quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

Opinião do dia: Johann Wolfgang von Goethe

Tal qual uma grande cidade, nosso mundo político e moral está minado por caminhos subterrâneos, porões e esgotos sobre cujas conexões e condições de ocupação ninguém parece refletir ou pensar; mas aqueles que sabem algo sobre isso acharão muito mais compreensível se aqui ou ali, agora ou depois, a terra se esboroa, a fumaça se ergue de uma fenda e se ouvem estranhas vozes.


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Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832) em carta à Johann Kaspar Lavater (1741-1801), antes da Revolução Francesa, citada por Hannah Arendt. “A promessa da Política”, p. 86, Difel, 2008.

Merval Pereira: Cármen deu o caminho

- O Globo

Cármen Lúcia colocou limites às pressões que vem sofrendo. Ao definir que o Supremo Tribunal Federal (STF) não pode se pautar por questões pessoais, e por isso seria apequenar a mais alta Corte do país rever a decisão sobre a prisão depois de julgamento em segunda instância devido à situação do ex-presidente Lula, a presidente Cármen Lúcia colocou limites às pressões que vem sofrendo para colocar o assunto na pauta.

Os advogados de Lula Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Martins mais uma vez explicitaram as pressões ao pedirem um habeas corpus preventivo antes mesmo que o acórdão do julgamento do TRF-4 tenha sido publicado, o que não é comum.

O vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Humberto Martins, negou o habeas corpus, afirmando que “não há plausibilidade do direito invocado, pois a possibilidade de execução provisória da pena encontra amparo na jurisprudência das cortes superiores”.

Nas explicações, os advogados de Lula usam argumentos políticos para justificar o que consideram a impossibilidade de o ex-presidente ir para a cadeia, como se dependesse da importância do condenado a decisão de cumprir a lei em vigor.

Hélio Schwartsman: De gambiarra em gambiarra

- Folha de S. Paulo

Gambiarras até funcionam, mas há riscos em utilizá-las. A instalação montada com recurso a peças improvisadas se torna menos segura e, na hipótese de uma sobrecarga, pode produzir fogo. O Brasil, por uma série de motivos, virou uma República das Gambiarras. O auxílio-moradia concedido a juízes é um bom exemplo.

Como magistrados não conseguem sensibilizar o Parlamento para aprovar todas as suas reivindicações salariais –a categoria já é a mais bem paga do serviço público e está entre o 1% com melhor remuneração em todo o país–, buscaram caminhos alternativos. A solução encontrada foi estender a todos os juízes uma verba indenizatória de R$ 4.377 mensais concebida para compensar servidores que precisam morar em cidades diferentes daquela em que têm residência.

A coisa começou até discretamente, com uma ação movida por juízes federais. Em 2014, o ministro Luiz Fux, do STF, concedeu-lhes o benefício em caráter liminar, mas a prebenda rapidamente se universalizou, abrangendo todos os magistrados e membros do Ministério Público. Estima-se que a farra já tenha custado R$ 5 bilhões.

Elio Gaspari: O Judiciário resolveu ser réu

- O Globo

Promotores, juízes, desembargadores e ministros não aguentam o teste da lanchonete da rodoviária

O juiz Marcelo Bretas resolveu passar de símbolo da faxina das roubalheiras do Rio de Janeiro a ícone dos penduricalhos do Judiciário. Contrariando uma resolução do Conselho Nacional de Justiça e respondendo a um questionamento da Ouvidoria da Justiça Federal, cobrou num tribunal o seu auxílio-moradia e o de sua mulher, também juíza.

Bretas sempre morou no Rio, e o casal obteve um penduricalho de R$ 8.600 mensais. Num cálculo grosseiro, para pagar uma quantia dessas à Viúva, uma pequena empresa que pague impostos pelo regime de lucro presumido precisa faturar R$ 5 mil por dia.

Bretas não é o único juiz ou promotor beneficiado pelo penduricalho. A desembargadora Marianna Fux, dona de dois apartamentos no Leblon, também recebe auxílio-moradia. Seu pai, o ministro Luiz Fux, reteve por três anos no Supremo Tribunal Federal o processo que contesta a legalidade do mimo classista.

Míriam Leitão: Fora da pauta

- O Globo

Negativa do STJ ao habeas corpus complica ainda mais a defesa. O pedido de habeas corpus do ex-presidente Lula tinha que ser ao STJ, que é o revisor das decisões dos TRFs. A negativa complica mais a defesa. E pode ser mais longo do que parece o caminho até o plenário do Supremo para a revisão do entendimento do início da pena após condenação em segunda instância. Qualquer recurso de Lula ao STF vai para o ministro Edson Fachin e, depois, para a Segunda Turma.

A ministra Cármen Lúcia disse ao Poder 360 que revisar o entendimento para atender a uma pessoa determinada é “apequenar” o Supremo. Mas mesmo quem pensa diferente sabe que, por enquanto, não há prazo para que o Supremo Tribunal Federal analise o assunto. Fevereiro já tem pauta publicada. Para março, o Supremo ainda não tem pauta, exceto o polêmico tema do auxílio-moradia. Para que o assunto da segunda instância volte a ser discutido, será preciso haver algum tipo de preferência.

Em março, como se sabe, o TRF-4 deve julgar os embargos. Quem faz revisão das sentenças dos tribunais regionais não é o Supremo, mas o STJ. Se o ex-presidente recorrer ao STF com um pedido de habeas corpus, ele não irá ao plenário. Será decidido pelo ministro relator, Edson Fachin, e pode ir, em seguida, para a Segunda Turma. Se os embargos ao TRF-4 forem julgados no começo de março, só uma medida cautelar impediria a execução da pena.

Fernando Exman: A briga no centro do ringue já começou

- Valor Econômico

PSDB desperdiçou patrimônio eleitoral obtido em 2014

No dia 26 de outubro de 2014, o PSDB perdia novamente uma disputa presidencial para o PT - a quarta vez seguida desde que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva subira a rampa do Palácio do Planalto. O resultado obviamente não era comemorado entre os tucanos, mas virtualmente garantia ao partido um patrimônio eleitoral de 51.041.155 de votos. Em razão da crise econômica já instalada no país e do cataclismo político que se avizinhava, esse ativo era considerado por Aécio Neves e seus correligionários um importante trunfo para as eleições presidenciais deste ano. Essa expectativa, no entanto, até agora não se confirmou.

A candidatura do PSDB à Presidência da República tem dificuldades de decolar e é vista com desconfiança pelas forças políticas e empresariais que querem eleger um candidato de centro. O processo de autodepuração pelo qual o partido teve de passar depois de ter o seu então presidente e mais recente candidato à Presidência da República envolvido em um ruidoso escândalo político, somado à pulverização da atual disputa eleitoral, colocou o PSDB em desvantagem competitiva.

O partido corre contra o tempo. Antes da fragilização do PT em razão da condenação em segunda instância do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o PSDB já assistia ao deputado Jair Bolsonaro dividir a dianteira das pesquisas de intenção de voto, na frente de Geraldo Alckmin ou outro nome que pudesse empunhar a bandeira do partido na eleição. Agora, ciente dos desafios, o PSDB já começa a aceitar o seu novo tamanho e sinaliza ceder a aliados em praças estratégicas, como São Paulo, para manter vivo um projeto nacional. Sabe que precisa se esforçar para ser encarado, pelos demais partidos, como um dos principais polos da eleição presidencial. Só assim conseguirá adesões para ampliar o tempo de exposição de seu candidato no rádio e na televisão, importante arma numa campanha que será marcada pela restrição de verbas e novas regras de financiamento eleitoral.

Vera Magalhães: Huck em marcha

- O Estado de S.Paulo

Se Luciano Huck já havia demonstrado que não desistira do plano presidencial com a aparição no Domingão do Faustão, a condenação de Lula fez com que apertasse o passo. Huck não esteve com Guillaume Liegey, estrategista de Emmanuel Macron que visitou esta semana no Brasil para vender seus serviços a partidos e postulantes ao Planalto, mas emissários do apresentador estiveram com o francês.

Além disso, o global retomou a comunicação intensa com o PPS, cujo presidente, Roberto Freire, ainda sonha em lançá-lo.

