quinta-feira, 29 de fevereiro de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Renegociação de leniências não é revisionismo

O Globo

Prazo de 60 dias concedido no STF se destina a rever valor das multas, não a anular provas de corrupção

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) adiou a análise de decisão do ministro Dias Toffoli que anulou as provas obtidas no acordo de leniência da Odebrecht (rebatizada de Novonor) no âmbito da Operação Lava-Jato. O colegiado decidiu por unanimidade esperar a tentativa de conciliação, promovida noutro processo, envolvendo 11 empresas que assinaram acordos de leniência num valor estimado em R$ 17 bilhões — Odebrecht inclusive.

Os partidos PSOL, PCdoB e Solidariedade alegaram ilegalidades nesses acordos de leniência e pediram a suspensão das multas das companhias que confessaram envolvimento em corrupção. Argumentam que eles foram fechados em momento marcado por “reprovável punitivismo”. Afirmam que houve “coação” e falam em “Estado de Coisas Inconstitucional”. Sustentam, por fim, que o Acordo de Cooperação Técnica (ACT), com regras sobre os procedimentos em leniências, foi posterior à Lava-Jato e pedem a revisão do que foi fechado antes.

Merval Pereira - Massa aspiracional

O Globo

Lula tenta se aproximar dos evangélicos abrindo as burras do governo com isenções até para compra de carros para as cúpulas

Quanta diferença do Lula que, em recente entrevista, declarou querer fazer “um governo para a classe média” para o dia em que a filósofa Marilena Chaui gritou que detestava “a classe média”, provocando risos do próprio Lula. Já se passaram muitos anos, e a ficha caiu, pelo menos para o presidente. Às voltas com o aftershock da manifestação bolsonarista na Paulista, ele tenta se aproximar dos evangélicos abrindo as burras do governo com isenções tributárias até para compra de carros para as cúpulas religiosas, num Estado supostamente laico.

Melhor faria se olhasse para dentro das comunidades evangélicas e demais segmentos comunitários das periferias para entender seus sentimentos, detectados logo após a eleição municipal que o PT perdeu em São Paulo, em 2016, por uma pesquisa do Instituto Perseu Abramo, do próprio partido. O que o então diretor do Datafolha Mauro Paulino, hoje comentarista da GloboNews, chamou de “aburguesamento de valores” da classe média brasileira já estava identificado ali.

Malu Gaspar - Os recados da Paulista

O Globo

Desde o primeiro momento, Jair Bolsonaro disse que seu maior objetivo com a manifestação do último domingo era produzir uma “fotografia para o mundo”.

Como Bolsonaro não costuma ser bom em esconder seus reais propósitos, é razoável apostar que ele não esperava comover ninguém que já não o apoie com seus pedidos de pacificação e anistia — muito menos o Supremo Tribunal Federal (STF). Tampouco achava que convenceria alguém de que não planejou um golpe de Estado. O que ele queria era a imagem mesmo, e para passar mensagens bastante claras.

A primeira, para o STF. A foto da Avenida Paulista mostra que prender Bolsonaro não será uma operação fácil, agora ou mais adiante. Quem se lembra do comício de Lula em São Bernardo do Campo em abril de 2018, horas antes de ser levado para Curitiba pela Polícia Federal, sabe por quê.

A Suprema Corte está até hoje expiando o trauma de ter prendido um ex-presidente popular, e mesmo o intrépido Alexandre de Moraes vai pensar algumas vezes antes de confrontar os bolsonaristas.

Outro recado foi aos aliados, especialmente aos governadores que se aboletaram no carro de som.

Luiz Carlos Azedo - Enquanto Lula está na Guiana, Bolsonaro vai a Itu

Correio Braziliense

O presidente brasileiro refaz seus laços com os governos da fronteira norte e caribenhos, o ex-presidente mergulha de cabeça nas eleições municipais

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva está em Georgetown, capital da Guiana, para onde viajou nesta quarta-feira, e deve se reunir com chefe de governo do país vizinho, Irfaan Ali, para tratar da crise entre Guiana e Venezuela pelo território de Essequibo, disputado pelos dois países. Lula foi convidado especial no encerramento da 46ª Cúpula de Chefes de Governo da Comunidade do Caribe (Caricom).

A viagem de Lula é ambiciosa do ponto de vista da nossa política externa, porque o Brasil precisa demonstrar capacidade de liderança e de mediação de conflitos no subcontinente. Ainda mais depois dos ataques que sofreu do presidente da Argentina, Javier Milei, por causa das suas críticas ao primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, que Lula acusa de promover um genocídio em Gaza. Nesta quarta-feira, o líder brasileiro esteve com o presidente do Suriname, Chan Santokhi, e com a primeira-ministra de Barbados, Mia Mottley.

