quinta-feira, 25 de abril de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Renovação do Perse é erro de R$ 15 bilhões

O Globo

Projeto de Lei prorrogando benefício concedido na pandemia a setor de eventos prejudica equilíbrio fiscal

Em mais um sinal de descaso com a responsabilidade fiscal, a Câmara aprovou na terça-feira um Projeto de Lei que prorroga o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos, conhecido pela sigla Perse. Criado em 2021 para ajudar empresas a enfrentar a crise econômica provocada pela pandemia, o Perse se tornou mais uma evidência de como, no Brasil, o provisório e emergencial tende a perdurar por mais tempo que o razoável. Seu custo é significativo. Dados da Receita Federal mostram que consumiu R$ 10,8 bilhões em renúncias fiscais em 2022 e R$ 13,1 bilhões no ano passado. Se o texto for aprovado no Senado, mais R$ 15 bilhões deixarão de entrar nos cofres do governo até 2026.

Merval Pereira - Briga eterna

O Globo

Dificilmente teremos em curto prazo saídas para estabilizar a relação entre um Executivo “progressista” e um Legislativo “conservador”

A declaração do presidente da Câmara, Arthur Lira, de que a disputa pelo Orçamento entre Executivo e Legislativo “continuará para sempre” é sinal de que o ambiente tenso entre os dois Poderes também continuará, não digo para sempre, porque pode-se encontrar um caminho de negociação, mas dificilmente teremos em curto prazo saídas para estabilizar a relação entre um Executivo “progressista” e um Legislativo “conservador”.

A dificuldade maior está em termos uma democracia multipartidária, com diversos partidos de porte médio que trabalham em nichos do eleitorado, não refletindo a média do pensamento brasileiro, mas sua divisão. O presidente disputa uma eleição majoritária, e durante muito tempo a liderança pessoal do presidente vale mais que seu partido. Bolsonaro já pulou para mais de dez partidos políticos, e é ele quem tem os votos.

Malu Gaspar – O tango de Lula e Lira

O Globo

Na noite de domingo, Lula recebeu Arthur Lira para uma conversa a sós no Palácio da Alvorada. O objetivo era aparar arestas. Os dois estavam desgastados por uma semana que terminou com Lira fazendo uma lista de pedidos de CPIs pendentes e o presidente da República mobilizando aliados no Senado Federal e no Supremo Tribunal Federal (STF) para mostrar ao chefe da Câmara dos Deputados que ele já não tinha o mesmo poder de antes.

Pesava no ar um clima de incerteza sobre as pautas do governo no Congresso, especialmente os vetos do presidente da República que deveriam ter sido analisados nesta quarta-feira e da bomba fiscal, a série de projetos que aumentam gastos e podem levar ao estouro do Orçamento em 2024.

O que Lula e Lira combinaram no papo ao pé do ouvido nenhum deles revelou. Lira tentou até negar o encontro, como se ignorasse que, em Brasília, palácios não guardam segredos.

Lula, ao ser questionado, disse que não tinha obrigação de contar o que foi dito. O resultado, porém, foi inequívoco. Ambos baixaram as armas, o que só costuma acontecer quando os dois lados entendem que não têm nada a ganhar com um conflito.

Míriam Leitão - A Reforma em sua hora da verdade

O Globo

Regulamentação agora vai passar pela batalha da aprovação em um Congresso com poderes excessivos

A solenidade e as palavras confiantes do ministro Fernando Haddad, ao entregar a regulamentação da Reforma Tributária, eram as de uma pessoa vitoriosa. Cada passo dessa reforma tão esperada é um feito, de fato. Agora os 500 artigos e as 300 páginas que prometem simplificar a vida dos contribuintes brasileiros precisam ser digeridos, entendidos e, quem sabe, aprovados sem maiores distorções. No meio do caminho tem um Congresso que chegou a um ponto de hostilidade tal que o governo terminou o dia ontem achando que havia vencido uma queda de braço apenas porque adiou a votação dos vetos.

