domingo, 14 de abril de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

É um erro atrasar aprovação do PL das Redes Sociais

O Globo

Ao criar grupo para rediscutir texto pronto, Lira atende aos interesses de quem quer que tudo fique como está

Ao mesmo tempo que criaram uma nova praça pública, as redes sociais agravaram velhos problemas. Serviram de trampolim para violação de privacidade, golpes de todo tipo, exploração sexual de menores, bullying, racismo, neonazismo e outros crimes de ódio, fomentaram vícios, abusos, ameaças, problemas de saúde mental, intolerância política e religiosa, circulação de desinformação. Diante da incapacidade reiterada das grandes plataformas digitais de resolver os problemas que criaram, a União Europeia adotou leis para que ao menos assumam responsabilidades pelos crimes cometidos nelas ou por meio delas. O objetivo é criar um ambiente de transparência, com mecanismos sensatos de vigilância e punição.

Merval Pereira - Contradições em choque

O Globo

O governo brasileiro reagiu mal nos primeiros momentos do debate de Elon Musk contra ministros do STF, em vez de deixá-lo falar sozinho, para os seus radicais

A direita brasileira, com apoio internacional, está usando as contradições do governo Lula e dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar fragilizar o sistema democrático brasileiro, desacreditando-o perante a opinião pública.

Esse debate do bilionário Elon Musk contra ministros do Supremo é a continuidade da guerra do ex-presidente Bolsonaro contra as instituições nacionais, mas só tem consequências porque o governo brasileiro reagiu mal nos primeiros momentos, em vez de deixá-lo falar sozinho, para os seus radicais.

A primeira conclusão a tirar é que Musk não é de direita nem de esquerda, ele assume posições quando cheira investimentos rentáveis, seja na China, uma ditadura de esquerda, seja em países governados pela direita, como a Argentina atual e o Brasil de Bolsonaro.

Bernardo Mello Franco - Lira esbraveja, ataca, ameaça

O Globo

Deputado passou recibo após votação que manteve Chiquinho Brazão na cadeia

Na quarta-feira, a Câmara manteve a prisão preventiva do deputado Chiquinho Brazão, acusado de mandar matar Marielle Franco. Na manhã seguinte, Arthur Lira acordou invocado. Despejou a fúria no articulador político do governo.

O chefão da Câmara chamou Alexandre Padilha de “desafeto pessoal” e “incompetente”. Acusou o ministro de plantar “mentiras e notícias falsas que incomodam o Parlamento”. Encerrou os ataques em tom de ameaça: “Depois, quando o Parlamento reage, acham ruim”.

Lira usa a palavra Parlamento como sinônimo de si mesmo. É ele quem está incomodado com a soltura de Brazão. É ele quem ameaça reagir, impondo derrotas ao Planalto.

O roteiro para soltar Brazão foi bem ensaiado. Os bolsonaristas, que não se importam em defender um acusado de duplo homicídio, votariam para derrubar a prisão. O Centrão, que tenta manter as aparências, esvaziaria o plenário. Na prática, as ausências contariam a favor do deputado preso. Para mantê-lo na cadeia, eram necessários 257 votos.

Elio Gaspari - Uma grande leitura, a 'Revista Brasileira'

O Globo

Publicação coloca a História do país à disposição do leitor

Está na rede, grátis como um arco-íris, a última edição da “Revista Brasileira”, da Academia de Letras, editada pela escritora Rosiska Darcy de Oliveira. São 192 páginas de cultura na veia.

Tem de tudo. José Paulo Cavalcanti Filho conta que o primeiro poeta brasileiro não foi Bento Teixeira, publicado em 1601, mas o jesuíta Bartolomeu Fragoso, descoberto pelo historiador Victor Eleutério. Sua poesia foi preservada em 1592 pelo Tribunal da Inquisição, que o excomungou e condenou ao degredo. Isso para o século XVI. Para o XXI, a revista publica cinco artigos sobre a vida virtual.

Para todos os outros séculos, surge a figura de Alberto da Costa e Silva, o historiador, poeta e diplomata morto em novembro passado. São dois textos de uma preciosa entrevista concedida em 2003 a Marina de Mello e Souza.