Míriam Leitão - Alckmin e a nova política industrial

O Globo

Vice-presidente afirma que novo plano para indústria não é repetição do passado, como dizem os críticos, e que há muita desinformação

O vice-presidente Geraldo Alckmin defendeu a nova política industrial, garantindo que a ideia do “conteúdo nacional” não é para proteger empresa ineficiente, que o BNDES entrará de sócio apenas em startups e com investidores privados, que o governo “não vai pôr dinheiro em navios”, e que a política será horizontal, para melhorar a competitividade da economia como um todo e não para “a empresa A, B ou C”. Contudo, ele admitiu que não gosta dos movimentos da Petrobras de recomprar empresas privatizadas. “Não gosto, porque você cria insegurança jurídica”. Falou também de política em entrevista que me concedeu, e que foi ao ar ontem à noite na GloboNews, e pode ser vista no Globoplay, e o texto na íntegra no blog.

Diante da pergunta se o presidente Lula não estaria governando apenas para o PT, apesar de ter sido eleito falando em frente política, Geraldo Alckmin foi firme.

— Eu tenho a convicção de que o presidente Lula salvou a democracia, quando eles tentaram dar um golpe de estado. Quem defende a Constituição, defende eleição, defende o povo, é democrata. O inverso disso é golpista. Se perdendo a eleição eles tentaram um golpe, imagina se tivessem ganho. E isso é a pior coisa também para a economia. As ditaduras suprimem a liberdade em nome do pão, não dão o pão, nem devolvem a liberdade que tomaram.

Assis Moreira* - Países em desenvolvimento sem ‘pouso suave’

Valor Econômico

Cicatrizes da pandemia só se aprofundaram para o grupo de economias em desenvolvimento, alerta agência da ONU

As economias desenvolvidas se preparam para uma “aterrissagem suave” (soft landing) em 2024, mas países em desenvolvimento não estão fora de perigo ainda. A constatação é do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), enquanto os ministros de finanças e de presidentes de bancos centrais do G20 terminam hoje em São Paulo reunião que examina a situação global.

A publicação dessa agência da ONU focada em desenvolvimento internacional confirma a importância da agenda do Brasil para sua presidência do G20, ancorada na relação entre desigualdade e políticas econômicas, cooperação para desenvolvimento sustentável, modelos de tributação progressiva e aliviar realmente a dívida de países em desenvolvimento.

Nicholas Reed Langen* - Dias de julgamento para a democracia

Valor Econômico

Diante da crescente pressão populista, os tribunais podem ser os últimos garantidores da ordem constitucional democrática

Dia após dia, semana após semana, os tribunais estão cada vez mais na linha de frente da luta para preservar a democracia contra populistas e autoritários. Nos Estados Unidos, a Suprema Corte ouviu recentemente as argumentações sobre a decisão do mais alto tribunal do Colorado de considerar que o ex-presidente Donald Trump não estava qualificado para ter seu nome incluído nas cédulas do Estado para as eleições presidenciais, por causa de seu papel na insurreição de 6 de janeiro de 2021 no Capitólio. E uma corte de apelação rejeitou a alegação de Trump de que presidentes gozam de imunidade no caso de qualquer ação tomada durante seus mandatos.

Maria Cristina Fernandes - Os riscos do fosso entre a avenida e o palanque

Valor Econômico

Golpismo dos manifestantes não encontrou eco nos discursos mas serve de alerta contra a polarização

O fosso entre aquilo que os manifestantes do domingo na avenida Paulista queriam ouvir e aquilo que foi dito no palanque contém um alerta desprezado pelo partido do presidente da República e movimentos sociais e até por setores do governo.

Não era fácil encontrar alguém naquela avenida que acreditasse na lisura do processo que colocou Luiz Inácio Lula da Silva no poder. Esta dificuldade foi mensurada pelo Monitor Digital da USP, que atestou a crença de 88% dos manifestantes de que a eleição de Lula foi fraudada.

Esta expressiva maioria de manifestantes não encontrou eco no palanque. Não ouviu isso do estridente Silas Malafaia, que protestou contra a “perseguição” a Jair Bolsonaro mas não questionou o resultado, nem da pastora Michelle e menos ainda do ex-presidente, que só queria mesmo “apagar o passado”.

Talvez por isso quando a Genial/Quaest saiu pelo país a perguntar sobre a manifestação, identificaria, em apenas 11% de seus questionários, a convicção de que aquele ato frearia as investigações em curso.

Esta frustração acomodará o golpismo? É o cerco do Supremo aos militares que o fará. O mais provável é que a insatisfação dos bolsonaristas sobreviva como uma centelha da radicalização.

William Waack - Ferrolho político

O Estado de S. Paulo

As dificuldades de Lula e Bolsonaro para obter maiorias consistentes

Conciliação e pacificação são palavras de fácil uso e difícil implementação. Aparecem com certa frequência nos pronunciamentos dos dois personagens que dominam a política brasileira, Lula e Bolsonaro. Mas não são para valer.

