segunda-feira, 19 de junho de 2023

Opinião do dia - Luiz Sérgio Henriques*

“Nisso, o Ocidente político, morfologicamente definido, mantém uma primazia e uma força de atração que só pode ser desafiada, nos seus próprios termos, como extensão tendencialmente continuada dos direitos de cada indivíduo e de toda a sociedade. No fundo, este é o recurso de que dispomos para fazer face às ondas desdemocratizadoras, tão hábeis em se infiltrarem pelos erros e delitos históricos das nossas sociedades.”

*Tradutor e ensaísta, é um dos organizadores das obras de Gramsci no Brasil. “Ocidente e sociedade civil”. O Estado de S. Paulo e Blog Democracia Política e novo Reformismo, 18.6.2023.

Fernando Gabeira - Bolsonaro fora do jogo, uma decisão histórica

O Globo

A ligeira queda na intensidade da polarização pode aumentar a esperança de terceiros, que no passado não conseguiram espaço para competir

Começa nesta semana o julgamento de Bolsonaro no TSE. É apenas um dos muitos processos contra ele. Mas, segundo todas as previsões, não deverá escapar. Bolsonaro se tornará inelegível. Existe apenas uma possibilidade de adiar essa decisão por 90 dias, caso o ministro que ele indicou para o STF, Nunes Marques, peça vista. Mas não seria um pedido inteligente, uma vez que a sorte está lançada, com o parecer do procurador eleitoral. Uma solução rápida pode ser importante.

Bolsonaro e a corrente política que ele representa terão de encontrar uma alternativa, e isso demanda uma discussão longa. Um novo nome precisará também de alguns meses para se fixar. No processo que se julga agora, Bolsonaro é considerado por muitos indefensável. Ele reuniu embaixadores estrangeiros, usando o aparato oficial da Presidência, para criticar o sistema eleitoral brasileiro e defender o voto em papel, algo que já havia sido rejeitado.

Miguel de Almeida - O PT bolsonarista

O Globo

Qual PT vibrará sob o espólio de Lula? O que defende Putin e Nicolás Maduro? Ou o que vota com os bolsonaristas?

Mal se avista 2024, e parte do PT, na dúvida ou muito pelo contrário, já se posiciona no pós-Lula. Nas duas principais capitais, Rio e São Paulo, o partido ameaça romper acordos ou promessas firmados no ano passado. Acostumado a jogar parado, o presidente, se agora toma bolas nas costas de Arthur Lira, corre também o risco de perder em casa.

Muito da indisciplina petista se explica com o diagnóstico verbalizado, à semelhança de um deboche, pelo próprio Lira: Lula será candidato à reeleição? Ao deixar em aberto o cenário — algo que não ocorreu desde que ela brotou pelas mãos de FH —, o presidente abre um flanco, baixa a guarda e se coloca como refém de seus algozes — a começar pela turma de copa e cozinha. Existem motivos para pulga atrás da orelha, de parte a parte, dado que até hoje se verifica um casamento de conveniência entre Lula e setores de seu partido. Ele, um tipo de centro, não de esquerda, como já reconheceu anos atrás; mas adequado à franja esquerda pela origem operária; e a política ama qualquer simbologia. Até que se esgarce no tempo — Lula era torneiro mecânico, função há muito desaparecida, mas aquele modelo de indústria ultrapassada luta pela sobrevivência no mundo digital. Antes de qualquer brinde, bom lembrar: no Brasil, o passado demora a passar.

Joseph E. Stiglitz* - Nossa dívida com as futuras gerações

Valor Econômico

Dívida ambiental é um ônus que não pode ser eliminado com a canetada de um juiz de falências 

Os conservadores dão muitas vezes uma grande demonstração de preocupação com o ônus de endividamento que estamos repassando para os nossos filhos. Esse argumento moral se fez sentir, de maneira destacada, na recusa dos republicanos do Congresso dos EUA em apoiar um aumento de rotina do teto da dívida dos EUA. O Partido Republicano está, supostamente, tão comprometido com a redução dos gastos a ponto de se revelar disposto a manter a economia global como refém e correr o risco de prejudicar permanentemente a reputação dos EUA.

Ninguém argumenta que não deveríamos pensar nas gerações futuras. A verdadeira questão é quais são as atuais políticas e compromissos fiscais que melhor atenderão aos interesses dos nossos filhos e netos. Encarando-se o problema desse ponto de vista, fica claro que são os republicanos que estão exibindo uma desconsideração negligente com relação às consequências dos seus atos.

Bruno Carazza* - Dilma não entendeu 2013. E Lula, aprendeu?

Valor Econômico

Superestimar a importância da extrema direita nas jornadas de junho é um erro estratégico do PT

Muito tem sido dito e escrito sobre as manifestações de 2013. Efemérides são convites à reflexão das causas e das consequências de eventos marcantes de nossa história. Ao lembrar os dez anos das jornadas de junho, é bom dar atenção para aquela que esteve no centro do redemoinho: Dilma Rousseff.

