sábado, 7 de fevereiro de 2015

Opinião do dia – Aécio Neves

Bendine é ligado ao mesmo governo que permitiu que uma quadrilha se instalasse na companhia e que faz o que pode para descredibilizar as investigações do esquema para, assim, blindar a presidente Dilma e Lula. A indicação dele sinaliza também que a interferência do governo na estatal irá continuar.
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Presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG). O Globo, 7 de janeiro de 2015

Dilma escolhe presidente do BB para chefiar Petrobras

• Opção por Bendine também tem como objetivo blindar o Planalto em CPI

• Presidente decidiu o sucessor de Graça sem ouvir ninguém, prática que vem se tornando cada vez mais comum

Natuza Nery, Andréia Sadi – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Em uma decisão solitária, a presidente Dilma Rousseff nomeou nesta sexta-feira (6) Aldemir Bendine, 51, para o lugar de Graça Foster no comando da Petrobras. Ex-chefe do Banco do Brasil, o novo executivo assume a empresa na maior crise de sua história com o desafio de rever o plano de negócios da petroleira.

Segundo a Folha apurou, Bendine se dedicará a resolver os problemas de caixa e a apresentar, em curto prazo, números confiáveis relativos ao tamanho dos desvios derivados da corrupção.

A meta é considerada crucial para que o balanço da companhia possa, finalmente, ser auditado. Sem isso, a Petrobras perderá acesso a empréstimos e terá de ser socorrida pelo governo.

A indicação de Bendine, nome da estrita confiança da presidente, tem como objetivo adicional blindar minimamente o Planalto diante de uma CPI no Congresso.

Dilma tinha apenas dois dias para executar a substituição após a antiga diretoria se recusar a permanecer na companhia por mais tempo.

Apesar dos rumores de que a petista ainda buscava um nome na quinta (5), Bendine já estava confirmado no cargo desde o dia anterior.

Para evitar vazamentos à imprensa, algo que a tira do sério, pouquíssimas pessoas souberam da articulação.

Ela escolheu o sucessor da amiga Graça Foster sem ouvir ninguém, prática que vem se tornando cada vez mais comum à medida que as dificuldades do governo se aprofundam. Nem mesmo ministros próximos foram informados com antecedência, muito menos o ex-presidente Lula.

Além da confiança, Bendine assumiu a maior empresa do Brasil pela atuação bem sucedida à frente do Banco do Brasil. Sua indicação mantém intocada a influência do Planalto nas decisões da empresa e, ao mesmo tempo, amplia a interlocução da Petrobras junto ao mercado.

Bendine já demonstrou experiência em pegar uma instituição em apuros e reerguê-la. Foi assim no BB, sua casa desde os tempos de office-boy. A partir de 2009, quando assumiu, triplicou os ativos do banco. Foi alçado ao posto de presidente do BB para executar o plano do governo de reduzir os juros nos empréstimos e, assim, forçar bancos privados a fazer o mesmo.

Sua escolha fez as ações da Petrobras caírem quase 7%. Investidores esperavam solução nos moldes de Joaquim Levy, ministro da Fazenda sem proximidade política com Dilma, e leram a nomeação como sinal de que o governo continuará interferindo nas decisões da petroleira.

Críticos pontuam que a origem de desmandos administrativos nos últimos anos se deu justamente pelo grau de ingerência da presidente.

O exemplo mais evidente foi o controle do preço da gasolina, segurado a rédeas curtas para evitar contratempos políticos e impactos inflacionários no período eleitoral.

Bendine possui boas relações com o Bradesco --é próximo de seu presidente, Luiz Traduco. Na política, costuma frequentar o Instituto Lula.

Nos últimos meses, ele ganhou pontos junto à chefe ao liderar uma operação com bancos privados para salvar a Sete Brasil, empresa que toca a cadeia do pré-sal.

Muitas das empreiteiras acusadas de envolvimento no esquema de corrupção são parceiras da Sete. Para evitar o colapso da companhia, Dilma escalou Bendine para ajudar a destravar empréstimos.

A escolha da presidente pegou petistas de surpresa. "Ele não tem perfil para gerenciar uma crise dessa dimensão", disse um dirigente da cúpula da sigla. A oposição afirmou que o objetivo da indicação é blindar PT e governo das denúncias sobre a estatal.

No Banco do Brasil, um fiel escudeiro do Palácio do Planalto

• À frente do maior banco da América Latina, Bendine seguiu recomendações do governo federal e não se importou com críticas

Murilo Rodrigues Alves - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O engenheiro Ivan de Souza Monteiro costuma seguir um ritual antes de qualquer apresentação que faça em público: fica sozinho por alguns minutos, em silêncio, não atende telefone, não responde e-mail nem mensagens. Aqueles que trabalham com ele dizem que ele faz isso porque é tímido e fica nervoso. Mas quem o assiste não pode imaginar que haja ali qualquer traço de insegurança. É bem verdade, no entanto, que ele é mais seguro e falante nas rodas que se formam depois dos eventos.

Como vice-presidente de Gestão Financeira e Relações com Investidores do Banco do Brasil, Monteiro sempre se mostrou firme. É considerado um excelente e competente executivo por seus pares no mercado financeiro e também por boa parte de seus colegas de banco. Tem crédito perante investidores.

Assim como Aldemir Bendine, que agora assume a presidência da Petrobrás, Monteiro é considerado um executivo de carreira, que tem certo trânsito político que possibilitou a ele galgar postos no BB. Entrou no banco pela agência de Santa Rita de Sapucaí, em Minas Gerais, ainda na década de 80. Nos anos 2000, teve passagens pelas filiais de Nova York e Lisboa, onde foi gerente. Chegou a diretor comercial em maio de 2009 e poucos meses depois assumiu a vice-presidência, onde esteve até esta sexta-feira, 6.

Diferentemente de Bendine, Monteiro é considerado mais técnico que político. Sua origem é a "turma do banco" no Rio de Janeiro, onde viveu quase toda sua vida apesar de ter nascido em Manaus e ter feito faculdade em Minas.

Teria uma ligação natural com o PMDB, segundo afirmam algumas fontes. Como diz um ex-colega, "ele nunca foi ligado à esquerda". "Tem um estilo Levy", em referência ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy, considerado um neoliberal pelos petistas.

Mas mesmo que seja visto com esse perfil a la "Chicago Boy", Monteiro sempre buscou durante entrevistas coletivas, quando apresentava resultados do BB, ou mesmo nas teleconferências com investidores, ter uma resposta cuidadosa para qualquer questão que pudesse afrontar políticas de governo. Nunca se esquivou de perguntas, apesar de não necessariamente responder o que lhe era perguntado.

Na última coletiva, depois da apresentação do balanço, foi provocado sobre se o aumento das provisões para perdas de devedores duvidosos naquele trimestre teria sido em razão dos empréstimos a Val Marchiori, a socialite amiga de Bendine que recebeu R$ 2,7 milhões. Sem titubear, respondeu: "Esse assunto é com ele", apontando para o assessor de imprensa e se retirando imediatamente do recinto.

O governo considera que a recepção negativa com o nome de Aldemir Bendine para a presidência da Petrobrás não pode ser considerada o melhor parâmetro para medir o sucesso do executivo à frente da estatal. A equipe de Dilma Rousseff lembra que a queda de 6,94% das ações preferenciais da companhia, que são as mais negociadas, ontem, foi menor do que o impacto nas ações do Banco do Brasil quando Bendine foi anunciado como presidente da instituição financeira - em 8 de abril de 2009, as ações do BB despencaram 8,15%.

Há quase seis anos, Bendine foi escolhido pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para comandar o BB com a condição de seguir à risca uma espécie de contrato de gestão: ampliar a participação do banco no mercado de crédito, oferecer melhores condições de empréstimo e ser mais agressivo com a concorrência. O ex-ministro da Fazenda, Guido Mantega, também determinou que ele orientasse o setor de seguros, área em que o BB estava atrás dos concorrentes. Seu antecessor, Antonio Francisco de Lima Neto, não seguiu a cartilha do Planalto e foi retirado do cargo.

À frente do BB, Bendine seguiu todas as recomendações do governo federal e não se importou com críticas de que o banco, sob sua gestão, se tornou um braço do governo na aplicação da política econômica. "Eu resgatei um pouco esse papel do Banco do Brasil enquanto agente de desenvolvimento econômico e social. Queria dizer: ele tem um papel de governo, de fato", disse, em entrevista ao Estado em agosto de 2013.

Ele deixa o comando do maior banco da América Latina, com volume de ativos que ultrapassa a marca de R$ 1,3 trilhão. O BB aumentou a participação no mercado em meio à retração dos bancos privados. Pelos dados mais atualizados - do 3.º trimestre do ano passado -, o BB tem a maior carteira de crédito entre as instituições financeiras brasileiras, correspondente a 21,1% do mercado de crédito nacional. É maior banco da América Latina, com mais de 100 mil funcionários e mais de 60 milhões de clientes.