Ambos subordinam a própria sobrevivência política à “missão” de liquidar o adversário. Operam por contraste em relação ao oponente. Isso foi sempre parte da postura de Bolsonaro frente “à esquerda”, mas é razoavelmente novo em Lula, que passou de “pai dos pobres” para “pai da democracia” (quer dizer, campeão do antibolsonarismo).

Do ponto de vista de Lula, as investigações criminais e o STF não eliminaram seu adversário, pelo menos não na rapidez desejada. Cujo atual peso eleitoral, mesmo inelegível, se explica em boa medida pelo próprio... Lula.

Bruno Boghossian - Uma doutrina econômica precária

Folha de S. Paulo

Governo tem ferramentas de sobra para influenciar o mercado, mas não tem armas para exigir obediência de empresas privadas

A cada duas ou três semanas, Lula abre espaço na agenda para dar uma pancada na gestão da Vale. Na bordoada mais recente, ele lançou mão de figurinhas repetidas: citou atrocidades ambientais e bateu no que seriam distorções criadas pela empresa num setor produtivo estratégico.

Um presidente que não domina o próprio megafone deveria economizar nas palavras. Não é o caso de Lula. Já um político que conhece o poder de suas declarações nunca se contentará com o papel de comentarista inofensivo.

Lula foi além de uma análise inocente sobre uma empresa que atua num setor regulado, submetida à legislação ambiental. Depois de criticar a mineradora, o petista exibiu a visão crua de um capitalismo de Estado. "As empresas brasileiras precisam estar de acordo com aquilo que é o pensamento de desenvolvimento do governo brasileiro", disse.

Maria Hermínia Tavares - Avenida dos vencidos

Folha de S. Paulo

No Brasil, extrema direita se vale das regras democráticas para avançar sua agenda reacionária

O entusiasmo da multidão que Jair Bolsonaro levou à avenida Paulista, no domingo, 25/2, não foi suficiente para esconder que ali se saudava um derrotado: nas urnas e no intento de permanecer no poder por meio de um golpe. Este só não se consumou porque as instituições democráticas e as lideranças que as animam, no Estado e na sociedade, barraram-lhe os passos.

Não foi por outra razão que, vencido, o ex-presidente abandonou a retórica incendiária –sua marca desde sempre– pela moderação, loas à democracia e apelos autointeressados de pacificação e anistia para os conspiradores –de gravata ou farda– e para os descerebrados que invadiram a praça dos Três Poderes.

Ruy Castro - Bolsonaristas de esquerda

Folha de S. Paulo

Uma massa de católicos ouvindo evangélicos e cantando um explosivo hino contra a ditadura militar

As palavras, coitadas, não têm como se defender. Existem para ser usadas e não podem impedir que energúmenos as torturem em palanques, obrigando-as a dizer o contrário do que significam. Foi assim no domingo (25) quando Bolsonaro, a bordo de uma caçamba na avenida Paulista, bradou mais uma vez atuar "dentro das quatro linhas da Constituição", defender o "estado democrático de direito" e lutar pela "nossa liberdade".

João Paulo Charleaux* - Intencionalidade é chave para provar crime de genocídio de Israel

Folha de S. Paulo

É inútil mencionar os quase 30 mil mortos em Gaza ou argumentar que é um número baixo comparado ao Holocausto

Concluir se Israel comete ou não genocídio depende de provar que as forças israelenses e o atual governo têm a intenção de exterminar a totalidade ou uma parte do povo palestino; e que as mortes de civis não são apenas decorrência de ataques desproporcionais ou de danos colaterais causados pelo enfrentamento ao Hamas.

Nesta quarta-feira (28), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) atribuiu pela segunda vez em 24 horas o crime de genocídio a Israel, como havia feito no dia anterior, em entrevista à Rede TV. Ele cita com frequência a amplitude da tragédia humanitária em Gaza, sobretudo a morte de mulheres e crianças, para embasar sua percepção sobre genocídio.

A Convenção sobre Genocídio de 1951 não menciona números, escala ou proporções. Então, é inútil mencionar os quase 30 mil mortos em Gaza, segundo dados palestinos, como forma de provar a existência de um genocídio, como faz Lula; assim como é inútil argumentar que esse número é relativamente baixo se comparado aos 6 milhões de judeus mortos no Holocausto, para refutar a tese de que há um genocídio em curso. Juridicamente, o que importa é a intenção de varrer do mapa, total ou parcialmente, um grupo humano. Mas é preciso provar que existe essa intenção.

