quarta-feira, 6 de janeiro de 2021

Opinião do dia - Luiz Werneck Vianna*

"Toda essa nova movimentação vem emprestar suporte novo aos que, no interior das instituições republicanas, notadamente no Congresso e no STF, vêm suportando o assédio das forças do autoritarismo político e lhe impondo limites. No horizonte imediato, surgem os primeiros sinais de terra à vista, confirmando que o plano de navegação até então obedecido merece confiança e deve ser preservado. Seu traçado fundamental repousa na formação de uma frente democrática a mais ampla possível, na forma como agora se delineia na eleição à presidência da Câmara dos Deputados, no que pode ser o esboço da política a ser adotada na próxima sucessão presidencial quando o país enfrentará o que tem sido seu trágico destino."

"As tragédias contemporâneas têm no lugar dos heróis clássicos a multidão dos homens comuns, como os das praças da primavera árabe e das ruas americanas das passeatas intermináveis do black lives matter. Essa a razão de fundo para que a luta pela democracia tenha seu ponto forte de partida na luta contra a atual pandemia, a fim de liberar, por meio de amplíssimas alianças, o acesso às nossas ruas e praças."

*Luiz Werneck Vianna, sociólogo, PUC-Rio. “A longa tragédia brasileira” Blog, 5/1/2021.

Merval Pereira - Um presidente disfuncional

- O Globo

O mais interessante, do ponto de vista político, é a frase de Bolsonaro ao final da declaração em que atestou que o país que governa “está quebrado”. Ele completou assim: “Vão ter que me engolir até o fim de 2022”. Isso mesmo, pelo menos por um ato falho, o presidente já está empenhado em defender seu primeiro mandato, sem falar em reeleição. 

Do ponto de vista econômico, é um desastre a fala de botequim do presidente, não apenas pela inadequação técnica, como vários economistas já demonstraram, como pela superficialidade vulgar com que aborda assunto tão delicado. Não, o país não está quebrado, está da mesma maneira de quando Bolsonaro se candidatou a governa-lo, com milhões de promessas não cumpridas no que importa, como privatizações, reformas estruturais. 

O que fez com que se elegesse, além do antipetismo, foi conseguir o apoio dos que nunca se aproximariam dele, acenando-lhes com um plano liberal comandado por Paulo Guedes. Se não fosse isso, ele poderia até ter muitos votos, mas os candidatos de centro-direita como Geraldo Alckmin, ou de centro-esquerda, como Ciro Gomes, estariam no páreo com o apoio do empresariado, dos investidores, das classes média e alta nas principais capitais do país. Bolsonaro disputaria o voto do eleitorado radicalizado com o Cabo Daciolo. 

Ricardo Noblat - O Brasil não quebrou. Bolsonaro é que não tem conserto

- Blog do Noblat / Veja

Desabafos de um presidente desorientado

No seu primeiro dia de aparente trabalho em Brasília depois de oito a navegar atrás de golfinhos e a provocar aglomerações sem máscaras em praias paulistas, o presidente Jair Bolsonaro brindou o país com desabafos tão desastrosos que alguns dos seus auxiliares se viram obrigados a tentar consertá-los.

O primeiro deles foi feito diante de um grupo de devotos à entrada do Palácio da Alvorada: “O Brasil está quebrado, chefe. Eu não consigo fazer nada. Eu queria mexer na tabela de imposto de renda. Tem esse vírus potencializado por essa mídia que nós temos aí. Essa mídia sem caráter que nós temos”.

O segundo desabafo veio na sequência e na mesma ocasião: “Então, [o Brasil] é um país difícil de trabalhar. Quando se fala em desemprego, né, [são] vários motivos. Um é a formação do brasileiro. Uma parte considerável não está preparada para fazer quase nada. Nós importamos muito serviço”.

No fim da tarde, no mesmo lugar e em resposta a um devoto que lhe cobrou a promessa de reajustar a tabela do Imposto de Renda para beneficiar os que ganham menos, Bolsonaro disse: “Eu queria mexer na tabela. Mas não esperava esta pandemia. Temos uma dívida de aproximadamente R$ 700 bilhões”.