A tarde de ontem de Brasília era a cena exposta da difícil governabilidade do Brasil. Ministros correndo atrás de deputados, em reuniões urgentes e sequenciais, tudo para tentar evitar a derrubada dos vetos presidenciais. Chegou ao absurdo de o governo liberar emendas para que o Congresso não derrubasse o veto às próprias emendas. Explicando melhor. Um dos vetos de Lula recaiu sobre uma parte das emendas de comissão, 10% de tudo o que os congressistas abocanham do orçamento público, ou seja, R$ 5,6 bilhões. Para que esse veto não fosse derrubado, o governo prometeu liberar R$ 3,6 bilhões. Noves fora, nada. É muito desgaste por um mero adiamento.

Luiz Carlos Azedo - "Vocês ainda vão sentir saudades do Sarney"

Correio Braziliense

Seu maior legado é a Constituição de 1988, que assegura as liberdades e os direitos sociais. Vale o registro de que Sarney estava disposto a apoiar o parlamentarismo

Era uma tensa reunião do Comitê Central do antigo Partido Comunista Brasileiro (PCB) para discutir a posição da legenda recém-legalizada, às vésperas das eleições de 1986. Uma ala desejava formar uma frente de esquerda e apoiar candidatos de oposição ao governo, mas prevaleceu a posição da cúpula da legenda, então sob a liderança de Giocondo Dias, um ex-cabo do Exército, que havia liderado a chamada Intentona Comunista em Natal (RN), em 1935, e sucedera o legendário Luiz Carlos Prestes, em 1980.

"Vocês ainda vão sentir saudades do Sarney", vaticinou Giocondo, ao defender a manutenção da política de frente democrática tecida pelos comunistas com os políticos liberais, durante o regime militar, e que levou à eleição de Tancredo Neves (MDB) no colégio eleitoral. Estava-se em meio à longa transição negociada com os militares, que aceitaram, contrariados, a derrota de Paulo Maluf (também não morriam de amores por ele). A alternativa descartada era uma frente com PDT, PT e PSB, leia-se, Leonel Brizola, Luís Inácio Lula da Silva e Miguel Arraes, respectivamente.

Bruno Boghossian - O pós-PMDB

Folha de S. Paulo

Líder em prefeituras, partido ganha capilaridade para oferecer sustentação a governantes no plano nacional

Em uma década, a paisagem partidária do país foi amassada por um rolo compressor. A principal sigla de esquerda está na Presidência, mas tem só uma fração da força que já acumulou no Congresso e nos municípios. A legenda que liderava a oposição praticamente acabou, e os grupos que dominam a direita se alojaram em partidos de aluguel.

A janela de migrações partidárias atualizou esse cenário. O PT ganhou 83 prefeitos, quase nada para uma legenda que tem a máquina do governo federal. O PL apostou tudo no poder de atração de um político incendiário e cresceu ainda menos.

Maria Hermínia Tavares - A Cultura é pública

Folha de S. Paulo

CPI da TV Cultura não tem objetivo claro e se baseia em vagas acusações

O estado de São Paulo tem uma longa história de políticas públicas inovadoras —no conteúdo, na forma de organizar a gestão e na entrega de resultados. Isso é especialmente verdadeiro nas áreas de ciência e cultura. Aí o controle estatal direto nunca traz bons frutos, pois tais atividades precisam manter profilática distância dos governos e da política partidária.

Criar organizações públicas não estatais, capazes de sobreviver até às grandes reviravoltas da política, foi ingrediente indispensável da pujança científica e cultural paulista. Basta citar a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, as três universidades paulistas, a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, a Fundação Butantan e a Fundação Padre Anchieta, que gere a TV Cultura. Cada qual com seu modelo jurídico: fundação pública; autarquias de regime especial; organização da sociedade civil de interesse público; ou fundações privadas de interesse público.

Conrado Hübner Mendes - A Constituição não aceita negociar

Folha de S. Paulo

Direito constitunegocial brasileiro busca esvaziar direitos fundamentais no STF

Um juiz constitucional trabalha a partir da categoria de constitucionalidade. Um juiz constitunegocial adota o parâmetro do "bom para ambas as partes". Um avalia se leis, políticas e práticas estatais respeitam a Constituição. O outro negocia a constitucionalidade para fins não publicáveis. À moda Russomanno.

