terça-feira, 17 de setembro de 2019

Opinião do dia – Luiz Werneck Vianna*

A ameaça nos ronda, ela está presente em nós, mas foi identificada. A defesa da democracia, que está contida no texto constitucional, é muito poderosa para ser removida. A maior trincheira que a democracia brasileira tem hoje é a Carta de 1988. Ela tem uma concepção democrática muito forte, muito consistente, e que tem 30 anos de vida. Poucas constituições brasileiras duraram tanto.

*Luiz Werneck Vianna, sociólogo, PUC- Rio. Entrevista – ‘Maior trincheira da democracia é a Carta de 1988’, O Estado de S. Paulo, 15/9/2019

Eliane Cantanhêde - Bolsonaro em 2022?

- O Estado de S.Paulo

Partidos se esfarelam, mas força da inércia empurra Bolsonaro agora e os evangélicos depois

O presidente Jair Bolsonaro deixou em segundo plano o núcleo militar e o núcleo ideológico do seu governo para investir decisivamente na sua fiel base evangélica, dentro e fora do Congresso Nacional. Entretanto, seu maior aliado para 2022 não é nenhum dos três segmentos, são o vazio de lideranças políticas e a ausência de uma articulação concreta do centro.

O Brasil nunca foi e continua não sendo um país de extremos, nem à esquerda nem à direita. Com toda sua biografia, seu carisma e o enraizamento do PT, Lula perdeu três vezes e só chegou lá após uma real guinada ao centro. A grande pergunta, hoje, é qual é e onde está o centro.

A única liderança de peso a dar cara e voz aos setores moderados e buscar uma alternativa entre o lulismo e bolsonarismo é Fernando Henrique Cardoso, do alto dos seus 88 anos e de uma posição acima de partidos, paixões e pretensões pessoais, políticas e eleitorais. Mas ele encarna a moderação, o bom senso e a defesa da democracia, não projeta o futuro.

Foi-se o tempo dos grandes líderes, na política, na vida congressual, na Igreja Católica, nos sindicatos, na academia, nas carreiras, no empresariado, nas Forças Armadas. Aqueles que abriam a boca e o País parava para ouvir. Ulysses Guimarães, Dom Ivo Lorscheiter, Barbosa Lima Sobrinho, Antônio Ermírio de Moraes e tantos outros que viabilizaram grandes mudanças e capitanearam a Constituinte de 1988.

Foi nesse ambiente, com grandes nomes e essa efervescência de ideias, que o próprio Fernando Henrique foi emergindo como candidato à Presidência e venceu duas vezes, consecutivamente, em primeiro turno. Qual o ambiente hoje? O que é possível florescer?

O grande líder das esquerdas está preso, enquanto seu partido não consegue esboçar nenhum programa, nenhum futuro, nenhuma articulação com as demais forças políticas, refém de duas palavras que não dependem de partidos e não levam a nada: Lula livre.

O grande líder da direita é um arrivista, que se contentou em passar quase três décadas no anonimato do “baixo clero” do Congresso e, ao subir a rampa do Planalto, se ocupa em promover recuos nos avanços da sociedade e se delicia jogando dúvidas sobre o futuro da democracia.

Michel Temer* - Direitos individuais e o advogado

- O Estado de S.Paulo

São as prerrogativas que permitem exercer de forma sobranceira o mister advocatício

Não me canso de registrar o necessário e inafastável cumprimento do que dispõe a Constituição federal. Repetirei mil vezes que o Direito existe para regular as relações sociais. E dar segurança às pessoas. Sei, em razão da Constituição, quais serão meus direitos e deveres. Sei, ao praticar um ato, quais as suas consequências.

Há direitos individuais e coletivos. Os individuais são os mais prezáveis. Até porque repercutem positivamente, se obedecidos, nos coletivos. Não é sem razão que a Constituição os arrola em 78 parágrafos e ainda registra que os direitos e garantias expressados não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios adotados ou constantes de tratados internacionais, firmados pelo Brasil (Constituição federal, artigo 5.º).

Tais dispositivos, como toda e qualquer norma jurídica, buscam o justo, o reto. Buscam a justiça, ao fundamento de que justo é aplicar rigorosamente o preceituado no sistema normativo.

