sábado, 23 de janeiro de 2021

Opinião do dia - Luiz Werneck Vianna*

 

As tragédias contemporâneas têm no lugar dos heróis clássicos a multidão dos homens comuns, como os das praças da primavera árabe e das ruas americanas das passeatas intermináveis do black lives matter. Essa a razão de fundo para que a luta pela democracia tenha seu ponto forte de partida na luta contra a atual pandemia, a fim de liberar, por meio de amplíssimas alianças, o acesso às nossas ruas e praças.

*Luiz Werneck Vianna, sociólogo, PUC-Rio. A longa tragédia brasileira, Blog, 5/1/2021

Marco Aurélio Nogueira* - O presidente caricato

- O Estado de S. Paulo

Democratas precisam evitar que Bolsonaro passe a controlar o Poder Legislativo

Surpreende que o mundo político, em sentido estrito – Congresso, parlamentares, partidos –, somente agora comece a cogitar de um possível impeachment presidencial por crimes de responsabilidade.

Quando o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, ativo militante do moderantismo, veio a público declarar (15/1) que o afastamento de Bolsonaro do cargo de presidente da República “será debatido de forma inevitável no futuro”, ele deu o tom de uma inflexão que se poderá consolidar nos próximos meses. Aproveitou para chamar às falas o Congresso, que inexplicavelmente se mantém em recesso enquanto o País pega fogo.

Bolsonaro não havia sido, até agora, atingido por uma ameaça desse tipo. A primeira etapa de seu mandato foi um período de desgoverno e tragédia, em que ele pintou e bordou, agindo com uma mistura patética de tiranete, chefe de gangue e godfather tropical. O escárnio diante do vírus, do povo, da vacina e dos cientistas foi constante, mastigado com indiferença e como prova de “autenticidade” por uma população em grande parte anestesiada. Com a pandemia, sua personalidade desequilibrada e narcisista ganhou plena manifestação. Os meses foram se passando e os estragos, aumentando. Seu prontuário engordou.

O presidente fez política contra a política, empenhado em criar confusão para camuflar sua incompetência e atiçar seus seguidores. Em nenhum momento, porém, pôde proclamar-se vitorioso.

O padrão oposicionista seguiu roteiro conciliador, que travou os planos maléficos do presidente. Fez o rei ficar nu. Meio que em silêncio, com muito jogo de bastidores, possibilitou que houvesse alguma governação no Brasil, paralisando a Presidência da República.

Merval Pereira – Reflexo da inépcia


Ascânio Seleme - De costas para o Brasil

- O Globo

Ao que parece, mais uma vez o Congresso vai dar as costas aos brasileiros. Os números apurados pelo GLOBO e pela Folha de S. Paulo indicam que o deputado Arthur Lira e o senador Rodrigo Pacheco devem ser eleitos presidentes da Câmara e do Senado. Os dois, como se sabe, são os candidatos apoiados por Jair Bolsonaro. Pacheco em duas entrevistas disse que até agora não viu crimes de responsabilidade cometidos pelo presidente e que “erros do governo na pandemia são escusáveis”. Lira não precisa dizer nada, todo mundo sabe o que ele pensa e como ele age.

O que se desenha com a eleição destes dois senhores é que os evidentes crimes praticados por Bolsonaro, contabilizados já na casa das duas dezenas, serão ignorados pelo Congresso. E obviamente também não tramitará qualquer outra denúncia por novos crimes que certamente o presidente perpetrará. Até o momento, 61 pedidos de impeachment de Bolsonaro foram encaminhados ao Congresso por partidos políticos e entidades civis. O presidente deveria ser julgado por apoiar o golpe de 1964, apoiar motim da PM, tentar interferir na PF, apoiar manifestações antidemocráticas, se calar diante de declarações antidemocráticas de ministros, ameaçar o STF, ameaçar procuradores, atentar contra a vida na pandemia, entre outros crimes.