Poesia | Cinco coisas, de Pablo Neruda

 

Música | Marisa Monte | Elegante Amanhecer/A Lenda das Sereias

 

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Governo ainda deve solução eficaz para armamentismo

O Globo

Há mais de 1,6 milhão de armas em situação irregular e quase 1 milhão nas mãos de amadores

O avanço do armamentismo no governo passado se transformou em herança pesada para a gestão Luiz Inácio Lula da Silva. Dos 2,89 milhões de armas registradas na Polícia Federal (PF) em nome de civis, servidores públicos, policiais e guardas municipais para defesa pessoal, 1,6 milhão, mais da metade, está em situação irregular, com o registro vencido, de acordo com reportagem do Jornal Nacional. Esse total não inclui os Colecionadores, Atiradores Desportivos e Caçadores (CACs), a categoria de amadores que se multiplicou no governo Jair Bolsonaro, atraídos pela facilidade de comprar armas e munições.

De 2018 ao final de 2022, a quantidade de CACs sextuplicou, de 117.467 para 783.385. O novo governo suspendeu decretos armamentistas de Bolsonaro, determinou a concentração na PF do controle de todo o armamento em mãos de civis. Concluído no ano passado, o recadastramento da PF contou 939.154 armas em poder de amadores. Mas a resistência do Exército a abrir mão do controle dos CACs e da própria PF a assumir a função, alegando falta de estrutura, tem mantido intocado esse arsenal. As armas continuam em circulação e, como mostrou reportagem do GLOBO, os clubes de tiro continuam funcionando a pleno vapor. Pouco se avançou na solução desse grave problema.

Vera Magalhães - Política com tecla SAP

O Globo

Lula e Bolsonaro tentam editar declarações comprometedoras numa era em que vídeos deixam pouca margem para dúvida

Numa era em que declarações de políticos ganham as redes sociais, com direito a vídeo em questão de minutos, tentar reescrever declarações e adicionar “contextos” ou interpretações posteriores tem pouca validade para além de apaziguar as torcidas organizadas. Foi o que tentaram fazer, no mesmo dia, Lula e Jair Bolsonaro, com falas recentes que causaram celeuma.

O presidente concedeu entrevista ao jornalista Kennedy Alencar em que se apegou ao fato de não ter usado a palavra “Holocausto” em sua declaração em Adis Abeba, onde disse que o único precedente para o que Israel comete na Palestina tinha sido “quando Hitler resolveu matar os judeus”.

Não é preciso fazer um tratado de interpretação de texto para saber que a ausência da denominação histórica dada à matança dos judeus pela Alemanha nazista não elimina a comparação disparatada feita pelo presidente brasileiro.

Esse tipo de contorcionismo poderia e deveria ser evitado por Lula. Se ele não viu razões para se retratar da fala, não há por que achar que Holocausto foi “interpretação” de Benjamin Netanyahu. Não foi o primeiro-ministro de Israel que deu nome ao evento histórico nefasto do Holocausto.

Elio Gaspari - A anistia de Bolsonaro

O Globo

Se não havia trama golpista, vai-se anistiar o quê?

A manifestação convocada por Jair Bolsonaro para a Avenida Paulista mostrou o vigor de sua liderança política. Quem esteve lá informa que havia até mesmo cordialidade no ambiente. O Bolsonaro de 2024 pretende ser diferente de todos os anteriores:

— O que eu busco é a pacificação, é passar uma borracha no passado. É buscar uma maneira de nós vivermos em paz, não continuarmos sobressaltados.

É, ou seria, um novo e bem-vindo Bolsonaro. Dando um passo adiante, ele falou em “conciliação”:

— É, por parte do Parlamento brasileiro, uma anistia para aqueles pobres coitados que estão presos em Brasília. Nós não queremos mais que seus filhos sejam órfãos de pais vivos. A conciliação. Nós já anistiamos no passado quem fez barbaridades no Brasil. Agora nós pedimos a todos os 513 deputados, 81 senadores, um projeto de anistia para que seja feita justiça em nosso Brasil.

Na mesma ocasião, ele ressalvou que não pretende beneficiar quem vandalizou prédios no 8 de Janeiro. Sobram aqueles que pretendiam anular o resultado da eleição em que Lula o derrotou.

Bernardo Mello Franco – Borracha no passado

O Globo

Jair Bolsonaro convocou sua tropa para mostrar força e tentar barganhar uma anistia. Três dias depois de silenciar na Polícia Federal, o capitão abriu o bico na Avenida Paulista.

Seu apelo foi explícito: “O que eu busco é a pacificação. É passar uma borracha no passado. É buscar maneiras de nós vivermos em paz. É não continuarmos sobressaltados”.

De volta ao palanque, o ex-presidente falou em “conciliação” e “anistia para aqueles pobres coitados que estão presos”. Na prática, quer um acordão para proteger aliados e salvar a própria pele.

O comício de domingo provou que Bolsonaro ainda tem capacidade de mobilização. Derrotado nas urnas e declarado inelegível, ele mantém a condição de líder inconteste da direita.