Se Bolsonaro nada consegue fazer uma vez que o país quebrou no seu colo, por que ele não pede as contas? No começo do seu desgoverno, reconheceu que não nascera para ser presidente. De fato, ao examinar-se sua biografia, pelo visto não nasceu para fazer grande coisa. Não faria falta se renunciasse.

Luiz Carlos Azedo - Perdido na pandemia

- Correio Braziliense

Bolsonaro não sabe o que fazer em meio à pandemia do novo coronavírus, pois nem crise sanitária nem recessão se resolvem com negacionismo, mas com ações governamentais

“O Brasil está quebrado. Não consigo fazer nada” — disse, com todas as letras, o presidente Jair Bolsonaro, ontem, queixando-se da situação em que se encontra o governo federal. Para não variar, culpou a imprensa e se fez de vítima, mas o estrago está feito. Além de terem virado piada pronta nas redes sociais e motivo de chacota nos meios políticos, suas palavras são um desastre para a economia. O impacto de uma afirmação dessa natureza junto aos agentes econômicos e investidores estrangeiros pode ser avassalador.

Poderiam ser ditas por qualquer empreendedor em dificuldades financeiras ou trabalhador desempregado, porém, na boca do presidente da República, essas afirmações funcionam como uma mensagem de desesperança. Revelam que Bolsonaro não sabe o que fazer em meio à pandemia do novo coronavírus, pois nem crise sanitária nem recessão se resolvem com negacionismo, mas com ações governamentais. Não chega a ser uma novidade, porque o presidente da República sempre disse que não entende de economia e que, nesse métier, quem daria as cartas seria o ministro da Economia.

Bruno Boghossian – O governante impotente

- Folha de S. Paulo

Sem conseguir 'fazer nada', Bolsonaro fabrica inimigos para preservar apoio

Antes de completar seis meses no cargo, Jair Bolsonaro divulgou um texto que dizia que o país era "ingovernável". No ano seguinte, reclamou do Congresso e afirmou: "Realmente, eu não consigo aprovar o que eu quero lá". Agora, avisou a seus apoiadores que "o Brasil está quebrado" e que, por isso, não tem condições de "fazer nada".

Desde o início do mandato, Bolsonaro esculpe a figura de um governante impotente. Além de expor sua incapacidade absoluta, esse esforço cumpre uma função política. Ao criar a ilusão de que não consegue entregar benefícios para sua base por culpa de outras pessoas, o presidente trabalha para que a fidelidade de seus eleitores dependa cada vez menos de vantagens concretas.

Bolsonaro disse nesta terça (5) que não poderia oferecer um alívio na tabela do Imposto de Renda porque o país estava no buraco. Para distrair os bolsonaristas diante de um compromisso frustrado, ele mudou o foco da conversa e afirmou que a ruína econômica havia sido provocada por "esse vírus, potencializado por essa mídia que nós temos".

Hélio Schwartsman - Vacinação pública ou privada?

- Folha d S. Paulo

Vacinações são por excelência uma estratégia coletiva de saúde

A vacinação só será capaz de pôr fim à epidemia se estiver no âmbito de um programa universal e público. E, se a circulação do vírus permanecer muito elevada, nem quem tem dinheiro para pagar por um imunizante estará livre de riscos. Vacinações são por excelência uma estratégia coletiva de saúde.

Isso dito, não vejo problemas em permitir que clínicas particulares importem e apliquem vacinas contra a Covid-19. A rigor, qualquer agente que consiga trazer para o Brasil biofármacos que de outra forma não chegariam aqui está contribuindo para o esforço comum.

É preciso, contudo, alguns cuidados. Seria decerto um despropósito se a iniciativa privada e o setor público entrassem numa disputa suicida pelos mesmos imunizantes. Mas há fórmulas menos drásticas que o veto às clínicas particulares para evitar esse tipo de situação.