Entusiastas da ideia argumentam que Lula deixou órfã uma fatia do eleitorado de classe média-baixa que atribuía ao petista uma melhora de vida experimentada em seu governo. Para essas pessoas, Huck pode ser visto, mais que políticos tradicionais, como alguém capaz de “mudar a vida” das pessoas.

O PPS seria uma incubadora adequada ao projeto, por ser um partido “anódino” o suficiente para receber movimentos como o Agora!, que dariam suposto lastro social a Huck.

O empresário não fará movimento explícito antes de abril. Não quer abrir mão do “contato semanal com 20 milhões de pessoas pela TV”, segundo um interlocutor, e vai observar se os demais candidatos do centro conseguem se firmar e empolgar o eleitorado.

Ranier Bragon: Sinais ao vento

- Folha de S. Paulo

A história mostra que alterações significativas nas pesquisas de intenção de voto tendem a se concentrar na reta final. Eleva-se o interesse do eleitor e entra em cena a propaganda na TV e rádio, ferramenta ainda essencial na disputa.

Pesquisa do Datafolha divulgada nesta quarta (31) traz sinais que devem ser cotejados com as armas que cada um terá nas semanas decisivas.

Os números reforçam uma hipótese: a de que, em uma eleição sem Lula, o eleitorado do ex-presidente caminhe em maior volume para Marina Silva (Rede) e Ciro Gomes (PDT).

Não há indicativo, porém, de que esse cenário se mantenha até a reta final. Mesmo combalidos, Lula e o PT investirão em candidato próprio, até por sobrevivência no Legislativo.

Vinte e sete por cento do eleitorado diz que votaria com certeza em um nome apoiado pelo ex-presidente. A não ser que opte por um improvável papel de coadjuvante, o PT deve ter um nome competitivo na urna, mesmo que hoje os seus planos B pareçam fadados a ser derrotados até em eleição a síndico de prédio.

Os políticos que almejam o selo de "candidato do centro" continuam com situação ruim. Geraldo Alckmin (PSDB), Henrique Meirelles (PSD) e Rodrigo Maia (DEM) ainda não empolgaram, sendo que os dois últimos ainda nem conseguiram sair da lona.

Roberto DaMatta: O julgamento

- O Estado de S.Paulo

Consciente do rebuscamento do falar jurídico, desembargador traduzia tudo para o português
Nos regimes democráticos, há o julgamento público, gravado, filmado e televisionado. Uma anormalidade produz uma crise; há um acusado que, tendo o direito de defesa, promove uma disputa a qual é levada a um juiz que, num julgamento aberto e invocando a lei, fecha o processo.

O antropólogo Victor Turner estudou as crises como “dramas sociais”. Os conflitos recorrentes que investigou entre os ndembu de Zâmbia levavam à segmentação e à uma indesejável perda de continuidade coletiva. Para Turner, processos agudos de disputa interna são marcados por quatro momentos interdependentes. O primeiro seria o da crise, quando comportamentos fogem das normas; o segundo é o do distúrbio por ela causada. O terceiro aciona tentativas de reparação e compensação do malfeito. Nesta etapa, entra em cena a turma do ‘deixa disso’ com o objetivo de mitigar os pontos de vista em colisão. Numa quarta e última fase, ocorreria rearranjo, concordância ou cisão. Um modificação das rotinas tradicionais ou o rompimento do grupo em duas comunidades.

Parece familiar, não?

Na ausência daquilo que o historiador inglês E. P. Thompson chamou de “the rule of law” - o domínio da lei -, são os incomodados que se mudam. Nas ditaduras, eles são presos ou eliminados como é comum nas crises sem a mediação de um juízo público englobador. Nos conflitos tribais investigados por Turner, a norma costumeira levava à bifurcação. Nas sociedades nacionais, a lei escrita e promulgada, aceita por todos e diretamente afastada dos conflitos, é invocada e pode até mesmo ser usada contra aqueles que detêm o poder - controle do contexto. O “domínio do fato”, como foi mencionado na condenação unânime e histórica do ex-presidente Lula - uma persona social dotada de um imenso “capital simbólico” para que ninguém diga que eu não gosto e não leio, além de Marx, Pierre Bourdieu.

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O julgamento foi extraordinário.

Pela primeira vez no Brasil, vimos desembargadores condenarem em segunda instância um ex-presidente da República. Assistimos a um drama que, depois de inúmeros inquéritos e vergonhosas descobertas de gorjeta, fechava a cortina, reafirmando um adormecido poder da lei aplicada a um representante máximo do poder e dos seus sequazes - aqueles que puseram a política a serviço do enriquecimento particular, em vez de se servirem dela para o enriquecimento público.

Na contramão dos axiomas do poder à brasileira, um ex-presidente emblemático da defesa dos oprimidos foi desmascarado e condenado, dissolvendo as ideologias nativas do “quanto maior menos cadeia”, do “você sabe com quem está falando” e do pós-moderno populismo no qual todos ganham, ninguém perde e nós (os donos do poder) ganhamos mais do que todos.

Ricardo Noblat: O caldeirão esquenta

- Blog do Noblat

O deputado Jair Bolsonaro já não parece mais com aquele que tanto medo metia nos demais aspirantes a candidato à sucessão de Temer. Tudo bem que pesquisa aplicada à tamanha distância do dia da eleição não passe de uma carta de intenção de voto.

Mas a carta registrada pelo Datafolha dá conta que Bolsonaro parou de crescer – e isso é muito ruim para ele, um quase sem partido, filiado a um insignificante, sem perspectivas de atrair algum mais graúdo, e condenado a não dispor de tempo de propaganda na tv.

Bolsonaro não só parou de crescer – oscilou negativamente em todos os cenários testados pelo Datafolha. Se disputasse o segundo turno contra Lula, perderia por uma diferença de 17 pontos percentuais. Contra Marina Silva, perderia por uma diferença de 10 pontos.

Se não puderem votar em Lula, 31% dos seus eleitores dizem que votarão em branco ou anularão o voto. Mas 15% passariam a votar em Marina, 14% em Ciro Gomes, 8% em Luciano Huck, 7% em Bolsonaro e 6% em Geraldo Alckmin.

Enquanto Bolsonaro perde fôlego, Alckmin patina em todos os cenários testados pelo Datafolha com percentuais que vão de 6% a 11%. O aspirante a candidato que periodicamente renova sua disposição em não ser, Huck, está na cola de Alckmin.

Imagine se até final de março próximo, com Alckmin devagar quase parando, Huck der o dito pelo não dito e anunciar que topa ser candidato, sim… O que será de Alckmin? É possível que na pesquisa seguinte acabe comendo a poeira provocada pelo caldeirão Huck.

A vida de Alckmin não está fácil. E não há sinais de que possa melhorar.

Sem Lula, Bolsonaro lidera e quatro disputam 2º lugar

Sem Lula, disputa por vaga no segundo turno se acirra

Bruno Boghossian / Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Em uma possível corrida presidencial sem Luiz Inácio Lula da Silva (PT), quatro candidatos disputariam uma vaga no segundo turno contra Jair Bolsonaro (PSC), de acordo com a primeira pesquisa do Datafolha após a condenação do petista em segunda instância.

Levantamento realizado na segunda (29) e na terça (30) mostra que o ex-presidente manteve vantagem sobre os rivais, com até 37% das intenções de voto. Seu eleitorado, porém, se pulveriza e a briga tende a se tornar acirrada caso ele seja barrado com base na Lei da Ficha Limpa.

Bolsonaro aparece em primeiro lugar no principal cenário sem Lula, com 18%. Ele supera Marina Silva (Rede), Ciro Gomes (PDT), Geraldo Alckmin(PSDB) e Luciano Huck (sem partido).

Marina lidera o segundo pelotão, com 13%. Ciro (10%), Alckmin (8%) e Huck (8%) estão tecnicamente empatados.

O Datafolha fez 2.826 entrevistas em 174 municípios. A margem de erro é de dois pontos para mais ou menos. A pesquisa foi registrada no Tribunal Superior Eleitoral com o número BR 05351/2018.

Apesar de liderar a corrida sem Lula, Bolsonaro parou de crescer. Ele oscilou negativamente em todos os quadros apresentados na pesquisa, em comparação com o levantamento de novembro.

