações predatórias e desiguais entre os diversos atores políticos, econômicos e sociais que ainda determinam o funcionamento da sociedade brasileira e as relações estabelecidas desta sociedade entre sí, com a sociedade mundial e a própria natureza.

Dora Kramer - Presidencialismo de colisão

Folha de S. Paulo

Cabe a Lula mostrar que não perdeu a argúcia para desarmar a arapuca no Congresso

O governo pode liberar emendas, pode distribuir quantos cargos tiver e fazer quantas reuniões quiser que nada disso será suficiente para resolver a situação periclitante ora em cartaz na área política.

Dias piores virão caso o presidente da República não pare um pouco de correr atrás de uma indicação ao Prêmio Nobel ou à Secretaria-Geral da ONU e trate de cuidar da casa. No caso, o Brasil; notadamente, a Casa de representação dos brasileiros.

Alvaro Costa e Silva - Lula e Lira no terceiro turno

Folha de S. Paulo

Cabo de guerra na Câmara expõe luta por poder e dinheiro

O revogaço, estratégia de Lula em seus primeiros dias na Presidência, parou na Foz do Amazonas.

A política de desfazer o tanto de errado que Bolsonaro fez ao longo de quatro anos ganhou maior visibilidade na segurança pública, com a suspensão de registros para caçadores, atiradores e colecionadores. O plano é elaborar uma nova regularização para o Estatuto do Desarmamento, promessa de campanha. Entre 2019 e 2022, a quantidade de armas de fogo em acervos particulares de civis e militares mais que dobrou, chegando a quase 3 milhões. Muitas dessas armas acabaram desviadas para mãos de traficantes e milicianos.

Pablo Ortellado - Os dois legados de junho de 2013

O Globo

Aquele período é, ao mesmo tempo, o sangue da nova política brasileira e um persistente enigma a ser decifrado

Durante o mês de junho, revisitarei na coluna os protestos de junho de 2013, esse mês que não parece terminar.

Dez anos depois, eles seguem nos assombrando e nos convocando a desvendá-los. Por um lado, é evidente que junho de 2013 é um marco temporal que claramente separa os 20 anos da Era FHC-Lula do agitado mundo das grandes manifestações de rua, da prisão de empresários e políticos e do populismo radical de direita. Por outro lado, a ligação entre os protestos de 2013 e tudo o que aconteceu depois não é direta, nem é simples.

Carlos Alberto Sardenberg - Um ‘Pibão’ desconfortável

O Globo

O agro está no rol dos adversários da esquerda dominante no governo Lula. Incluindo o presidente. Um baita equívoco

Em qualquer país, o governo, seja de direita ou de esquerda, comemora quando há crescimento do Produto Interno Bruto. Lógico. É tudo de bom — emprego, renda, oportunidades. Pois, nesta semana, o IBGE informou que o PIB brasileiro cresceu 1,9% no primeiro trimestre em relação ao período anterior, resultado expressivo e bem acima das expectativas. Tanto que os analistas elevaram a perspectiva de expansão neste ano para acima dos 2%, o dobro do que se calculava no início de 2023.

O governo e seus aliados não comemoraram. Em alguns setores, notou-se até mesmo um certo desconforto. Há um motivo técnico. O resultado do primeiro trimestre foi puxado pela agropecuária, com uma surpreendente e espantosa expansão de 21,6%, sempre na comparação com o último trimestre do ano passado.

Eduardo Affonso -Porchat não é uma ilha

O Globo

Porchat não errou, porque nunca defendeu humor racista ou que causasse dor. Mas isso não basta: agora o humor tem uma ‘função social’

A Ilha Porchat, no litoral paulista, ficou famosa pelos bailes de carnaval, apinhados de celebridades. Isso nos anos 80, quando, para que fosse considerada celebridade, a pessoa precisava ser razoavelmente conhecida.

Dois detalhes: os bailes eram no Ilha Porchat, no masculino. Não que a ilha, como muitos foliões, mudasse de gênero no carnaval: havia aí uma silepse — tratava-se do Clube Ilha Porchat. E ela não era, tecnicamente, uma ilha, mas um promontório. Só que, convenhamos, “Baile do Promontório Porchat” está longe de ter o mesmo charme.