Office-boy. Bendine nasceu em 1963 em Paraguaçu Paulista (SP). Graduado em administração de empresas, ingressou no BB em 1978, com 14 anos, como office-boy. Antes de assumir a presidência da instituição, era vice-presidente de Cartões e Novos Negócios de Varejo.

O novo presidente da Petrobrás tem laços políticos com o PT, apesar de não ser filiado à sigla. Entre seus padrinhos, está o ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, que fez carreira no sindicalismo bancário. O Palácio do Planalto, ainda com Lula, colocou Bendine à frente do BB para influenciar mais diretamente as decisões da instituição pública com o objetivo de minimizar efeitos da crise econômica. Em 2012, quando o governo iniciou uma cruzada contra o alto custo do crédito no País, o BB foi o primeiro banco a ver espaço para reduzir os juros e as taxas bancárias, sendo seguido, pelos demais concorrentes.

Nem mesmo as polêmicas em que esteve envolvido diminuíram o prestígio dele com Lula e Dilma. Uma das últimas diz respeito a empréstimo do BB, com recursos do BNDES, aprovado para a socialite Val Marchiori (mais informações na pág. A7). Ele também pagou multa de R$ 122 mil à Receita Federal ao ter sido autuado por não informar a procedência de R$ 280 mil na declaração do Imposto de Renda.

O primeiro imbróglio foi em 2012, quando disputou o poder com Ricardo Flores, presidente da Previ (fundo de pensão do Banco do Brasil) na época. Dilma ameaçou demitir ambos, mas apenas Flores e o ex-vice-presidente Allan Toledo, que se aliou a Flores, foram defenestrados e perderam o poder.

Bendine tem carta-branca, mas ações despencam

As metas de Bendine

  • Novo presidente assume com carta-branca de Dilma para aumentar controle financeiro da estatal

Gabriela Valente – O Globo

Escândalos na Petrobras

BRASÍLIA - Com poucas horas no cargo, o novo presidente da Petrobras, Aldemir Bendine, traçou um plano para blindar a estatal do maior escândalo de corrupção do país. São três metas, segundo o novo presidente informou a fontes ouvidas pelo GLOBO. A missão mais urgente é resolver a questão contábil, que levou a empresa a não ter seu balanço financeiro auditado pela consultoria PricewaterhouseCoopers (PwC). Bendine deve passar o fim de semana lendo 800 páginas sobre as metodologias utilizadas na empresa para começar a ter noção do trabalho que tem de ser feito. E já avisou a alguns funcionários que urgência não significa trabalho malfeito.

Para isso, será feita uma avaliação de perdas e alguns testes de retorno financeiros sobre vários ativos. A nova diretoria ainda pretende fortalecer a área financeira com um novo plano de negócios. O terceiro objetivo é fazer com que a petrolífera atravesse a investigação da Operação Lava-Jato com o mínimo de danos. Bendine recebeu carta-branca da presidente Dilma Rousseff para fazer o que for preciso, até reformar o estatuto da Petrobras.

As tarefas mais árduas já foram repassadas a Ivan Monteiro, o novo diretor financeiro, segundo fontes do setor. O técnico era até ontem o vice-presidente de Finanças do Banco do Brasil, e subordinado a Bendine na instituição. A primeira avaliação do técnico foi que é preciso criar um processo financeiro mais confiável, como o que teria feito no BB. A primeira ação é resolver a questão do balanço, já que isso influencia diretamente na imagem da estatal no mercado financeiro. A divulgação das perdas de R$ 88 bilhões com corrupção na semana passada foi considerada uma "barbeiragem" pelo governo, que alega que a avaliação não seguiu a melhor metodologia para o cálculo.

Em segundo lugar, o objetivo é fortalecer a área financeira. Para isso, Monteiro - considerado pelo mercado um dos melhores na área - deve analisar a situação de caixa e promover novas captações para resolver problemas mais urgentes. A intenção é fazer um "novo mix" nas finanças da instituição. A nova diretoria quer rediscutir papéis dentro do corpo técnico. E, depois disso, criar um novo plano de negócios, de investimentos e de capital.

A terceira missão é enfrentar a Lava-Jato, mas a avaliação do novo presidente é que a empresa tem tratado a investigação com transparência e colaborado com a PF e o Ministério Público.

Antes da reunião de ontem do conselho da Petrobras, Graça Foster, que renunciou ao cargo de presidente da empresa dois dias antes, conversou com Bendine e se colocou à disposição para colaborar numa transição mais tranquila. Segundo funcionários da estatal, Graça está abalada emocionalmente com o escândalo e com a forma que a levou a sair da empresa, na renúncia coletiva da diretoria.

Bendine não participou da primeira parte da reunião do conselho da estatal e só entrou na sala após ter o nome aprovado. Enquanto o ex-ministro da Fazenda e ainda atual presidente do colegiado, Guido Mantega, conduzia a reunião que votava sua escolha, Bendine aguardava em uma sala ao lado. Segundo participantes, os acionistas minoritários se incomodaram quando souberam que o nome de Bendine havia sido veiculado pela imprensa como o novo presidente mesmo antes da votação.

Bendine foi convidado para o posto na quarta-feira, quando Dilma o chamou para uma conversa e apresentou a missão. No encontro, ela teria dado autonomia total para o executivo.

Lula vê ação para Dilma 'não concluir mandato'

• Em Belo Horizonte, ex-presidente conclama petistas, faz defesa de tesoureiro do partido e afirma que opositores buscam 'atalhos para o poder'

Ricardo Galhardo, Ricardo Della Coletta e Marcelo Portela - O Estado de S. Paulo

BELO HORIZONTE - O ex-presidente Luiz Inácio Lula usou boa parte de seu discurso de cerca de 40 minutos no evento de comemoração dos 35 anos do PT para distribuir alfinetadas a adversários e críticas à imprensa. Sem citar nomes, o presidente de honra da legenda entremeou a história da sigla desde sua fundação com diversas indiretas aos tucanos que, segundo o petista, não "querem mais esperar outra derrota" nas urnas e "apostam no caos" buscando "atalhos para o poder".

“Não é fácil um partido de esquerda governar um país importante como o Brasil. Eles não querem nem deixar concluir o mandato da Dilma, tentando criar todo e qualquer processo de desconfiança. Querem que o PT seja desacreditado na sociedade brasileira”, afirmou Lula, segundo a Agência PT de Notícias.

Apesar de a maior parte das falas terem sido lidas, Lula manteve a tradição e ao menos a abertura de suas declarações foi feita de improviso. E usou este momento para comparar as investigações em torno de desvio de recursos da Petrobrás com o mensalão, criticando a condução do tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, para depor nas investigações da Operação Lava Jato mediante ordem judicial.

"Ontem (quinta) fiquei indignado. Tenho que ter cuidado para não passar aqui, nessa festa de 35 anos, a indignação. (Mas) seria mais fácil a Polícia Federal convidar nosso tesoureiro para se apresentar. Seria muito mais simples dizer que estou vendo o mesmo ritual que começou em 2012 no que chamaram de mensalão", disse. E direcionou críticas também à imprensa, que, de acordo com ele, mantém "um ritual" com renovação semanal de assuntos para atacar o PT.

Mas Lula direcionou mesmo suas baterias contra a forma como o partido tem sido tratado principalmente a partir da última campanha eleitoral, classificada pelo ex-presidente como "a mais difícil" enfrentada pela legenda. "Certamente, a mais suja. Aquela em que nossos adversários utilizaram as piores armas para tentar nos derrotar. Tentaram fraudar a vontade política da maioria, usando todos os seus recursos de comunicação para manipular, distorcer, falsear e até inventar episódios contra nosso partido, nosso governo e nossa candidata", disparou.

E, de acordo com o presidente, a derrota "despertou os mais baixos instintos" dos adversários. "Tiveram a ousadia de pedir recontagem dos votos, como se o Brasil ainda fosse aquela república das eleições a bico de pena. Tentaram impugnar a prestação de contas da campanha e barrar a diplomação da presidenta. Tentaram criar um ambiente de inconformismo com o resultado que se recusam a aceitar democraticamente", enumerou. E ressaltou que "a luta não acabou". "Nossos adversários não podem dizer qual é o seu projeto, porque é antinacional, contrário ao desenvolvimento. Eles só podem atacar o PT e o nosso governo com as armas da irracionalidade e do ódio", salientou.

E, em meio à leitura de trechos do manifesto de fundação do PT, relacionou as mudanças pelas quais o País passou após o partido chegar ao governo federal. Sem pontuar ações adotadas por Dilma nos primeiros dias do atual mandato criticadas por entidades sindicais e movimentos sociais, Lula fez uma comparação com o tratamento de um câncer pelo qual passou para defender medidas "duras" e "amargas" para "garantir avanços". Ao citar as sessões de quimioterapia e radioterapia a que teve que se submeter, disse que não houve "nada pior" na vida. "Mas era disciplinado e precisava para estar aqui bonitão", brincou.

