- O Estado de S.Paulo
A visível hostilidade com que Lewandowski e companhia trataram Fachin mostra que a trinca da Segundona estava disposta a estender o puxadinho para Dirceu ao ex-presidente Lula
No dia 28 de agosto de 2007, flagrei um desabafo telefônico do ministro Ricardo Lewandowski, do STF, com seu irmão, Marcelo. Jantando num restaurante em Brasília, ele dizia ao interlocutor, pelo celular, que o Supremo havia recebido a denúncia do mensalão, naquele dia, porque votara “com a faca no pescoço” graças à pressão da imprensa. Antes de jornais revelarem o teor de conversas dos ministros combinando votos pelo sistema interno de mensagens da corte, a tendência, dizia Lewandowski, era “amaciar para o Dirceu”. Ele mesmo, disse ao irmão, estava “tinindo nos cascos” para não abrir a ação penal contra o ex-ministro petista.
Passados 11 anos, e duas condenações de Dirceu depois, o que se viu foi um Lewandowski de novo “tinindo nos cascos” na Segunda Turma da Corte, acompanhado de Dias Toffoli e de Gilmar Mendes – que, à época do mensalão, não formava com a dupla na maioria dos votos.
O que o trio fez não tem nada a ver com garantismo constitucional. Foi uma baciada de puxadinhos do qual o exótico habeas corpus de ofício – ou seja, sem pedido da defesa – para Dirceu à revelia de um pedido de vista foi a cereja do bolo.
A visível hostilidade com que Lewandowski e companhia trataram Fachin, que na véspera remetera para apreciação do Ministério Público Federal, e de lá ao plenário, recurso de Lula, mostra que a trinca da Segundona estava disposta a estender o puxadinho ao ex-presidente. Isso a despeito da fragilidade jurídica de pedir a soltura do petista depois de o provimento do recurso extraordinário ter sido negado pelo TRF-4.
De que garantismo se pode falar diante de uma clara tentativa de driblar a vontade do plenário, manifestada por 6 a 5 quando da análise do HC de Lula em abril, e a jurisprudência da Corte a favor da execução provisória da pena a partir da condenação em segunda instância, fixada desde 2016 e reiterada sucessivas vezes?
Também se trata de manobra a decisão de Fachin, isolado na Turma, mandar ao plenário o caso de Lula – o que Lewandowski chamou de “usurpação de poderes” do colegiado.
O que o Supremo tem de fazer urgentemente, sob pena de continuar a encenar esse espetáculo triste de desmoralização diária, é unificar os entendimentos e os procedimentos. O saldão de recesso da Segundona mostra que é urgente que os ministros deem um passo atrás no ativismo, de todos os lados.