domingo, 22 de janeiro de 2023

Merval Pereira - Lula se impõe

O Globo

O presidente Lula, ao impor sua autoridade na demissão do comandante do Exército, Júlio Cesar de Arruda, foi ajudado pelo voluntarismo do ex-presidente Bolsonaro em relação ao que chamava de “meu Exército”. Notificado de que seria demitido, o comandante Arruda convocou o Alto Comando do Exército para queixar-se da decisão do presidente Lula. Não encontrou respaldo nos generais, que alegaram, entre outras coisas, que o ex-presidente Bolsonaro demitiu de uma só vez o ministro da Defesa e os três Comandantes das Forças Armadas, e não houve nenhuma reação.

A razão pela qual Bolsonaro demitiu os militares era até mesmo menos relevante que as razões de Lula agora. Naquela ocasião, Bolsonaro queria a adesão dos comandantes militares à suas ações políticas, e não aceitou que se pusessem em atitude neutra, profissional. Agora, ao contrário, o comandante Arruda negou-se a cumprir determinação do presidente, constitucionalmente comandante em chefe das Forças Armadas.

Bernardo Mello Franco - A conversa da pacificação

O Globo

Investigações mal começaram, mas ministro da Defesa já absolveu militares pelo 8 de Janeiro

O ministro da Defesa apresentou uma fórmula para evitar novos atos golpistas. Quer presentear os militares com mais tanques, aviões e submarinos. Na sexta-feira, José Múcio Monteiro levou os três comandantes ao Planalto. Na saída, prometeu abrir os cofres para Exército, Marinha e Aeronáutica.

“Lula foi o presidente da República que mais investiu nas Forças Armadas”, discursou o ministro. Pode ser, mas a crise que ameaça a democracia não tem nada a ver com a lista de compras da caserna.

Há duas semanas, extremistas invadiram as sedes dos Três Poderes e tentaram usar a força para reverter o resultado da eleição. O quebra-quebra contou com a omissão e a atuação de militares de diversas patentes. Após a depredação do patrimônio público, os bolsonaristas se refugiaram ao lado do Quartel-General. À noite, a polícia tentou prender os criminosos em flagrante. A ação esbarrou na resistência do Exército, que chegou a enviar blindados para proteger o acampamento.

Elio Gaspari - A anatomia de um golpe pifado

O Globo

Lula protegeu seu mandato na tarde do dia 8, ao refugar a proposta de decretação do expediente de Garantia da Lei e da Ordem

Na sua entrevista à repórter Natuza Nery, Lula mostrou que, por instinto, protegeu seu mandato na tarde do dia 8, ao refugar a proposta de decretação do expediente de Garantia da Lei e da Ordem, a GLO. Se ele aceitasse a proposta, mobilizaria as Forças Armadas para restabelecer a paz em Brasília. Depois disso, sabe-se lá o que aconteceria, mas esse era o caminho defendido também por pessoas que não gostam dele.

Há anos, Jair Bolsonaro sonhava com Apocalipses que chamariam a tropa. Às 17h10min do dia 8, o general da reserva Hamilton Mourão, ex-vice presidente e senador eleito pelo Rio Grande do Sul, escreveu: “Repito que o governo do Distrito Federal é responsável e, caso não tenha condições, que peça ao governo federal um decreto de Garantia da Lei e da Ordem.”

Quando Mourão ofereceu esse caminho, o Congresso, o Planalto e o Supremo Tribunal já haviam sido invadidos. O painel de Di Cavalcanti, esfaqueado, o relógio de D. João VI, atirado ao chão, e o armário do ministro Alexandre de Moraes, arrombado. Às 17h02min, a Agência Brasil informou que uma tropa do Batalhão da Guarda Presidencial estava chegando ao Planalto e o Choque da PM havia retomado o Supremo.