Nesses termos, é preciso administrar, dar, oferecer justiça. E é para tanto que o Texto Magno abre o capítulo IV com o título Das Funções Essenciais à Justiça. Arrola quatro instituições para exercê-las: o Ministério Público, a advocacia pública, a advocacia privada e a Defensoria Pública. É o que está nos artigos 127 a 135 da Constituição federal. Todas elas ao lado, naturalmente, do Judiciário, a quem essas entidades se dirigem para movimentá-lo.

Reporto-me à advocacia privada. E o faço em função de veto aposto pelo presidente da República a texto da Lei de Abuso de Autoridade, que se caracteriza se houver violação às prerrogativas profissionais do advogado (artigo 43), e porque, como parlamentar, sempre defendi essas prerrogativas. De logo registro que abusa da autoridade o agente público que ultrapassa os limites da lei.

Joel Pinheiro da Fonseca* - Política é religião e futebol

- Folha de S. Paulo

É hora de resgatar algumas das virtudes que outrora caracterizavam o Brasil

Num ato de desespero, Olavo de Carvalho conclama as massas a formar uma militância organizada em defesa de Bolsonaro e partir para a “ação”.

A horda de defensores virtuais do governo, contudo, está dividida porque descobriu que o presidente prefere proteger os interesses dos filhos a apoiar uma CPI para apurar corrupção no STF.

A adesão do povo verde-amarelo nos protestos domingueiros vem decaindo mês a mês. O governo continua com os mesmos vícios e autoritarismo, mas será que entre a população o fanatismo começa a diminuir? Estamos encharcados de polarização e sentimos seus efeitos destrutivos nas relações humanas. Muita gente já está exausta.

Polarização não é a mera existência de opiniões divergentes —que é algo desejável— mas o estado mental no qual a pessoa que pensa diferente deixa de ser um interlocutor legítimo —alguém que quer o bem da sociedade assim como eu— e passa a ser visto como um canalha a serviço de interesses inconfessáveis.

Se chegamos a esse ponto, nos tornamos alvo fácil de qualquer teoria conspiratória que corrobore nosso ponto de vista; e ficamos mais dispostos a violar as regras do jogo democrático para enfrentar esse inimigo imaginário.

A desconfiança mútua de todos que não concordam entre si envenena as relações, inclusive entre amigos e parentes.

Hélio Schwartsman - Com noticiar asneiras?

- Folha de S. Paulo

Como a imprensa deve tratar as declarações escatológicas de Jair Bolsonaro?

Como tratar as declarações escatológicas do presidente Jair Bolsonaro, que falam mais sobre sua psique do que sobre o estado do mundo? O que fazer quando o segundo filho insinua que a democracia não nos serve? E quando o terceiro desfila ostensivamente com uma arma na cintura? Tais imagens devem ser publicadas?

As asneiras ditas e encenadas quase diariamente por Bolsonaro e seu entorno colocam a imprensa numa sinuca de bico. A missão do que os britânicos chamam de "quality press" é dupla. Devemos, por um lado, destacar aquilo que tem interesse público, sem nos perder nas irrelevâncias típicas do reino da fofoca e menos ainda em psicoses privadas. Por outro, temos a obrigação de registrar os principais acontecimentos do dia, em especial os fatos que dizem respeito à política.

Nem sempre esses objetivos são compatíveis. Se os jornais estampam em suas primeiras páginas as opiniões pouco coerentes que um membro da família presidencial tem sobre a democracia, fracassam na primeira meta; se deixam de fazê-lo, malogram na segunda. É a definição clássica de dilema, em que qualquer solução adotada se mostra contraditória e insatisfatória.

Ranier Bragon – A dignidade do Senado tem preço?

- Folha de S. Paulo

Político faz papel de despachante de pleitos de colegas na gestão Bolsonaro

O jovem político Davi Alcolumbre (DEM), de 42 anos, carrega no currículo o feito de ter derrotado dois símbolos da propalada velha e carcomida política, o ex-presidente José Sarney (MDB), no Amapá, e Renan Calheiros (MDB), no Senado.

Presidente do Congresso desde fevereiro, resolveu agora ter recaídas à baixo clero, o contingente de congressistas com pouquíssima projeção nacional --ambiente que habitou de 2003 até derrotar Renan.