Lula ainda deu um recado aos companheiros dizendo que "o verdadeiro problema do PT é que ele se tornou um partido igual aos outros", conclamando os correligionários a manter os ideais de fundação da legenda. E garantiu que o partido jamais vai "trair o compromisso com o povo ignorante, que o príncipe da Sociologia tratou assim", em clara referência a seu antecessor na Presidência da República, o sociólogo Fernando Henrique Cardoso.

PT aplaude e Lula elogia Vaccari

Vaccari é aplaudido em reunião no PT e defendido por Lula

• Lula ataca imprensa, justiça e a oposição

• Na festa dos 35 anos, Dilma conclama partido a resistir ao ‘golpismo’ dos adversários: Não podemos vacilar’

Tatiana Farah e Thiago Ricci – O Globo

BELO HORIZONTE- Um dia depois de ser conduzido à força para depor na Polícia Federal e acusado de receber US$ 50 milhões de propina no esquema de corrupção da Petrobras, o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, foi aplaudido ontem no encontro do Diretório Nacional do partido, em Belo Horizonte, ao falar sobre o depoimento e afirmar que respondeu todas as perguntas dos policiais, sem deixar nenhuma sem resposta.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva também recebeu aplausos de petistas ao defender Vaccari. Em encontro a portas fechadas, Lula pediu apoio ao tesoureiro e, com a ressalva de que pessoas que cometem erros devem pagar, usou o seguinte argumento para afirmar que confia em Vaccari:

- Na dúvida, fique com o companheiro.

Lula classificou o depoimento coercitivo de Vaccari como "repugnante" e conclamou dirigentes a não vacilarem na defesa do partido e do tesoureiro.

As acusações contra o PT e Vaccari constam da delação premiada do ex-gerente da Petrobras, Pedro Barusco, na Operação Lava-Jato.

- Se a ficarmos quietos, a sentença já está dada. O PT vai ter que voltar pra luta. Não podemos permitir que quem não tem moral venha dar moral na gente - disse o ex-presidente.

Lula ainda disse aos correligionários ter aprendido que "há situações que não têm sustentação", e acrescentou acreditar que a denúncia do ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco é um desses episódios. O ex-presidente disse que não vai "admitir a criminalização das doações privadas ao partido" e acrescentou ter aprendido com o processo do mensalão que o julgamento "é político, não jurídico".

Confiança de Rui Falcão
Vaccari, por sua vez, anunciou que o partido fará corte de gastos. O discurso de Lula vai na mesma linha do que foi dito anteontem pelo presidente do PT, Rui Falcão, que afirmou que sequer perguntaria a Vaccari sobre supostos desvios de recursos porque tem "confiança de que ele nunca colocou dinheiro do bolso".

O deputado Arlindo Chinaglia afirmou que é preciso tomar cuidado com a "eventual exploração midiática" da condução coercitiva do tesoureiro.

- Evidentemente que quando o tesoureiro Vaccari vai depor de forma coercitiva, é preciso ter um cuidado quanto a uma eventual exploração midiática de fatos ruins. É preciso ter cautela - afirmou Chinaglia.

O novo líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), disse que é necessário recompor a base e organizar o partido e a militância. Guimarães também defendeu o ajuste fiscal do governo e afirmou que para isso era preciso dialogar com os movimentos sociais. Esta semana, o presidente nacional da CUT, Vagner Freitas, disse que o governo errou e retrocedeu em conquistas trabalhistas.

"O PT está em uma encruzilhada e precisa de mudanças", afirma um texto divulgado durante a reunião do diretório nacional do partido pela segunda maior força da sigla, o grupo Mensagem ao PT, do qual fazem parte o ex-governador Tarso Genro, o ministro José Eduardo Martins Cardozo e os integrantes da Democracia Socialista (DS), como os ministros Pepe Vargas e Miguel Rossetto. O documento acusa a mídia de formar um "cartel" e pede reação dos petistas. Para a Mensagem, a mídia "transformou política em crime".

"Ou aprofundamos o processo de transformação que desencadeamos na sociedade brasileira, produzindo alterações relevantes no sistema político partidário do país e que resultou nos governos Lula e Dilma, ou sucumbimos à moléstia que acometeu as legendas que nos precederam", afirma o texto.

A proposta, que não foi integralmente encampada pelo PT, diz ainda que as autoestimas dos brasileiros e do partido foram "sistematicamente demolidas pelo cartel da mídia conservadora que pretende converter a política em crime". O texto prossegue: "Esse cartel, verdadeiro obstáculo ao avanço da democracia e ao direito à informação, não suporta a altivez que conquistamos com os governos Lula e Dilma diante do mundo".

Fundo partidário menor
Vaccari frisou a necessidade de o partido em economizar recursos. Com 20 deputados a menos que na legislatura anterior, o partido viu encolher a cota do fundo partidário, recurso público do Orçamento da União distribuído aos partidos com base na representação da bancada na Câmara dos Deputados. O PT estima que deve deixar de receber, no mínimo, R$ 1 milhão mensais do Fundo Partidário.

Em festa do PT, Lula diz que desvios 'nos envergonham'

Lula critica PT e diz que partido tem se tornado igual aos outros

• Nos 35 anos da sigla, ex-presidente afirma que petistas praticam vícios que sempre criticaram

• Dilma defende estatal e diz que quem errou tem de pagar, mas que é preciso preservar a história da legenda

Catia Seabra, Andréia Sadi – Folha de S. Paulo

BELO HORIZONTE - Em um discurso para militantes no aniversário de 35 anos do PT, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva admitiu que o partido sofreu desgastes no governo, lamentou a repetição de desvios e disse que a sigla está se tornando igual a outras.

Lula esteve com a presidente Dilma Rousseff nas comemorações dos 35 anos do partido, em Belo Horizonte.

Segundo ele, o PT pratica vícios que sempre criticou na política tradicional. "É neste ambiente que alguns cometem desvios que nos envergonham. Precisamos dar um fim a essa situação", discursou, sem citar casos de corrupção, como a crise na Petrobras.

O ex-presidente lamentou que "o PT tem se tornado cada vez mais um partido igual aos outros". "Cada vez mais deixando de ser um partido de base para se transformar num partido de gabinete."

Segundo Lula, muitos petistas "estão mais preocupados em se manter nos cargos. E essa é a origem dos vícios da militância paga".

Ele comparou a adoção de medidas amargas na economia ao tratamento contra o câncer a que ele e Dilma foram submetidos. Para justificar, disse que os dois são obrigados a tomar medidas que não querem. "Faça o que tiver que fazer. Faça, Dilma. Um erro desastroso nosso seria não atender ao povo brasileiro."

Lula disse que ficou tão indignado com a "condução coercitiva" do tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, para depor à Polícia Federal, que preferiu ler seu discurso.

"Eles estão repetindo o mesmo ritual que começou em 2005, quando começaram as denúncias que eles chamaram de mensalão", afirmou, acrescentando: "na campanha, Dilma foi vítima disso como poucas vezes vi ser".

Lula também criticou a atuação da imprensa. "Eles trabalham com a convicção de que é preciso criminalizar o partido, não importa se é verdade ou não é verdade. O que importa é a construção da narrativa".

Após chamar o ex-presidente FHC de "príncipe da sociologia", Lula disse que a oposição não tem autoridade para atacar o governo. "Não se incomodam do prejuízo que causaram à Petrobras e ao Brasil. Eles vão prestar contas à história".

Ao discursar, Dilma defendeu a Petrobras e, sem citar nomes, disse que quem errou tem que pagar, mas que é preciso preservar a história do PT. "Se tiver erro, aqueles que erraram paguem por eles. Mas devemos preservar a história deste partido e dos nossos governos."

A presidente não fez menção ao tesoureiro do PT. Ele estava presente no evento.

A petista disse que o partido tem que ter orgulho e não pode aceitar que "alguns" coloquem a Petrobras como "vergonha". Afirmou ainda repudiar a "tentativa de golpe contra a manifesta vontade popular", em recado a quem prega que ela seja alvo de processo de impeachment.

Ela defendeu apuração das irregularidades: "É fundamental que não deixemos repetir nenhuma irregularidade dentro da Petrobras".

Para oposição, interferência do governo continuará

• Líderes ironizam e criticam escolha política feita por Dilma

Adriana Mendes, Cristiane Jungblute e Chico de Gois - O Globo

BRASÍLIA - Para líderes da oposição, o principal motivo que levou a presidente Dilma Rousseff a escolher Aldemir Bendine foi a dificuldade de achar um nome que aceitasse afastar o Planalto dos escândalos da Petrobras.