No início de janeiro, reportagens da Folha revelaram que o patrimônio de Bolsonaro e de sua família se multiplicou depois que ele entrou na política, e que o deputado recebe auxílio-moradia da Câmara apesar de ser dono de apartamento em Brasília.

As intenções de voto do deputado também ficaram estáveis nas simulações de segundo turno. Ele seria derrotado tanto pelo ex-presidente Lula (49% a 32%) quanto pela ex-senadora Marina Silva (42% a 32%).

A pesquisa indica ainda que o ex-presidente Lula conserva força eleitoral mesmo condenado a 12 anos e 1 mês de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelo TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região).

O petista lidera o primeiro turno em todos os cenários em que seu nome é colocado, com percentuais que variam de 34% a 37%. No segundo turno, venceria Alckmin (49% a 30%) e Marina (47% a 32%), além de Bolsonaro.

A condenação de Lula pode torná-lo inelegível, mas sua participação na campanha depende de uma decisão do TSE que só deve ocorrer em setembro. Até lá, ele pode se apresentar como pré-candidato e recorrer a tribunais superiores para garantir seu nome na disputa.

A saída de Lula impulsionaria principalmente Marina e Ciro Gomes. Na comparação de cenários com e sem a participação do ex-presidente, Marina passa de 8% para 13%, enquanto Ciro cresce de 6% para 10%.

Presidente desafia oposição a criticar governo na eleição

Em nova estratégia, Michel Temer admite que examina ‘panorama eleitoral’ e faz discurso de candidato durante cerimônia em Goiás
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Gustavo Porto ENVIADO ESPECIAL / RIO VERDE (GO)
Vera Rosa / O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente Michel Temer adotou ontem nova estratégia e desafiou opositores a criticar ações de seu governo na campanha eleitoral deste ano, como as reformas do ensino médio e trabalhista e as medidas do ajuste fiscal.

Em uma cerimônia para produtores rurais, em Rio Verde, em Goiás, Temer admitiu que examina o “panorama eleitoral” e fez discurso de candidato, embora negue planos nesse sentido.

Nos bastidores, o Palácio do Planalto e a cúpula do MDB tentam viabilizar a candidatura do presidente a um novo mandato, mas tudo depende de como o cenário estará até o fim de março. A avaliação no governo é a de que, se a reforma da Previdência passar, não houver outro escândalo atingindo a gestão, a economia der mais sinais de recuperação e Temer conseguir reverter sua impopularidade, ninguém melhor do que ele próprio para defender o seu “legado”.

“Quem quiser opor-se ao que o governo fez ao longo deste ano e oito meses vai ter de dizer o seguinte: ‘Olha aqui, eu sou contra o teto dos gastos públicos porque eu quero gastar à vontade’”, disse o presidente, ao lançar ontem o programa de pré-custeio do Banco do Brasil da safra 2018/2019. “Quem quiser se opor ao governo vai ter de dizer ‘sou contra a reforma do ensino médio, sou por aquele ensino médio anacrônico e superado’ (...) Ou também ‘sou contra a modernização trabalhista, cujo objetivo é trazer empregos para o nosso país’.”

Barbosa não tem garantia no PSB, afirma França

Fabio Leite, Marianna Holanda, Leonardo Augusto / O Estado de S. Paulo.

BELO HORIZONTE - O vice-governador de São Paulo, Márcio França, disse ontem que uma eventual filiação do ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa ao PSB seria “uma honra”, mas não significa que ele seria automaticamente escolhido como candidato do partido à Presidência neste ano.

“Joaquim Barbosa ser filiado ao meu partido é uma honra para mim e para o meu partido, mas ele não vai poder entrar dizendo ‘eu vou só se for ser candidato a presidente’”, disse França em entrevista à Rádio Bandeirantes.

O Estado informou ontem que uma ala do PSB prepara ofensiva para viabilizar a candidatura de Barbosa ao Planalto.

O apoio ao ex-ministro do STF, no entanto, não é unânime dentro do partido. O diretório do PSB de Minas divulgou nota ontem na qual afirmou não integrar movimento interno neste sentido. O presidente do PSB/MG, João Marcos Grossi, afirmou que a nota publicada na semana passada, na qual o partido saúda uma eventual filiação de Barbosa, “foi um gesto de cortesia” e não faz menção a uma eventual candidatura.

No comunicado divulgado ontem, o diretório estadual afirma que “não faz parte de qualquer movimento interno para apoiar eventual candidatura do ex-ministro Joaquim Barbosa” à eleição presidencial.

São Paulo. No partido, França, que deve assumir o governo em abril, quando Geraldo Alckmin (PSDB) deixar o cargo para se candidatar à Presidência, é um dos principais defensores do apoio do PSB ao tucano.

Ontem, Alckmin afirmou que a questão nacional e o cenário em São Paulo são independentes. “Não depende uma coisa da outra”, afirmou em evento na Secretaria de Fazenda.

"Quanto mais candidatos, melhor", diz Cesar Maia

Estevão Taiar | Valor Econômico

SÃO PAULO - A condenação em segunda instância do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva abre espaço para o surgimento de novas candidaturas de centro, diz o ex-prefeito do Rio de Janeiro, hoje vereador, Cesar Maia (DEM-RJ). Cesar é pai do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), apontado como um dos possíveis candidatos de centro na disputa presidencial deste ano.

Em entrevista ao Valor por e-mail, Cesar Maia repete o discurso do filho e diz que "o foco dele (Rodrigo) são as reformas, e não eleição". Mesmo assim, admite que, caso Lula realmente não dispute a eleição, "terminou a necessidade de buscar um nome aglutinador pelo centro". Sem o ex-presidente na disputa, diz, "não há mais polarização radical" com o segundo colocado nas pesquisas, o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ). "Quantos mais candidatos, melhor para todos", afirma.

A derrota de Lula por 3 a 0 no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) na semana passada era esperada por Cesar Maia. "Foi uma missa anunciada", diz.

Na seara eleitoral, os mais prováveis concorrentes de centro que Rodrigo Maia teria na disputa pela Presidência, pelo menos por enquanto, seriam o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles (PSD).

Com Meirelles, a disputa começou ainda antes, a respeito de quem pode ser o defensor e herdeiro da retomada econômica que o governo do presidente Michel Temer quer deixar como legado.

Cesar Maia é cético em relação aos pontos fortes de Meirelles. "Pontos fortes só se em agosto a curva [de Temer] for a mesma de Itamar Franco no mesmo período de 1994", diz, citando o ex-vice-presidente também transformado em presidente que, com a implantação do Plano Real, conseguiu eleger o seu então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso.

Já Alckmin é visto pelo ex-prefeito como alguém com a "capacidade de aglutinação". Deputado mais votado do Rio de Janeiro nas últimas eleições, Bolsonaro, por sua vez, tem como ponto forte a "antipolítica populista". "Forte, claro, para ele", afirma.

Manuela reafirma candidatura

Por Sérgio Ruck Bueno | Valor Econômico

PORTO ALEGRE - Pré-candidata à Presidência da República pelo PCdoB, a deputada estadual Manuela D'Ávila, do Rio Grande do Sul, afirma que uma aliança entre os partidos de esquerda pode não ser "possível" nem "desejável" na eleição presidencial deste ano. Afirma, no entanto, que eles precisam estabelecer um "diálogo" para enfrentar a "eleição diferente" que se aproxima com a possibilidade de o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ficar de fora da disputa após a condenação pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) e espera que a multiplicidade de candidatos, "conjuntamente", impeça que a eleição se defina no primeiro turno e garanta vaga para um deles no segundo.

O ingresso de Manuela, assim como de Ciro Gomes, do PDT, na corrida presidencial reflete a janela de oportunidade aberta com a possível saída de Lula do páreo e o provável enfraquecimento do PT caso o partido tenha que optar por outro nome. Neste cenário, siglas que antes se aliavam aos petistas ou ficavam bem atrás deles nas eleições têm a chance de buscar um espaço mais relevante na briga pela hegemonia à esquerda. O quadro deve se completar com o PSOL, que pode entrar na disputa com o presidente do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos.