Luiz Carlos Azedo - Relação de Lula com evangélicos tem duas dimensões

Correio  Braziliense

Presidente não consegue atrair o eleitorado pentecostal, embora tenha apoio de setores evangélicos. O fosso está nas questões do aborto e das relações homoafetivas

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva é católico romano, sempre foi ligado aos padres adeptos da teoria da libertação, sobretudo ao frade dominicano Carlos Alberto Libânio Christo, ou Frei Betto. Na década de 1970, Frei Betto organizou Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) na Arquidiocese de Vitória (Espírito Santo); depois foi para São Paulo, trabalhar na Pastoral Operária do ABC. Foi quando se aproximou de Lula, então presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, que havia liderado as grandes greves operárias do ABC em 1978.

A chegada de Frei Beto a São Bernardo coincide com a fundação do PT, que se tornaria o leito natural para os militantes das comunidades eclesiais de base, que estavam sendo dissolvidas por ordem do Papa João Paulo II. Frei Betto era amigo de dona Marisa, falecida esposa de Lula, e chegou a assessorá-lo no Palácio do Planalto, no primeiro mandato. Essa relação, que se mantém até hoje, está longe de favorecer uma aproximação de Lula com os evangélicos.

Roberto DaMatta - O mal-estar da globalização

O Globo

Todo conflito desvenda exclusivismos que não podem ser tomados como modelos absolutos

Quando se trata de guerra — de violência e fúria que fulminam pessoas e formas de vida —, todo comentário é discutível e potencialmente ofensivo. Feita a primeira vítima, fica difícil chegar à última.

Nas razões convocadas pela guerra, quando ela emerge como um sujeito — uma instituição com direitos tão profundos quanto justos e desumanos do agredido ou do agressor —, o conflito armado tem enorme vigor. Isso porque ele chama a promessa de finalização de uma injúria ou etapa histórica. Quem não se lembra daquela guerra que acabaria com todas as guerras?

Se o mundo fica melhor sem judeus, muçulmanos, católicos, puritanos, materialistas, índios... — eu esgotaria um volume com exemplos —, então há o remédio de tomar Jerusalém, exterminar subversivos e catequizar índios e todos os que não são como nós. Se não admitimos o outro como alternativa e classificamos as alternativas como erros, ignorância, pecado, primitivismo, doença ou deformação, legitimamos seu extermínio porque, nesse caso, o aniquilamento é cura, livramento e progresso. Algo, valha-me Deus, que está na base de todo etnocentrismo e dos anacronismos.

Zeina Latif - No inevitável mundo novo, todos querem ser ouvidos

O Globo

As redes não aumentam a polarização da forma imaginada, não se distanciando do que ocorre no mundo off-line

A crise global de 2008-09 e seus desdobramentos produziram inflexões no sentimento das sociedades mundo afora. A insatisfação com governantes, instituições e elites só fez crescer, com a visão de que as classes populares foram deixadas para trás. No Brasil, a inflexão veio nos protestos de 2013. O país que muito prometeu decepcionava os filhos da nova classe média recém surgida.

O segundo capítulo dessa história veio, em um contexto de insegurança econômica, com a ascensão de políticos populistas no mundo ocidental, ocupando o vácuo deixado por líderes que não conseguiram compreender os novos anseios da sociedade.

Barry Eichengreen aponta algumas características próprias dos líderes populistas, como se colocarem como “salvadores”, propondo soluções imediatistas e contraproducentes, com pouco apego a recomendações técnicas.

São “anti” muitas coisas e atacam políticos tradicionais, que são vistos como corruptos ou dominados por grupos que conspiram contra o bem comum. Os populistas de direita atacam as minorias e os de esquerda, segmentos da elite — outra parcela é premiada com favores oficiais.

Fernando Exman* - Articulação do Planalto entra em nova fase

Valor Econômico

Cargo de articulador político do Planalto está longe de ser um emprego confortável

Vem do processo cinematográfico a frase segundo a qual uma foto não representa o todo do filme. Afinal, o cérebro humano é incapaz de processar várias imagens como fotografias independentes, quando elas são transmitidas em alta velocidade. Sequenciados, os quadros, ou “frames”, provocam uma sensação de movimento. Ao fixar-se apenas em um dos fotogramas, o público pode ser levado a um erro de avaliação.

É o que ocorre quando se analisa, individualmente, as fotografias divulgadas nas redes sociais na quinta-feira (22) à noite pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) após encontro com líderes partidários e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

Lula aparece ladeado por Lira e pelo ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha. Fernando Haddad, ministro da Fazenda, também ocupa o primeiro plano. Mais distante, aparece o ministro da Casa Civil, Rui Costa.

Mas são as fotos, não o filme. Hoje, Rui Costa é o interlocutor preferencial de Lira. E o sucesso da agenda do governo depende dessa relação, embora a função estivesse fora dos planos do ministro.