Reportagens relatam já há algum tempo que Alcolumbre trabalha nos bastidores para convencer colegas a aprovar a indicação de Eduardo Bolsonaro à embaixada brasileira em Washington. Os debates não seriam só sobre atributos ou a falta deles.

Vão-se os hambúrgueres e entram os carguinhos, as boquinhas, as emendinhas e todo e qualquer pleito que o interessado tenha ou possa vir a ter na administração federal.

O presidente do Senado se dispõe a encaminhá-los, a resolvê-los, em suma, a ser um despachante de luxo da velha e carcomida política. Oferece a reputação do Senado em troca do acesso a algumas tetas federais.

Renato Janine Ribeiro* - Os outros elementos do fascismo

- Folha de S. Paulo

Não se salva a democracia terceirizando sua defesa

Afirmei nesta Folha, em meu artigo “A Flip e o fascismo” (16.jul), que a principal diferença entre o fascismo e outros autoritarismos de extrema-direita é que ele tem militantes ativos, empenhados, empolgados: quem o apoia não se envergonha de usar a violência de forma banal e corriqueira. Foi o caso dos ataques a Glenn Greenwald, durante a Flip, e das ameaças a Miriam Leitão, convidada a outra feira literária.

Mas há mais dois fatores, pelo menos, que distinguem o fascismo do restante da extrema-direita: um é o desgaste ou destruição das instituições; o outro, a invasão totalitária da vida privada. Mussolini dizia: “Nada acima do Estado, nada contra o Estado” —e, pior ainda, “nada fora do Estado”. Ora, numa democracia o Estado tem várias instituições que se equilibram, fazendo o que chamamos de pesos e contrapesos. No Brasil, por forte que seja o presidente, seu poder é limitado por ao menos quatro instituições civis que pertencem também ao Estado. Como vão elas?

O Supremo Tribunal Federal, instituição decisiva por resolver as pendências em última instância, oscila. Se é verdade que limitou (poucas) medidas inconstitucionais de Jair Bolsonaro (PSL), dizem que o presidente Dias Toffoli teria alertado seus colegas a não enfrentarem um poder que comanda “300 mil homens armados”. Se a cúpula do Judiciário tem medo, o que devemos nós, simples cidadãos, sentir?

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP) receia que um veto à indicação do deputado Eduardo Bolsonaro para a embaixada em Washington (EUA) leve o Planalto a congelar emendas senatoriais. E a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, evitou atritos com o presidente.

Luiz Carlos Azedo - Base em desalinho

- Nas entrelinhas | Correio Braziliense

“Bolsonaro teme perder a bandeira da ética, mas de fato armou um cerco à Lava-Jato, com a indicação de Augusto Aras para o cargo de procurador-geral da República”

O presidente Jair Bolsonaro reassume o cargo hoje, embora não esteja plenamente recuperado da cirurgia para correção de uma hérnia no abdômen, realizada no dia 8 de setembro, em São Paulo. Sua volta coincide com muitas especulações sobre mudanças na equipe de governo, cujo objetivo seria melhorar a relação com o Congresso e reestruturar a sua base parlamentar. Na próxima sexta-feira, a equipe médica deverá reavaliar Bolsonaro em Brasília. A viagem a Nova York, onde o presidente discursará pela primeira vez na assembleia geral da Organização das Nações Unidas (ONU), está mantida. Por recomendação médica, porém, foi adiada de domingo para segunda. Seu discurso está previsto para terça-feira.

Cabe ao representante do Brasil abrir os debates da assembleia geral. Bolsonaro tem previsão de seguir depois para o Texas, onde se encontrará com representantes do setor industrial, empresários e militares americanos. O retorno ao Brasil somente deverá ocorrer na quarta. Até lá, a reforma da Previdência estará aprovada pelo Senado, que ontem encerrou o prazo para apresentação de emendas. Entretanto, isso não significa que a base do governo esteja articulada no Congresso, pelo contrário. Está a maior bagunça. Cindiu-se profundamente por causa da Lava-Jato e do caso Queiroz. Vamos por partes:

A visita do ministro da Justiça, Sérgio Moro, e de sua esposa, Rosângela Moro, a Bolsonaro no hospital, no fim de semana, serviu para desanuviar um pouco a relação entre ambos, mas nos bastidores, a tensão entre os defensores da Lava-Jato e os aliados do clã Bolsonaro continua. A turma da Lava-Jato tenta emplacar a CPI para investigar o Judiciário no Senado, mas enfrenta a resistência da maioria dos líderes partidários e do Palácio do Planalto. A tensão é tanta que o líder do PSL no Senado, Major Olímpio (PSL-SP), pediu a saída de Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) da legenda. É mais fácil, porém, a migração do senador paulista para o Podemos.