"Não cogito a hipótese de deixar de registrar a minha candidatura porque hoje este não é o ambiente político do meu partido", garante a deputada. "Hoje a nossa militância e o nosso partido estão muito mais entusiasmados do que quando lançamos [a pré-candidatura], em novembro", reforça.

Incógnita mantida: Editorial/Folha de S. Paulo

A condenação em segunda instância do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), na quarta-feira (24), em pouco alterou o cenário de intenções de voto que havia sido apurado pelo Datafolha no final de novembro de 2017.

Na nova sondagem, que foi a campo após a decisãodo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o petista continua a liderar em todas as simulações de primeiro e segundo turnos.

Lula, em razão da sentença proferida por um colegiado, tende a ser impedido de concorrer ao pleito, em razão da Lei da Ficha Limpa –mas, enquanto não houver um pronunciamento do Tribunal Superior Eleitoral acerca da situação, continuará apto a apresentar-se como postulante ao cargo.

Embora a pesquisa apresente oscilações nos percentuais anteriormente verificados, elas não alteram essencialmente o quadro.

Estagnado, Jair Bolsonaro (PSC) mantém-se como segundo nome nas preferências. Continua à frente no cenário mais plausível apresentado aos eleitores, sem a presença de Lula –seguido por Marina Silva (Rede), Ciro Gomes (PDT), Geraldo Alckmin (PSDB) e Luciano Huck (sem partido).

Perigo real e imediato: Editorial/O Estado de S. Paulo

Consciente de que ainda não tem os votos necessários para fazer passar no Congresso a reforma da Previdência mesmo em sua versão mais desidratada, a despeito da inquestionável necessidade de aprová-la, o governo decidiu subir o tom de suas advertências sobre os riscos reais que o País corre no curtíssimo prazo se tudo ficar como está. E faz muito bem, pois deve ficar muito claro para todos de quem será a responsabilidade caso o sistema entre em colapso, como inevitavelmente acontecerá em breve sem a reforma, tornando-se impossível honrar o pagamento de parte dos benefícios previdenciários.

O aumento de R$ 41,9 bilhões no déficit da Previdência em um ano, fechando em R$ 268,8 bilhões em 2017, está sendo usado pelo governo como argumento inapelável na sua nova tentativa de chamar à razão os deputados que ainda não se convenceram da necessidade de reformar o sistema.

É certo que não se deve perder tempo com parlamentares que são contrários à reforma da Previdência por questões puramente ideológicas, pois estes não estão preocupados com o País, mas somente com os projetos de poder das organizações políticas das quais são soldados. Com estes, não há argumento racional que funcione nem negociação que leve a bom termo, pois quem diz que não há déficit na Previdência não pode ser levado a sério. Já os parlamentares que se dizem contrários à reforma porque temem perder votos ainda podem ser convencidos de que muito pior do que ser mal compreendido por alguns eleitores é ver-se vinculado a uma decisão legislativa que provoque a “situação catastrófica de se cortar benefícios” previdenciários, como alertou, em entrevista ao Estado, o economista Paulo Tafner, especialista em Previdência.

Não é sustentável a melhoria fiscal: Editorial/O Globo

Diante do descalabro nas contas públicas, o resultado de 2017 chega a ser heroico, embora também tenha sido um déficit. Mas o relativo êxito é tópico, devido à Previdência

Se forem considerados o tamanho da crise fiscal e sua evolução, principalmente a partir de 2015, a recuperação relativa das contas públicas no ano passado chega a ser heroica. Embora, dada a gravidade do quadro, a União tenha encerrado mais um ano com um déficit bilionário, de R$ 124,4 bilhões, ele foi R$ 34,6 bilhões inferior à meta de R$ 159 bilhões.

O feito tem vários aspectos relevantes. Um deles, que o esforço de contenção de gastos do governo foi recompensado. Outro, que chegaram em bom momento receitas extraordinárias — de leilões de hidrelétricas e na área de petróleo, e o Refis. Sendo oportuno comentar, no entanto, que são receitas, como diz o termo, que não se repetem no futuro. Portanto, para que seja mantido sob controle o quadro fiscal, elas precisam ser substituídas por imposto, outras rendas extras ou corte de gastos.

Seja como for, o horizonte deste ano ficou bem mais claro. A ponto de o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, ontem, no evento “E Agora, Brasil?”, promovido pelo GLOBO, ter demonstrado relativa despreocupação com o cumprimento em 2018 da regra de ouro — é vetado pela Constituição emitir títulos de dívida para financiar gastos de custeio.

Dúvidas sobre benefícios da desoneração da folha: Editorial/ Valor Econômico

Foi um sucesso a desoneração da folha de pagamentos adotada pelo governo federal em 2011 como uma forma de estímulo ao crescimento? E se foi bem avaliada a iniciativa não seria o caso de ser retomada essa proposta em um momento em que o país começa a se recuperar da mais séria recessão da sua história? O debate é oportuno porque há uma proposta no Congresso à espera de definição.

Existem, na verdade, muitas dúvidas sobre o acerto da Lei número 12.546/2011. Um texto para discussão recentemente divulgado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), escrito por Felipe Garcia, Adolfo Sachsida e Alexandre Xavier Ywata de Carvalho, avança no debate sobre a oportunidade e possibilidade de repetição do mesmo projeto ou algo semelhante.

Os autores do levantamento concordam que "o custo do fator trabalho é amplamente atribuído como entrave central para a ampliação do dinamismo e da competitividade da economia brasileira". Por isso, seria, em princípio, positiva em termos de impulso ao crescimento "a realocação da contribuição patronal à Previdência da folha de salários para folha de receitas - com implementação de uma alíquota não neutra em termos de arrecadação".

Vinicius Torres Freire: Banco estatal derruba o crédito

- Folha de S. Paulo

Os bancos estatais foram responsáveis por 99% da redução do crédito no ano passado. O BNDES sozinho causou a baixa de 74% do total de empréstimos.

Encolher o BNDES é uma política deliberada dos economistas de Michel Temer. O banco ficou menor também porque as empresas pediram menos empréstimos, obviamente por causa da recessão e da falta de perspectivas de crescimento acelerado.

Além do mais, acabou a mamata de empréstimos concedidos a taxas de juros negativas ou, de qualquer modo, subsidiados além da conta, o que por vezes financiava indiretamente até a distribuição de dividendos pelas empresas.

Em 2015 e 2016, o total de dinheiro emprestado pelo BNDES (estoque de crédito) diminuiu mais de R$ 140 bilhões. Mas o banco não ficou pequeno.

O bancão de desenvolvimento ainda tem 17,5% do total dos empréstimos bancários do país. É o mesmo tamanho de 2009, penúltimo ano do governo Lula 2, quando se começava a inflar o banco a fim de combater uma crise econômica que, enfim, já acabava (foi a breve e rasa recessão causada pela crise financeira mundial de 2008).

Cevado sob Dilma Rousseff, o banco serviria muita vez para facilitar a criação de oligopólios, a fusão de empresas avariadas por incompetências financeiras grosseiras na crise de 2008 e para financiar também projetos ruins do nacional-empresismo petista. No auge, início de 2015, chegou a ter 21,5% do estoque de empréstimos.

Cristiano Romero: A volta do Brasil ao baixo crescimento

- Valor Econômico

História mostra que PIB só acelerou depois de reformas

Nas duas últimas décadas do século passado, depois de experimentar, por quase 30 anos, as taxas mais altas de expansão do mundo, a economia brasileira passou a crescer em ritmo lento, desolador para as necessidades de um país com indicadores de pobreza e desigualdade tão elevados. Na década de 1990, mesmo crescendo pouco, superou a inflação crônica e deu os primeiros passos rumo à construção de uma economia competitiva graças ao início da abertura comercial, ao fim dos monopólios estatais, ao aumento da escolaridade da população, às privatizações e à adoção de certa disciplina fiscal. Olhando em perspectiva, é possível dizer que as reformas do período anterior criaram as condições para a aceleração do crescimento na primeira década do século atual. Saímos de algo em torno de 2% para pouco mais de 4% ao ano.

