Professor da Unicamp avalia que volta de
Lula ao cenário político contribuiu para a organização da esquerda e que a
direita não bolsonarista precisa encontrar um caminho para enfrentar o
presidente em 2022
Marlen Couto / O Globo
RIO — Presidente do Centro Brasileiro de
Análise e Planejamento (Cebrap) e professor da Unicamp, o cientista social
Marcos Nobre avalia que o presidente Jair Bolsonaro não está enfraquecido, como
acredita parte da oposição — embora pesquisas recentes mostrem que sua
aprovação é a mais baixa desde o início do mandato. Para o pesquisador, o
presidente que agora enfrenta o desgaste de manifestações de rua e de uma CPI
contra seu governo não está “fraco nem forte”, mas forte o suficiente para ir
ao segundo turno em 2022 e evitar um possível processo de impeachment; e fraco
o suficiente para manter a narrativa de que está permanentemente na luta contra
o sistema e manter sua base unida.
A aprovação ao governo
Bolsonaro vive seu pior momento, mas o presidente mantém o apoio de uma parcela
significativa da população. A oposição subestima o presidente?
Existe um grau diferente de organização na
oposição. Enquanto a esquerda está mais organizada no entorno do PT e do Lula,
a direita não bolsonarista ainda não encontrou sua maneira de se organizar.
Outro ponto é que não existe uma articulação política entre esses dois centros
para fazer frente a Bolsonaro. Para derrotá-lo em 2022, vai ser preciso um
acordo entre eles. Sem isso, não será possível. Quando olhamos as pesquisas,
vemos que a rejeição a Bolsonaro subiu, mas muita gente que saiu da aprovação,
do ótimo ou bom, foi para a avaliação de que o governo é regular. Essas pessoas
podem voltar se não encontrarem uma candidatura alternativa. Não é razoável
imaginar que 2022 vai ser pior do que 2021 porque vai ter vacina, mesmo que de
maneira tardia ou desorganizada. E existe um cenário de crescimento da
economia, que pode não durar, mas pode durar o suficiente. Mesmo que alguém
acredite que Bolsonaro estará pior em 2022, não deveria deixar de tentar
organizar o campo democrático. A política, na situação em que a gente está,
existe para a gente reduzir ao máximo a possibilidade de catástrofe.
Quem são os eleitores que
avaliam o governo como regular e podem ser tão decisivos?
Dá para dizer que é um contingente que não
gostaria de ser obrigado a escolher entre Bolsonaro e Lula. Ao mesmo tempo,
diante de uma alternativa Lula ou Bolsonaro, não vai se dividir de maneira
igual. Existe um grande ponto de interrogação. Diante de um risco, você não
dobra a aposta. Se nós tivermos vacinação, economia melhorando, prorrogação do
auxílio emergencial e depois um Bolsa Família robusto, Bolsonaro será um
candidato muito forte.
“Bolsonaro está forte o suficiente para ir
ao segundo turno e fraco o suficiente para mostrar a seu eleitorado que ele
luta permanentemente contra o sistema"
É muito estranho as pessoas continuarem a
achar que Bolsonaro está enfraquecido, porque faz parte da encenação dele
parecer que está fraco, que está lutando contra o sistema. O extraordinário é
que muitas pessoas acreditam. Quando alguém me pergunta se Bolsonaro está fraco
ou forte, respondo “nenhuma das duas coisas”. Está forte o suficiente para ir
ao segundo turno e evitar um impeachment, e está fraco o suficiente para
mostrar a esse eleitorado que ele é alguém que luta permanentemente contra o
sistema.