Peemedebista consegue 56 votos de colegas mesmo denunciado por procurador-geral.
Com Renan na presidência do Senado e Henrique Alves na da Câmara, na terça, PMDB terá hegemonia no Legislativo.
Cinco anos depois de renunciar ao cargo sob acusações de corrupção, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) voltou à presidência do Senado apoiado pelos governistas e com votos até de tucanos. Denunciado pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, pelos crimes de peculato, falsidade ideológica e uso de documentos falsos, Renan, nome central da tropa de choque do ex-presidente Fernando Collor, afirmou que "ética é obrigação de todos". A oposição apoiou Pedro Taques (PDT-MT), mas o peemedebista venceu por 56 votos a 18, dois votos brancos e dois nulos. Aliados de Renan contabilizaram sete traições no PSDB, o que garantiu a vaga da 1º Secretaria da Mesa para o tucano Flexa Ribeiro (PA). O novo presidente do Senado articulou aliados para arquivar processos contra ele no Conselho de Ética da Casa.
"A ética é o meio, e não fim" Renan Calheiros - Novo presidente do Senado
"O último que tentou ser vestal nessa Casa foi desossado" Lobão Filho - Senador pelo PMDB-MA, em referência a Demóstenes Torres.
De volta, a ética de Renan
Denunciado ao STF, senador retoma cargo 5 anos após renúncia para evitar cassação
Maria Lima, Fernanda Krakovics e Júnia Gama
Sob velha direção
BRASÍLIA - Cinco anos depois de renunciar ao cargo sob acusações de corrupção, Renan Calheiros (PMDB-AL) foi reconduzido ontem à presidência do Senado, por voto secreto, dizendo que "ética é obrigação de todos". Sem surpresas e com votos inclusive da oposição, que havia anunciado apoio à candidatura de Pedro Taques (PDT-MT), o peemedebista foi eleito por larga maioria: 56 a 18, com dois votos brancos e dois nulos. Aliados de Renan contabilizaram sete traições no PSDB, o que garantiu a vaga da 1ª Secretaria da Mesa Diretora para o tucano Flexa Ribeiro (PA).
Diante do risco de o Supremo Tribunal Federal (STF) aceitar denúncia do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e abrir inquérito para investigar se Renan usou notas fiscais frias para justificar seu patrimônio, o novo presidente do Senado já tem articulação montada para arquivar eventuais processos contra ele no Conselho de Ética da Casa. Renan escolheu a dedo o futuro presidente do órgão: João Alberto (PMDB-MA), homem de confiança de José Sarney (PMDB-AP), e que já presidiu o conselho.
- Isso contra o Renan é requentado - adiantou João Alberto ao GLOBO ontem.
A tropa de choque de Renan já está com discurso e estratégia prontos. O senador Romero Jucá (PMDB-RR) disse que o peemedebista só não pode presidir o Senado se for condenado pelo STF:
- É um assunto vencido, mas, se chegar ao Conselho de Ética, arquivamos. Renan só não pode ser presidente do Senado se for condenado pelo Supremo.
Temor de volta da crise
O clima no Senado é de preocupação com a possível volta da crise que paralisou a Casa em 2007, quando Renan deixou a presidência em meio à acusação de que um lobista da empreiteira Mendes Júnior pagava pensão de R$ 12 mil para sua ex-amante Mônica Veloso, com quem teve uma filha.
- Será um início de mandato turbulento. Não se espera um mar de tranquilidade daqui para a frente - disse Álvaro Dias (PSDB-PR).
Nos discursos antes e depois da eleição, Renan anunciou uma plataforma ousada de administração. Pivô de um escândalo sexual em 2007, e com a mulher Verônica Calheiros no plenário, o peemedebista provocou um burburinho no local ao anunciar a criação de uma Procuradoria da Mulher. Em seu discurso de candidato, rebateu o senador João Capiberibe (PSB-AP), que havia dito, antes, que Renan tem "telhado de vidro":
- Eu queria lembrar ao senador Capiberibe que a ética não é o objetivo em si mesmo. O objetivo em si mesmo é o Brasil, é o interesse nacional. A ética é meio, não é fim. A ética é obrigação de todos nós, é responsabilidade de todos nós e é dever deste Senado.
Renan também aproveitou o discurso para dar uma estocada em Taques, senador de primeiro mandato e sem trânsito na Casa, devido a seu estilo de cobrar os colegas ao defender a ética e a moralidade:
- Senador Pedro Taques, Vossa Excelência está chegando e eu já estou aqui há 18 anos. Aqui as decisões não são do presidente, não é decisão pessoal. É decisão coletiva, colegiada; não é individual, é decisão do Senado Federal.
O senador Pedro Simon (PMDB-RS) lembrou, da tribuna, a crise de 2007 e fez um apelo para que ele desistisse da candidatura:
- Vamos repetir o filme. Não tenho intimidade com Vossa Excelência, nosso estilo é diferente, mas se tivesse diria: não te mete nessa. Era melhor continuar como líder.
Na sequência, Lobão Filho (PMDB-MA) fez a defesa mais veemente de Renan, criticou o procurador-geral da República por ter feito a denúncia às vésperas da eleição, e rebateu Simon:
- O último que tentou ser vestal nesta Casa foi um senador desossado pela imprensa, Demóstenes Torres, acredito até injustamente. Então, não há ninguém capaz de levantar o dedo contra o senador Renan Calheiros.
Já o discurso mais raivoso foi o do senador Fernando Collor (PTB-AL), que voltou a acusar Gurgel de "chantagista" e "prevaricador". E disse que, com Renan na presidência, o Senado poderia agilizar uma representação que pede a cassação de Gurgel, para que ele nunca mais tivesse a possibilidade de denunciar qualquer senador.
Os partidos que declararam apoio a Taques - PSDB, DEM, PSB e PSOL - e outros senadores independentes somavam 25 votos. Saíram da urna, porém, apenas 18 votos para Taques, além de dois votos brancos e dois nulos.
A oposição quis marcar posição contra a candidatura de Renan, mas foi moderada nos ataques. Pré-candidato à Presidência da República em 2014, Aécio Neves (PSDB-MG) não discursou.
Já o PT deu um apoio envergonhado a Renan. Eduardo Suplicy (SP) chegou a apelar a um santo para encontrar um nome sobre o qual não pairassem "dúvidas".
- Se pudesse trazer aqui São Francisco de Assis para achar um nome de consenso - disse Suplicy, que acabou votando em Renan mesmo.
O líder petista Wellington Dias (PI) justificou a orientação de voto pelo respeito à proporcionalidade:
- O maior partido tem direito a presidir a bancada. É assim que vejo a candidatura de Renan Calheiros. Nossa bancada decidiu por unanimidade respeitar a proporcionalidade.
Não havia constrangimento político no plenário em função das denúncias contra o presidente eleito da Casa. Nem problemas no campo pessoal. Pelo menos aparentemente. Como há cinco anos, quando viveu um drama familiar com a renúncia do marido, ontem a mulher do senador, Verônica Calheiros, esteve ao seu lado no plenário. Discretamente, assistiu a toda a sessão da volta triunfal, acomodada ao lado de dona Marly Sarney e do filho Rodrigo.
Fonte: O Globo