Elio Gaspari - O maior espetáculo da Terra

- O Globo / Folha de S. Paulo

EUA vão ao triste patamar das repúblicas latino-americanas

Donald Trump começou o espetáculo da sua partida deixando “House of Cards” no chinelo. Seu telefonema de uma hora para o secretário de Estado da Geórgia, Brad Raffensperger (um republicano), seria rejeitado por qualquer roteirista de séries de TV. Foi desconjuntado, alternou momentos de prepotência e delírio. Ao seu estilo, puxou a carta do Apocalipse: “O povo da Geórgia está zangado, o país está zangado”. Falou três vezes em “tumultos”. Ameaçou e fez-se de vítima, queixando-se do que “vocês fizeram com o presidente”.

Na essência, Trump acha que ganhou a eleição na Geórgia por mais de cem mil votos e telefonou para que Raffensperger contasse o resultado, arrumando-lhe 11.779 votos. Repetiu 11 vezes esse número ou o milhar arredondado. Numa das últimas menções foi patético: “E agora? Eu só preciso de 11 mil votos. Pessoal, eu só preciso de 11 mil votos. Tenham paciência”.

O telefonema termina de uma forma bizarra.

Raffensperger: “Obrigado pelo seu tempo, presidente”.

Trump: “Ok. Obrigado, Brad”.

(Não cabe a um interlocutor encerrar uma conversa com o presidente dos Estados Unidos.)

Zuenir Ventura - Uma trama intrincada

- O Globo

Paes não esconde os motivos por que precisa agradar a Bolsonaro

Se o prefeito Eduardo Paes achava que podia caminhar em harmonia com dois parceiros que são, entre si, declarados desafetos políticos — Jair Bolsonaro e João Doria —, bastou a primeira segunda-feira do ano para desfazer a ilusão. No dia 19 de dezembro, Paes havia assinado em São Paulo um termo de cooperação com o Instituto Butantan para a aquisição da vacina contra a Covid-19. Mas, anteontem, O GLOBO publicou reportagem de página inteira revelando o plano da prefeitura para a vacinação.

Na matéria, Paes alega que, ao contrário de São Paulo, ainda não tem calendário para a campanha porque resolveu seguir o Plano Nacional de Imunização (PNI) do Ministério da Saúde. E contou que o ministro Eduardo Pazuello lhe dissera que anunciaria as datas do PNI no dia seguinte. “Ouvi até a especulação de que seria no dia 20 (data em que o Rio comemora seu padroeiro, São Sebastião).” Só que, em vez disso, no dia seguinte o Ministério da Saúde negou que fosse anunciar as datas do plano, desmentindo assim o prefeito.

Fabio Giambiagi* - O tabuleiro de 2022

- O Estado de S. Paulo

Começa um jogo que exigirá muita habilidade e estratégia dos participantes

Começam agora os primeiros movimentos visando a 2022. Em qualquer democracia o presidente tende a ser um candidato forte nas eleições. Até Mauricio Macri, com mais de 50% de inflação, foi um candidato competitivo na Argentina. Seria tolo não considerar o presidente Jair Bolsonaro um candidato de peso para 2022 se a economia estiver em condições minimamente decentes, isto é, crescendo – ainda que abaixo do desejável – e com inflação baixa.

Por outro lado, seria também ingênuo julgar que, pela elevada popularidade que ele teve em 2020, será um candidato imbatível. Parte daquela popularidade foi decorrência do auxílio do “coronavoucher” outorgado durante meses a 60 milhões de pessoas, que não se repetirá neste ano. E tudo indica que o governo enfrentará as eleições com desemprego alto e crescimento do produto interno brito (PIB) inferior ao de 2021. São elementos que uma oposição competente deveria ser capaz de explorar.