Flávio Bolsonaro é protagonista do racha político do clã presidencial com o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC). Ontem, anunciou o rompimento da bancada de 12 deputados estaduais do PSL com o governador fluminense. O estopim da crise foi entrevistas à imprensa de Witzel criticando o governo Bolsonaro. Witzel tem declarada disposição de se candidatar a presidente da República. O mal-estar existe desde quando o governador fluminense disse a Bolsonaro que gostaria de conhecer a suíte presidencial do Palácio da Alvorada, porque pretendia ocupá-la, quando fosse eleito presidente da República. Bolsonaro não deixou. Essa mesma conversa Witzel teve com o então governador Fernando Pezão (MDB), ao visitar o Palácio Guanabara, fato que entrou para o folclore político de Brasília porque o ex-governador fluminense, que hoje está preso, contou pra todo mundo.

Carlos Andreazza - A democracia como empecilho

- O Globo

Bolsonarismo funda-se na falácia de que o sistema político é estrutura pervertida

Ninguém precisava dos tuítes de Carlos Bolsonaro — que é Jair Bolsonaro — para saber que a mentalidade bolsonarista considera a democracia liberal representativa um entrave ao projeto de poder autocrático que o presidente encarna; e que, portanto, estimula seus agentes a investir contra os marcos institucionais que a animam. É preciso desqualificá-los; apregoá-los como fortalezas a serviço do establishment.

Não tardaria, pois, até que se divulgasse um programa de cadastramento para militantes bolsonaristas — um mecanismo de arregimentação para as milícias digitais, difundido explicitamente como um plano de adesão para a luta política concreta, em função não de abstrações ideológicas, mas do nome, do governante, do projeto. Trata-se de uma nova etapa, aquela em que se estabelece o critério da fidelidade personalista e acrítica; o que equivale a chamar o gado de gado. Sim. Já vimos esse filme.

Não faço aqui, porém, um alerta para o risco de uma ditadura conforme o modelo clássico do século XX. Não. O bolsonarismo não se move para fechar Congresso, empastelar jornais ou interditar eleições. Nem para reproduzir o modelo lulopetista de assalto e aparelhamento de instituições fortes, a serem assim mantidas, quando não anabolizadas, para servir ao financiamento do programa autoritário do partido. Não.

Sob a lógica da geração permanente de conflitos e crises, o bolsonarismo não opera para tomar, ocupar e cultivar instituições pujantes, mas para miná-las, desacreditá-las, enfraquecê-las, submetê-las. A captura do corpo do Estado pela revolução reacionária bolsonarista depende de o edifício estar condenado, tão de pé quanto corroído. Vivo, mas sem peso para dar equilíbrio.

Bernardo Mello Franco - A política da intimidação

- O Globo

As ameaças ao youtuber Felipe Neto não são caso isolado. As milícias virtuais agem diariamente contra pesquisadores, jornalistas, políticos e artistas que ousam contestar o poder

O youtuber Felipe Neto falaria hoje no Educação 360, o seminário que acontece na Cidade das Artes. Ontem ele cancelou a palestra por razões desegurança. Em comunicado, relatou “ameaças que atentam contra a sua vida e de sua família”.

Felipe pilota um canal de vídeos com 34 milhões de seguidores. Virou empresário bem sucedido e ídolo do público infanto-juvenil. Nos últimos tempos, ele reduziu o besteirol em favor das mensagens educativas. Também conquistou desafetos ao se insurgir contra os discursos de ódio e a homofobia.

Há dez dias, o youtuber peitou o prefeito Marcelo Crivella, que tentava ressuscitar a censura na Bienal do Livro. Em reação ao bispo, comprou e distribuiu gratuitamente 14 mil volumes com temática LGBT. Marquetagem à parte, a ação enfureceu as milícias virtuais. Felipe virou alvo de uma campanha difamatória, impulsionada por robôs e liderada por blogueiros governistas e deputados do PSL.