Dorrit Harazim - O desabrochar

O Globo

Ex-estagiária da Casa Branca conseguiu reerguer-se muito lentamente, sem trocar o nome que havia adquirido reconhecimento planetário

Mudando de assunto. Nesta semana, uma mulher madura de 49 anos reflete sobre o curso de sua vida, de sua história e da sociedade moderna que fez da humilhação alheia uma commodity. Por ocasião do 25º aniversário do escândalo que a arrancou brutalmente do anonimato, Monica Lewinsky faz uma avaliação serena de seu despertar para a ferocidade e a falta de alma humanas. Escreveu um texto sucinto de 25 tópicos para a Vanity Fair — única mídia que lhe estendera a mão quando ela mais precisava — e soa pacificada.

Recapitulando: em 1995, Monica era uma jovem californiana de 22 anos recém-saída da faculdade, que estagiava na Casa Branca. Apaixonou-se perdidamente pelo chefe sedutor, que, além de casado, também era o 42º presidente dos Estados Unidos — o democrata Bill Clinton. A tórrida relação clandestina, pontuada por nove encontros, durou 18 meses. Na manhã de 17 de janeiro de 1998, o affair explodiu no Drudge Report, um dos primeiros sites de política daqueles tempos. O escândalo reverberou com um mero clique no mundo inteiro, formando uma tempestade perfeita que juntava sexo e política.

Luiz Carlos Azedo - A tragédia Ianomami envergonha a nação

Correio Braziliense

Estima-se que 570 crianças foram mortas pela contaminação por mercúrio, desnutrição e fome. Além disso, em 2022 foram confirmados 11.530 casos de malária entre os Ianomâmis

Em março de 2014, o fotógrafo Sebastião Salgado realizou uma expedição à Terra Indígena Ianomâmi. Em seus registros estão a tradicional festa fúnebre Reahu, realizada na aldeia Demini, morada do líder Davi Kopenawa, e a subida ao Pico da Neblina com um grupo de xamãs Ianomâmi, fotos publicadas na edição digital do Washington Post, naquela ocasião. Em preto e branco, são imagens fortes e fascinantes, como são todas que o consagraram o fotógrafo brasileiro. Como na exposição “Genesis”, aquele ensaio passa o mesmo sentimento de um lugar num tempo diferente do nosso. Salgado já havia percorrido a região nos anos 70 e 90 do século passado. Um poster dos Ianomami olhando para o Yaripo, o cume do Pico da Neblina, no site do Instituto Terra, custa R$ 250. São indígenas alegres, bonitos, robustos e saudáveis.

Eliane Cantanhêde - Ordem, disciplina e... democracia!

O Estado de S. Paulo.

Assim como reuniu o poder civil, Lula tem de unir as Forças Armadas pró-democracia

O presidente Lula e as Forças Armadas “viram a página”, “olham para a frente” e discutem como financiar os programas militares, com a iniciativa privada e recursos internacionais, mas isso não significa jogar para debaixo do tapete a omissão proposital de uns e a participação direta de outros militares no que o presidente percebeu como “golpe de Estado”. A troca no comando do Exército é exatamente por isso.

O comandante que sai, general Júlio Cesar de Arruda, é das Forças Especiais (FE), consideradas “uma seita linha dura” no Exército, e, além de apontado como leniente com os acampamentos golpistas no Quartel General, se recusava a exonerar o tenente-coronel Mauro Cid do Batalhão de Ações de Comando. Cid, também das FE, foi ajudante de ordens de Jair Bolsonaro e é alvo de ações por fake news em lives e de suspeitas sobre gastos da família presidencial.

Rolf Kuntz - Superada a barbárie, falta mostrar um plano

O Estado de S. Paulo.