Como se vê, o presidente do Brasil é um criminoso contumaz. E a maioria dos 594 deputados e senadores que vão eleger os novos chefes das duas casas do Congresso tende a se alinhar àqueles que já disseram publicamente que os erros de Bolsonaro são desculpáveis ou que ele não cometeu crime. Não precisa ser muito esperto para entender o que a constatação explica. E a sua compreensão depõe ainda mais contra o Congresso brasileiro. Deputados e senadores estão trocando votos por cargos, vantagens e benesses do poder executivo, como sempre. Em alguns casos, compreende-se. Em outros, não.

Não surpreende, por exemplo, que mesmo alguns parlamentares do DEM de Rodrigo Maia, que apoia Baleia Rossi para dirigir a Câmara, votem em Arthur Lira. O Democratas é um partido de aglomeração. Reúnem-se nele políticos de centro, de centro-direita ou de direita. O partido não vota monoliticamente como orientação política, mas sempre apoia medidas de caráter liberal. Sucessor da Arena e do PDS, que dominaram o Congresso durante a ditadura, virou coadjuvante em todos os governos civis desde José Sarney. O DEM é conhecido pelo seu gosto de apoiar governos, não importa qual.

Míriam Leitão - Erro econômico na crise sanitária

- O Globo

O Ministério da Economia ficou ausente de questões decisivas para a economia no combate à pandemia. Na vacinação, os economistas poderiam ter induzido a estratégia de comprar mais vacinas e não menos, exatamente para não concentrar o risco. Em tempos de incerteza e de escassez, o certo a fazer é diversificar riscos e ampliar potenciais fornecedores. Em relação ao auxílio emergencial, era fundamental ter um plano para este momento em que as transferências vão secar.

Em conversa esta semana com o economista José Alexandre Scheinkman, ele me chamou a atenção para esse ponto:

— O Ministério da Economia deveria ter alertado o governo que precisava formar um portfólio diversificado. Nós economistas entendemos esse problema de risco e diversificação. O pessoal da saúde pode não pensar nessa estratégia de portfólio. O Canadá encomendou quatro vacinas para cada cidadão, de tipos diferentes. No programa americano também há várias vacinas encomendadas.

Esta semana o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta explicou, numa entrevista na Globonews, como o governo errou nas negociações da Organização Pan-Americana de Saúde. Em vez de usar o fato de ser um país grande para aumentar sua capacidade de negociação, o Brasil se apequenou. Primeiro, disse que não entraria no consórcio, depois, que só compraria 10% da sua necessidade. Neste momento está havendo um choque na capacidade de oferta. Mas a equipe econômica se deixou convencer pela ideia de Bolsonaro, de que, por sermos grandes, somos um mercado desejado. Em momento de escassez de oferta e muita demanda, é o oposto.

Ricardo Noblat - Acendeu a luz vermelha para a reeleição de Bolsonaro

- Blog do Noblat / Veja

Se tiver impeachment ainda vai demorar

Uma notícia boa para o presidente Jair Bolsonaro: a Câmara dos Deputados não deveria abrir um processo de impeachment contra ele. É o que pensam 53% das 2.030 pessoas em todo o Brasil entrevistadas por telefone pelo Datafolha nos últimos dias 20 e 21. O percentual era de 50% no início de dezembro. Os que defendiam o impeachment caíram de 46% para 42%. Parabéns, presidente!

Quanto ao mais descoberto pelo Datafolha, só tem notícia ruim – com efeito, em linha com pesquisas divulgadas nesta semana pelos institutos Paraná, Ipespe e IDEIA. Subiu de 32% para 40% os que avaliam o desempenho de Bolsonaro como ruim ou péssimo. Os que avaliam como ótimo e bom diminuíram de 37% para 31%. É a maior queda desde o começo do seu governo há dois anos.

Metade dos brasileiros considera que ele não tem capacidade para governar e não merece confiança. Nunca confiam em sua palavra 41% (eram 37% em dezembro) dos entrevistados, enquanto 38% o fazem às vezes (eram 39%) e 19%, sempre (eram 21%). Também pudera. Bolsonaro, hoje, diz uma coisa e amanhã o seu oposto. Fala mal das vacinas, depois as compra e fala mal outra vez.