Alguns analistas afirmam que o Brasil aumentou o ritmo de expansão entre 2004 e 2010 graças ao boom da economia mundial, liderado pela China. É verdade que o mundo ajudou, mas o país não teria tirado proveito daquele momento não fossem as reformas da década anterior e se o governo da ocasião tivesse adotado políticas equivocadas. De 2003 a 2006, o governo Lula surpreendeu ao se comprometer com políticas responsáveis tanto na área fiscal quanto monetária. Mesmo tímido no quesito reformas - aprovou apenas a da previdência do setor público e, ainda assim, não a implementou totalmente -, ensejou confiança nos empresários, que começaram a investir e a contratar trabalhadores.

Monica de Bolle*: Estado da União

- O Estado de S.Paulo

O discurso ultrapassado anti-imigração é a outra faceta do protecionismo comercial

Requer a Constituição americana que os chefes de Estado descrevam todo início de ano a situação do país e elaborem a agenda legislativa dos meses seguintes. O discurso conhecido como o “State of the Union Address” e proferido no Congresso é ocasião das mais solenes no calendário político dos EUA. Quando este artigo estiver nas páginas do Estado, Trump terá feito seu primeiro State of the Union na noite anterior.

O discurso, este ano intitulado “Construindo uma América segura, forte e orgulhosa”, terá quatro eixos fundamentais, alguns parcialmente elaborados durante a fala de Trump em Davos na última semana. O primeiro eixo é a economia americana, em particular a solidez da recuperação e os esforços que o governo tem feito para trazer investimentos para os Estados Unidos e melhorar o ambiente de negócios. A reforma tributária aprovada em dezembro de 2017 – e sobre a qual já escrevi nesse espaço ,– além de medidas para desmontar regulações tidas como excessivas, muitas erguidas no governo Obama, têm sido exaltadas como os pilares da recuperação econômica e da queda do desemprego iniciados em 2009.

O segundo eixo do discurso é a infraestrutura, que, verdade seja dita, está mesmo em frangalhos para padrões norte-americanos. Como o plano trilionário para reconstruir pontes, estradas e ferrovias não tem financiamento garantido, e os cortes de impostos da recente reforma tributária tampouco estão cobertos, as duas medidas em conjunto deverão elevar consideravelmente o déficit e a dívida pública, o que poderá descarrilar a recuperação atual mais à frente.

STJ nega pedido de Lula para tentar evitar prisão

Cármen Lúcia diz que não retomará análise sobre execução de pena em 2ª instância

‘O Supremo não se submete a pressões’, diz presidente do STF sobre a possibilidade de voltar a discutir o assunto agora; advogado do petista tentou obter habeas corpus preventivo

Em um mesmo dia, o ex-presidente Lula teve um duplo revés em sua tentativa de evitar ser preso após ter sido condenado por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex do Guarujá. No Superior Tribunal de Justiça, o ministro Humberto Martins negou habeas corpus pedido pelo petista. No STF, a ministra Cármen Lúcia afastou qualquer possibilidade de pôr na pauta o processo que poderia mudar o entendimento da Corte sobre a prisão de condenados em 2ª instância. “O Supremo não se submete a pressões para fazer pautas. A questão foi decidida em 2016 e não há perspectiva de voltar ao assunto”, disse.

O nó de Lula

STJ nega habeas corpus para petista, e Cármen diz que não vai pautar prisão após 2ª instância

Carolina Brígido, Daniel Gullino e Gabriela Viana / O Globo

-BRASÍLIA E RIO- Em um só dia, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu duas más notícias das mais altas cortes do país. Enquanto a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, anunciou que não cogita pautar a votação sobre prisões após condenações em segunda instância, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou um pedido de habeas corpus feito pela defesa do petista.

Condenado na semana passada a 12 anos e um mês de prisão pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), Lula tem especial interesse na pauta que agora não está mais nos planos de Cármen — embora um dos ministros ainda possa levar o caso ao plenário, o que não é muito comum. Se o Supremo não voltar a discutir o assunto, vale o entendimento atual de que réus condenados à prisão por um colegiado de juízes devem esperar seus recursos a cortes superiores atrás das grades.

— Em primeiro lugar, o Supremo não se submete a pressões para fazer pautas. Em segundo lugar, a questão foi decidida em 2016 e não há perspectiva de voltar a esse assunto — afirmou Cármen Lúcia ao G1.

Ao site Poder 360, a ministra afirmou que um caso específico não pode gerar uma pauta diferente no STF, e que isso “apequenaria a Corte” (leia mais na reportagem abaixo). Já no STJ, o ministro Humberto Martins, vicepresidente da Corte, negou ontem o habeas corpus pedido pela defesa de Lula em relação à condenação por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex do Guarujá. 

STJ nega 1º pedido para evitar prisão de Lula

Decisão. Habeas corpus preventivo ajuizado pelos advogados do ex-presidente foi negado por Humberto Martins, do Superior Tribunal de Justiça; defesa quer afastar inelegibilidade

- O Estado de S. Paulo.
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O ministro Humberto Martins, do STJ, negou ontem pedido de habeas corpus preventivo feito pela defesa do ex-presidente Lula e argumentou que não há imediata ameaça de início da execução da pena imposta pelo TRF-4. Os advogados também pediram que a Corte afaste a “situação de inelegibilidade” do petista. Lula foi condenado a 12 anos e 1 mês de prisão no caso do triplex do Guarujá.

A defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sofreu ontem a sua primeira derrota em uma Corte superior após a condenação em segunda instância no caso do triplex do Guarujá (SP). Os advogados do ex-presidente ajuizaram um habeas corpus preventivo no Superior Tribunal de Justiça (STJ) com pedido de liminar para evitar a prisão do petista. O ministro Humberto Martins, porém, indeferiu a solicitação com o argumento de que não há imediata ameaça de início da execução da pena imposta pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4).

Na semana passada, a 8.ª Turma da Corte com sede em Porto Alegre confirmou a sentença do juiz federal Sérgio Moro – responsável pela Lava Jato na primeira instância, em Curitiba, que condenou Lula por corrupção passiva e lavagem de dinheiro – e ampliou a pena para 12 anos e 1 mês de prisão.

Assim como Moro, os desembargadores federais entenderam que o triplex no Edifício Solaris e suas respectivas reformas custeadas pela OAS representam propinas de R$ 2,2 milhões ao petista. A decisão determina o início da execução da pena de prisão, em regime fechado, após esgotado seu único recurso ao TRF-4 – os embargos de declaração.

O mérito do habeas corpus apresentado pela defesa de Lula agora será avaliado pela 5.ª Turma do STJ, sob relatoria do ministro Felix Fischer.

PT ataca declaração de Cármen Lúcia sobre revisão de prisão após 2ª instância

Deputado Wadih Damous diz que a ministra ‘fala por ela própria’ e o STF ‘já se apequenou’

Catarina Alencastro / O Globo

BRASÍLIA - O PT criticou a declaração da ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), de que a corte iria se "apequenar" se aproveitasse este momento pós-condenação do ex-presidente Lula em segunda instância para revisar o entendimento do próprio Supremo de que a pena deve ser cumprida após esgotada essa fase. O posicionamento foi classificado como "político" por membros do partido, e a ministra chamada de "inepta" por não ter pautado o assunto antes.

Para o deputado e jurista Wadih Damous (PT-RJ), a ministra não representa o colegiado ao proferir essa opinião. Segundo ele, a corte tomou uma decisão inconstitucional ao determinar o pronto início da pena após um julgamento em segunda instância. Para ele, a Constituição é clara em afirmar que apenas quando esgotados todos os recursos possíveis é que o réu pode ser preso.

— O Supremo já se apequenou. A ministra fala por ela própria, ela não representa o colegiado. O Supremo decidir que não deve ser cumprida a pena antes do último recurso é o que diz a Constituição, e o Supremo é o interprete da Constituição. Pequeno é quem não respeita a Constituição — diz Damous.

Defesa de Lula pede habeas corpus no STJ para evitar prisão

Objetivo é garantir que ex-presidente aguarde em liberdade julgamento de recursos

Por Daniel Gullino / Gabriela Viana / Carolina Brígido / O Globo

BRASÍLIA E RIO — A defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva entrou com pedido de habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para que ele não seja presomesmo após a análise do recurso no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que, na semana passada, confirmou a condenção do petista por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A orientação do Supremo Tribunal Federal (STF) é de que as penas comecem a ser cumpridas após a condenação por um tribunal de segunda instância.

