O Estado de S. Paulo.
A democracia representativa está com dificuldade de acompanhar as mudanças aceleradas da vida moderna
Há um reconhecimento geral posto na mesa: a
democracia representativa está sendo atacada por diferentes vetores, perde
qualidade e parece abandonada pelos cidadãos. O espectro da “crise da
democracia” se agita por todos os cantos. O Brasil não é exceção.
Será assim mesmo? A democracia
representativa conhece de fato uma crise?
Convivemos com um maremoto de imprecisões
terminológicas e de entendimentos dissonantes na linguagem da vida cotidiana. É
o que acontece, por exemplo, quando se confunde democracia com liberdade ou
quando se pensa que democracia significa ausência de regras, limites e
obrigações. A democracia é vista como irmã xifópaga do liberalismo, mas não se
valorizam com igual desenvoltura seus laços fundamentais com a reforma social,
o socialismo e a social-democracia, que foram igualmente estratégicos para os
avanços da ideia democrática no último século.
A situação atual está cortada por uma crise
de assimilação. A democracia representativa está com dificuldade de acompanhar
as mudanças aceleradas da vida moderna, que a desafiam. Precisa se adaptar a
elas, mas nem sempre consegue fazer isso de maneira criteriosa, com reformas
corajosas, ou seja, de maneira ativa e criativa, sem resignação e fatalismo.
Antes de tudo, a democracia sente os efeitos da mercantilização geral da vida, da prevalência unilateral do mercado como cultura, fator de organização e valor. Tudo se converte num sistema de “trocas” e vantagens competitivas, dissolvendo as ações de tipo cooperativo. Os próprios custos das transações políticas são extrapolados e não ajudam a que se governe melhor.