Dorrit Hazarim - Algoritmo da morte

O Globo

Isso explica a mortandade indiscriminada das seis primeiras semanas da guerra: mais de 15 mil palestinos mortos, quase metade do total de 33 mil vítimas computadas até agora

Até pouco tempo atrás o jornalismo independente da revista on-line +972, com sede em Tel Aviv, era pouco conhecido fora das fronteiras do Oriente Médio. Publicada em língua inglesa desde sua fundação, em 2010, ela tem direção e corpo editorial composto de israelenses e palestinos. Seu nome esdrúxulo deriva do código de telefonia usado tanto para Israel como para a Cisjordânia ocupada. No espectro ideológico que estraçalha a profissão, a +972 pode ser definida como francamente de esquerda. É respeitadíssima junto a entidades internacionais de jornalismo investigativo e inversamente incômoda para o governo de extrema direita de Benjamin Netanyahu. Sobretudo em tempos de guerra.

Em novembro último, quando a +972 publicou um inquietante relato sobre o afrouxamento das normas militares que permitiam o bombardeio de alvos não militares por parte das Forças de Defesa de Israel (FDI), houve pouco alvoroço mundial. Uma lástima, pois a investigação, assinada pelo veterano Yuval Abraham, se baseava no depoimento inédito sob sigilo de sete integrantes da ativa e da reserva dos serviços de inteligência israelenses — todos com atuação direta na campanha contra Gaza.

Míriam Leitão – Ajudar a versão do adversário

O Globo

PT ajuda a versão do adversário ao defender que tem a mesma proposta do PC Chinês

A China é uma ditadura. O PT sempre governou o Brasil democraticamente. Tudo o que a extrema direita golpista quer é vincular o PT ao autoritarismo, apesar de ter sido essa mesma direita que tentou golpear as instituições democráticas. Nos últimos dias, na esteira do histrionismo de Elon Musk, parlamentares brasileiros ligados a Jair Bolsonaro têm gritado no exterior a sandice de que o Brasil é uma ditadura. Por que mesmo, num contexto assim, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, vai a Pequim declarar que seu partido e o PC Chinês têm afinidades, e afirmar que foi “inspirador" o encontro dos dois partidos?

Luiz Carlos Azedo - O fascínio ideológico pelo modelo da China

Correio Braziliense

‘Mandarinato vermelho’ promove capitalismo em plena expansão, em regime de partido único. Isso fascina a esquerda e, com sinal trocado, também seduz a extrema direita

A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, liderou uma comitiva de 28 dirigentes e deputados que estreitou as relações da legenda com o Partido Comunista da China (PCCh), que já vem se desenvolvendo há alguns anos. É a maior delegação de um partido brasileiro a visitar a China, maior do que a de qualquer visita do líder comunista Luís Carlos Prestes no auge de seu prestígio como secretário-geral do PCB.

Foi uma programação intensa, que incluiu um seminário com lideranças de Pequim, na qual Gleisi leu uma carta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva “ao camarada Xi Jinping”, e um encontro no Palácio do Povo com um dos sete membros do Comitê Permanente do Politburo, Li Xi, que integra o núcleo dirigente mais poderoso da China.

Amom Mandel* - Até agora, só fizeram de conta no quesito inclusão

O Globo

Não temos números de como essas pessoas cresceram, onde estão, se tiveram acesso a seus direitos, se estão estudando, se estão tendo a assistência prevista em lei

Era uma vez a promessa de uma sociedade digna. Um país em que as pessoas viveriam com respeito a seus direitos, em comunhão umas com as outras, principalmente com as diferenças. A palavra maior seria incluir e não excluir. Esse foi o storytelling contado na fotografia bem posicionada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na rampa do Palácio do Planalto, no dia 1º de janeiro de 2023. Na sua posse, ele estava de mãos dadas com representantes do povo brasileiro que, simbolicamente, passaram a faixa para que Lula assumisse seu terceiro mandato. Algo significativo, sim, mas não representativo. Os meses seguintes deixaram a lacuna perceptível: a continuidade da invisibilidade de grupos sociais, principalmente do autismo.

Celso Rocha de Barros - O bolsonarismo tentou soltar Brazão

Folha de S. Paulo

Deputados queriam evitar o risco baixíssimo de pagar pelos crimes que de fato cometeram

Os bolsonaristas lideraram um movimento para tirar o suspeito de matar Marielle Franco da cadeia. Quase deu certo.