A proximidade do executivo com o grupo político de Dilma e do ex-presidente Lula, num momento em que a empresa enfrenta sua mais grave crise de credibilidade, causou surpresa aos parlamentares, que defenderam a adoção de um mecanismo que obrigue as indicações para o comando da estatal a passar pelo crivo do Legislativo. E todos oposicionistas lembraram ainda as denúncias que envolvem o ex-presidente do Banco do Brasil.

- Bendine é ligado ao mesmo governo que permitiu que uma quadrilha se instalasse na companhia e que faz o que pode para descredibilizar as investigações do esquema para, assim, blindar a presidente Dilma e Lula. A indicação dele sinaliza também que a interferência do governo na estatal irá continuar - criticou o presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG).

Assim como Aécio, o presidente nacional do DEM, senador José Agripino Maia (RN), também foi irônico:

- Para substituir a presidente da Petrobras, a exigência maior era escolher alguém da total confiança de Dilma. Ponto. A escolha foi feita.

Os líderes da oposição foram unânimes em criticar a decisão da indicação política, ao invés de um técnico do setor que pudesse recuperar a empresa com independência e credibilidade do mercado.

Ex-líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (SP) ironizou a opção presidencial, afirmando que o novo presidente da estatal "entende tanto de petróleo como a Palmirinha", referindo-se a apresentadora de um programa de TV sobre culinária.

O deputado Júlio Delgado (PSB-MG), por sua vez, defendeu que seja aprovado um mecanismo que obrigue essas indicações a passarem pelo crivo da sociedade, via Legislativo. Assim, seria evitada, por exemplo, a ingerência política em um cargo estratégico como a presidência da Petrobras.

- A presidente Dilma pensou: ou explode o Brasil ou explodimos nós. Preferível explodir o Brasil - disse Delgado.

Presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) disse aguardar os desdobramentos e não quis comentar a indicação:

- Prefiro não opinar.

Os partidos começaram ontem a apresentar os nomes que irão compor a CPI da Petrobras na Câmara. O início da CPI se dará após o Carnaval, mas a expectativa é que todos os membros sejam indicados ainda na próxima semana.

CPI: PT quer emplacar relator
O líder do PT, Sibá Machado (AC), disse que irá brigar para emplacar um petista como relator. O nome, no entanto, ainda será definido até segunda-feira. Ontem, o PSD indicou os deputados Paulo Magalhães (BA) e Silas Câmara (AM) como titulares da comissão; o Solidariedade escolheu Paulinho da Força (SP); o PSDB terá o estreante Bruno Covas (SP), além de Izalci (DF) e Otávio Leite (RJ); pelo PR, estarão João Carlos Bacelar (BA) e Altineu Côrtes (RJ), outro estreante na Câmara; e o líder do PROS, Domingos Neto (CE), ligado ao ministro da Educação, Cid Gomes, optou pelo próprio nome para integrar a CPI.

Comando da estatal racha e 3 ficam contra escolhido de Dilma

• Votos contrários vieram de 'independentes'; demais membros do conselho foram escolhidos pelo governo

• Minoritários foram surpreendidos com a escolha; currículos de novos diretores vieram incompletos

Raquel Landim, Samantha Lima - Folha de S. Paulo

SÃO PAULO, RIO - Três membros do Conselho de Administração da Petrobras votaram nesta sexta-feira (6) contra a escolha de Aldemir Bendine para presidir a empresa. Ele teve seis votos a seu favor.

O racha no alto comando da estatal se deu em meio a mais grave crise vivida pela estatal, envolvida em denúncias de corrupção investigadas pela Operação Lava Jato.

Os votos contrários a Bendine, que até esta sexta-feira presidia o Banco do Brasil, vieram de Mauro Cunha e José Guimarães Monforte, que representam os acionistas minoritários da estatal, além de Silvio Sinedino, eleito pelos trabalhadores.

Eles declararam sua insatisfação com o processo de troca de comando da estatal conduzido pela presidente Dilma Rousseff depois que Graça Foster e todos os diretores renunciaram.

"É um episódio de desrespeito ao conselho. A União mais uma vez impõe sua vontade sobre os interesses da Petrobras, ignorando os apelos de investidores de longo prazo", disse Cunha, em nota.

Apenas esses três conselheiros são considerados independentes pelo mercado. Os demais foram escolhidos, direta ou indiretamente, pelo governo federal, que é o acionista majoritário.

Currículo incompleto
Segundo a Folha apurou, os conselheiros foram surpreendidos com a notícia da escolha de Bendine, que vieram a saber pela imprensa. Só foram informados oficialmente da escolha do novo presidente no meio da reunião realizada nesta sexta.

Os conselheiros então solicitaram que fossem distribuídos currículos dos postulantes aos cargos de presidente e diretores da maior estatal do país. Mesmo assim, os dados chegaram incompletos, segundo a Folha apurou.

Na reunião, os representantes do governo argumentaram que era preciso eleger uma nova diretoria rapidamente para não deixar a empresa acéfala.

A Petrobras não tinha sequer uma lista de possíveis nomes, porque o comitê de remuneração e sucessão da estatal não havia preparado.

O representante dos empregados, Silvio Sinedino, sugeriu que a diretoria da Petrobras fosse escolhida pelo governo numa lista tríplice apresentada pelos trabalhadores. A proposta não prosperou.

Os conselheiros dissidentes também estão preocupados com a escolha de Bendine, que, segundo eles, não conhece o setor de petróleo.

"O conselho de administração tem 10 membros, mas nós só tínhamos uma pessoa especialista em petróleo, que era a Graça. Agora não temos ninguém", disse um conselheiro, que pediu anonimato.

Havia uma expectativa no mercado de troca do atual conselho, mas não há sinais de que isso vá ocorrer em breve. Os outros sete membros do colegiado são: Guido Mantega e Miriam Belchior (ex-ministros); Marcio Zimmermann (secretário de Minas e Energia); Luciano Coutinho (presidente do BNDES), Francisco Roberto de Albuquerque (general da reserva) e Sérgio Quintella (vice-presidente da FGV); além de Graça Foster, que cedeu a vaga a Bendine.

Propina na BR distribuidora variava entre 5% e 10%

• Segundo Moro, Mário Goes atuou no esquema até fim de 2014

Cleide Carvalho – O Globo

CURITIBA- A propina cobrada de fornecedores da BR Distribuidora variava entre 5% e 10% do valor dos contratos - que, segundo investigações da Operação Lava-Jato, eram superfaturados para garantir lucro maior às empresas e repasse de "comissões" a diretores da própria empresa e da Petrobras, e a agentes públicos. O modelo da corrupção era o mesmo adotado na matriz: os fornecedores faziam pagamentos a empresas de fachada, por meio de falsos contratos de prestação de serviços, e um operador fazia a distribuição entre os beneficiados. Segundo o juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, há provas de funcionamento do esquema na BR até o fim do ano passado.

O esquema na BR foi flagrado na 9ª etapa da Lava-Jato, batizada de My Way, em que 62 mandados de prisão e de busca e apreensão foram cumpridos pela PF, anteontem. Notas e contratos falsos, firmados com a empresa entre 2013 e 2014, mesmo depois de março, quando foi deflagrada a Lava-Jato, foram apreendidos na Arxo, fabricante de caminhões-tanque e tanques de armazenamento de combustíveis para aeroportos localizada no norte de Santa Catarina.

Entre as 26 empresas alvo de mandados de busca e apreensão quinta-feira, quatro eram ligadas ao operador Mário Goes, que teve prisão preventiva decretada pelo juiz Sérgio Moro. Eram usadas para emitir notas e fechar contratos sem prestar serviços. Goes não foi achado até ontem à noite e é considerado foragido. Segundo a PF, ele atuava na diretoria de Serviços da Petrobras - na distribuição de dinheiro para o ex-diretor Renato Duque e para João Vaccari, tesoureiro do PT -, e na BR Distribuidora. Em despacho, Moro se mostrou inconformado com a atuação de Goes:

"Perturba este juízo a existência de provas de que Mário Goes, na intermediação de propinas, teria atuado para Pedro Barusco e Renato Duque no passado e persistiria atuando (...) agora da Arxo até o final de 2014". A PF chegou a Goes unindo depoimentos de delações premiadas e dados passados voluntariamente por uma ex-funcionária da Arxo.

Em nota ontem à noite, a Petrobras Distribuidora afirmou que "está encaminhando aos responsáveis pelas investigações os documentos referentes à relação comercial com a Arxo Industrial do Brasil Ltda.".

Inflação atinge os básicos: alimentos, luz e transporte

• IPCA chega a 7,14% em 12 meses e a 1,24% só em janeiro, a maior taxa em 12 anos

Lucianne Carneiro - O Globo

A inflação este ano atinge gastos dos quais as famílias não podem fugir, principalmente as que têm renda menor: alimentos, transporte público e energia. Só esses três grupos de despesas foram responsáveis por dois terços da alta de 1,24% do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no mês passado, o dobro do peso dessas despesas no orçamento. A taxa de 1,24% de janeiro é a mais alta desde fevereiro de 2003, quando foi de 1,57%. Com o dado do mês passado, o resultado acumulado em 12 meses subiu para 7,14%, o maior desde setembro de 2011 (7,31%) e bem superior aos 6,41% de 2014.