As pessoas que têm medo de pegar o novo coronavírus estão entre as que mais rejeitam o presidente. A rejeição a ele entre os que têm muito medo de ser infectados pelo vírus saltou de 41% em dezembro para 51%. A aprovação caiu de 27% para 20%. Entre quem tem um pouco de medo de infectar-se, a rejeição subiu de 30% para 37%. A parceria com o vírus fez mal a ele.

Hélio Schwartsman - Cuidado com a caça às bruxas

- Folha de S. Paulo

A vacinação será um processo longo, difícil e sujeito a falhas

Como era previsível, multiplicam-se os relatos de casos de pessoas que estariam furando a fila da vacina. Não há dúvida de que desrespeitar a ordem de prioridades constitui grave violação ética e, em algumas situações, se houver a participação de autoridades, pode caracterizar também irregularidade administrativa e até delito, mas é preciso cuidado para não transformar o justo sentimento de indignação numa caça às bruxas.

Uma parte considerável das "furadas" que vêm sendo descritas se deve mais à falta de detalhamento dos grupos prioritários do que a uma intenção deliberada de passar outros para trás.

"Profissionais de saúde que atuam na linha de frente" pode parecer uma descrição precisa, mas ainda deixa muita margem a dúvidas. O dermatologista que trabalha em consultório particular e passa visita uma vez por semana na UTI está ou não na linha de frente?

Demétrio Magnoli* - Raphaela ph

- Folha de S. Paulo

Na nossa fila de privilégios e direitos, as crianças ocupam o último lugar

Raphaela dos Santos, 5, de Paraisópolis, esqueceu como escrever seu nome e os números. Ana Júlia, 5, quase vizinha, ainda escreve seu primeiro nome, mas não o segundo. A Prefeitura de São Paulo não definiu data para reabertura das escolas, mas garante que aplicará medidas de recuperação de conteúdos que “eventualmente foram perdidos” (Folha, 27/12). 2020 ficará na memória como o ano em que o Brasil tirou a máscara, evidenciando que, na nossa fila de privilégios e direitos, as crianças ocupam o último lugar.

“Não venha comparar as nossas escolas com as da Europa!” Benin, Chade, Burkina Faso, Guiné Equatorial, República do Congo, Serra Leoa e Cabo Verde —anote esses nomes, professor. São alguns dos países africanos que, em outubro, já tinham retomado aulas presenciais. Sugiro uma atividade para o dia distante da volta à escola: colori-los no mapa. Título: onde sobrevive o direito à educação.

 “A vida primeiro! As crianças infectarão os professores e seus próprios familiares.” A ciência diz coisa diferente. Crianças não são grupo de risco e não participam significativamente da cadeia de transmissão. Mas, ao que parece, o consenso científico vale apenas quando não colide com os interesses corporativos. E, de mais a mais, sempre haverá algum “especialista” de rede social disponível para afirmar o que se quer ouvir.

Monica de Bolle* - A posse e seus símbolos

- Revista Época

Joe Biden e seu discurso em prol da democracia, da união e da justiça foi radicalmente distinto das alusões à carnificina feitas por Trump há 4 anos

Foram quatro anos de “meu jeito”. Se “meu jeito” tivesse alguma relação com o mundo real, talvez esses anos tivessem sido ligeiramente mais toleráveis, ainda que não muito menos terríveis. Mas, não. O jeito de Trump foi constituir uma realidade alternativa desde o início. Fatos alternativos, a expressão e a insistência na fantasia, começaram no dia da posse, e ele agiu todos os dias para implantá-los. Pois hoje, no tão esperado dia da partida do pior presidente dos Estados Unidos na história recente, o avião decolou para Mar-a-Lago ao som de “My way”, na voz de Frank Sinatra. Assisti à cena com uma alegria feroz e uma ponta de decepção, porque adoro Frank Sinatra. Mas esse foi tão somente o início do dia.