Merval Pereira - Dia decisivo

- O Globo

Mudança na lei eleitoral é retrocesso brutal, inclusive para o Congresso, que estava recuperando a sua imagem

A maior prova da irregularidade que está sendo tramada nos bastidores do Senado para aprovar a toque de caixa o projeto de lei que altera a legislação eleitoral está no relatório favorável do senador Weverton Rocha.

Ele opinou pela “constitucionalidade, juridicidade e regimentalidade” do projeto, e seu relatório deveria ser colocado em votação na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, mas o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, cancelou a reunião da CCJ de hoje, e colocou o projeto como prioritário na ordem do dia de votação.

Alcolumbre já havia tentado, na semana passada, levar a votação diretamente ao plenário, mas foi derrotado por uma obstrução de senadores de diversos partidos. O argumento de que é preciso aprovar o projeto até inicio de outubro, um ano antes da eleição municipal, para permitir que as novas regras sejam válidas já em 2020 é falacioso, pois elas não são regras eleitorais, com nenhum impacto na eleição em si, mas na atuação burocrática e jurídica dos partidos políticos.

O relator também rejeitou todas as emendas apresentadas, alegando justamente esse prazo. “Melhorias pontuais (...) terão o condão de colocar a perder os benefícios de todo o projeto para o processo eleitoral do ano que vem”.

José Casado - As bombas subsidiadas

- O Globo

Brasileiros contribuem do próprio bolso com a matança no Iêmen

Drones bombardearam uma refinaria da Arábia Saudita no sábado. Perderam-se 5% do suprimento mundial de petróleo. Não é pouca coisa. Essa ruptura no abastecimento de 5,7 milhões de barris por dia é mais do que o dobro daquilo que o Brasil consome em óleo a cada 24 horas.

Os brasileiros começarão a sentir no bolso os efeitos desse conflito entre Arábia Saudita, Irã e Iêmen. Preços da gasolina, diesel e gás ainda podem subir muito, se demorar a recuperar a produção e se os sauditas não eliminarem as dúvidas sobre defesa de uma infraestrutura vital ao abastecimento mundial de energia.

O impacto no Brasil tende a crescer no ritmo da imprevidência governamental. Depois de 34 semanas gastando energia em negar a ciência, impor censura, reprimir a sexualidade de alguns e armar todos, o governo Bolsonaro ainda não sabe se cria um fundo para estabilização de preços dos derivados de petróleo. Também, não resolveu o impasse sobre preços do diesel — embora seja recente a memória do caos num país onde 60% das cargas fluem por rodovias.

É ilusão achar que o Brasil está a 11 mil quilômetros dessa guerra. Os brasileiros contribuem do próprio bolso com a matança no Iêmen.

Míriam Leitão - Os vários efeitos de um atentado

- O Globo

Atentado na Arábia Saudita afetará os preços do diesel, da gasolina e do gás e atingirá a indústria intensiva em energia

A Petrobras reajustou o preço do diesel na última sexta-feira, mas ontem a cotação do petróleo estava US$ 8 mais cara. O atentado contra a Arábia Saudita será um teste para o governo. A estatal terá que ter uma política de preços de combustível confiável e transparente, mas o que se viu ontem foi o presidente Bolsonaro anunciando que não haverá reajuste até que as cotações se estabilizem. As distribuidoras pedirão aumento do gás, e isso afetará a indústria intensiva em energia. O Banco Central terá que ser convincente se quiser continuar reduzindo as taxas de juros mesmo diante do forte aumento da incerteza global.

A ação da Petrobras subiu ontem indicando a visão positiva sobre o país, pelo fato de os campos brasileiros ficarem ainda mais interessantes. Mas a empresa depende da liberdade de preços para ter sucesso na venda de quatro de suas refinarias. Com a privatização, ela espera reduzir suas dívidas e estimular a criação de um mercado de refino no Brasil. A estatal poderá até esperar um pouco para ver em que patamar os preços vão ficar. Mas não muito.

Petróleo quando sobe produz efeitos em cascata. Na Abividro, Lucien Belmonte explicou o impacto:

— A fórmula do reajuste do gás natural é atrelada ao barril do petróleo e ao dólar. Se o aumento for maior que 5% do faturamento da distribuidora, ela pode pedir reajuste extraordinário. Então, se a Comgás reajustar isso afetará todas as indústrias que usam intensivamente o gás no estado de São Paulo.