Miguel Reale Júnior - A inconstitucional e vergonhosa anistia

O Estado de S. Paulo

A PEC 9/2023 perpetua a desigualdade de gênero e de cor e destrói o espírito das ações afirmativas endossadas constitucionalmente

A partir de 2009, alterações legislativas visaram a implementar maior participação das mulheres nos partidos políticos e no processo eleitoral. Essas ações afirmativas receberam apoio significativo do Judiciário, em decisões do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do Supremo Tribunal Federal (STF).

Estabeleceu-se no artigo 44, V, da Lei dos Partidos (Lei n.º 9.096/95) que os recursos partidários serão aplicados, no mínimo, no porcentual de 5% na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres. Por sua vez, conforme a Lei n.º 13.165 de 2015, determinou-se a reserva de no mínimo 5% e de no máximo 30% do montante do Fundo Partidário Eleitoral para aplicação nas campanhas de suas candidatas.

Bolívar Lamounier - Três vezes Brasil

O Estado de S. Paulo

O País hoje: uma mediocridade política só comparável, no passado, às ‘ditaduras estaduais’, uma recuperação econômica que parece se distanciar no horizonte e uma sociedade desordeira

A rigor, o título deste artigo deveria ser Relembrando Euclides da Cunha. O leitor com certeza sabe que o grande autor de Os Sertões foi também um notável ensaísta e, em particular, um exímio analista político.

Não vacilo em afirmar que seu Esboço de História Política, escrito no primeiro centenário da Independência, incluído no volume À Margem da História (reeditado pela Editora Lello em 1967), tem seu lugar assegurado entre os quatro ou cinco melhores textos brasileiros nessa área. Inventei outro título por uma razão muito simples: meu propósito não é resenhar Euclides, mas aproveitar o texto dele para reinterpretar e trazer o texto dele até o Brasil atual. Na primeira parte, apenas interpreto a linha-mestra do Esboço; na segunda e na terceira, exponho o que se passou desde 1891, superpondo o que veio à minha mente à medida que relia o original de Euclides.

O fio condutor da interpretação euclidiana parece-me ser este: “Somos o único caso histórico de uma nacionalidade feita por uma teoria política”. Complementado logo adiante por esta frase-manifesto: “Estávamos destinados a formar uma raça histórica, através de um longo curso de existência política autônoma. Violada a ordem natural dos fatos, a nossa integridade étnica teria de constituir-se e manter-se garantida pela evolução social. Condenávamos à civilização. Ou progredir ou desaparecer”.

João Gabriel de Lima - Banquete com os canibais

O Estado de S. Paulo

Partidos radicais que chegam a governos contribuem para a deterioração dos regimes de liberdade

O Partido Popular, de direita, foi o grande vitorioso nas eleições regionais espanholas que ocorreram no domingo, dia 28. Venceu na capital Madri e em redutos da esquerda, como Sevilha e Valência. O PP emerge, assim, como grande favorito nas eleições nacionais previstas para julho. Os espanhóis se perguntam: em caso de vitória, o PP irá se aliar ao Vox, o raivoso partido da direita radical espanhola, que também vem ganhando peso eleitoral?

Trata-se do dilema central da direita europeia, segundo escreveu Soledad Gallego-Díaz, ex-diretora do jornal El País. Ela lembra que a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, nascida e criada na democracia cristã alemã, repudia qualquer acordo com extremistas. Conservadores como ela temem ser devorados por radicais – a italiana Giorgia Meloni e a francesa Marine Le Pen dizimaram a direita moderada em seus países. Em sua coluna, Gallego-Díaz cita um verso do cantor australiano Nick Cave: “Quem janta com canibais pode acabar comido”.

Fareed Zakaria - Um novo mundo antiamericano

O Estado de S. Paulo

Navegar nessa arena internacional será o grande desafio da diplomacia dos EUA

Acompanhando a eleição turca, fiquei impressionado ao escutar uma das mais graduadas autoridades do país, o ministro do Interior, Suleyman Soylu, discursando para a multidão de uma varanda. Exultante, ele prometeu que o presidente Recep Tayyip Erdogan “varrerá qualquer um que causar problemas” para a Turquia, “incluindo o Exército americano”.

Anteriormente, Soylu disse que indivíduos “perseguindo uma abordagem pró-EUA serão considerados traidores”. Tenha em mente que a Turquia é membro da Otan, com bases americanas, há 70 anos.