José Nêumanne* - Bolsonaro e Mourão são a quintessência da maldade

- O Estado de S. Paulo

Vice fã de torturador garante distância de presidente desumano de eventual impeachment

Balanço do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) aponta que, até 21 de novembro de 2020, foram registradas no Brasil 200 mil mortes, 24% mais do que era estimado para o ano findo. Naquela data, as perdas em decorrência da covid-19 chegavam a 168.989, conforme dados divulgados pelo consórcio dos meios de comunicação, já que o Ministério da Saúde se recusa a fornecer dados confiáveis. A coincidência levanta a hipótese de que, mesmo com aumento da população, a pandemia, maior causa de óbitos do País no ano, está muito longe de poder ser definida como mera “gripezinha”. Os números nunca mentem, mas isso não comoveu quem cruzou o marco do calendário gregoriano facilitando a contaminação pelo novo coronavírus.

Alguns brasileiros ilustres agiram como agentes desse contágio. O craque Neymar promoveu festa para 500 convidados em Mangaratiba, aviltando o tema do sucesso de Luiz Gonzaga. O influenciador em redes sociais Carlinhos Maia aglomerou centenas no Natal da Vila, resultando em 47 contaminados. Outro ídolo de crianças e adolescentes nas redes sociais, Felipe Neto, criticou-o, mas foi filmado jogando futebol. O governador de São Paulo, João Doria, jura adesão à ciência, mas fez um bate-volta para Miami a pretexto de “merecido” repouso de guerreiro. Outro tucano, Bruno Covas, festejou a reeleição para a Prefeitura de São Paulo num “covidão” que lembrou bailes funk da periferia, e ainda promoveu um bonde da alegria com aumento de 46% para si, o vice, vereadores e servidores. Merval Pereira definiu-os como “sem noção” em sua coluna no Globo.

Dentre eles, Jair Bolsonaro é hors-concours. Ganhou menção especial porque passou o Natal num forte militar em São Francisco do Sul (SC), pertinho de Presidente Getúlio, no Vale do Itajaí, onde 21 brasileiros morreram afogados numa enchente. Na companhia de um magote de bajuladores, deixou em Brasília a mulher, Michelle, que usufruiu o feriadão rodando de kart com o maquiador Agustin Fernandez no Ferrari Kart do Autódromo Nelson Piquet. Madame pode ser adicionada ao rol.

Tiago Cavalcanti* - O populismo em ascensão

- Valor Econômico

Os populistas acabam vendo as instituições existentes como um obstáculo aos seus objetivos

Winston Churchill, em discurso no parlamento britânico em 1947, proferiu o seguinte pensamento sobre a democracia: “Ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos.” Essa frase é frequentemente empregada para justificar o regime de governo democrático em relação aos outros sistemas.

Não há apenas um tipo de democracia. Ao contrário, há diversas formas, que variam nos graus de representatividade, liberdade e possibilidade de alternância de poder.

O pensador francês Alexis de Tocqueville, influente no pensamento liberal americano, argumentou em meados do século XIX que a liberdade individual e a igualdade de condições na política são princípios fundamentais em uma democracia. A liberdade individual deve ser regulada por meio de leis, que restringem o comportamento dos indivíduos e as interações sociais. Mas há certos princípios fundamentais que devem existir, como, por exemplo, a liberdade de expressão.

Após décadas da célebre frase do Churchill, o descontentamento com a democracia vem aumentando e atingiu nível recorde em vários países recentemente. Um relatório lançado em outubro passado pelo Centro para o Futuro da Democracia da Universidade de Cambridge, com dados de quase 50 anos e cobrindo 154 países, mostra que nos anos 90 cerca de 67% da população dos países desenvolvidos estavam satisfeitas com a democracia. Atualmente, mais de 50% dos indivíduos nesses países se dizem insatisfeitos com a democracia e a descrença é ainda maior nos Estados Unidos e no Reino Unido, bem como entre os mais jovens.