Christopher Garman* - Ato mostra força eleitoral de Bolsonaro

Valor Econômico

Ato mostra realidade que contraria análises que previam uma pacificação do país após a eleição de 2022 e um declínio na relevância política do ex-presidente

Sob qualquer métrica, o ex-presidente Jair Bolsonaro atingiu seus objetivos com a manifestação realizada na Avenida Paulista no último domingo. Acuado diante de investigações contra ele e membros de seu círculo pessoal, Bolsonaro deu uma demonstração de força política.

Dados da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo apontam que entre 600 mil e 750 mil pessoas compareceram ao ato. Ainda que esses números não sejam precisos - ou sejam até mesmo inflados - as imagens deixam claro que a manifestação teve um tamanho considerável. Por sua vez, o pedido do ex-presidente para que os participantes evitassem cartazes criticando diretamente o Judiciário foi atendido - o que atenua o risco (relevante) de dar mais munição a ações judiciais contra ele. Finalmente, as grandes lideranças nacionais de direita compareceram ao evento.

A manifestação pode ser examinada sob duas óticas: suas repercussões de curto prazo ou que ela indica sobre o futuro da política brasileira. A segunda é bem mais relevante que a primeira.

Lu Aiko Otta - Receitas seguiram fortes em fevereiro

Valor Econômico

Desempenho da arrecadação é recebido com alívio nos bastidores da equipe econômica

Fevereiro ainda não acabou, mas os dados preliminares mostram que a arrecadação tributária seguiu robusta. Haverá queda em relação ao recorde histórico de janeiro. Por motivos sazonais, os ingressos de receita são maiores no primeiro mês do ano do que no segundo. Mas tudo indica que haverá, novamente, uma surpresa positiva.

O desempenho da arrecadação é recebido com alívio nos bastidores da equipe econômica. Também há grande torcida para que se confirme o anúncio, hoje, de um forte superávit primário nas contas do governo central em janeiro. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estimou um saldo positivo de R$ 77,9 bilhões para o mês.

Assim, ganha corpo a hipótese de o governo não tomar a impopular decisão de contingenciar despesas para cumprir a meta de zerar o déficit público neste ano eleitoral. A decisão será anunciada no dia 22 de março, com a divulgação do relatório bimestral com projeções de receitas e despesas para o ano.

Vinicius Torres Freire - Dinheiro largado no chão do governo

Folha de S. Paulo

Revisão de gasto é necessária para que país seja mais justo e eficiente, não apenas o governo

O governo antecipou o pagamento de R$ 30,1 bilhões em precatórios deste ano. Rendeu economia de R$ 2 bilhões em juros etc. contou a ministra Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) a este jornalista. Não precisou bulir com ninguém, não cortou serviço ou benefício. Achou uma nota de R$ 100 no chão. Há outras por aí.

É muito dinheiro, R$ 2 bilhões. Faltam coisas tão elementares como ultrassom e remédio em hospital público, carteiras e material de limpeza em escolas etc.

É pouco dinheiro. Equivale a 0,1% do total da despesa federal em 2023, que foi de R$ 2,1 trilhões.

É dinheiro bem gasto? É pergunta necessária, claro, para qualquer item da despesa.

É preciso, possível ou recomendável cortar todos os ganhos obtidos com revisão de gastos e programas do governo? Não. Por exemplo, afora milagres, jamais será possível fazê-lo nas despesas com saúde pública, em que a necessidade é feia.

Igor Gielow - Recado da Paulista para Lula vai além de Bolsonaro

Folha de S. Paulo

Eleição na capital é teste para a musculatura antipetista apresentada na avenida

Se a multidão levada à avenida Paulista no domingo (25) de certa forma encarnou um epitáfio do poderio do bolsonarismo como forma de pressão de seu líder sobre as instituições, há sinais de uma movimentação social que deveria preocupar Lula (PT) e seu governo.

Jair Bolsonaro (PL) não ficou um centímetro mais distante das agruras judiciais que o esperam devido ao comportamento golpista por causa dos milhares que envergaram verde e amarelo. Seu tom amedrontado, deixando o serviço sujo para o pastor Silas Malafaia, confirma essa realidade.

Assim, fica fácil para o governo tergiversar e a esquerda em geral repetir o erro usual de tachar a totalidade dos presentes ao evento pseudoreligioso de gado, fascista ou algo do gênero.

Bruno Boghossian - Tarcísio perdeu o CPF na Paulista

Folha de S. Paulo

Se aliados descrevem o governador como um equilibrista, falta explicar por que ele sempre cai para o mesmo lado da corda

Tarcísio de Freitas disfarçou mal. Pegou o microfone, apertou velhos botões do patriotismo ("estamos aqui para celebrar o verde-amarelo") e lançou palavras genéricas sobre liberdade. Enquanto colegas exibiam uma dose de orgulho golpista, ele disse que era preciso entender um tal "desafio da representatividade".

O governador paulista tentou fingir que aquele era um comício normal, num domingo qualquer. Exaltou obras de infraestrutura hídrica, citou um questionável milagre de expansão de ferrovias e disse ser grato a seu líder político —sem mencionar que os dois só estavam ali porque um deles corre o risco de ser preso por preparar um golpe de Estado.