O deputado Eduardo Bolsonaro gravou vídeo explicando sua posição: se o Congresso não soltasse Brazão, em algum momento chegaria a vez de os bolsonaristas serem presos.

Na divisão do trabalho da família Bolsonaro, Eduardo era o responsável por cultivar relações com o fascismo internacional. Flávio administrava aquele negócio com Queiroz, Carluxo cuidava do Twitter e Jair organizava o golpe.

Bruno Boghossian - De volta à 'suruba selecionada'

Folha de S. Paulo

Depois de barbeiragem do Supremo na revisão de regras, casuísmo está quase completo

Quando o STF restringiu o foro especial, os políticos chiaram. Na época, o Congresso ameaçou estender a gentileza e também mandar para a primeira instância os processos contra ministros do tribunal. Na discussão, o então senador Romero Jucá resumiu a retaliação com uma pérola: "É todo mundo na suruba, não uma suruba selecionada".

Se os políticos encaram a obrigação de prestar contas à Justiça como uma farra, essa é uma cortesia das delícias do poder. Ainda que estejam expostas a excessos, essas autoridades trafegam com desenvoltura nos corredores dos tribunais. Mas o bagunçado vaivém do foro especial tornou a atividade mais custosa.

Hélio Schwartsman - Inimigos e vizinhos

Folha de S. Paulo

Livro que conta a história do conflito israelo-palestino de forma razoavelmente equilibrada, não deixa margem a otimismo

Segui o conselho de João Pereira Coutinho e devorei "Enemies and Neighbors" (inimigos e vizinhos), do jornalista britânico Ian Black. Não me arrependi. Black traça uma história razoavelmente detalhada do conflito que hoje opõe israelenses a palestinos. Começa com a declaração Balfour, de 1917, pela qual os britânicos prometeram um lar nacional para os judeus na Palestina (sem deixar de fazer promessa semelhante aos árabes) e vai até 2017, ano da publicação do livro.

O grande mérito de "Enemies..." é que ele consegue manter-se equidistante das versões mais inflamadas de ambas as partes, o que não é pouco num mundo em que cada vez mais a análise é substituída por palavras de ordem. A fórmula de Black para obter tal êxito é simples: não passar pano para nenhum dos lados e tentar ser tão justo quanto possível com ambos. É pena que o jornalismo, que até pouco tempo atrás adotava essa fórmula como mantra, esteja se afastando dela, no afã de emitir sinalizações morais sobre tudo.

Muniz Sodré - O tribunal das almas

Folha de S. Paulo

Antigo tribunal misturava poderes temporais com administração de sacramentos, como confissões de pecados

O STF tem exibido aparências "extrafederais". Sinal é a desconcertante visita do senador Moro, em meio a processo de cassação eleitoral, a um magistrado do Supremo. E precisamente a alguém que, aos olhos públicos, não parece apreciá-lo. Inexiste, claro, qualquer impedimento legal para o encontro. O que chama a atenção é o seu aparente caráter terapêutico no sentido americano do "counseling", que comporta aconselhamento e orientações de conduta. Extrafederalização, com certeza.

Ainda mais, o episódio evoca também uma observância eclesiástica do remoto século 12 italiano, atinente ao Tribunal das Almas. Era o tempo dos papas reis, que misturavam poderes temporais com administração de sacramentos, como confissões de pecados. Cabia ao tribunal ponderar a gravidade dos atos e conceder ou negar absolvições.

Vinicius Torres Freire - Brasil, uma situação perigosa

Folha de S. Paulo

País vive rara conjunção de juros altos, dívida cara e pouca poupança para pagar tudo isso

Nesta semana, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva deve dizer que sua meta de poupar dinheiro em 2025 vai ser menor do que previa desde o ano passado. A meta de superávit primário vai ser menor —trata-se da diferença entre o que se arrecada e o que se gasta, afora despesas com juros.

Mesmo menos ambicioso, o objetivo será ainda assim difícil de cumprir, entre outros problemas que vão afetar o novíssimo teto móvel de gastos de Lula-Haddad.

As contas do governo do Brasil estão em situação perigosa, rara desde que se estabeleceu um regime baseado nas ideias de meta de inflação, câmbio flutuante e superávit primário, ideias na prática muita vez furadas, e desde que há estatísticas comparáveis. Desde 2002.