Um juiz constitucional argumenta. Um juiz constitunegocial barganha. Um navega o cânone jurídico e a análise de fatos a partir de compromissos normativos. O outro persegue interesses a partir de compromissos patrimonialistas, familistas, às vezes partidários. Com a força e autoridade de seu cargo, o juiz constitunegocial e seus parentes saem na frente.

Maria Cristina Fernandes - Impeachment inédito preocupa os Poderes

Valor Econômico

Jantar marcou uma atuação coordenada do Executivo e do Supremo para evitar uma maioria bolsonarista no Senado em 2027

O Congresso não se enterneceu com o apelo conciliatório do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas o governo ganhou tempo. Lula disse que depois que um projeto de lei sai do Executivo o Congresso pode lhe dar o destino que quiser. No dia seguinte, o governo suou para adiar a votação dos vetos presidenciais. Não sem antes assegurar a retaguarda.

Veio na forma de uma ação de inconstitucionalidade impetrada no Supremo Tribunal Federal pela AGU contra uma desoneração que privou o Tesouro de R$ 10 bilhões anuais. A ADI é fruto da aliança entre Executivo e Supremo que enfurece o Congresso. Seu relator será o ministro Cristiano Zanin.

Lula, o conciliador, entrou em campo depois do jantar com ministros que, no Congresso, foi lido como maquinação entre os dois Poderes contra o terceiro. O ministro Alexandre de Moraes também foi à luta. Arquivou o inquérito da hospedagem do ex-presidente Jair Bolsonaro na embaixada da Hungria. Ao ministro Gilmar Mendes coube suspender as ações em curso no Judiciário relacionadas ao marco temporal. O STF havia derrubado a tese, levando o Congresso a aprovar lei para reinstituí-lo.

William Waack - Segurança pública sem solução

O Estado de S. Paulo

Não há chances de consenso político sobre como combater o crime organizado

Os profissionais que lidam com a questão do crime organizado são unânimes em afirmar que o problema é muito pior do que se imagina. Essa constatação é comum no mundo acadêmico, empresarial, no ambiente dos investigadores, nas polícias e nos Executivos estaduais.

O crime organizado é descrito como problema muito maior do que a já preocupante percepção de violência – aquela diretamente atrelada à taxas de criminalidade como assaltos, estupros e furtos. Seu impacto na economia é estimado em torno de R$ 600 bilhões por ano, mais de R$ 1 bilhão por dia.

Nas palavras do presidente do Banco Central, em recente evento sobre segurança pública, o crime organizado tem efeitos na economia que podem ser medidos até no spread bancário (leia-se juros ao consumidor). E é visto por investidores externos como uma espécie de imposto a ser calculado, que torna mais caro ainda o custo de capital no Brasil. Já influi na direção e intensidade do investimento estrangeiro direto (FDI), com o México sofrendo ainda mais.

José Serra - Alegria na economia brasileira dura pouco

O Estado de S. Paulo

Tanto se fala nos gastos obrigatórios com saúde e educação, mas é no buraco negro das relações com o Congresso que está o grande elemento de instabilidade

No início deste mês, era perceptível um clima de otimismo na economia. Expectativa de queda nos juros, inflação sob controle, emprego em crescimento, oportunidades de negócio em alta. E o mais importante, diversos anúncios de investimento divulgados por grandes empresas, de vários segmentos. Além disso, a receita da União vai conseguindo expressivos ganhos reais.

A realidade hoje é outra, bem diferente. A reversão parece ter começado nas desventuras governamentais na gestão da Petrobras, que quase produziram a queda do seu atual presidente. Na sequência, a proposta do Ministério da Fazenda de mudar a meta para as contas públicas, para 2025, de superávit de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) para zero, gerou grande descrédito sobre o novo arcabouço fiscal. Além disso, o crédito suplementar de R$ 15 bilhões para novos gastos, no Orçamento da União de 2024, soou como um passamoleque no arcabouço fiscal, articulado entre o Executivo federal e o Congresso Nacional.

Felipe Salto - Comitê Gestor do IBS acabará com a Federação

O Estado de S. Paulo

O avanço de uma estrutura megalômana, com governança baseada em critérios de representação inconstitucionais, custará caro ao País

Enquanto escrevia este artigo, o governo ensaiava enviar os projetos para regulamentar a Emenda Constitucional (EC) n.º 132, de 2023, a Reforma Tributária do Consumo. Neste artigo, retomo o tema do Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). O novo tributo substituirá os atuais ISS, municipal, e ICMS, estadual, para compor a parte subnacional do novo Imposto sobre Valor Adicionado (IVA). A Federação corre risco.