A tarifa de energia elétrica subiu 8,27% e respondeu sozinha por 20% da inflação de 1,24%. E a alimentação continuou subindo com a seca e foi a maior influência entre os grupos de produtos, com alta de 1,48%. Já o transporte público subiu 5,07%. O destaque foi a alta de 8,02% do ônibus urbano, puxado pelo reajuste de tarifas em Rio e São Paulo.

- O mês de janeiro registrou aumentos significativos em três grupos muito importantes no orçamento das famílias, que são alimentos, habitação e transportes. São os gastos para comer, para morar e para se locomover - afirmou a coordenadora dos Índices de Preços do IBGE, Eulina Nunes.

Quando se considera o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) - que é a inflação para as famílias com renda entre um e cinco salários mínimos -, a alta dos preços foi ainda maior, de 1,48%, mais que o dobro da taxa de 0,62% de dezembro. No resultado acumulado em 12 meses, chega a 7,13%, bem acima dos 6,23% de 2014.

- Alimentos, energia e transportes são bens essenciais, não suprimíveis, o que acaba reduzindo o orçamento do consumidor. A tendência é que se reorganize as despesas, abrindo mão de outros itens não tão importantes - avalia a economista da Tendências Consultoria Adriana Molinari.

As donas de casa Bruna de Araújo e Tatiane Ribeiro se assustaram com as altas em carne, tomate, feijão e laticínios.

- Eu paguei R$ 20 em 1,5 quilo de acém. Levei um susto e estava na promoção. Nunca vi promoção assim - afirmou Tatiane.

Tatiane usa o vale-alimentação de R$150 do pai, que é motorista de ônibus, além do benefício do Bolsa Família. Já a estratégia de Bruna é aproveitar as promoções para lidar com a alta dos preços:

- Sempre acompanho os encartes.

Eletrodomésticos mais baratos
Parte desse ajuste no orçamento já está ocorrendo, segundo a técnica do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Maria Andréia Parente. Ela aponta a queda de preços dos eletrodomésticos, e em vestuário:

- Janeiro é época de promoções de vestuário, mas os descontos foram maiores. Aos poucos, as pessoas tendem a reduzir os supérfluos , como laticínios e biscoitos, e nos bens de consumo.

Analistas revisam projeções e já veem IPCA de até 8%

• Este ano, conta de luz pode subir 50%, estimam economistas. frete também vai pressionar

- O Globo

A expectativa de um impacto maior do preço de energia e também um dólar mais alto motivaram revisões nas estimativas para a inflação em 2015. Há previsões de até 8% este ano, contra uma meta que admite no máximo que a inflação chegue a 6,5%.

O BNP Paribas divulgou ontem relatório revisando sua projeção de 7% para 8% em 2015. A Tendências também está revisando sua expectativa dos atuais 6,8% para algo entre 7,3% e 7,4%. Em fevereiro, a taxa deve ficar em 1,11%. O último Boletim Focus do Banco Central com projeções do mercado do início da semana indica que o IPCA deste ano deve ficar em 7,01%, antes mesmo da divulgação da inflação de janeiro.

- Considerando os fatores já previstos para o ano, com energia pressionando, mesmo sem contar possíveis reajustes extraordinários, e o impacto da volta da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) nos combustíveis e no frete em geral, a inflação deve ficar em 7%. É um ano de ajuste, mas espera-se que se possa arrumar a casa e começar 2016 com uma inflação mais limpa, sem aumentos represados - afirma a economista Maria Andréia Parente, do Ipea.

"O consumidor vai ter que se adaptar"
Nos cálculos da Tendências está embutida expectativa de alta maior de energia. A estimativa inicial era de que esse preço subisse 27% em 2015, mas agora se espera reajustes entre 40% e 50%. O BNP Paribas também trabalha com avanço de 40% na energia este ano. Para o economista-chefe do banco ABC Brasil, Luis Otavio de Souza Leal, a tendência é de preços em ascensão e números altos no IPCA:

- Os aumentos na energia vão continuar. A questão hídrica bate fortemente nos preços dos produtos In natura E é provável que os alimentos continuem pressionados ao longo do ano. O consumidor vai ter que se adaptar. (L.C.)

No Rio, preços quase 9% mais altos

Lucianne Carneiro - O Globo

Os cariocas já desconfiavam. E os números reforçaram todas as suspeitas. A inflação na Região Metropolitana do Rio de Janeiro subiu 1,71% em janeiro, após uma alta de 1,39% em dezembro - num resultado que faz da alta dos preços a maior entre as 13 regiões pesquisadas pelo IBGE. Em 12 meses, a inflação acumulada no Rio é de 8,90%, também a mais alta do país.

O transporte pesou especialmente no bolso dos cariocas. A pressão maior da inflação no Rio veio do aumento da tarifa dos ônibus urbanos, que subiram 11,67% e respondeu sozinho por quase um terço da inflação de janeiro. Em 3 de janeiro, a tarifa subiu de R$ 3 para R$ 3,40 - uma alta de 13,3%. E a segunda maior influência veio de energia elétrica, que subiu 5,98%, que foi responsável por 12% da taxa.

- A inflação para quem mora no Rio de Janeiro já chega a quase 9%. Sistematicamente, o Rio tem mostrado variações mais altas, a pressão de custo tem sido mais forte. Passamos um ano de Copa do Mundo, estão chegando as Olimpíadas, há a demanda dos turistas. São fatores que estão pressionando os preços na cidade - afirma a coordenadora dos Índices de Preços do IBGE, Eulina Nunes. 

Lava-Jato não intimidou esquema de propinas na Petrobras, diz juiz

- Agência Estado

O esquema de intermediação de propinas a agentes da Petrobras ou de suas subsidiárias ainda persiste, avalia a Justiça. Ao decretar a prisão do lobista Mário Frederico Mendonça Goes, apontado como operador do ex-diretor de Serviços da estatal Renato Duque, o juiz federal Sérgio Fernando Moro advertiu que nem mesmo a deflagração da Operação Lava-Jato "dissuadiu" a corrupção na petrolífera.

"Em especial, perturba este Juízo a existência de provas de que Mario Goes, na intermediação de propinas, teria atuado para Pedro Barusco (delator da Lava-Jato) e Renato Duque no passado e persistiria atuando, na intermediação de propinas periódicas, agora da Arxo para a Petrobrás Distribuidora, de 2012 até pelo menos o final de 2014?", destaca o magistrado.

A BR Distribuidora é uma subsidiária da Petrobras.

Mário Goes é procurado pela Polícia Federal, que lhe atribui papel central na Operação My Way. Deflagrada nesta quinta-feira (5) a My Way é mais um passo da Lava-Jato e mira, agora, negócios e pagamentos suspeitos de empresas com relações na BR Distribuidora.

Sérgio Fernando Moro é o juiz que conduz todas as ações penais da Lava-Jato sobre fraudes em licitações, cartelização das maiores empreiteiras do País e corrupção na Petrobrás.

Em seu despacho, o juiz anota que restou "constatado que persiste, em novos esquemas, a intermediação de propinas a agentes da estatal ou de suas subsidiárias".

Mario Goes, segundo o Ministério Público Federal, teria o mesmo papel do doleiro Alberto Youssef e do lobista Fernando Soares, o Fernando Baiano, operador do PMDB na Petrobras - Youssef e Baiano estão presos.

"Um intermediador profissional do pagamento de propinas por empresas privadas a dirigentes ou empregados da Petrobras", assim é rotulado Mario Goes pela força tarefa da Lava-Jato.

Goes teria atuado para Renato Duque e também para Pedro Barusco, ex-gerente executivo da Diretoria de Serviços, que fez delação premiada e apontou o universo de desvios na companhia.

"Também perturbadora a informação da negociação recente de pagamento de propina em contrato da Petrobras Aviation com a Arxo, aparentemente ainda em curso de pagamento", assinala o juiz federal.

Pedro Barusco, o delator, afirmou que parte da propina no âmbito da Diretoria de Serviços da Petrobras teria sido paga através de contas secretas controladas por Mario Goes no exterior.

Para o juiz Moro, "os fatos revelam não só a antiguidade, mas também a duração prolongada e a atualidade do esquema criminoso, ainda que agora em subsidiárias da Petrobrás (Petrobrás Distribuidora e Petrobrás Aviation), e autorizam a prisão cautelar (de Mario Goes) para prevenir crimes em andamento, além de reiteração delitiva."