Paulo Fábio Dantas Neto* - Universidades e institutos federais: a busca de uma razão razoável

É possível que ocorra, em âmbito nacional, já a partir de abril, uma greve de docentes nas universidades e institutos federais de educação, já tendo sido tomada essa decisão em algumas delas. Servidores técnico-administrativos da educação superior já adotam, há semanas, esse expediente de pressão. 

A possibilidade é colocada mesmo quando a ministra da Gestão e Inovação, Esther Dweck – que gere, simultaneamente, dezenas de mesas de negociação com categorias específicas de servidores públicos – informa que o governo trabalha para apresentar, justamente aos docentes e técnico-administrativos do setor da Educação, uma contraproposta de reajuste salarial (a proposta anterior do governo, de 4,5% em 2025 e 4,5% em 2026 não foi aceita) e uma proposta de reestruturação da carreira, no caso dos segundos. Um vídeo com a fala de Dweck (Canal Gov - “Bom dia ministra” - 11.04.24) circulou amplamente e seu conteúdo foi bem contextualizado e explicado mais detalhadamente em matérias publicadas nos dias 11 e 12 de abril, pelo jornal O Globo (“Ministra quer prioridade no reajuste de servidores para a educação federal” – matéria de Geralda Doca, em 11.04.24 e “Governo deve apresentar nova proposta de reajuste para servidores” - matéria de Renan Monteiro, em 12.04.24). 

Eliane Cantanhêde - Nova frente de batalha

O Estado de S. Paulo

Aumento de servidores é problema orçamentário, econômico e político, num ano eleitoral

O presidente Lula vai dar de cara com mais uma frente de conflitos, a dos servidores públicos. A semana começa com pedido de 30% de aumento geral de salários, ameaça de greve de professores – categoria tradicionalmente alinhada com o PT – e risco de virar bola de neve. A questão é orçamentária, econômica e também política, num ano eleitoral.

Como sempre, Lula acionou o apagador-mor de incêndios, Fernando Haddad, da Fazenda, não só para fazer as contas, mas para dizer “não” com sobriedade e negociar saídas, enquanto Esther Dweck, da Gestão, toureia os líderes do funcionalismo, cara a cara, e Rui Costa, da Casa Civil, fica na espreita para dar o bote petista ao final da negociação.

Rolf Kuntz - Incertezas bilionárias

O Estado de S. Paulo

Dados sobre consumo, inflação e emprego justificam melhora das expectativas para 2024. Mas quem acompanha a gestão pública tem motivos suficientes para preocupação e incerteza

Consumo em alta, inflação em baixa e desemprego contido justificam a melhora das expectativas para o Brasil em 2024, com projeções de crescimento próximas de 2%. Os mais otimistas apostam num resultado pouco superior a essa marca. O otimismo é limitado, no entanto, pela insegurança internacional e pela incerteza quanto à evolução das contas públicas. Para defender o Tesouro, o presidente Luiz Inácio da Silva terá de resistir às pressões do PT e, mais do que isso, às próprias tendências. Como vários companheiros de partido, o presidente às vezes parece acreditar na gastança como fonte milagrosa de prosperidade. Além do maquiavelismo e do marxismo de botequim, há também um keynesianismo botequinesco.

Pedro S. Malan - Em busca da eficiência do gasto público

O Estado de S. Paulo

Lembremos o alerta de Rogoff: ‘Os que desejam um papel mais amplo do setor público fortaleceriam sua posição se estivessem preocupados em encontrar formas de fazer o setor público mais eficaz’

Em 15 de abril o Poder Executivo apresenta ao Congresso a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que deverá orientar a elaboração da Lei Orçamentária Anual para o ano de 2025 e compreender – assim reza a Constituição federal – as metas e prioridades da Administração Pública Federal.

Há neste governo quem defenda que se poderia, talvez, introduzir na LDO uma forma de dar curso à revisão de ações públicas, medindo sua eficiência. Trata-se de discussão da maior relevância. Em artigo publicado neste espaço em fevereiro passado, o ex-ministro José Serra deu importante contribuição ao debate sobre finanças públicas no Brasil ao propor a adoção entre nós de um processo sistemático e transparente de revisão do gasto público, que conversaria bem com o “novo” arcabouço fiscal e com as regras, combalidas, mas que resistem ainda após 24 anos de vigência, da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Poesia | O açúcar, de Ferreira Gullar

 

Música | Caetano Veloso, Carminho - Você-Você