O contraste com a escuridão bolsonarista é importante, mas também é preciso apresentar um plano de reativação econômica com responsabilidade

O maior fiador do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seu terceiro mandato continua sendo o ex-presidente Jair Bolsonaro, auxiliado por seus filhos e por vândalos golpistas. Mas o sucesso de um governo requer algo mais que a rejeição da barbárie. Três semanas depois da posse presidencial, a nova equipe quase nada explicou sobre como pretende promover crescimento econômico, ampliação do emprego e redução da pobreza. Falta indicar com clareza se haverá ações bem programadas e sustentáveis ou se o caminho será o da gastança e do voluntarismo. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, prometeu uma reforma tributária fatiada e a apresentação, até abril, de uma nova âncora fiscal, cobrada com especial insistência no setor financeiro. As promessas foram bem recebidas no mercado, mas as cobranças permanecem.

Vinicius Torres Freire - Que fim levou a Covid? Não levou

Folha de S. Paulo

É preciso também desbolsonarizar a saúde

A Organização Mundial de Saúde (OMS) discute na sexta-feira que vem se a Covid ainda é uma "Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional" (ESPII), o maior nível de alerta e, em tese, de engajamento legal e dedicação mundiais na lida com um desastre sanitário, entre eles epidemias. Foi no 30 de janeiro de 2020 que a Covid se tornou uma ESPII.

Cientistas dizem pelo mundo que seria cedo decretar o fim da emergência mundial, se por mais não fosse porque a doença vai fazer uma desgraça na China, que deu cabo de sua política de "Covid zero" e vai ter muita infecção e morte.

Caso determine o fim da ESPII, a OMS não quereria dizer que a pandemia acabou, embora tal decisão tivesse algumas consequências práticas. Teria efeito simbólico?

Celso Rocha de Barros – Alexandre de Moraes

Folha de S. Paulo

Moraes é quem as instituições designaram contra golpismo de Bolsonaro

Não há dúvida de que, sem a atuação do STF, o golpe talvez vencesse.

Ao contrário do que dizem os bolsonaristas, Alexandre de Moraes não é um ditador. Ele é só o sujeito que as instituições brasileiras designaram para conduzir a briga contra o golpismo de Jair Bolsonaro.

Moraes foi designado para esse papel por seus colegas de STF, que sempre ratificaram suas decisões. O STF, por sua vez, agiu por obrigação constitucional e clara delegação do Congresso Nacional.

Os congressistas brasileiros poderiam ter limitado os poderes de Moraes, inclusive mudando a Constituição; Bolsonaro tentou fazer isso várias vezes, sem nenhum sucesso.

Bruno Boghossian - Uma longa virada de página

Folha de S. Paulo

O governo e a caserna já sabiam que a relação não se resolveria num bate-papo

O governo e a caserna já sabiam que a relação entre Lula e os militares não se resolveria num simples bate-papo. A troca do comandante do Exército é considerada apenas a primeira medida para começar a virar uma página que ficou pesada demais depois dos episódios de 8 de janeiro.

Nos dias que antecederam a demissão do general Júlio de Cesar de Arruda, neste sábado (21), Lula dizia a auxiliares que era preciso tomar uma providência enérgica para restabelecer a autoridade sobre o Exército. O presidente cobra substituições em altos cargos e a punição de militares coniventes com o ataque à praça dos Três Poderes.

Hélio Schwartsman - Não tão preto no branco

Folha de S. Paulo

Livro traça a história do racismo e faz crítica de esquerda

O livro "Not So Black and White" (não tão preto no branco), de Kenan Malik, pode ser descrito como uma crítica de esquerda à política identitária. Para dar peso a seus argumentos, ele traça uma história do racismo desde seu surgimento, em fins do século 18, até os dias atuais. E aí nos faz viajar por lugares, períodos e movimentos definidores, como a revolução haitiana, a Alemanha nazista e o Black Lives Matter.

Para o autor, o racismo é a reação da direita às teses universalistas do Iluminismo, que afirmavam que não havia diferenças significativas entre as pessoas. Para contrapor-se a isso, a direita reacionária veio com a ideia de raça. Diferenças biológicas, mentais e de valores observadas entre os grupos étnicos é que forjariam a identidade de cada indivíduo.

