- O Estado de S.Paulo
O coração da antipolítica parece ser a única coisa que pulsa e perigosamente se move
Na geografia política que localiza os campos em contenda, bem como suas respectivas orientações, para além do problema das identidades partidárias, existe a questão das alianças políticas, sejam eleitorais e/ou de governo. Trata-se de um tema transversal. Contudo não seria erro apontar que é no campo da esquerda que esse tema ganhou dimensão prática e invadiu o universo da política.
Em desenho convencional, a oposição entre esquerda e direita, com pouca relevância ao centro, embora sofra um desgaste largamente reconhecido, continua a ser referência em nossa forma de pensar o problema das alianças políticas. O mesmo ocorre com os partidos. Como se diz, os partidos são parte, mas neles sempre há a marca do todo. Assim, para além de programa, máquina e militância é preciso indagar sobre a dimensão da cultura política que cimenta partidos e frentes políticas, sendo estas coligações eleitorais ou coalizões governamentais.
Há culturas políticas que desempenharam um papel significativo na construção da modernidade. O liberalismo político foi essencial na construção dos Estados após as lutas de independência na América. O republicanismo foi fator de coesão importante em países que construíram suas democracias no correr dos séculos 19 e 20, como os EUA ou a França. E é inegável que a cultura política da democracia tenha sido fator de fortalecimento dos direitos, do pluralismo e da convivência de diferentes ideologias a partir do segundo pós-guerra.
Nada disso foi conquistado facilmente e sem tensões, afetando diretamente atores políticos, que mudaram suas posturas ao perceberem que só teriam êxito caso dessem passos ajustados ao tempo histórico. Foi assim quando os comunistas abandonaram parte do seu sectarismo e propuseram a estratégia das frentes populares, uma aliança pluriclassista e democrática, ultrapassando o período da frente única. Mesmo que defensivas diante do nazi-fascismo, as frentes populares jogaram os comunistas para dentro dos sistemas políticos e passaram a exigir deles não só o heroísmo revolucionário, mas engenho e arte na política.
Ultrapassada a “fase heroica”, as frentes políticas continuariam como referencial de uma política de esquerda encetada na democracia. Em alguns casos, juntando os “mais próximos” ideologicamente e, em outros, atores de diferentes perfis em alianças de tipo muito variado. Nunca foi fácil antever o destino das frentes, seja qual for o cenário histórico. Algumas morreram rapidamente, outras se tornaram longevas e há casos daquelas que até ressuscitaram.