Na sequência da partida, que fez pensar como ética e estética se relacionam, vieram outras cenas. Solenes, esperançosas, alegres, até, apesar da tragédia, das mortes, das desavenças, de uma crueldade orgulhosa. Como normalmente ocorre em solenidades, foram vários os momentos marcantes da posse de Joe Biden e não tenho a pretensão de cobrir todo o seu simbolismo. O Mall, área central de Washington, D.C., que reúne seus monumentos e prédios históricos, parques, museus e galerias, aparecia na TV coberto de bandeiras dos Estados Unidos. Cada uma representava uma pessoa morta pelo vírus causador da Covid-19. Foi uma forma simples e eficaz de comunicar o valor da vida individual para o país. Lady Gaga, um ícone LGBT, cantou o hino com seu estilo inigualável. Já a cantora de origem porto-riquenha Jennifer Lopez clamou “justicia para todos”, após quatro anos de injúrias de Trump contra negros e latinos. Kamala Harris se tornou, no ato, a primeira vice-presidente: uma mulher, negra e filha de imigrantes. Joe Biden e seu discurso em prol da democracia, da união e da justiça foi radicalmente distinto das alusões à carnificina feitas por Trump há 4 anos.

João Gabriel de Lima - A Terra volta a ser redonda. Hora de o Brasil embarcar

- O Estado de S. Paulo

Foi semana de benditas obviedades. Só falta o Brasil ajustar sua rotação com a do planeta

Stefani Germanotta, a Lady Gaga, cantou o hino dos Estados UnidosJennifer Lopez deu um twist latino à sua interpretação de God Bless America; e, no encerramento, a poeta Amanda Gorman, de 22 anos, declamou versos que resumem o sentimento da nova geração. Na posse do presidente Joe Biden, as três mulheres nos lembraram que os Estados Unidos são um país ítalo-americano, hispano-americano, afro-americano – sem contar outras etnias e misturas. Muito de sua força e riqueza se deve à bênção de ser uma nação de imigrantes.

Parece óbvio. É como dizer que a Terra é redonda.

No momento-chave de seu discurso, Biden disse: “Nós devemos tratar os outros com dignidade e respeito. Juntar forças, parar o tiroteio e baixar a temperatura. Sem unidade não há paz – só amargor e fúria. Não há progresso – só ultraje exasperante. Não há nação – só um estado de caos”.

Dignidade e respeito. Condições óbvias para o debate inteligente nas democracias. A Terra é redonda.

No mesmo dia da posse de Biden, Portugal assumiu a presidência rotativa do Conselho da União Europeia. Em Bruxelas, o primeiro-ministro António Costa traçou as linhas gerais dos próximos seis meses: foco no social, na economia digital e no combate às alterações no clima. “Temos um planeta para proteger, e não podemos perder mais tempo,” disse Costa em seu discurso.

A Terra é redonda, e temos que cuidar dela.

Adriana Fernandes - Jacaré econômico

- O Estado de S. Paulo

Placar parcial no Congresso: 100% de apoio ao auxílio emergencial, 0% para o Ministério da Economia

É uma roda de ciranda a coleção de compromissos assumidos na área econômica pelos candidatos à presidência da Câmara e do Senado. Quatro dos quatro principais candidatos (os senadores Rodrigo Pacheco e Simone Tebet e os deputados Baleia Rossi e Arthur Lira) deram declarações de apoio à nova rodada do auxílio emergencial, que o ministro Paulo Guedes resiste em aceitar. Resultado até agora: 100% de apoio para o auxílio contra 0% para o Ministério da Economia.

Guedes, por sua vez, quer uma nova CPMF para financiar a desoneração da folha e aposta na vitória de Lira, que, no ano passado, indicou essa possibilidade “desde que com alíquota baixa” para criar empregos.

Contrário ao novo imposto, Baleia Rossi, que é autor da PEC 45 de reforma tributária, sai a campo e marca posição depois que reportagem do Estadão mostrou que o plano de Guedes para a recriação do imposto não morreu. “Meu adversário é pura metamorfose ambulante. Ele já quis CPMF. Depois, disse que não é bem assim.”

Pisando em ovos e com as redes sociais repercutindo negativamente o risco da volta da CPMF, Lira desconversa, finge esquecer o apoio dado há poucos meses, liga para Guedes e cobra explicações do ministro. O Ministério da Economia diz que “não tem nada disso” e tenta abafar o assunto. A recomendação é ninguém falar nada agora para não atrapalhar a eleição. Mas o tema volta com Pacheco, que afirma que “pode se discutir, criar a CPMF e desonerar a folha, é até aceitável desde que haja desoneração na outra ponta”.