No despacho em que mandou prender Mario Goes, o magistrado argumenta, ainda. "Se tudo o que foi feito até o momento na Operação Lava Jato, com a notoriedade que a investigação e a persecução alcançaram, ainda não foi suficiente como elemento dissuassório da prática de novos crimes contra a Petrobras, sendo ao contrário constatado que persiste, em novos esquemas, a intermediação de propinas a agentes da estatal ou de suas subsidiárias, então é forçoso reconhecer pela necessidade do remédio amargo da prisão preventiva."

Para Sérgio Moro, o País experimenta "uma cultura da corrupção que reclama reação imediata". O juiz considera que "a persistência de crimes da espécie até a atualidade representam, no contexto, uma afronta ao Judiciário e à lei".

"Não é possível ainda olvidar a elevada gravidade em concreto dos fatos que constituem objeto da Operação Lava-Jato", alerta Moro. "Nas ações penais já propostas, há a descrição de esquema criminoso que teria perdurado por anos e lesado a Petrobrás, só com pagamento de propinas, em valores da ordem dos bilhões de dólares. A dimensão em concreta dos fatos delitivos, jamais a gravidade em abstrato, também pode ser invocada como fundamento para a decretação da prisão preventiva."

O juiz federal assinala que "a credibilidade das instituições públicas e a confiança da sociedade na regular aplicação da lei e igualmente no Estado de Direito restam abaladas quando graves violações da lei penal não recebem uma resposta do sistema de Justiça criminal".

Ele pondera que "não se trata de antecipação de pena, nem medida da espécie é incompatível com um processo penal orientado pela presunção de inocência".

O juiz reputa "presentes riscos à ordem pública, não só diante da necessidade de prevenir novas práticas delitivas e até mesmo crime em andamento por parte da Mario Goes, mas também diante da própria dimensão em concreto dos crimes que constituem objeto de imputação e de investigação e do consequente abalo à ordem pública".

Sérgio Moro concluiu. "Havendo indícios de que o investigado mantém valores vultosos não declarados no exterior, especialmente contas secretas no exterior, há indicativo concreto de que não se pretende curvar-se à lei, havendo risco à aplicação da lei penal, podendo o investigado deixar o país e ainda fruir do produto de sua atividade delitiva, mantida a salvo das autoridades brasileiras em outros países."

Merval Pereira - Já vimos esse filme

- O Globo

Quando a nomeação de um Aldemir Bendine para presidir a Petrobras é considerada uma ação de resistência esquerdista da presidente Dilma, e aplaudida como tal pela militância partidária; quando o tesoureiro João Vaccari Neto, acusado de desviar até U$ 200 milhões para o partido e levado coercitivamente a depor na Polícia Federal, é aplaudido pelos militantes, aí vemos que o caminho do PT está definitivamente obstruído pelos interesses internos, e ele não tem qualquer capacidade (ou vontade) de se reinventar.

Revendo um velho preceito jurídico que manda "na dúvida, a favor do réu", Lula disse: "Na dúvida, fique com o companheiro", já colocando indiretamente Vaccari como réu nesse processo. Mais um tesoureiro do PT encalacrado com métodos nada ortodoxos de recolher doações políticas.

Delúbio Soares, de triste memória, achava que tudo terminaria em piada, e ele terminou na cadeia. Mas não abriu o bico, o que parece ser condição sine qua non para assumir essa tarefa partidária.

Não há mais volta nesse pântano em que o PT se encalacrou, e o que vier daí será apenas para aumentar o ridículo da situação, dar o tom escandaloso dessa tragicomédia em que nos meteram.

Quando a presidente Dilma Rousseff, a grande muda nesses dias de crises, sai de seus cuidados para dar posse na Secretaria de Ações Estratégicas a Mangabeira Unger, e fala da importância do pré-sal para nossa Educação, aí vemos que ela está fora de órbita.

Fala de uma situação que já está superada pela conjuntura internacional, assim como, por exemplo, os sonhos megalômanos de Mangabeira Unger para os Brics, ou o aqueduto para levar água do Amazonas para o Nordeste.

Quando o ex-presidente Lula, como um Jim Jones aloprado, leva ao suicídio político seus seguidores repetindo na festa dos 35 anos do PT o mesmo discurso da festa dos 25 anos, em que o mensalão estava em evidência, vemos que o partido não saiu do lugar onde sempre esteve. Dez anos depois, o petrolão rebobina o filme para contar novamente a mesma história.

O PT manteve os mesmos instrumentos de fazer política que sempre usou, transformando o cenário brasileiro em uma baixa disputa sindicalista, em que valem todos os métodos para vencer, e em que o adversário torna-se inimigo e precisa ser destruído, não apenas derrotado.

Quando um executivo petista como Aldemir Bendini é visto como um adepto de políticas progressistas, e o que de mais progressista que se vê em sua biografia foi afrontar as normas internas do Banco do Brasil para conceder um empréstimo milionário para uma socialite deslumbrada, vemos que não há mais saída para esses que militam por uma causa que é apenas uma frase no programa partidário vazio.

Val Marchiori é a versão real de Dorinha, a socialite socialista de Luis Fernando Veríssimo. O progressismo representado pela nomeação de um Aldemir Bendini para presidir a Petrobras é uma tragédia tornada farsa pela repetição de um truque malfeito.

Ainda mais quando se constata que mesmo no atual Conselho de Administração houve votos contrários à sua nomeação, assim como os novos diretores receberam o veto de conselheiros. Os representantes dos minoritários foram atropelados pela maioria governista, que manteve sob controle a gestão da Petrobras, não para defendê-la do ataque dos privatistas, essa bobagem de militantes fora do eixo ou de má-fé, mas para blindar o Palácio do Planalto, repentinamente desguarnecido com a demissão antecipada de Graça Foster e parte de sua diretoria.

Bendine é o primeiro presidente da Petrobras desde que o PT chegou ao poder que não é filiado ao partido, mas tornou-se petista "de coração". Primeiro José Eduardo Dutra, depois José Sergio Gabrielli, dois sindicalistas da área, e em seguida Graça Foster; o PT perdeu a condição política de indicar o substituto, e se preparava para abrir mão do controle da estatal para um executivo do mercado. Não foi por falta de convite, mas não apareceu ninguém interessado nesse emprego, com os problemas colaterais que ele traz consigo. 

Paradoxalmente, a recusa ajudou Dilma a buscar no seu entorno o substituto, dando uma saída política para a crise que se no momento interessa ao Palácio do Planalto, a médio prazo deve lhe trazer mais dores de cabeça.

Igor Gielow - A solução petista

- Folha de S. Paulo

Como seria previsível, o PT na sua festa de 35 anos ofertou ao governo Dilma a saída da radicalização para enfrentar a crise existencial que se abate sobre o partido e sua gestão na esfera federal.

Seus caciques defenderam João Vaccari Neto, o tesoureiro mais do que suspeito segundo a Polícia Federal apura, e o próprio acusou o famoso golpe das elites contra o probo governo dos trabalhadores ao ser apontado como parte da gatunagem que assola a Petrobras.

É uma furada. Um filme velho que remonta a 2004, quando na comemoração dos 24 anos do petismo foi feita a defesa de José Dirceu, acertado pelo petardo Waldomiro Diniz (o seu faz-tudo no Congresso, pego cobrando propinas, sempre elas).

A narrativa ganhou corpo em 2005, com a reação à revelação do mensalão. "Todo mundo faz caixa 2", disseram Lula e o PT. O STF não comprou a balela e a cúpula do partido, Dirceu à frente, foi parar na cadeia.

O que ouvimos de Lula e companhia agora? Que o financiamento de campanhas pelas empreiteiras investigadas no escândalo da Petrobras era legal e para todos os partidos, como se o PT e aliados fossem virgens a passear em um prostíbulo.

Há duas mistificações aqui. Empreiteiras doam para todo mundo, só que dão mais para quem está no poder e pode usar de esquemas de favorecimento. A graça da história é que a Lava Jato descobriu que propinas foram dadas dentro da lei.

A segunda observação peca pela obviedade. Ainda que grana suja tenha abastecido aqui e ali partidos de oposição, o grosso absoluto do apurado aponta para o PT e os seus. A oposição não indicava diretores corruptos na Petrobras.

Ao indicar Aldemir Bendine para descascar o abacaxi gigante da Petrobras, Dilma mostrou-se sozinha em suas opções. Resta saber se daqui para a frente ela irá seguir o receituário petista do negativismo e correr o risco de isolar-se ainda mais.

Cristovam Buarque - Novos direitos

• De tanto repetirem a própria publicidade, as lideranças fizeram o povo acreditar nas ilusões

- O Globo

O problema do ajuste fiscal está na falta de ajustes sociais, que substituam direitos velhos por novos direitos estruturais, assegurando bem-estar social permanente aos cidadãos. Ao longo dos últimos anos, o Brasil optou por uma verdadeira folia de gastos públicos, consumismo exacerbado, baixo nível de poupança e investimento, irresponsabilidade fiscal, preços administrados, contabilidade criativa escondendo a realidade, desonerações fiscais em dimensões escandalosas. Ignorando os alertas, os partidos no governo comemoravam euforicamente os benefícios do curto prazo. De tanto repetirem a própria publicidade, as lideranças fizeram o povo acreditar nas ilusões: o pré-sal resolveria tudo, empresas como o grupo X colocariam o país no cenário mundial, o BNDES construiria a nação emergente mais dinâmica do século 21.