Muniz Sodré* - Espoliação como vício

Folha de S. Paulo

Dinheiro não é apenas valor de troca, mas incremento de fantasias de eternidade e poder

Tão logo solto, o ex-governador do Rio voltou à memória dos jornais a sua admissão pública de corrupção compulsiva, nos termos de vício em poder e dinheiro. É uma fala espantosa, porque sincera e confirmadora de um fenômeno que afeta, em escalas diferentes, a classe política no mundo inteiro. O que singulariza essa confissão é tanto o tamanho quanto a exibição pública da defraudação. "Taxa de oxigênio" era o nome debochado da propina.

Cristovam Buarque* - Corporativismo Militar

Blog do Noblat / Metrópoles

As lideranças civis sempre aceitaram a tutelagem, ostensiva ou discreta, das Forças Armadas sobre a política

A coincidência de Bolsonaro e Covid foi um desastre para a educação brasileira, mas o sistema educacional já era uma tragédia resultado do descaso histórico dos governos anteriores. Da mesma forma, a conivência dos militares com as ameaças golpistas ao longo dos últimos anos não é o resultado apenas do bolsonarismo, mas do descaso histórico de nossos dirigentes com a chamada questão militar, desde o início da República. As lideranças civis sempre aceitaram a tutelagem, ostensiva ou discreta, das Forças Armadas sobre a política, ao ponto de reconhecer na Constituição sua intervenção no processo político, quando necessário. As FFAA são vistas como uma corporação com vontades, ideologia e interesses próprios, como um sindicato especial e armado. Esta tradição secular impede o bom funcionamento da democracia ao longo dos anos.

Livro Longa Jornada até a Democracia, de Carlos Marchi, será lançado nesta quinta-feira (dia 26), no Rio de Janeiro

Cleomar Almeida, coordenador de Publicações da FAP

Escrito pelo jornalista e escritor Carlos Marchi, o livro Longa Jornada até a Democracia (476 páginas), primeiro de dois volumes que abordam os 100 anos do Partido Comunista Brasileiro (PCB), será lançado nesta quinta-feira (26/01), a partir das 19 horas, durante evento presencial no Bar e Restaurante da Rua Farme de Amoedo, 51 – Ipanema, Rio de Janeiro. Os leitores poderão ter seus exemplares autografados no local pelo autor da obra, editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP).

A obra registra o legado do partido que, com erros e acertos registrados em livros de história, ainda permanece como um dos principais atores da luta pela democracia brasileira. O autor começa em 1922 e se detém ao período que segue até a década de 1960, a qual define a característica mais própria e delineada com que o Partidão entrou na memória coletiva.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

BC autônomo é um teste político para Lula e o PT

O Globo

Em vez de atacar os juros, presidente deveria lembrar como cumprir a meta de inflação ajudou em sua reeleição

As últimas declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva revelam que a relação com o Banco Central (BC) impõe um desafio ao governo petista. Em entrevista à GloboNews na semana passada, Lula atacou a autonomia do BC, criticou a meta de inflação e disse que, no seu governo, o presidente do BC tinha mais independência — um disparate. No dia seguinte, voltou a atacar o nível dos juros e a soltar despropósitos sobre a política monetária. “A gente poderia não ter nem juro, não é verdade?”, afirmou.

Mesmo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que tem dado declarações sensatas quando fala na necessidade de equilibrar as contas públicas, derrapou em entrevista ao GLOBO ao sugerir que deveria haver colaboração do BC para recuperar a atividade econômica. Reclamou dos juros altos e da “situação anômala”, com “inflação comparativamente baixa e taxa de juros real fora de propósito para uma economia que já vem desacelerando”. Nada disso tem cabimento, já que a missão do BC é tão somente controlar a inflação — e nem isso tem conseguido.

Poesia | Carlos Drummond de Andrade -Caso do Vestido

 

Música | Moacyr Luz & Samba do Trabalhador / Teresa Cristina - Anjo da velha guarda