Ricardo Noblat - Bolsonaro à caça do traidor

- Blog do Noblat | Veja

Reforma ministerial adiada
O presidente Jair Bolsonaro desembarcou, ontem, em Brasília furioso com a informação de que encomendou aos auxiliares que o cercam mais de perto o esboço de uma ampla reforma ministerial que pretende fazer em breve. Está à caça da fonte, ou das fontes, que vazaram a informação para as jornalistas Helena Chagas e Lydia Medeiros, editoras do boletim TAG Reporter. Este blog obteve a mesma informação.

Recomenda-se ao presidente que amplie a investigação que pretende fazer em busca do que chama de “traidor” infiltrado entre as pessoas de sua confiança. A quem poderia interessar o vazamento da notícia? Resposta óbvia: a quem desejasse abortar o que estava sendo estudado. Ou porque seria prejudicado com a reforma ou simplesmente porque discordava dela a essa altura. O governo passaria cedo demais o recibo de que vai mal.

O episódio da reforma negada por Bolsonaro, especialista em se desdizer e em desmentir o que com frequência acaba se confirmando adiante, lembra episódio parecido que ocorreu em 1984 quando a eleição de Tancredo Neves para presidente era dada como certa. Em um esforço desesperado para vencer, Paulo Maluf, candidato do regime militar, convenceu o presidente João Figueiredo a fazer uma reforma ministerial a seu favor.

A informação vazou para Tancredo. Então pela primeira e última vez na sua vida, ele deu uma entrevista coletiva em “off”. Repassou a informação para um grupo de repórteres dos maiores jornais da época mediante a condição de não ser citado. Deu o nome dos ministros que seriam demitidos e dos que entrariam com a missão de ajudar Maluf. Ao ver a informação publicada no dia seguinte, Figueiredo desistiu da reforma.

Não se cobre a Bolsonaro conhecimentos históricos nem sabedoria política em excesso, apanágio de figuras que existiram no passado e de raras que ainda vivem. Bolsonaro é binário – preto ou branco, terra ou ar, amigo ou inimigo. É da sua formação. Paraquedista faz parte das chamadas Forças Especiais do Exército. O governo está repleto deles. Não é estimulado a pensar muito e tampouco a discutir. Ordem é ordem. Quando acionado, cai atirando para matar ou morrer. Selva!

Fora do hospital antes da hora

Fernando Exman - A precoce disputa pelo cargo de Maia

- Valor Econômico

Deputados renovam argumentos de críticos dos partidos

Veio em ótima hora, para o presidente Jair Bolsonaro, a mais recente tentativa do Congresso Nacional de ampliar o volume das verbas públicas destinadas aos partidos políticos e reduzir a transparência no uso desses recursos.

Antes de passar o exercício da Presidência ao vice para submeter-se a mais uma cirurgia, Bolsonaro via de seu gabinete o Congresso Nacional consolidando dia após dia um protagonismo na condução da agenda econômica. Foi o Legislativo quem deu tração à reforma da Previdência Social e saiu na frente nas discussões sobre a reforma tributária. Nos últimos dias, contudo, enquanto Bolsonaro se mantinha afastado do trabalho e consequentemente de novas polêmicas, foram os deputados federais que entraram em desgraça com parte expressiva da opinião pública.

A expansão dos fundos eleitoral e partidário ocorreu em paralelo à aprovação do projeto que dificulta a fiscalização desses recursos. Caso o Senado aprove a proposta, passará a ser permitido, por exemplo, o uso desse dinheiro para comprar imóveis, pagar a defesa de dirigentes implicados em casos de corrupção ou quitar multas. Acabaram ficando em segundo plano outros debates importantes conduzidos pelos parlamentares.

A conclusão da reforma da Previdência e as discussões do pacto federativo, por exemplo, não deveriam sair da lista de afazeres prioritários do Senado. Na Câmara, os deputados tentam reduzir as despesas obrigatórias, mas também estão em busca de fontes que viabilizem um estímulo fiscal. Começou a deixar de ser tabu entre deputados liberais o uso das reservas internacionais e, agora, a questão passou a ser como se pode utilizar parte desses cerca de US$ 386,8 bilhões.