Os desafios do multilateralismo

Joe Biden reaviva expectativas de que os EUA liderem esforços de colaboração internacional

Por Laura Greenhalgh  - Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Os dias que antecederam a troca de comando na Casa Branca serão lembrados pelas manobras antidemocráticas de Donald Trump, inconformado com a derrota nas urnas e nos colégios eleitorais. Já o novo presidente, Joe Biden, no meio da confusão armada pelo presidente em fim de mandato, preferiu tuitar: “Mask up, folks”. Insistia no mantra para que os americanos ficassem de máscara, sem baixar a guarda para o vírus. Esse estilo meio zen e meio econômico nas palavras, numa transição de poder não só tumultuada, como sui generis, diz algo sobre o novo presidente dos Estados Unidos.

“Mask up” talvez não seja só uma mensagem para o público interno. Pode ser uma sinalização para fora, um apresentar-se para o jogo no mundo impactado pela covid-19. Biden torna-se o 46º presidente americano num cenário global repleto de incertezas: há um ano correu a notícia de um vírus ameaçador na China, que rapidamente se espalhou por todos os continentes, desafiando a ciência e a medicina, destruindo economias e sistemas de saúde, escancarando desigualdades e impondo, a toque de caixa, novas formas de vida para a população mundial. Para certos observadores, o século XXI pode ter começado, de fato, na atual pandemia. Assim corre o tempo histórico.

No entanto, o estilo contido de Biden acaba deixando perguntas no ar. Entre elas: até que ponto ele assume o enfrentamento da atual crise sanitária como um desafio global, e não americano? Até que ponto está consciente de que falar de pandemia não é só falar de saúde e recuperação econômica? Até que ponto deverá recompor a política externa americana, adotando uma agenda de prioridades para o planeta em estado de emergência? Até que ponto deve liderar a retomada do multilateralismo?

Respostas ainda se confundem com apostas. Para Joseph Stiglitz, Nobel de Economia e autor de “Povo, Poder e Lucros: Capitalismo Progressista para uma Era de Descontentamento” (Record), livro de 2019 que trata justamente da importância dos governos, Biden terá de assumir compromissos tão decisivos e demarcatórios quanto os do final da Segunda Guerra Mundial (1939-1945): “Ele deveria ir na direção do verdadeiro multilateralismo, no qual o excepcionalismo americano se subordina, genuinamente, aos interesses comuns, a valores compartilhados e ao respeito às instituições internacionais”.

Dois experientes diplomatas brasileiros foram ouvidos pelo Valor sobre as mesmas questões. Para o ex-ministro e ex-embaixador Rubens Ricupero, Biden, quando vice-presidente, sentiu de perto as tensões e os riscos trazidos pela epidemia por ebola. Corria o ano de 2014, e a Organização Mundial de Saúde (OMS), aturdida com a gravidade do vírus, precisou se valer da experiência de campo dos Médicos Sem Fronteiras para começar a entender o que se passava em regiões africanas.

Naquele momento, Biden acompanhou os esforços da Casa Branca para ativar, rapidamente, uma estrutura governamental de biossegurança que respondesse ao novo patógeno - aliás, estrutura herdada de George W. Bush, reforçada por Obama e, mais tarde, destruída por Trump. “Biden sabe que, se o ebola não se espalhou pelo mundo, isso se deve a Barack Obama”, afirma Ricupero. “Portanto, agora ele terá de ser ainda mais audacioso. Se há uma lição a tirar da atual pandemia, é a de que precisamos nos preparar para a próxima. Que virá.”

Marcus Pestana* - Vacina, estupidez e desenvolvimento

As redes sociais vieram para ficar. Todos nós, ou quase todos, somos usuários ou até mesmo escravos do Facebook, do Instagram, do Youtube, do WhatsApp, do Tik Tok e do Google. Nas redes sociais, é possível assistir belíssimos shows, interessantes debates, a fantástica entrevista de Muhammad Ali sobre racismo ou rememorar jogadas geniais de Pelé, Zico ou Ronaldinho Gaúcho. Por outro lado, é possível também ser vítima da mais radical estupidez e da mais profunda ignorância.