Mariliz Pereira Jorge - Gente ignorante ganha eleição

Folha de S. Paulo

Tratar o bolsonarismo como um movimento de elite em 2024 é puro elitismo

É quase irresistível não fazer piada sobre os participantes da manifestação convocada por Jair Bolsonaro. Tudo tão caricato, mas o que vimos é mais alarmante do que cômico. Em público, integrantes do governo Lula ironizaram, enquanto o presidente reconheceu que foi "grande". Pelo menos temos um adulto na presidência.

Tanto faz se foram 185 ou 700 mil, era gente para dedéu na rua, sem falar de lives que reuniram mais de 200 mil pessoas e da mobilização nas redes, na quantidade de artigos, muitos desmerecendo o significado do ato, além dos que se lambuzaram em etarismo, racismo e elitismo. Por mais engraçado que seja, as senhoras que entoam Geraldo Vandré devem acreditar que lutam pela democracia e talvez estejam dispostas a pegar em armas para defendê-la da ditadura em que acreditam viver. O nível de dissonância cognitiva é grande, mas produzir meme não dissolve essa massa antidemocrática.

Wilson Gomes* - Construir pontes ou afiar facas?

Folha de S. Paulo

Em um cenário de radicalização, Lula precisa ponderar o que fala

Na semana passada, argumentei que Lula estava diante de uma escolha crucial entre abraçar ou rejeitar a "via bolsonariana".

Nos últimos quatro anos, vimos que governar é fazer declarações e decidir que se vai falar só para os seus, mesmo que sejam uma minoria, criar inimigos, provocar o outro lado, polemizar sempre, além de mostrar-se forte e viril, popular e amado ou vítima e vulnerável, conforme a conveniência.

Lula hesita, mas vai ter que optar. Afinal, ou ele constrói pontes ou afia facas; ou investe em uma nova maioria composta com quem não lhe fez juramentos de fidelidade e ainda o olha com desconfiança ou aposta tudo nos seus crentes e se assume como líder de seita.

O recente episódio de radicalização dos lulistas deveria servir como uma lição sobre as consequências da adoção da abordagem bolsonariana.

Marcelo Godoy - A prisão que desafia Moraes

O Estado de S. Paulo

Se há erro no caso de Martins, ele deve ser solto; a PF tem como saber se prova da defesa é válida

A virtù e o direito eram para Cícero premissas, o núcleo fundador de seu tratado sobre a República. Não é por outra razão que Francesca Nenci, ao analisar a obra De Re Publica do pensador romano, afirma que, por meio de uma concepção da virtude (virtus) estritamente ligada ao direito, o diálogo de Cícero se sustenta em um sistema de valores próximos à tradição ocidental do chamado republicanismo. A teoria ciceroniana tem como base a ideia de que o homem tem por fim natural a vida em sociedade onde possa realizar a parte melhor de si mesmo justamente no âmbito do Estado, como cidadão, em sua vita activa. O ministro Alexandre de Moraes conhece bem essas páginas. Poucos em Brasília sabem como ele a importância da virtù para um homem público. Sua trajetória é testemunha disso.

Poesia | Quando olho para mim, de Fernando Pessoa

 

Música | Marisa Monte e Paulinho da Viola - Dança da Solidão

 

terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Usar multidão contra a Justiça mostra que Bolsonaro não muda

O Globo

Não é tolerável numa democracia que ex-presidente use sua força política para atacar investigação sobre golpe

Alvo de investigação da Polícia Federal sobre tentativa de golpe de Estado, o ex-presidente Jair Bolsonaro liderou uma gigantesca manifestação na Avenida Paulista, em São Paulo, no domingo. Quarteirões ficaram lotados com manifestantes vestindo camisas amarelas. Caravanas de ônibus chegaram de todo o país. Havia veículos de Minas Gerais, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Pernambuco. A estratégia era evidente desde antes do ato: usar as ruas para tentar proteger Bolsonaro da Justiça. Isso ficou explícito quando o próprio Bolsonaro, microfone em mãos, afirmou querer “passar uma borracha no passado”.

As suspeitas sobre Bolsonaro, ministros e apoiadores são graves. Elas devem ser investigadas a fundo e, comprovada culpa, a punição deve ser severa. Tramar para subverter a vontade expressa pelo voto popular é o crime mais grave numa democracia. “Passar uma borracha”, como quer Bolsonaro, tornaria mais provável um novo plano de golpe no futuro. Seria também um ataque intolerável à noção, basilar numa democracia, de que todos são iguais perante a lei. Quem consegue atrair multidões para manifestações deve receber o mesmo tratamento dado a qualquer suspeito. Não dá para aceitar esse subterfúgio para pressionar a Justiça.

