sábado, 8 de julho de 2023

Marco Antonio Villa - A volta da política

Revista IstoÉ

A serpente tem de ser atacada quando se manifesta, pois, após deixar seus ovos, o combate será muito mais difícil, despertando os sentimentos mais selvagens dos indivíduos.

Depois de um primeiro semestre turbulento – mas não tanto como em 2022 –, o Brasil está virando uma página. Pode ser uma frase feita, mas é real. Viramos a página do autoritarismo bolsonarista. O Tribunal Superior Eleitoral simplesmente cumpriu a lei. Não foi – como acusou Jair Bolsonaro – um julgamento eleitoral. Pelo contrário, deu-se amplo direito de defesa, o contraditório e o processo foi transparente. O julgamento foi transmitido pela televisão, nada ficou oculto. E apresentaram-se os votos de todos os sete ministros, que recordaram – cada um ao seu modo – os acontecimentos de 18 de julho de 2022.

Bolsonaro saiu derrotado. E o Brasil venceu, assim como a Constituição, as liberdades democráticas, o Estado democrático de Direito. No último quadriênio presidencial estivemos ameaçados cotidianamente pelo despotismo bolsonarista. Mas longe daquele (suposto) despotismo esclarecido do século XVIII. Aqui foi substituído pelos “filósofos” cultores da violência, do racismo, da misoginia, da homofobia e do antissemitismo.

Fernando Schüler * - Sobre as regras do jogo

Revista Veja

A democracia permite a discussão sobre muitas coisas, mas não sobre seus princípios elementares

Muita coisa foi escrita sobre o dito de Lula de que a “democracia é relativa”. Segundo alguns, o presidente teria cometido um “erro”; outros falaram em “decepção”, pois teriam assinado a “carta pela democracia” e esperavam mais de seu líder. Li também que Lula “não sabe o que é o comunismo”, pois não teria “lido Lenin”, nem estudado a história soviética. Sejamos claros, não há “erro” nenhum, nem muita novidade. Ele sabe o que se passa em países como Venezuela e Cuba. Qualquer um pode saber, aliás. Basta dar um clique em Human Rights Watch ou no relatório da ONU sobre os “crimes contra a humanidade” do regime chavista. Não há nenhuma “incoerência” ou confusão aí. São apenas escolhas políticas. Lula sempre agiu como fiador das ditaduras na América Latina, que todos sabem quais são. Ainda na outra semana, Moisés Naím denunciou a estratégia chavista para procrastinar investigações sobre tortura e execuções extrajudiciais, dizendo que Maduro tenta “lavar a cara”, e que seu maior trunfo é “Lula continuar a abraçá-lo em público”.

Cristovam Buarque - Jogar a favor das escolas

Revista Veja

“Somos campeões de futebol porque temos uma motivação em comum. E porque a bola é redonda para qualquer brasileiro”

A população brasileira não se conforma em perder a Copa do Mundo de futebol a cada quatro anos, mas não se constrange em ficar todo ano entre os últimos colocados na avaliação dos sistemas educacionais feita pela Unesco. Felizmente, começamos a perceber a falência do nosso projeto escolar e a entender as consequências para o progresso do país e o bem-estar de cada cidadão quando condenamos milhões de pessoas ao “analfabetismo para a contemporaneidade”, desperdiçando o potencial de cada uma delas para a construção do futuro.

A realidade mostra que os recursos aportados e os programas adotados nas últimas décadas produziram ligeiras melhorias na qualidade escolar, mas sem evitar que continuemos com uma educação deficiente e desigual.

Dora Kramer - Jair faz um favor a Tarcísio

Folha de S. Paulo

Ao hostilizar governador, ex-presidente se isola no radicalismo sem resultados

Sutileza, inteligência fina e senso tático, sabemos, não são características de Jair Bolsonaro. Ele mesmo confirmou isso na recente reunião do PL em que tentou crescer para cima do governador Tarcísio de Freitas chamando-o de inexperiente na política.

Só que neste campo nem sempre antiguidade é posto, pois na eleição de 2022 o novato deu um banho no veterano. Tarcísio ganhou o governo de São Paulo falando ao centro sem perder a referência à direita e Bolsonaro perdeu a Presidência por insistir na manutenção do pisca-pisca ligado exclusivamente na direção da bolha extremada.

Hélio Schwartsman - A democracia é relativa?

Folha de S. Paulo

Lula erra ao defender Venezuela, mas conceito de democracia comporta graus e variantes

A democracia é relativa? Não dá para entender por que Lula ainda insiste em defender ativamente um regime falido e brutal como o de Nicolás Maduro na Venezuela. Fazê-lo é ruim para sua imagem pessoal, para seu governo e para o Brasil. Mas a colocação do presidente brasileiro sobre a relatividade da democracia, se utilizada em outro contexto, seria aceitável.