“Temos que discutir todas as hipóteses sem preconceito. Alguma coisa precisa ser feita”, diz um líder que sempre foi radicalmente contra o uso das reservas em políticas anticíclicas. Ele pediu aos técnicos do seu partido que analisassem o assunto com cautela.

O que pensa a mídia – Editoriais

- Os editoriais de hoje:

Mais fogo na cena global – Editorial | O Estado de S. Paulo

O ataque incendiário a uma refinaria saudita, seguido de um salto do preço do petróleo, é mais um componente, especialmente inquietante, de um cenário carregado de riscos geopolíticos, tensões comerciais, ameaças protecionistas, recuo nas trocas, perda de vigor de grandes economias e focos de insegurança financeira.

A alta de preços baterá no Brasil se a crise do petróleo se prolongar e os aumentos forem repassados sem demora ao mercado interno. Será de novo testada, nesse caso, a capacidade da Petrobrás de administrar custos e preços com prudência e sem distorção política. Ou, na melhor hipótese, o mercado internacional logo se acomodará e a nova ameaça será superada. Mas o quadro geral continuará complicado e sombrio, com muitas bombas perto de explodir. Dirigentes e técnicos do Banco Central (BC) têm apontado os perigos. Quem mais, em Brasília, percebe o conjunto de riscos?

Com vendas em queda para vários grandes mercados, como Ásia, União Europeia e Mercosul, o Brasil já contabiliza perdas comerciais importantes, num ambiente de baixo crescimento econômico, demanda fraca e queda de preços de commodities importantes, como a soja.

De janeiro a agosto a exportação de bens proporcionou receita de US$ 148,85 bilhões, 5,2% menor que a de um ano antes pela média dos dias úteis. As vendas para os Estados Unidos, no valor de US$ 19,70 bilhões, com aumento de 10,9%, foram a exceção mais notável, mas também a economia americana mostra enfraquecimento.

Poesia | Vinícius de Moraes - Amigos

Tenho amigos que não sabem o quanto são meus amigos.
Não percebem o amor que lhes devoto e a absoluta necessidade que tenho
deles. A amizade é um sentimento mais nobre do que o amor,
eis que permite que o objeto dela se divida em outros afetos,
enquanto o amor tem intrínseco o ciúme, que não admite a rivalidade.
E eu poderia suportar, embora não sem dor,
que tivessem desaparecidos todos os meus amores,
mas enlouqueceria se desaparecessem todos os meus amigos!
Até mesmo aqueles que não percebem o quanto são meus amigos
e o quanto minha vida depende de suas existências ...
A alguns deles não procuro, basta-me saber que eles existem.
Esta mera condição me encoraja a seguir em frente pela vida.
Mas, porque não os procuro com assiduidade,
não posso lhes dizer o quanto gosto deles.
Eles não iriam acreditar.
Muitos deles estão lendo esta crônica e não sabem
que estão incluídos na sagrada relação de meus amigos.
Mas é delicioso que eu saiba e sinta que os adoro,
embora não declare e não os procure.
E às vezes, quando os procuro,
noto que eles não tem noção de como me são necessários,
de como são indispensáveis ao meu equilíbrio vital,
porque eles fazem parte do mundo que eu, tremulamente construí,
e se tornaram alicerces do meu encanto pela vida.
Se um deles morrer, eu ficarei torto para um lado.
Se todos eles morrerem, eu desabo!
Por isso é que, sem que eles saibam, eu rezo pela vida deles.
E me envergonho, porque essa minha prece é, em síntese,
dirigida ao meu bem estar.
Ela é, talvez, fruto do meu egoísmo.
Por vezes, mergulho em pensamentos sobre alguns deles.
Quando viajo e fico diante de lugares maravilhosos,
cai-me alguma lágrima por não estarem junto de mim,
compartilhando daquele prazer ...
Se alguma coisa me consome e me envelhece
é que a roda furiosa da vida não me permite ter sempre ao meu lado,
morando comigo, andando comigo, falando comigo, vivendo comigo,
todos os meus amigos, e, principalmente,
os que só desconfiam ou talvez nunca vão saber que são meus amigos!
A gente não faz amigos, reconhece-os.

Música | Casuarina - Jackson do Pandeiro