A demanda por anistia chegou ao absurdo quando Bolsonaro admitiu a existência do documento conhecido como “minuta do golpe”. “Agora, o golpe é porque tem uma minuta de um decreto de Estado de Defesa. Golpe usando a Constituição? Tenham santa paciência”, disse Bolsonaro. Na versão dele, o rascunho de decreto encontrado na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, instalando Estado de Defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), era inofensivo. Nada mais longe da verdade. O objetivo da minuta era mudar o resultado das eleições de 2022, vencidas por Luiz Inácio Lula da Silva. De constitucional, não tinha nada. A partir da delação premiada de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, a PF investiga os indícios de que o ex-presidente tenha participado da redação final do texto.

Merval Pereira - Sinal de alerta

O Globo

Infelizmente, dependemos do surgimento de um líder equilibrado e popular para colocar o trem no trilho novamente

Há dois aspectos a analisar em relação à manifestação bolsonarista de domingo na Avenida Paulista. O primeiro, mais superficial, é a tentativa de escapar de punições pela marcha golpista que culminou com a invasão da Praça dos Três Poderes em janeiro de 2023. Não há nenhuma razão para que seja levada a sério. A pressão popular não tem força para paralisar a investigação em andamento, já praticamente encerrada com a definição de um quadro claro de frustração de um golpe de Estado.

Havia o temor de que a prisão de Lula, depois de condenado por duas instâncias da Justiça, como rezava a lei na ocasião, pudesse levar a um confronto, e nada aconteceu. Nada acontecerá também com uma eventual prisão de Bolsonaro.

O outro aspecto, esse mais profundo, é a resiliência de uma liderança radicalizada de extrema direita, apesar de tudo o que aconteceu no país desde que o capitão chegou ao poder por circunstâncias alheias a suas capacitações.

Míriam Leitão - A encrenca que o ato não resolve

O Globo

Bolsonaro mostra que consegue levar um grande público às ruas, mas não é com aglomeração que ele se livrará das contas que têm que prestar à Justiça

O ex-presidente Jair Bolsonaro pretendia com a convocação de seus seguidores para a Paulista ter uma “fotografia”, como disse. Demonstrou que consegue levar muita gente para a rua e isso já se sabia. Contudo, não é de mais uma aglomeração que ele precisa. Bolsonaro tem que saber como responder a todas as dúvidas sobre a tentativa de golpe de estado que ele conduziu. Ele produziu contra si abundantes provas. Essa é a encrenca que a manifestação não resolve. No ato, ele acabou comentando o que alegava desconhecer, a minuta do decreto golpista. O ex-governante disse que aquele documento não era golpe, apenas previa estado de sítio, estado de defesa, convocação do conselho da República. Tudo previsto na Constituição, como ele disse. No final, isso o complica um pouco mais na investigação da Polícia Federal.

Com a fotografia ele queria, claro, ameaçar quem tem a responsabilidade de pedir e determinar sua prisão. Esse era o objetivo, mostrar que ele tem o povo ao lado dele. Não surtirá efeito. O que precisa agora é ter bons argumentos para os seus interrogatórios, boas defesas para os processos aos quais responde e responderá pelos crimes que cometeu. Bolsonaro não falou diretamente contra o ministro Alexandre de Moraes e terceirizou esse papel para Silas Malafaia, que distorceu a história recente do país.

Luiz Carlos Azedo - Ato pró-Bolsonaro mostra sua resiliência política

Correio Braziliense

Bolsonaro foi cauteloso, num ano de eleições municipais, para não se isolar politicamente. Muito mais do que por temor a uma eventual prisão, que agora o transformaria em vítima

Há controvérsias sobre o número de participantes do ato em apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro, domingo, na Avenida Paulista. O Palácio dos Bandeirantes, por meio da Secretaria de Segurança Pública, inflacionou os números para 600 mil pessoas, chegando a 750 mil se incluídas as ruas adjacentes. Imagens da multidão de apoiadores são usadas nas redes sociais de Bolsonaro para corroborar essa avaliação. O Monitor do Debate Político Digital da USP, grupo de pesquisa que o cientista político Pablo Ortellado coordena, também utilizando imagens e inteligência artificial para identificar as cabeças dos participantes, apontou a presença de 185 mil. Mesmo assim, é muita gente.

Essa é diferença é importante para avaliar o grau de mobilização dos bolsonaristas que vestem amarelo, mas o problema para o governo Lula são os que não se vestem de “patriotas” nem estavam lá, mas apoiam Bolsonaro e também avaliam que o fato de estar sendo investigado em razão do 8 de janeiro de 2023 é uma perseguição política. O objetivo do ato claramente foi demonstrar apoio ao ex-presidente, que, na semana passada, prestou depoimento à Polícia Federal (PF) e permaneceu calado, como os generais Walter Braga Netto e Augusto Heleno, ex-ministros do seu estado-maior na Presidência.