Além de confirmar a condenação de Lula, o TRF-4 aumentou a pena do ex-presidente para 12 anos e 1 mês de prisão. O petista tem direito a recurso nesse tribunal, mas apenas para esclarecer pontos da sentença. Segundo os desembargadores do TRF-4, ele pode ser preso logo após a análise desse instrumento. No pedido de habeas corpus apresentado nesta terça-feira, porém, os advogados de Lula defendem que ele só poderia ser preso após esgotadas as possibilidades de recurso em instâncias superiores (STJ e STF).

No habeas corpus, os advogados alegam que o cumprimento antecipado da pena é incompatível com o artigo 5º da Constituição Federal, segundo o qual “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Além disso, a defesa afirma que o STF deve analisar novamente o tema em breve.

Os representantes legais de Lula também alegam que uma eventual prisão irá influenciar nas eleições presidenciais, já que o petista anunciou sua pré-candidatura e está liderando as pesquisas de intenção de voto. O documento é assinado pelos advogados Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Martins.

“A privação de sua liberdade no período de campanha (ou pré- campanha) eleitoral, consideradas as credenciais acima referidas, configurar-se-ia em um prejuízo irreversível ao exercício da democracia no país – que pressupõe o debate de ideias muitas vezes antagônicas entre si. Garantir liberdade de trânsito e voz a alguém que representa tantos brasileiros, especialmente neste período de conflagração sócio-política que se atravessa”, diz o texto.

Lula usa declarações de Gilmar para evitar prisão

Em habeas corpus ao Superior Tribunal de Justiça, defensores do ex-presidente lembraram que ministro do Supremo sinalizou 'mudança de entendimento' para permitir que execução da pena se dê apenas após o 'esgotamento da jurisdição' do STF

Luiz Vassallo, Julia Affonso, Rafael Moraes Moura, Amanda Pupo e Ricardo Galhardo/ O Estado de S. Paulo

Em habeas corpus ao Superior Tribunal de Justiça, a defesa do ex-presidente Lula ressalta a possibilidade de ministros do Supremo Tribunal Federal mudarem seu entendimento, ainda em 2018, a respeito da execução de penas após sentenças de segunda instância. Entre o rol de justificativas da defesa para que o petista não seja preso, os defensores lembram que o ministro Gilmar Mendes sinalizou possível mudança de seu entendimento sobre o tema.

O ex-presidente foi sentenciado a 9 anos e 6 meses pelo juiz federal Sérgio Moro, que entendeu serem o triplex 164-A, no condomínio Solaris, e suas respectivas reformas, propinas de R$ 2,2 milhões da construtora OAS. A pena não apenas foi confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, como também aumentada pelos desembargadores para 12 anos e 1 mês.

Ao condenar Lula, desembargadores pediram para que a pena seja executada após esgotados os recursos no âmbito da Corte de apelações da Lava Jato. Em razão da unanimidade da condenação no TRF-4, cabe à defesa de Lula, naquela instância, embargos declaratórios, recurso por meio do qual se questiona obscuridades nos votos dos desembargadores.

Contra a possibilidade de prisão após a sentença do Tribunal da Lava Jato, o ex-presidente entrou com habeas ao Superior Tribunal de Justiça – o recurso está sob relatoria do ministro Félix Fischer. Os advogados querem que Lula recorra em liberdade até que sejam esgotados todas as apelações em Cortes Superiores.

O Supremo Tribunal Federal decidiu, em outubro de 2016, manter a possibilidade de execução de penas – como a prisão – após a condenação pela Justiça de segundo grau e, portanto, antes do esgotamento de todos os recursos. Por 6 votos a 5, a Corte confirmou o entendimento em um julgamento que deverá ter efeito vinculante para os juízes de todo o País.

Há uma semana, Cármen Lúcia admitia pautar prisões em 2ª instância

Com tendência a rever posição de 2016, STF está dividido sobre reavaliar a própria decisão

Carolina Brígido/ O Globo

BRASÍLIA - A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, cogitava, há uma semana, pautar para julgamento em plenário o processo que poderia reverter o entendimento da Corte sobre as prisões depois de condenação por um tribunal de segunda instância. Agora, disse que seria “apequenar muito o Supremo” voltar a analisar o assunto à luz de um caso específico — no caso, a condenação do ex-presidente Lula da Silva pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4).

A ministra não conversou sobre o assunto com outros colegas do STF. Mesmo que ela não inclua o processo na pauta, o assunto pode ser julgado. Um dos outros dez ministros pode levar ao plenário o habeas corpus de algum réu preso que peça para continuar recorrendo em liberdade de uma sentença de tribunal de segunda instância.

Resta saber se algum ministro estaria disposto a fazer isso. A prática não é muito comum na corte. Isso porque, sem a prévia concordância de outros ministros, poderia haver um pedido de vista, adiando a decisão para tempo indeterminado. Entre os integrantes do tribunal, há interessados no novo julgamento da causa. Para eles, a definição é necessária para evitar decisões díspares entre os ministros sobre um mesmo assunto.

STF adia revisão de prisão em 2º grau

Marco Aurélio diz que não vai pedir para Cármen pautar revisão de execução de pena; presidente da Corte descarta colocar tema em plenário

Rafael Moraes Moura, Amanda Pupo / O Estado de S. Paulo.

Marco Aurélio Mello, ministro do STF, disse que não vai cobrar que a presidente Cármen Lúcia paute revisão de execução de pena após condenação em segundo grau. Cármen descarta colocar tema em pauta.

O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse ao Estado que não vai cobrar a presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, para que inclua na pauta do plenário o julgamento de duas ações que tratam da possibilidade de execução da pena após condenação em segundo grau.

Anteontem, a ministra afirmou que usar o caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para revisar a decisão sobre prisão após a segunda instância seria “apequenar” o Tribunal.

“Não sei por que um caso específico geraria uma pauta diferente. (Analisar o tema por Lula) Seria apequenar muito o Supremo. Não conversei sobre isso com ninguém”, disse Cármen, em jantar promovido pelo site Poder360. Em entrevista à TV Globo ontem, Cármen afirmou que o Supremo “não se submete a pressões para fazer pautas” e a “questão foi decidida em 2016 e não há perspectiva de voltar a esse assunto”.

Fernando Pessoa: A parte do indolente

A parte do indolente é a abstrata vida.
Quem não emprega o esforço em conseguir,
Mas o deixa ficar, deixa dormir,
O deixa sem futuro e sem guarida,

Que mais haurir pode da morta lida,
Da sentida vaidade de seguir
Um caminho, da inércia de sentir,
Do extinto fogo e da visão perdida,
Senão a calma aquiescência em ter
No sangue entregue, e pelo corpo todo
A consciência de nada qu'rer nem ser,

A intervisão das coisas atingíveis,
E o renunciá-las, como um lindo modo
Das mãos que a palidez torna impassíveis.

Moacyr Luz e Banda - A Reza Do Samba

terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Opinião do dia: José Murilo de Carvalho

Valor: O que isso representa para a esquerda brasileira?

Carvalho: O fato de o PT, com, no mínimo, a aprovação de Lula, ter-se deixado atrair pelas práticas de malfeitos, causou um grande dano à esquerda e à política brasileira. País com o grau de desigualdade como o nosso precisa de um partido forte de esquerda que saiba promover reformas estruturais de redistribuição de renda. Aderindo a práticas anti-republicanas, contra suas próprias propostas iniciais, o PT desmoralizou a esquerda. Precisa reinventar-se, coisa que sua liderança atual não parece estar disposta a fazer

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José Murilo de Carvalho é historiador, cientista político e membro da Academia Brasileira de Letras. Entrevista ao jornal Valor Econômico, 29/1/2018.

Merval Pereira: Buscam-se ideias

- O Globo

O impasse generalizado que vivem os partidos políticos para a escolha de candidatos à presidência da República demonstra com clareza não apenas a falta de líderes, mas, sobretudo, a desimportância dos programas de governo no debate eleitoral.