Confesso que não sou especialista nas tramas e nos segredos da internet. E que também não tenho paciência para responder, um a um, cada comentário provocado. Mas as tempestades de sandices, como a da última semana, sobre a posse de Joe Biden, o livro de Chico Buarque, “Essa Gente”, e a vacina do Butantã, me fazem publicar, vez ou outra, frases de pensadores de várias épocas, que traduzem meu espírito diante de afirmações assertivas de que Biden é comunista, que a vacina de Dória é ineficaz, só marketing e uma trama diabólica da China, e que Chico é terrorista e deveria estar preso, além de centenas de postagens impublicáveis.    

Cláudio de Oliveira* - Frente ampla na Câmara e no Senado

Os partidos democráticos e progressistas deveriam se unir todos aos candidatos da Frente Ampla às presidências da Câmara e do Senado, respectivamente o deputado Baleia Rossi e a senadora Simone Tebet, ambos do MDB.

Os candidatos governistas Arthur Lira, deputado do PP, e Rodrigo Pacheco, senador do DEM, certamente assumiram compromissos para receber o apoio do presidente Jair Bolsonaro e da máquina federal. E presumo que um deles seja não colocar em votação os muitos pedidos de impeachment.

Ainda que o senador Rodrigo Pacheco possa não endossar as tentativas de golpe aberto ou de minar por dentro as instituições democráticas, sua vitória fortalecerá o bolsonarismo e o seu projeto autoritário e retrógrado, cujas consequências dramáticas estamos vivendo com o negacionismo na pandemia do coronavírus, a interrupção do auxílio emergencial e a inação para estimular a economia.

O que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais

O custo de ser pária – Opinião | O Estado de S. Paulo

A permanência de Jair Bolsonaro na Presidência inviabiliza a recuperação da imagem do País e a retomada dos contatos produtivos e pacíficos com todas as nações.

O constrangedor isolamento do Brasil entre as nações civilizadas, resultado de uma política externa amalucada e irresponsável, deveria ser motivo mais que suficiente para que o chanceler Ernesto Araújo fosse demitido sem mais delongas. A pressão para que isso ocorra, aliás, nunca esteve tão forte. 

Parece estar se constituindo um consenso, inclusive em alguns setores do próprio governo, que a manutenção do sr. Araújo à frente do Itamaraty representa enorme risco para a imagem do Brasil, já tão desgastada, e justamente no momento em que o País, mergulhado numa pandemia mortal e numa crise econômica desafiadora, mais precisa da cooperação internacional.

A questão é que a demissão do sr. Araújo não resolveria nada, pois o problema não é o chanceler, mas o chefe dele. É a permanência do sr. Jair Bolsonaro na Presidência que inviabiliza a recuperação da imagem do País e a retomada dos contatos produtivos e pacíficos com todas as nações, que sempre foi a marca da diplomacia do Brasil.

É claro que o sr. Araújo é o responsável direto pela formulação da estapafúrdia doutrina externa bolsonarista e deve ter seu nome marcado na história, em letras maiúsculas, como o chanceler que se empenhou em destruir o legado do Barão do Rio Branco. Deve ser lembrado para sempre como aquele que conduziu a diplomacia nacional sob inspiração de um obscuro ex-astrólogo que vive nos Estados Unidos, espécie de guru de Bolsonaro et caterva.

Música | Gal Costa e Silva - Só Louco

 

Poesia | Fernando Pessoa - Tenho tanto sentimento

Tenho tanto sentimento
Que é frequente persuadir-me
De que sou sentimental,
Mas reconheço, ao medir-me,
Que tudo isso é pensamento,
Que não senti afinal.

Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.

Qual porém é a verdadeira
E qual errada, ninguém
Nos saberá explicar;
E vivemos de maneira
Que a vida que a gente tem
É a que tem que pensar.