A realidade desfez as ilusões, os alertas se mostraram proféticos, mas a eleição não permitia que se admitisse a crise. A folia econômica que se esgotava chegou à política e as ilusões foram ampliadas pelo marketing. Os eleitores passaram a acreditar que nunca o Brasil fora tão rico, dinâmico e sem pobreza, e que o país daria passos para trás se não reelegesse o grupo no poder.

O resultado é que a economia brasileira chegou a 2014 em uma situação de crise de proporções catastróficas: déficit em transações correntes de 4,2%, déficit nominal de 6,7% e dívida pública bruta de 6,3% (em relação ao PIB); além de inflação persistente acima da meta.

Agora, passadas as eleições, o governo faz tudo o que acusava seus opositores de pretenderem fazer contra o povo e o país: elevação da taxa de juros, controle de gastos, redução de direitos e realismo nos preços passaram a ser defendidos como ajustes necessários. A fala do novo ministro da Fazenda, carregada de medidas antifolia, passou a ser aceita pelos que as criticavam, enquanto outros que antes se beneficiavam da folia começam a criticar os ajustes.

O problema das últimas medidas não está na fala do ministro Levy controlando ou eliminando direitos trabalhistas, mas na falta de falas ousadas dos demais ministros, como do Trabalho, da Educação e da Saúde, oferecendo novos direitos. Alguns ajustes nos chamados benefícios sociais são necessários para corrigir os desastres criados pela folia fiscal, mas, em vez de repudiá-los ou de se conformar a eles, é preciso atualizá-los e fazê-los avançar. Alguns dos antigos direitos trabalhistas não têm como ser mantidos, mas novos direitos devem ser implementados.

Alguns dos atuais direitos precisarão ser moralizados, modificados e substituídos por direitos contemporâneos, como: direito do filho do trabalhador à mesma escola de qualidade do filho do patrão; licenças periódicas para efetiva capacitação; direito do trabalhador à licença para ir à escola do filho e para cuidar preventivamente de sua saúde.
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Cristovam Buarque é senador (PDT-DF)

Hélio Schwartsman - Ainda o impeachment

- Folha de S. Paulo

Como o espaço desta coluna é meio apertadinho, não deu para desenvolver no texto de ontem as razões pelas quais não acredito muito que a presidente Dilma Rousseff venha a sofrer impeachment e nem os motivos pelos quais não desejo que isso ocorra. Como alguns leitores escreveram me indagando sobre esses pontos, volto ao tema.

Hoje, a cada desdobramento da Operação Lava Jato, a situação parece ficar pior para o governo do PT e para Dilma. É preciso considerar, porém, que nossa amostra é, por assim dizer, viciada. Por enquanto, estão sendo divulgadas só acusações referentes a indivíduos que não têm foro privilegiado. Dentro de algumas semanas, quando vier à luz a parte atinente a políticos, que tramita no STF, a distribuição das suspeitas deve ficar um pouco mais democrática.

Se as informações de bastidores publicadas na imprensa são corretas, gente importante de outros partidos também vai ganhar espaço no noticiário. Especula-se até que os nomes dos presidentes da Câmara e do Senado poderão aparecer. Não é impossível que o Legislativo saia tão ou mais fragilizado quanto o Executivo.

E esse é o tipo de situação que gera pizza. Sem um fato novo que ligue diretamente Dilma a um malfeito, o mais provável é que parlamentares façam algum teatro, mas, no fundo, trabalhem para que o "status quo", do qual são beneficiários, seja mantido.

E por que o impeachment é indesejável? Destituir a presidente não seria o melhor meio de "cortar o mal pela raiz", como escreveram alguns leitores? Não gosto da ideia de reduzir o problema da corrupção ao nome de Dilma. Nada indica que ela seja a mentora nem a maior favorecida pelo esquema. Creio que faz mais sentido que as pessoas possam ver o resultado das políticas que ela adotou e tenham a chance de rejeitá-las. Esse processo de exclusão de más ideias, que é a base do avanço institucional, fica mais transparente quando os governantes concluem seus mandatos.

André Lara Resende - O choque da realidade

- O Estado de S. Paulo

O quadro político e econômico agrava-se desde o fim do primeiro mandato de Lula. A revelação da sistemática compra de apoio ao governo por meio de um esquema de desvio de recursos públicos - o "mensalão" - foi um marco divisor. Ainda não estava claro o grau do estrago que a ocupação do Estado por militantes e simpatizantes viria a fazer, mas estava quebrado o encanto.

A condução da política macroeconômica sofreu uma inflexão a partir de 2008. Sob pretexto de praticar uma política anticíclica keynesiana - que a grande crise financeira justificava nos países centrais, mas não nos países periféricos -, acelerou-se o processo de expansão dos gastos diretos e indiretos, explícitos e implícitos, do setor público. A política macroeconômica perdeu toda a racionalidade e tornou-se manifestamente voluntarista.

O desajuste fiscal e os desmandos administrativos, associados à distribuição de benefícios demagógicos, de vantagens e subsídios, ficaram mascarados pelo ciclo de alta das commodities, pelo o ganho nos termos de troca com o exterior. O País cresceu relativamente pouco, mas enriqueceu muito. A riqueza não depende só do crescimento, mas também das expectativas. O valor dos ativos, das empresas e dos imóveis, depende das expectativas. Com as expectativas favoráveis, o aumento da riqueza foi muito superior ao crescimento da renda. A reversão levará a uma correspondente queda da riqueza.

No ano passado, a aceleração da piora nas condições tanto econômicas como políticas não deu tempo para que as percepções pudessem acompanhar o agravamento da realidade. As eleições contribuíram para atrasar a convergência das expectativas. O clima de campanha eleitoral tornou difícil separar os fatos da propaganda. O País saiu das eleições dividido e com um fosso entre as condições objetivas e a percepção da realidade. O choque da realidade está agora em curso.

No ano passado, a economia não cresceu, o superávit fiscal primário desapareceu e o déficit externo passou de 4% do produto interno bruto (PIB). Apesar dos preços administrados defasados e dos juros em alta, a inflação vai superar o teto da meta. A infraestrutura está obsoleta e o racionamento de água e energia elétrica será inevitável. A Petrobrás está paralisada, incapaz de acessar os mercados de capitais. Sua viabilidade está ameaçada. Os investimentos privados devem colapsar.

A surpreendente nomeação de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda impediu que o ajuste das expectativas levasse a uma crise cambial e financeira. Sua presença foi crucial para que a crise não explodisse com toda a sua força logo nos primeiros dias do segundo mandato de Dilma Rousseff. O PT poderia então explorar mais facilmente a tese da sabotagem dos "mercados" a um governo que acabara de ser democraticamente eleito. Isolado num Ministério de inédita incompetência, Levy corre o risco em alguns meses se defrontar com apenas duas alternativas: a demissão, diante da inviabilidade política do ajuste necessário, ou a desmoralização.

Some-se às dificuldades macroeconômicas o racionamento de água e energia para que as perspectivas se configurem dramáticas. O racionamento racional deveria considerar as repercussões do corte para os diferentes setores. Para minimizar o impacto sobre o PIB os cortes deveriam ser definidos a partir da matriz de insumos-produtos. Numa economia de guerra, que exija o racionamento de bens essenciais, não é possível utilizar apenas o sistema de preços para alocar recursos. O racionamento planejado exige, pois, planejamento e execução centralizada, o que não pode prescindir de autoridade e comando.

O País está acéfalo. O Executivo, atordoado e acuado, está aparentemente preocupado exclusivamente em minimizar as possibilidades de impeachment. Os quadros do serviço público estão desmoralizados e desmotivados. A percepção popular do Congresso Nacional, envolvido no esquema da corrupção sistematizada pelo governo na Petrobrás, nunca foi tão negativa. Desmoralizado com a população, o Legislativo corre ainda o risco de colisão com o Judiciário. Não há novas lideranças nem sinais de que possam surgir da política partidária, cujos canais estão entupidos. Dada a desmoralização da política, abre-se a possibilidade de lideranças externas a ela, populistas e inimigas das instituições.

A combinação da economia submetida a um racionamento drástico com a falta de autoridade institucional é o caminho para se chegar aos chamados "Failed States". Caminho que a Venezuela parece ter começado a trilhar e no qual países como a Síria, o Iraque e o Afeganistão, entre outros, estão avançados. Sem autoridade institucional constituída e reconhecida, forças paralelas passam a controlar o racionamento e os mercados negros. Numa fase aguda, diante da revolta popular e da generalização dos saques, surgem milícias armadas, inicialmente para vender segurança, mas que se transformam em poderes paralelos.