O próprio Erdogan usa com frequência e estridência a retórica anti-Ocidente. Uma semana antes do primeiro turno, ele tuitou que seu rival “não revelará o que prometeu para os terroristas matadores de bebês ou para os países ocidentais”.

Erdogan pode ser um dos representantes mais extremos dessa atitude, mas não está só. Conforme muitos comentaristas têm notado, a maior parte da população mundial não está alinhada com o Ocidente em sua luta contra a invasão da Ucrânia ordenada por Vladimir Putin. E a guerra em si apenas ressaltou um fenômeno mais amplo: os mais poderosos países em desenvolvimento estão cada vez mais anti-Ocidente e anti-EUA.

Divergência para 2026 trava federação PSDB e MDB

Bianca Gomes / O Globo

Partidos negociavam para as eleições de 2024, mas desistiram pela obrigatoriedade de estarem juntos em 2026; união favoreceria a candidatura de Ricardo Nunes para a prefeitura de São Paulo

MDB e o PSDB desistiram nesta sexta-feira de formar uma federação após constatarem que a inclusão do MDB na já existente federação entre PSDB e Cidadania obrigaria os três partidos a estarem juntos nas eleições presidenciais de 2026.

Hoje, no entanto, não há consenso para uma aliança daqui três anos. Enquanto o PSDB estuda lançar o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, à Presidência, o MDB, hoje, faz parte da base do governo Luiz Inácio Lula da Silva.

Em entrevista ao GLOBO publicada na segunda-feira, Leite disse que as legendas consultariam o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre o tema, mas a decisão de abandonar a ideia veio antes mesmo de uma resposta da Corte.

Marcus Pestana* - Juiz de Fora, berço e laboratório do capitalismo brasileiro

Juiz de Fora, minha aldeia, completou 173 anos esta semana. Fernando Pessoa disse certa vez: “O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia. Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia. Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia...”. O Paraibuna é o rio da minha aldeia. “Manchester mineira”, “Atenas de Minas”, “O primeiro sorriso de Minas” (Manuel Bandeira), foi um dos berços da transição da sociedade agrária e escravista para o mundo urbano-industrial-assalariado no Brasil. Síntese da formação social brasileira, mescla da elite branca, moderna e empreendedora, com uma grande população negra, no início ainda escrava, temperada com uma pitada de influência dos imigrantes italianos, alemães e sírio-libaneses.

Juiz de Fora hospedou a primeira hidrelétrica da América Latina no final do século XIX. Até 1931, só havia uma estrada brasileira pavimentada, a União-Indústria, que ligava a capital, Rio de Janeiro, à Petrópolis e Juiz de Fora. As ferrovias dominavam. O boom da economia cafeeira, e não suas crises, gerou o excedente de capital para o nascimento pioneiro das indústrias têxteis, cervejeiras, metalúrgicas e da construção civil.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

PIB positivo não dá pretexto para complacência

O Globo

Análise de Lula sobre surpresa no resultado da economia está errada. É hora de trabalhar, não de festejar

Foi surpreendente o crescimento da economia brasileira no primeiro trimestre. O PIB subiu 4% em relação ao mesmo período do ano passado. A expansão se deveu sobretudo à agropecuária, cujo crescimento foi de 18,8%. Os serviços também registraram alta de 2,9%. Comparada aos três últimos meses de 2022, a economia cresceu 1,9%, acima de Estados Unidos (0,3%), México (1%) e perto da China (2,2%). Todos os dados divulgados pelo IBGE ficaram acima das previsões. O crescimento de 3,3% acumulado em 12 meses levou analistas a refazer as estimativas para 2023.

A projeção do Fundo Monetário Internacional (FMI) feita em abril era de 0,9%. No último levantamento do Banco Central (BC), a previsão era de 1,26%. Mesmo levando em conta que o ritmo deverá desacelerar nos próximos meses, não será surpresa se for revisada para mais de 2%. É pouco para o potencial do Brasil e muito abaixo do necessário para recuperar a renda de trabalhadores e a confiança dos empresários. Mas, diante das incertezas que ainda cercam a política econômica, é sem dúvida motivo para celebrar.

Poesia | Carlos Drummond de Andrade - Verdade

 

Música | Roberta Sá - Sorriso Aberto