Os mais baixos juros da nossa história recente inauguram uma nova forma de remuneração da caderneta de poupança e são a esperança de um ritmo maior no crescimento.
O dia de ontem confirmou a tendência do Copom de um corte de 0,5% porque foi particularmente pesado na Europa, com temores de uma crise bancária na Espanha.
Desde a última reunião, houve uma enxurrada de notícias, mudanças de humores, novidades na economia.
Entre18 de abril, data da última reunião, e ontem, houve queda nas previsões de crescimento brasileiro de 3,21% para 2,99%. Mudou-se a fórmula de remunerar a caderneta de poupança. Houve um agravamento da crise europeia após a eleição na Grécia, que aumentou o risco de uma saída desordenada do país do euro, e cresceu o medo em relação à Espanha.
O dólar disparou e ficou volátil. Chegou a subir 10%, depois caiu 5% e voltou a subir. Tudo em menos de 45 dias. Deixou incertos os negócios de importadores e exportadores. Depois de o Ministério da Fazenda ter instalado várias trancas na porta impedindo a entrada de dólar, o Banco Central teve, nesse hiato entre as duas reuniões, que voltar a vender dólar para conter a alta da moeda americana.
Há temor de que a valorização do dólar não eleve as exportações mas tenha o efeito ruim de subir a inflação pelo impacto nos preços de matérias- primas e bens duráveis.
O IGP-M divulgado ontem ficou em 1%. Mas o BC disse que o cenário externo é "desinflacionário", ou seja, a crise derruba e não eleva preços.
O que pode impedir o efeito do dólar na inflação pode também atingir a balança comercial brasileira, que é a redução das commodities. O índice CRB, que mede a queda ou alta das commodities, em pouco mais de três meses, desde 24 de fevereiro, caiu 15,3%. Em 12 meses, a redução é de 20,57%. Bom para a inflação, ruim para a balança.
Entre uma e outra reunião do Copom, o governo abriu uma guerra contra os juros bancários, que até agora tem tido o saudável objetivo de diminuir os escandalosos spreads brasileiros. O BC informou que passaria a divulgar o voto dos diretores e isso é muito bom, por aumentar a transparência, mas há muito tempo não se vê um BC com tão pouca autonomia. A reunião apressada da diretoria para aprovar a medida feita por encomenda da Fazenda, de liberar compulsório direcionado para a indústria automobilística, foi a prova dos nove de como a atual administração entende seu papel.
Neste período, apareceu na imprensa, várias vezes, a notícia de que o governo pensa em reduzir o superávit primário para estimular o crescimento.
Jabuti não sobe em árvore, como se sabe. Se está lá, alguém colocou. Se a notícia tem aparecido, é o governo que tem testado a informação para ver se há reação. O que está errado não é o superávit primário, mas o fato de que o governo tem investido menos do que pode por ineficiência.
Ontem, o Tesouro divulgou que houve uma queda de 3,5% nos investimentos no primeiro quadrimestre. Para o número não aparecer feio como ele é, o governo o reapresenta com os gastos do Minha Casa, Minha vida.
O fraco desempenho da economia não é resultado de o governo gastar pouco, mas investir pouco. A indústria não está com problemas por faltar crédito ao comprador de carro, mas porque o ambiente de esfriamento da economia está fazendo com que inúmeras empresas deixem nas prateleiras os investimentos.
Perguntadas, elas não dirão que os planos de expansão foram arquivados, mas eles não estão andando.
A queda dos juros anunciada ontem foi a sétima consecutiva desde agosto, quando estava em12,5%, e ficou agora abaixo do piso atingido em 2009 e 2010, que era 8,75%.
Com isso, foi disparado o mecanismo que altera a fórmula de remuneração da poupança.
Ela agora pagará 70% da Selic. No começo, é quase igual, mas se os juros continuarem caindo as duas cadernetas — a dos depósitos antigos e a dos depósitos feitos a partir de 4 de maio — terão rendimentos bem diferentes.
Tudo isso abriu o caminho para a queda dos juros: a mudança na poupança, a queda nas previsões do PIB, os dados antecedentes divulgados pelo BC mostrando quase estagnação no primeiro trimestre, o aumento de estoques nas empresas, a queda das commodities no mercado internacional.
O mais determinante, no entanto, é o ambiente de deterioração externa.
A crise está conosco desde 2008, mas dois novos desdobramentos assustam. A fragmentação política na Grécia fez os analistas começarem a fazer contas sobre o que aconteceria num cenário de saída do país da Zona do Euro.
O BC da Grécia fez um relatório sobre os efeitos no país nesse cenário: a renda média anual dos gregos cairia 55%, com quedas equivalentes nos valores dos imóveis e das contas bancárias; a renda per capita despencaria e, mesmo assim, a inflação poderia subir pelo impacto da desvalorização implícita na volta da velha moeda.
O cenário é complexo para a Zona do Euro como um todo, pelo risco do contágio. A Espanha de novo não teve trégua. Os juros cobrados pelo mercado para rolar a dívida chegaram a 6,6%. O país ganhou mais um ano para cumprir a meta fiscal, dado pelas autoridades europeias, mas o alívio foi pequeno. A fuga dos investidores para ativos considerados seguros fez os títulos ingleses pagarem o menor rendimento desde1703. Foi também a menor taxa da história da Alemanha e a menor taxa desde 1946 do Tesouro americano.
Com um ambiente externo assim conturbado, a tendência é de novas quedas de juros no Brasil nas próximas reuniões.
FONTE: O GLOBO