Nem PT nem PSDB, partidos que polarizam a política nacional há mais de 20 anos, têm consistência programática que mantenha seus eleitores unidos em torno de ideias, fato que ficou encoberto esse tempo todo justamente devido à radicalização do confronto direto entre eles, que supostamente representam duas maneiras distintas de ver o mundo.

Quando o candidato tucano em 2006, o mesmo Geraldo Alckmin que deve voltar a disputar a presidência este ano, recuou na defesa das privatizações, foi-se a coerência partidária, escancarou-se a disputa do poder pelo poder numa ação mercadológica equivocada.

Assim como a coerência ideológica petista esvaneceu-se quando o partido operário que nasceu para fazer política de outra maneira revelou-se um velho usuário da corrupção como método político, desde o início da escalada a partir de municípios como o Ribeirão Preto de Palocci, com a licitação pública para “molho de tomate refogado, peneirado, com ervilhas", que era produzido por apenas uma empresa.

Ou a Santo André do prefeito Celso Daniel, assassinado por disputas internas no PT pela propina dos serviços públicos. Tanto PT quanto PSDB governaram o país com as mesmas alianças políticas, o que sugere que os partidos que os apoiaram também não tinham programas a serem seguidos, no máximo alguns se sentiam mais à vontade que outros apoiando os governos petistas ou tucanos, mas raros foram os que permaneceram em seu campo programático sem aderir às indecências do poder.

Não há dúvida de que o esquema corrupto montado pelo PT para controlar o Estado brasileiro e colocá-lo à disposição de seus interesses foi uma aberração poucas vezes vista em qualquer país do mundo.

Raymundo Costa: Entre a prisão e a candidatura

- Valor Econômico

O STF não deve ser casa de heróis, talvez de anti-heróis

A maior dificuldade à vista para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não é conseguir um habeas corpus para evitar a prisão, mas o deferimento do registro de sua candidatura. A defesa de Lula aos poucos descobre vias jurídicas para mantê-lo em liberdade ou tirá-lo da cadeia, caso ele venha a ser preso por uma ordem do Tribunal Federal de Recursos (TRF) da 4ª Região, após o julgamento dos recursos da defesa de Lula naquela instância (os tais embargos de declaração). Mais difícil será encontrar em Brasília algum juiz indiferente à opinião pública disposto a conceder-lhe uma superlicença para disputar a eleição presidencial de outubro.

A via mais fácil para Lula evitar a prisão seria o Supremo Tribunal Federal (STF) rever a decisão pela qual condenados em segunda instância do Judiciário podem começar a cumprir imediatamente a pena. Decisão para a qual muito contribuiu a impunidade do ex-senador Luiz Estevão, condenado a 31 anos, em 2006, mas que até 2016 ainda usufruia da liberdade, depois de recorrer pelo menos 36 vezes a instâncias judiciais. Luiz Estevão, por sinal se entregou logo depois da decisão e passou a cumprir pena na Penitenciária da Papuda, famosa depois de abrigar políticos condenados no escândalo do mensalão.

Para o Supremo rever esta decisão é necessário que a presidente do tribunal, ministra Cármen Lúcia, coloque a discussão em pauta. Ainda assim não é fava contada a mudança de posição do STF, muito embora alguns ministros tenham manifestado a intenção de mudar de voto. Caso específico de Gilmar Mendes, cuja opinião sobre o assunto tem evoluído ao longo do tempo. Em 2011, ele preferia apostar em medidas tomadas à época para esvaziar as cadeias. Depois, votou a favor do encarceramento após decisão da segunda instância. A decisão do tribunal foi tomada por 6 x 5. Ou seja, se Gilmar muda de lado, pode mudar a jurisprudência do STF.

Hélio Schwartsman: O lugar de Lula é a cadeia?

- Folha de S. Paulo

Não acho que a cadeia seja o lugar para Lula. Nem para Paulo Maluf e outros criminosos de colarinho branco, nem para milhares de pequenos traficantes ou autores de delitos que não envolvam violência física. Como já escrevi diversas vezes, o Brasil prende demais. O efeito mais notável dessa política é que gastamos muito (cerca de R$ 20 bilhões por ano) para fornecer mão de obra cativa para organizações criminosas como o PCC.

Mesmo sendo um entusiasta da redução das penas de prisão (que deveriam ser reservadas para criminosos violentos), vejo com preocupação as articulações para que o STF, a fim de evitar que Lula seja encarcerado, reveja a jurisprudência que permitiu a execução de sentenças após condenação em segunda instância.

Fazê-lo seria mais um passo desastroso na longa trilha de descaminhos cometidos pelo STF. Aliás, recomendo vivamente a quem ainda não leu o primoroso artigo de Conrado Hübner Mendes sobre o Supremo na última "Ilustríssima" que o faça.

Joel Pinheiro da Fonseca: Palavras versus atos

- Folha de S. Paulo

Discurso petista pede a violação da lei em prol de Lula. Por sorte, ninguém está disposto a realiza-lo

O discurso de defesa política de Lula como candidato envolve necessariamente afirmar uma conspiração de todo o Judiciário, toda a grande mídia e ainda grande parte dos partidos políticos. Exige também, a partir da semana passada, pedir a violação da lei em prol de um cidadão. Quem acreditasse e propusesse isso a sério não teria como participar normalmente da vida democrática do país, pois negaria frontalmente nossas instituições e defenderia, se possível, sua anulação na marra. Por sorte, embora muitos repitam esse discurso, ninguém está disposto a realizá-lo.

Esse é o sinal claro de que a polarização tem aumentado: a necessidade de negar as instituições normais da vida política e social -em particular a mídia, que é de onde vêm informações que não se pautam pela narrativa paranoica- para sustentar a própria posição.

O único jeito de fazer isso e preservar uma aura de justiça é enxergar, por trás delas, uma vontade maléfica e todo-poderosa em operação. No caso do lulismo, essa entidade é o "golpe", que já foi elevado em entidade metafísica que se transforma e age no tempo. O julgamento de Lula é mais um desdobramento do golpe.

José Casado: ‘Queridos companheiros’

- O Globo

Lula lamentou não poder reencontrar velhos amigos no fim de semana em Adis Abeba, líderes de dinastias cleptocratas que sustentam longevas ditaduras

Sem passaporte, Lula não pôde encontrar “companheiros” ditadores na África. Horas depois de ser condenado a mais de 12 anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, estava pronto para atravessar o Atlântico e participar de uma reunião sobre... a luta contra a corrupção. A viagem de dez mil quilômetros à Etiópia (14 horas em voo direto) foi abortada pela Justiça na sexta-feira. “Vejam que absurdo” — contou em video na página do PT. “Eu estava com a mala pronta, quando recebi um recado em casa: um juiz bloqueou o meu passaporte.”

Protestou: “Nós vivemos um momento de ditadura de uma parcela do Poder Judiciário, sobretudo o Poder Judiciário que cuida de uma coisa chamada Operação Lava-Jato, que vocês já devem ter ouvido falar aí na África.” Lula iria à cúpula da União Africana em Adis Abeba, capital de um país onde o “estado de emergência” é decreto recorrente, e a opinião pública não pode ser expressa nem em particular.

Queixou-se por não poder estar com “o querido companheiro” Hailemariam Desalegn, primeiro-ministro etíope, cuja polícia matou mil opositores nos últimos 16 meses e recolheu outros 21 mil a “campos de reabilitação” — informa a Human Rights Watch em relatório deste mês.

Carlos Andreazza: (O) Barba de molho

- O Globo

A matriz da insegurança jurídica galopante hoje no Brasil é o STF, fonte da instabilidade sobre a qual Lula se reinventa a ponto mesmo de raptar adversários para seu discurso

Então nos acercamos do momento decisivo em que a Justiça responderá ao cidadão brasileiro — sobre o mais visível dos casos — se tem mesmo, conforme acusam historicamente os petistas, seus privilegiados, se está ou não a serviço do establishment ; se é para todos ou não. Aqui, porém, o drama convida a ironia. Isso porque é Lula — o homem do povo — o sujeito cujo futuro, em 2018, dirá se, apesar da Lava-Jato, nada mudou; se as cortes superiores deste país continuarão rebolando, jurisprudência formada e reformada segundo o vento partidário na biruta, para que os poderosos assim permaneçam.