É fácil entender que a democracia não é um estado binário, que se materializa ou não se materializa, sem nuances e meios tons. A melhor prova disso é a profusão de índices e rankings de democracia. Um dos mais prestigiados deles, o V-Dem analisa a democracia em cinco dimensões (eleições, liberdades, participação, deliberação e igualdade) e ranqueia em cada uma delas os 202 países examinados. Pelo relatório de 2022 do V-Dem, o Brasil é uma democracia eleitoral, categoria que fica abaixo das democracias liberais, mas acima das autocracias eleitorais e das autocracias fechadas.

Demétrio Magnoli - Democracia relativa

Folha de S. Paulo

Compete aos eleitores, não aos juízes, escolher os representantes do povo pelo voto

A "democracia relativa" venezuelana é uma ditadura absoluta –que, como tantas outras, promove periódicas eleições farsescas. María Corina Machado, candidata da oposição nas eleições presidenciais do ano que vem, acaba de ser inabilitada por uma Controladoria sob controle de Maduro. No Brasil, por outro lado, Bolsonaro foi declarado inelegível por um tribunal eleitoral que segue a lei. Não é novidade: a mesma lei tornou Lula inelegível em 2018. Um sistema político que inabilita os dois principais líderes populares precisa ser caracterizado como uma "democracia relativa".

Lula teria cometido crimes de corrupção? Bolsonaro deve ser sentenciado por golpismo? Numa democracia plena, as respostas –e as penas– competem à Justiça criminal, não à Eleitoral. Nela, leis como a da Ficha Limpa seriam anuladas por ferirem um princípio fundamental: a soberania popular. Compete aos eleitores, não aos juízes, escolher os representantes do povo. A inelegibilidade de Lula, antes, e a de Bolsonaro, agora, implica a cassação dos direitos de seus eleitores –que, somados, formam a maioria do eleitorado.

Pablo Ortellado - Lula é ambíguo com as ditaduras

O Globo

Desde que assumiu como presidente, Lula vem tomando posições ambíguas com relação às ditaduras de esquerda da América Latina. Recebeu o presidente da VenezuelaNicolás Maduro, e o tratou como companheiro. Defendeu-o em múltiplas ocasiões da acusação de que a Venezuela não é democrática. Em março, a diplomacia brasileira deixou de assinar uma declaração do Conselho de Direitos Humanos da ONU que condenava “sérias e sistemáticas violações” de direitos humanos na Nicarágua (o Brasil, porém, assinou uma resolução mais branda da OEA no fim de junho pedindo democracia no país).

Às vezes, Lula dá a entender que tudo não passa de estratégia diplomática. Declarações brandas ou ambíguas diminuiriam resistências e permitiriam ao Brasil atuar como mediador, conduzindo esses países a uma democracia mais plena. Mas a ambiguidade também pode ser lida como condescendência e falta de compromisso democrático. Como o movimento é ambíguo, não dá para saber quanto há de estratégia e quanto há de tolerância com as falhas democráticas quando o governo é de esquerda. Seja como for, a postura ambivalente está assustando e radicalizando as respostas da extrema direita brasileira — a tal ponto que eventuais benefícios para a política externa certamente não compensam o dano infligido à dinâmica política nacional.

Eduardo Affonso - Ligeiramente democrático

O Globo

Com Bolsonaro inelegível e a terceira via em extinção, Lula parece cada vez mais empenhado em liderar a oposição a si mesmo

Em 1985, ano da redemocratização, a banda O Espírito da Coisa fez sucesso com uma canção em que a personagem anunciava:

— Mamãe, eu acho que estou/Ligeiramente grávida.

Cinco anos antes, Kleiton e Kledir já tinham flexibilizado a virgindade:

— A mãe da moça me garantiu/É virgem, só que morou no Rio.

Fecundação, ruptura do hímen e — sabemos agora — democracia, tudo é relativo. Absoluto, só o 0 K (-273,16 °C) ou o desprezo do presidente Lula por sua história e pela inteligência de quem, por três vezes, o elegeu presidente.

Seu conceito de democracia anti-Denorex (que não parece, mas é) ou democracia feijoada (que tem tudo de porco, mas não é porco) veio para justificar o apoio à ditadura de Nicolás Maduro, que promove a maior tragédia humanitária da América do Sul. Isso enquanto metade do Brasil ainda respira aliviada por ter se livrado dos arroubos autoritários de Bolsonaro, e outra metade acha que agora é que a democracia corre mais riscos.

João Gabriel de Lima* - Leões de Ouro para a cidadania

O Estado de S. Paulo

Pela ferramenta é possível saber quanto um congressista gasta em refeições, viagens ou carros

Todos deveríamos acompanhar as despesas de deputados e senadores como monitoramos nosso cartão de crédito. Afinal, o dinheiro que eles gastam é o nosso dinheiro. Uma nova ferramenta digital permite que você faça exatamente isso. Você escolhe um ou mais parlamentares e, a cada despesa do gabinete de seu escolhido, recebe um “push” no celular – como se fosse uma despesa do cartão de crédito de um de seus filhos.

A ferramenta, batizada de “Cartão da Transparência”, acaba de ganhar seis “Leões” no Festival de Cannes, considerado o Oscar da publicidade mundial – dois de ouro, três de prata e um de bronze. Ela foi desenvolvida pela agência de comunicação AKQA e está hospedada no site Congresso em Foco.