O avanço de uma estrutura megalômana, com governança baseada em critérios de representação inconstitucionais, custará caro ao País. Serão 54 membros escolhidos pelos Estados e municípios. Os iluminados vão decidir tudo a respeito do principal tributo do País, o gigantesco IBS, cuja alíquota ultrapassará 33%, nas minhas estimativas.

Para ter claro, a junção do ISS e do ICMS ocorrerá após uma longa transição, a encerrar-se em dezembro de 2032. Até lá, o sistema tributário conviverá com os antigos e os novos tributos, confluindo para uma complexidade exponencialmente maior em relação ao modelo atual.

Cláudio Carraly* - O fenômeno da “Narcomilícia Evangélica e dos Traficantes de Deus”

O Brasil enfrenta desafios complexos relacionados ao crime organizado, com destaque para o Rio de Janeiro, onde a presença desses grupos é particularmente marcante, a emergência da narcomilícia evangélica e dos traficantes de Deus representa uma evolução sinistra nesse cenário. Ao combinar elementos do tráfico de drogas, historicamente operando à margem da lei, com grupos paramilitares e influências nas redes religiosas, esses grupos se tornam uma força ainda mais abominável e insidiosa, ressalte-se que lamentavelmente esse caldo de intolerância e criminalidade vem aos poucos chegando ao restante do país.

Essa fusão de poderes cria um ambiente onde a violência e a coação são legitimadas por justificativas religiosas, minando não apenas a segurança física, mas também a ordem democrática, as comunidades afetadas muitas vezes se encontram em um estado de vulnerabilidade, sujeitas à arbitrariedade do controle que impõem suas próprias leis e punições. Além das implicações criminais, a existência desses dois grupos levanta preocupações sérias sobre intolerância religiosa e violência, ataques aos terreiros de candomblé são exemplos vívidos desse fenômeno. 

Guga Chacra – Dinheiro garantido para guerras

O Globo

US$ 90 bi para armas são 2.000 vezes o valor que Biden prometeu para conter o desmatamento da Amazônia, mas o Congresso barrou

Com o ensino público básico decadente, uma infraestrutura ultrapassada e sem um sistema de saúde público similar ao de nações avançadas, o governo de Joe Biden, com o apoio de quase todos os senadores democratas e a maioria dos republicanos, arrumou dinheiro e aprovou uma multibilionária ajuda militar a seus aliados Ucrânia, Israel e, em escala muito menor, Taiwan. O valor ultrapassa US$ 90 bilhões, sendo duas mil vezes maior do que o presidente prometeu para conter o desmatamento da Amazônia, mas não conseguiu aprovar. Isso mesmo, a preservação do meio ambiente vale 0,5 milésimo do suporte dado a conflitos armados. É um fato.

Luís Faro Ramos* - A madrugada por que todos esperávamos foi há 50 anos

Folha de S. Paulo

Cinquentenário da Revolução dos Cravos deve ser recordado não só para homenagear os heróis, mas também para lembrar às novas gerações que a liberdade não é um valor adquirido

Há 50 anos, no dia 25 de abril de 1974, as ruas de Portugal encheram-se de gente, numa manifestação espontânea de júbilo. Na véspera, o movimento das Forças Armadas pôs em prática um golpe que vinha sendo planeado ao segundo. Os convidados não foram chamados, como nos nossos dias, por uma rede social, mas antes por uma canção transmitida pela plataforma mais popular na altura, a rádio!

Rompendo o silêncio da noite, ouviu-se "E depois do adeus", de Paulo de Carvalho. Porque "Grândola Vila Morena", de Zeca Afonso, era demasiado explícita. E depois do adeus foi a senha para que todas as forças envolvidas dessem início à festa!

Poesia | A Revolução dos Cravos, de Rosa Redondo na voz Joaquim Sustelo

 

Música | Chico Buarque - Tanto Mar - Versão Original

 

Música | 25 de Abril 1974 - Nara Leão: Grândola, Vila Morena