- O Estado de S.Paulo
Como sistema de orientação, meus artigos vêm observando a crise que nos assola a partir da nossa experiência na matéria
Como sistema de orientação, meus artigos vêm observando a crise que nos assola a partir da nossa experiência na matéria, que ensina a reparar inicialmente a fim de medir seu potencial disruptivo, as ruas e os quartéis como os lugares mais sensíveis para o registro de sua gravidade. Salvo momentos episódicos de pico, as ruas estão vazias e os quartéis, silenciosos, fazendo profissão de fé à ordem constitucional. De forma inédita em nossa História, é da família do campo do Poder Judiciário em associação também inédita com a imprensa – combinação sempre explosiva aqui e alhures – que, faz tempo, provêm as tentativas de desestabilizar a ordem reinante, levando o presidente da República às barras dos tribunais mesmo a poucos meses das eleições gerais, como já é o caso.
Duas das corporações mais influentes na conjuntura presente – a militar e a jurídica –, como seria natural, falam de perspectivas distintas, a do poder a primeira e a segunda, do princípio republicano da moralidade e dos seus valores diante da degradação pública que, nos últimos anos, sofreram nossas instituições políticas, hoje justamente repudiadas pela cidadania. O momento eleitoral pode constituir, se levado a sério, uma oportunidade de ouro para o saneamento, pelo voto, dos partidos e da própria atividade política.
Ambas são animadas por lógicas distintas, mas que podem e devem exercer papéis complementares, tanto para garantir que a competição eleitoral obedeça às vias democráticas quanto para interditar o acesso a candidaturas que, na forma da lei, estejam proscritas.
Se este país se tornou, a partir dos anos 1930, um caso clássico de modernização por cima, conduzindo pela mão do Estado a industrialização, valendo-se de todos os meios para a realização dos seus objetivos, borrando desde aí os limites que devem separar as esferas públicas das privadas, tal modelo se esgotou sob o governo Dilma, que pretendia radicalizá-lo, contra todos os sinais que apontavam para sua exaustão.
Nesse sentido, o processo eleitoral que já vivemos pode ser considerado como um momento quase constituinte, na medida em que deve impor pelo voto uma radical mudança nas relações entre o Estado e a sociedade civil. O movimento de junho de 2013 da juventude anunciou com tintas fortes a profundidade da crise dessa relação, enquanto a devassa nos negócios entre agentes públicos e empresas privadas procedida pela chamada Operação Lava Jato fez o resto, jogando ao chão o que ainda restava dela. Decerto que o momento de uma campanha eleitoral não seria o mais oportuno, pelas paixões que ela suscita, mas, por ora, só contamos com ele.