Adriana Fernandes - Trator Lira

O Estado de S. Paulo

De nada adianta votar a reforma com um placar tão folgado para ela morrer no Senado

Desde domingo passado, o presidente da Câmara, Arthur Lira, ligou a chave do seu trator para conseguir a aprovação da reforma tributária.

O que mais se ouviu no plenário após a votação histórica da Câmara foi que, sem o trator Lira, a reforma nunca teria sido aprovada, dada a quantidade de atores e lobbies envolvidos nas negociações e tantas tentativas frustradas em 35 anos.

O próprio presidente da Câmara passou por cima de interesses regionais do seu Estado, Alagoas, para contar votos favoráveis para o placar histórico da PEC 45 de 382 votos favoráveis no primeiro turno e 375 no segundo.

Comprou uma briga das grandes com os governadores do Nordeste, sua região de origem, ao negociar com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, e Estados do Sudeste e do Sul que o modelo de partilha do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional – a cereja do bolo da reforma para os Estados – ficará para depois da PEC, em lei complementar.

Marcus Pestana* - Da marcha forçada à marcação de passo

No artigo da última semana alinhamos números e evidências que revelam uma realidade inequívoca: o Brasil teve um dos melhores desempenhos econômicos, entre todos os países, de 1930 a 1980, transitando de uma economia agroexportadora para uma estrutura industrial sofisticada e diversificada, e, após a crise de 1979/80, perdeu o dinamismo e desenhou uma trajetória parecida com uma montanha russa: espasmos de crescimento acelerado entremeados por recessões profundas, resultando num desempenho em média perto da mediocridade e congelando o crescimento da renda por habitante dos brasileiros. Recentemente, inclusive recuamos: em 2013, antes da recessão do Governo Dilma e da pandemia, o PIB per capita brasileiro era, em valores corrigidos, segundo a FGV, de 48,4 mil reais, e o projetado para 2023, é de 46,4 mil reais. Ou seja, dez anos marcando o passo. 

Fernando de la Cuadra* - La inelegibilidad de Bolsonaro y el desmonte de la extrema derecha

“Nada es más importante que acabar con el fascismo, porque de lo contrario, el fascismo va a acabar con nosotros”.

Fred Hampton

Cuando restaban pocas horas para que el Sistema Judicial brasileño concluyera sus actividades semestrales para entrar en el receso de invierno -por un mes a partir del 1 de julio-, el Supremo Tribunal Federal (STF) determinó la inelegibilidad de Jair Messías Bolsonaro por los próximos ocho años. Este proceso que le impide al ex presidente presentarse a cualquier elección por ese periodo, es el primero entre muchos otros procesos (16 en total) que continúan pendientes por los diversos delitos cometidos por el ex presidente durante su mandato.

En este caso, la acusación que fue juzgada tuvo relación con la insistencia del ex mandatario en poner en duda la transparencia y licitud del sufragio electrónico en una reunión oficial convocada por el entonces gobernante en el Palacio da Alborada, ante decenas de embajadores, periodistas y miembros de organizaciones internacionales. Según el Ministerio Publico, en aquella ocasión el ahora condenado habría cometido abuso de poder político, desvío de finalidad y uso indebido de los medios de comunicación.

Concretada entonces la inelegibilidad del ex capitán, surge casi que naturalmente la interrogante sobre cuál será el destino de la extrema derecha en Brasil. Existe una infinidad de tesis especulativas sobre este asunto, aunque en términos generales existe un consenso que la extrema derecha en Brasil llegó para quedarse.

IEPfD | Política e Democracia – Reflexões sobre seus Desafios para o Século XXI - Abertura

 

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Ataque a Marco do Saneamento deve ser repelido

O Globo

Depois de derrota na Câmara, governo volta à carga com decretos que prejudicam os mais pobres

A aprovação do Marco Legal do Saneamento Básico, em 2020, deu ao Brasil a esperança de resolver um dos problemas mais graves que afligem a população: o acesso desigual a serviços de água e esgoto. Por inépcia, imobilismo dos governos, pressão de empresas estatais e das poderosas corporações do funcionalismo público, o país apresenta há décadas índices indigentes de saneamento. Basta dizer que, em pleno século XXI, 100 milhões de cidadãos não são servidos por coleta de esgoto, e 35 milhões não têm água tratada nas torneiras. Um absurdo.

Resultado de longas discussões no Congresso, o Marco do Saneamento transformou essa realidade, tornando o setor mais competitivo, profissional e com maior capacidade de investimento. Um de seus muitos méritos foi abrir espaço à atuação de concessionárias privadas num cenário dominado por estatais dispendiosas e ineficientes, muitas das quais conhecidas mais como cabides de emprego que por prestar serviços de qualidade. Os números atuais do saneamento são a prova mais eloquente do descalabro.

Poesia | Clarice Lispector - Sabedoria é não entender

 

Música | Diogo Nogueira e Orquestra Ouro Preto - Flor de Lis