Entre os "Failed States" e a situação brasileira ainda há uma grande distância, mas mesmo que não sejamos pessimistas o horizonte não é promissor. Na melhor das hipóteses, teremos quatro anos de um governo acuado e paralisado, diante da pior crise política e econômica em décadas. A possibilidade de um tumultuado impeachment da presidente não pode ser descartada. Em tese, basta o fundamento jurídico para o impeachment, mas na prática é preciso o apoio político "das ruas".

Diante da gravidade do quadro, não é hora de dividir, mas de reconciliar o País em torno de uma coalizão suprapartidária, com apoio de todos os segmentos da sociedade. É preciso reconstruir o Estado, resgatar a capacidade de formular e implementar políticas para enfrentar a crise. Infelizmente, parecemos caminhar no sentido oposto, o da radicalização da divisão do País.
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Economista

Miriam Leitão - Lição do avesso

- O Globo

É um caso para estudo em escolas de administração. Pelo avesso. Ensina tudo sobre o que não se deve fazer. Este é o resumo desta desastrada intervenção da Presidente Dilma na Petrobras. Mas uma coisa se diga: foi coerente. Improvisada e insensata do começo ao fim. Há três meses, o então ministro da Fazenda Guido Mantega desmentia que Aldemir Bendine estivesse demissionário do Banco do Brasil.

Bendine tentava, no dia 7 de novembro, explicar o inexplicável caso do empréstimo de R$ 2,7 milhões concedido com juros camaradas a uma amiga que deu como garantia a pensão alimentícia dos filhos menores. No dia 6 de fevereiro, está ele alçado pela presidente Dilma ao posto de presidente da Petrobras. Na presidência do conselho de administração, confirmando indicação, o mesmo Guido Mantega.

Imaginemos, para alimentar algum otimismo, que reste provado que Bendine nem sabia do tal empréstimo à amiga. Ele precisará ficar se explicando deste e de outros casos. E se existe uma coisa que a Petrobras não precisa neste momento é de um presidente que tenha que ficar se defendendo. Todos os esforços devem ser para defender a Petrobras.

O perfil ideal para o cargo é ser uma pessoa que simbolize independência. O que a estatal precisa é de um executivo com autonomia. O problema da Petrobras não será resolvido por um presidente que aceite pressões políticas e cumpra ordens que contrariem os interesses da empresa. O melhor seria evitar pessoas do grupo dos amigos do governo.

O que espanta neste caso é como nenhuma solução foi pensada com antecedência. Tão longa crise e não foi tempo suficiente para o governo ter uma saída estratégica. A presidente convocou a ex-presidente Graça Foster para demiti-la e, ao mesmo tempo, pedir que ela permanecesse no cargo até a publicação do balanço. Pelo andar dos trabalhos com a PricewaterhouseCoopers (PwC), se a diretoria permanecesse, seria possível ter o resultado financeiro auditado em maio. Ou seja, Dilma estava pedindo à Graça que ficasse dependurada por mais quatro meses no cargo do qual fora demitida. Em seguida, o governo confirmou a informação de que Graça sairia, a diretoria se rebelou e pediu demissão coletiva naquela mesma noite de segunda-feira.

Contudo, na manhã da terça, o ministro da Energia, Eduardo Braga, disse que a diretoria ficaria até março. Ainda que eles aceitassem permanecer, quem, com o mínimo de bom senso, imaginaria que uma empresa em crise poderia ser comandada por uma equipe enfraquecida pela demissão anunciada?

Hoje a Petrobras é uma empresa que não sabe o valor do seu patrimônio, está no meio da mais profunda e extensa investigação policial por corrupção. A companhia tem que administrar a crise e ao mesmo tempo fazer uma gestão de dano. A imagem da empresa sofreu sério estrago junto aos seus credores, auditores, investidores, acionistas e precisa reduzir esses danos. Ao mesmo tempo, precisa se proteger contra os riscos futuros de novos rebaixamentos ou cobrança antecipada de dívida.

A demissão que causou tanto reboliço esta semana não foi causada pelo escândalo. Mas sim pela divulgação do número de R$ 88,6 bilhões de diferença entre o valor real e o valor contábil de alguns dos ativos da Petrobras. A diretoria poderia ter sido trocada por outros motivos, mas, ao ser trocada por esse, a mensagem que a presidente da República passou é de que continuará interferindo nos rumos da empresa. O risco Dilma permanece.

O governo nem fez esforço para cumprir a legislação do mercado de capitais. Deixou vazar o nome de Aldemir Bendine bem antes que ele fosse anunciado como o escolhido do controlador. Mas essa foi apenas mais uma trapalhada. Coerente até o fim.

Demétrio Magnoli - Corpo de delito

• Dilma desperdiçou a chance de queimar sua bandeira mais querida, apontando um homem de preto para resgatar a Petrobras

- Folha de S. Paulo

Joaquim Levy é um homem de preto; Aldemir Bendine, não. Ao nomear Levy, Dilma Rousseff abdicou do comando da política econômica. A escolha de Bendine, pelo contrário, indica que Dilma não queimou todas as bandeiras. O executivo subserviente ao Planalto, alçado à presidência do BB por Lula, não equivale a Sergio Gabrielli, mas é algo como uma Graça Foster sem a experiência no setor petrolífero. A presidente almeja conservar o controle direto sobre a Petrobras. Ela não compreende a raiz da crise --e ainda imagina que pode ter um almoço grátis.

Gabrielli, o anjo que presidiu a Petrobras entre 2005 e 2012, desfiou a versão lulopetista sobre a crise. Ao jornal "Valor", o "amigo do povo" disse que a oposição inflaciona episódios periféricos de corrupção com as finalidades destruir a estatal e abrir o pré-sal à exploração gananciosa das empresas petrolíferas internacionais. O jornalismo oficialista reproduz a essência do diagnóstico fantasioso, com a prudente ressalva ocasional de que, talvez, a corrupção seja mais que insignificante. A opção por Bendine evidencia a adesão de Dilma a esse conto de fadas.

Na entrevista de Gabrielli, existe uma noz de verdade: por maiores que sejam, os números do "petrolão" empalidecem sobre o pano de fundo da movimentação financeira da Petrobras. Os desvios de bilhões de dólares em contratos superfaturados, abastecimento de partidos e formação de patrimônios privados catalizaram o desenlace, mas o colapso financeiro da estatal estava escrito nas estrelas. A sua raiz encontra-se na diretriz política definida pelos "amigos do povo" desde, pelo menos, a descoberta das jazidas do pré-sal. A Petrobras ingressou em espiral falimentar porque metamorfoseou-se de empresa pública em ferramenta do neonacionalismo reacionário.

O crime, premeditado, foi cometido em meio aos acordes do verde-amarelismo balofo e entre imagens de Lula e Dilma com macacões laranja e as mãos sujas de petróleo. No corpo de delito, destacam-se os superinvestimentos no pré-sal, a sangria de capital provocada pela política de conteúdo nacional, a diversificação improdutiva e, por fim, os subsídios embutidos nos preços de combustíveis. A corrupção aparece na cena do crime, mas apenas como um detalhe significativo: a chave de decifração das alianças de negócios entre o lulopetismo e as grandes empreiteiras.

A Petrobras dos "amigos do povo" deveria monopolizar os campos do pré-sal, estender as operações de baixo retorno em refino, transporte e petroquímica, estimular a produção interna de plataformas e equipamentos, além de corrigir os desequilíbrios inflacionários da "nova matriz econômica". O delírio ufanista, sustentado por preços do barril superiores a US$ 100, desmanchou-se no compasso da reversão do ciclo do mercado petrolífero. Enquanto assenta-se a poeira de uma mentira persistente, despontam os esqueletos brancos de uma dívida monumental, de refinarias perdulárias, do casco destroçado da Sete Brasil e de um balanço sem assinatura.

Dilma teve meses para refletir sobre o fracasso, mas preferiu o caminho da negação. Na hora decisiva, desperdiçou uma última oportunidade de queimar a sua bandeira mais querida, apontando um homem de preto para resgatar a estatal, que continua a possuir excepcionais competências na prospecção e extração de petróleo em águas profundas. A seleção de Bendine atesta o poder encantatório da ideologia. Tanto quanto sua amiga Graça Foster, Dilma acredita no oportuno conto de Gabrielli --e ilude-se imaginando que o cortejo macabro dos Costas, Duques e Baruscos não passa de um infortúnio casual.

Na esfera do Direito, discute-se se o impeachment requer dolo ou apenas culpa. Na arte da política, sabe-se que uma condição necessária é a perda da legitimidade para governar. Deve ser por isso que Eduardo Cunha anda todo pimpão.