Ao escrever o prólogo da coletânea “Junho de 2013: a rebelião fantasma”, que acaba de sair pela Boitempo, a ex-presidente oferece a sua interpretação daquele ponto de inflexão em seu governo.

Para Dilma, os protestos foram uma oportunidade bem explorada pelas “elites internas e seus sócios internacionais”, utilizando “meios muito superiores de comunicação, além de recursos financeiros”, de transformar as legítimas reivindicações por serviços públicos melhores e mais baratos num movimento contra o seu governo.

Alex Ribeiro - Campos Neto não manda sozinho no Copom

Valor Econômico

Na hora de sinalizar queda dos juros, presidente do BC provavelmente ainda precisará convencer a maioria dos integrantes do colegiado

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, não manda sozinho no Comitê de Política Monetária (Copom). Quando ele chegar à conclusão de que está na hora de sinalizar a queda dos juros básicos - algo que não ficou claro nas suas declarações mais recentes, que foram recheadas de ambiguidade -, provavelmente ainda precisará convencer a maioria dos integrantes do colegiado. Atualmente, há diferenças relevantes de visão entre os diretores do BC.

O longo histórico de decisões unânimes tomadas desde 2016 passa a falsa ideia de que Campos Neto tem o controle absoluto do comitê e de que todos pensam uniformemente. Não é bem assim: costuma haver divergências relevantes, sobretudo nos inícios e finais de ciclos de alta ou de baixa de juros, ainda que suavizadas pela busca do consenso.

Angela Alonso* - Cenas brasileiras

Folha de S. Paulo

Parte da elite que nem imagina como vive a maioria dos habitantes de seu país

Nos últimos dias, membros do sistema de justiça estrelaram três cenas bem brasileiras. Uma delas trouxe para a frente das câmeras nacionais uma procuradora de Goiás. Carla Fleury de Souza cometeu o crime do desabafo. Reclamou ao vídeo de seu parco salário de 37,5 mil reais. Insuficiente, declarou, para sustentar seu estilo de vida de princesa: "Meu dinheiro é só para fazer minhas vaidades, graças a Deus. Só para os meus brincos, minhas pulseiras, meus sapatos." Graças a Deus e ao marido, que, depreende-se da fala da esposa, arrecada bem mais.

A franqueza foi bisonha, coisa de quem ainda não se acostumou à vida filmada. Mas o franco exprime o que pensam os dissimulados. A procuradora delatou o sentimento de uma fração da elite social que, ilhada com seus iguais, nem mesmo imagina como vive a maioria dos habitantes de seu país. Na ilha da senhora Fleury, os proventos são muito, muito mais altos do que o da média dos brasileiros.

Marcus André Melo* - A assombração de Janio e junho de 2013

Folha de S. Paulo

A Nova República nasceu sob o signo do combate à impunidade

Janio de Freitas argumentou, nesta Folha, em 2016, que a impunidade com relação a malfeitos era responsável pela perpetuação da corrupção no país. Como uma maldição, a falta de punição à corrupção fazia com que ela reaparecesse inclusive com os mesmos personagens. Em 1987, Janio denunciara o conluio de empreiteiras na licitação Norte-Sul, fazendo publicar na Folha em linguagem cifrada o resultado do certame. Fizera o mesmo em relação a obras do metrô, entre outras no Rio de Janeiro: denúncias que entraram para a história como casos exemplares de jornalismo investigativo.

Lygia Maria - Quando a exceção vira norma

Folha de S. Paulo

Usar o medo coletivo para suspender garantias individuais é ferramenta de regimes anti-democráticos

Quando a ministra Cármen Lúcia proferiu seu voto a favor da proibição da exibição de um documentário até o fim do segundo turno das eleições no ano passado, disse: "Eu vejo isso como uma situação excepcionalíssima". A exceção era o pleito. Para protegê-lo, valia até ir contra a jurisprudência do STF e a Constituição, que impedem a censura.

Passados oito meses, a ideia de "excepcionalidade" foi usada pelo ministro Alexandre de Moraes para censurar Monark —ao ordenar o bloqueio de todas as contas das redes sociais do influencer, que havia feito críticas ao STF, ao TSE e questionado a lisura das eleições.

Felipe Moura Brasil - Os dois estados de sítio

O Estado de S. Paulo

Há sempre uma solução bolsonarista para cada problema lulista (e vice-versa): simples e errada

“Há sempre uma solução bem conhecida para cada problema humano – simples, plausível e errada”, escreveu o jornalista americano Henry Louis Mencken, no segundo volume de sua coleção de ensaios “Preconceitos”, de 1920.

A frase que virou citação por mais de um século surgiu no capítulo “O sopro divino”, no qual Mencken trata da misteriosa faísca de inspiração e criatividade nas artes e letras, indicando que “explicações existiram desde sempre” para qualquer fenômeno, o que não quer dizer que estejam certas. “Os antigos”, segundo ele, “colocaram a culpa nos deuses”, que “às vezes eram mal-humorados, às vezes gentis”. Na Idade Média, outros abordaram o tema “e assim se lê sobre obras de arte inspiradas por Nossa Senhora, pelos Santos Beatos, pelas almas dos mortos e até pelo demônio”.