O porvir do ex-presidente esclarecerá se ele é ou não um poderoso; se é um dos intocáveis em função dos quais, fulanizadas, as leis se aparam; se é ou não, retórica popular à parte, um representante das elites contra as quais porção resistente de seus eleitores sempre votou. E aí? Tudo o mais constante, uma vez cumpridos os ritos recursais e de acordo com o entendimento corrente do Supremo Tribunal Federal: Lula será preso. Isso se as regras de hoje valerem amanhã. Alguém, entretanto, apostaria nisso? Com firmeza, alguém? Embora só agora o jornalismo tenha lançado a devida atenção ao movimento, faz meses — sempre com o destino do ex-presidente no radar — que o STF testa, em suas turmas, derrubar a jurisprudência que autoriza que um réu, uma vez condenado em segunda instância, possa ser preso.

A preparação do terreno foi — é — primorosa: depois de tatear a cancha, medindo a reação da sociedade frente à intenção, o tribunal de Cármen Lúcia ora simula uma dança de cadeiras, uma troca de convicções, Gilmar para um lado, Rosa Weber para outro, tudo para que, afinal, aquele que não havia participado da deliberação anterior, Alexandre de Moraes, pronuncie-se pela flexibilização da cousa, talvez de modo a subir um grau na exigência e condicionar — para que a prisão seja possível — a condenação em um segundo órgão colegiado; no caso de Lula, o STJ. Uma lambada para que escape da cadeia.

Eliane Cantanhêde: Sem preconceito

- O Estado de S.Paulo

Previdência, Eletrobrás e Embraer: não aos dogmas, sim ao debate real e maduro

Além das denúncias, da impopularidade e das quedas de braço com a Justiça, o presidente Michel Temer está decidido a enfrentar preconceitos e dar racionalidade aos debates sobre reforma da Previdência e pulverização de ações da Eletrobrás. A “combinação” Embraer-Boeing pode pegar carona na discussão. A ideia é resistir ao “não sei, não vi, não provei, mas não gostei”. Não é inteligente, não é razoável e não leva o Brasil a lugar nenhum. É preciso saber, ver, ouvir especialistas e versões divergentes para ser a favor ou contra, ou a favor só em parte.

“Reforma da Previdência? Sou contra.” Por quê? “Porque só prejudica os pobres.” Isso é efeito da campanha deseducativa, que finge estar defendendo “os pobres” quando, na verdade, embute a defesa de privilégios das carreiras mais bem pagas do Estado.

São elas, junto com partidos ditos de esquerda, que operam contra a reforma, não para proteger a aposentadoria e pensões de trabalhadores de baixa renda, mas sim aposentadorias de mais de R$ 30 mil de algumas categorias – caso de juízes e magistrados. A reforma é justamente para evitar que o sistema entre em colapso ao longo dos anos e a base da pirâmide – que é quem efetivamente precisa de aposentadoria – acabe ficando sem ela.

Luiz Carlos Azedo: A deriva para o centro

- Correio Braziliense

O PT fracassou porque o poder levou seus quadros à cooptação patrimonialista e à adesão ao programa que havia dado errado no governo Geisel

A crise ética, o impeachment de Dilma Rousseff e a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em segunda instância, a 12 anos e 1 mês de prisão em regime fechado, levaram a liderança petista a realizar um movimento de “esquerda, volver!”, na esperança de reagrupar forças para tentar sobreviver. Já não se trata de voltar ao poder, com Lula na Presidência, porque esse projeto se inviabilizou.

É sobrevivência mesmo, inclusive para alguns dos que mais se destacam na narrativa do “golpe” e da “fraude”, como a presidente do PT, senadora Gleisi Hoffman (PT-PR), e o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), que deverão deixar o Senado e disputar uma cadeira na Câmara. A estratégia é transformar Lula numa vítima da “ditadura do Judiciário”, organizar uma suposta “resistência democrática” e, com isso, reagrupar forças políticas e sociais, como o PSol e o MST, que haviam se descolado do projeto petista por seu “transformismo” numa “frente de esquerda” pela democracia entre aspas.

O conceito de “transformismo” foi cunhado por Karl Marx no livro O 18 de Brumário, de Luís Bonaparte, que analisa a crise política que levou à restauração da monarquia na França, no período que vai de 1848 a 1851. No calendário da Revolução Francesa, a data corresponde ao 9 de novembro do calendário gregoriano. Foi escrito nos meses de dezembro de 1851 e março de 1852, originalmente para um semanário político de Nova York, que fracassou com a morte prematura de seu editor, Joseph Weydemier. Os artigos foram publicados pela revista Die Revolution.

Nessa época, o jovem Marx, como nos mostra o filme em cartaz assim intitulado, sobrevivia dos recursos que ganhava como jornalista e escritor. O livro começa com uma frase que se tornou lugar-comum: “Hegel observa, em uma de suas obras, que todos os fatos e personagens de grande importância na história do mundo ocorrem, por assim dizer, duas vezes. E esqueceu-se de acrescentar: a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa”. Tem tudo a ver com o que está acontecendo com o PT.

Ricardo Noblat: Lula, deixe Marisa Letícia em paz!

- Blog do Noblat

Às favas todos os escrúpulos

O Instituto Lula e o PT convidam parentes, amigos e militantes em geral para a missa de um ano da morte da ex-primeira-dama Marisa Letícia a ser celebrada às 19h do próximo sábado na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo.

Ali o corpo de Marisa foi velado há um ano. Lula aproveitou a ocasião para transformar o velório num comício. À beira do caixão, proclamou que “os facínoras que fizeram isso contra ela” deveriam um dia ter “a humildade de pedir desculpas”.

Desde então, vez por outra, Lula responsabiliza direta ou indiretamente os agentes da Lava Jato pela morte da sua mulher. De fato, ela morreu porque teve um Acidente Vascular Cerebral (AVC) diagnosticado muitos anos antes. Não se cuidou. Ele arrebentou.

Marisa Letícia fumava muito, não fazia exercício e tinha medo do que pudesse ocorrer com seus filhos e com ela mesma. Reclamava da disposição do marido de defender-se confrontado a Justiça. Achava que ele deveria adotar uma postura mais discreta.

Para Lula, será irresistível aproveitar a missa de um ano da morte da mulher para reapresentá-la novamente como vítima da sanha dos seus perseguidores. E receber em troca a solidariedade dos que acreditam ou fingem acreditar em tudo o que ele diz.

Afinal, vale tudo para escapar da prisão e disputar a vaga de Temer. Vale até desrespeitar a memória da ex-mulher e a verdade em torno de sua morte. Vale mandar às favas todos os escrúpulos.

Míriam Leitão: Ainda no pântano

- O Globo

Quando os números começaram a melhorar na Secretaria do Tesouro, o governo nem pôde comemorar, porque já estava de olho nas dificuldades dos anos de 2018 e 2019. Mas foi um alívio verificar que o déficit do governo encolheu no final do ano. Ontem, o Tesouro divulgou que o rombo, previsto para ficar em R$ 159 bi, terminou o ano, como divulgado aqui no dia três de janeiro, mais de R$ 30 bilhões abaixo da meta.

Aqueda de 24,8% no rombo é uma boa notícia, mas o que a secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, chamou a atenção foi para o fato de que o país está com um déficit de 1,9% do PIB. Só não é tão ruim porque no ano anterior havia sido de 2,5% do PIB. Não é possível esquecer que o país está no quarto ano de resultados negativos e o desequilíbrio entre receita e despesa ficou em R$ 124 bilhões. E eles continuarão no vermelho por, pelo menos, mais quatro anos, segundo as estimativas das instituições financeiras consultadas pelo Banco Central no Boletim Focus.

O ano passado foi tão incerto que no começo, diante de muita queda de arrecadação, o governo propôs elevar a meta para R$ 159 bi. No final do ano, os números começaram a melhorar e terminaram em um resultado menor do que a primeira meta que fora alterada. O medo do descumprimento, que pareceu em determinado momento bem provável, é que levou à mudança, que se revelou desnecessária.