Denis Lerrer Rosenfield* - A minoria petista

O Estado de S. Paulo

Há alguma chance de qualquer articulação política dar certo quando o governo parece dizer a todos ‘não ao apaziguamento’?

Lula e o PT, do alto de seus minguados 68 deputados, de um total de 513, representando apenas 13,2%, tentam impor um programa que, por essa mesma razão, não foi referendado pelas urnas. Se juntarmos toda a esquerda, ela perfaz 129 deputados, 25% do total, incluindo partidos como o PSB, o PDT e o Solidariedade, que jamais se submeteram completamente à hegemonia petista. Logo, a escolha popular – porque é disso que se trata – foi por uma pauta liberal/conservadora ou, para utilizar uma outra terminologia, de centro-direita, avessa ao radicalismo esquerdizante, este mesmo que está sendo imposto arbitrariamente ao País.

O novo presidente venceu enquanto representante de uma ampla “frente democrática”, que ele tenta, com afinco, desmontar. Sua eleição se deve ao “não” que os brasileiros disseram a Bolsonaro, temerosos de suas ambições autocráticas e de suas posições de extrema direita. Escolheram um mal menor, talvez ainda tendo na memória o Lula cordato, negociador e moderado de seu primeiro mandato, tendo naquele então abandonado a cartilha petista, substituindo-a por uma Carta ao Povo Brasileiro, aliás, jamais referendada pelo partido.

José Renato Nalini* - Estamos perdendo o Brasil

O Estado de S. Paulo

Enquanto não houver a regularização fundiária, a Amazônia se mostrará suscetível a encontrar um proprietário: o crime organizado

Estamos perdendo o Brasil. E não é para os estrangeiros, como as teorias conspiratórias propalam. É para coisa pior: a criminalidade organizada, apátrida e cruel. Ela se apodera de grande parte da Amazônia Legal, por incúria do Estado brasileiro, que não leva a sério a regularização fundiária.

O que acontece com aquele patrimônio da Nação e que pertence a todos? A Procuradoria-Geral da República admite não saber quais são as terras da União. O mesmo ocorre em relação às unidades subnacionais, os Estadosmembros e os municípios, estes erigidos à condição de entidade federativa a partir da Constituição Cidadã.

Valendo-se da balbúrdia registraria, os inescrupulosos fazem uma autodeclaração de que possuem terras protegidas e preenchem o Cadastro Ambiental Rural (CAR). Confiar na declaração do interessado é um pouco ingênuo para um país que nasceu e que convive confortavelmente com a corrupção.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

S&P melhora rating do país, mas faz vários alertas

Valor Econômico

Brasil será rebaixado se a adoção de políticas “inadequadas” resultarem em expansão econômica limitada

A melhoria de “estável” para “positiva” da classificação de risco do crédito soberano de longo prazo feita pela S&P foi ótima notícia para o Brasil. Ela indica que, realizando as reformas em curso, evitando voltar atrás nas que já foram feitas e terminando o trabalho de controlar a inflação será possível voltar a obter o grau de investimento que o país já teve em 2008. É preciso dar um salto de dois degraus para atingir esse rating, algo que requer um duro trabalho do governo. O governo recebeu com alegria a boa notícia, mas interpretou-a como um aval prévio ao novo regime fiscal proposto e, de forma implícita, a suas políticas. Essa interpretação é incorreta. Na comemoração, houve mais críticas à política do Banco Central.

No título da nota que comunica a reavaliação, a S&P dá o tom de sua análise: há a “expectativa de políticas pragmáticas”. A exposição das razões alinha não só as reformas que antecederam o governo Lula como os riscos de que ele venha a revertê-las. “Esperamos que o pragmatismo político do governo se traduza em uma estrutura estável e previsível para a política monetária, esforços para conter o deslize fiscal e governança eficaz das entidades relacionadas ao governo, muitas delas com papéis importantes na economia brasileira”.

A S&P menciona que desde 2016 - ano em que Dilma Rousseff sofreu impeachment, não mencionado - foram feitas reformas para modernizar a economia e enfrentar a péssima situação fiscal. O resultado: o crescimento foi melhor que o esperado nos últimos dois anos, embora seja muito fraco em relação a países emergentes comparáveis. O esperado equilíbrio entre governo, Congresso e instituições públicas independentes, afirma a empresa, faz crer que a reversão das reformas é improvável. As mencionadas são: independência do Banco Central, mudanças no sistema previdenciário, revisão do código trabalhista, governança mais sólida das entidades relacionadas ao governo e “a existência de uma regra fiscal”.

Poesia | Fernando Pessoa - Sou um evadido

 

Música | Batendo a Porta (J. Nogueira/P. César Pinheiro) - Tabuleiro do Ary