Malu Delgado - Cartografias da política e da miséria

- Valor Econômico

Uma onda de mal-estar inunda esse país sem bússola, sem auxílio nem plano de vacinação, hostil ao agravamento da miséria

Em política, quase sempre a memória serve de algo. E as evidências, quando se pensa em políticas públicas, caminham ao lado de gestões eficientes. Pois vamos a elas. Em setembro de 2020, o IBGE antecipou a publicação da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) feita em 2017- 2018. Soube-se, na ocasião, que cerca de 85 milhões de brasileiros sofriam, já naquela época, de “algum grau de insegurança alimentar em 36,7% dos domicílios”.

O nível de segurança alimentar do país chegava a seu patamar mais baixo desde que havia começado a ser medido, em 2004, a partir da criação do Ministério de Desenvolvimento Social (MDS), o gestor do Bolsa Família. Os dados atestavam que 10,3 milhões de pessoas viviam situações de “privação severa de alimentos” nesse período. Pelo menos 6,5 milhões de crianças com menos de cinco anos de idade moram em domicílios onde há algum grau de insegurança alimentar. Lembrete: esse era um cenário anterior à pandemia.

Para além das inúmeras variáveis da escala que o IBGE usa para medir insegurança alimentar leve, moderada ou severa, é bom ser direto: insegurança alimentar é prenúncio da fome, ou a fome propriamente dita, sem disfarce. No dramático 2020, a sociedade brasileira e todos os gestores públicos tomaram conhecimento, oficialmente, pelo IBGE, de que o Brasil retornara ao Mapa da Fome, antes do impacto da covid-19.

Adriana Fernandes - O País quebrado de Jair Bolsonaro

- O Estado de S. Paulo

Um presidente da República não deveria sair alardeando por aí que o país que ele mesmo governa está quebrado. Muito menos para servir de justificativa para o fato de não ter cumprido uma promessa de campanha sempre cobrada pelos seus apoiadores: aumentar o limite da faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF).

Saiu-se logo com a resposta mais fácil: o Brasil quebrou. Mas a verdade é que o presidente não mexeu uma palha para abrir espaço para corrigir a tabela do IRPF. Pelo contrário, beneficiou setores específicos nesses dois anos de governo e atropelou a discussão de mudanças no campo tributário por disputas políticas. Também não ajudou na pauta de corte de gastos ineficientes.

O que vão achar os investidores que compram papéis de um governo do qual o seu próprio presidente diz que está quebrado? É natural que comecem a cobrar cada vez mais para comprar os títulos da dívida brasileira. 

Ou seja, pode custar mais dinheiro para os contribuintes que o presidente promete ajudar com a correção da tabela do IRPF.

Míriam Leitão - A logística da Fiocruz

- O Globo

A presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, trabalha de olho no calendário e nos números de produção. Sabe que a saúde e a economia dependem da capacidade de fornecimento de vacinas. Até sexta-feira o instituto deve entrar com o pedido emergencial de uso da vacina da Oxford-AstraZeneca. Até o dia 17, devem chegar as duas milhões de doses importadas da Índia. Em fevereiro, a Fiocruz entrega ao governo 10 milhões de doses e, em março, outras 15 milhões. Ao todo, o instituto vai produzir 100 milhões de doses. O país começará, com a vacinação, a entrar em outra fase. “O momento atual é de muita dor, muita desinformação”, lamenta.

Nísia conta que o espaçamento de doze semanas entre as duas aplicações foi, no caso da vacina da AstraZeneca, conclusão de pesquisa clínica. Com a primeira dose, a imunidade já é de 70%.

—Uma coisa a nosso favor é esse intervalo de 12 semanas, porque, se essa estratégia for adotada pelo Plano Nacional de Imunização, permitirá que mais pessoas sejam imunizadas — diz Nísia Trindade.

Ela participou na segunda-feira de reunião com a Anvisa, para saber de todos os documentos que faltam para o pedido de autorização emergencial. São documentos que devem vir da Índia, onde são fabricadas as vacinas compradas prontas. Ela não tem dúvidas de que o Instituto Serum vai respeitar o contrato feito e mandar as doses:

Roberto DaMatta - Pandemia, comportamento e cura

- O Globo

Uma vacinação em massa seguindo critérios do bom senso é a maior prova de que podemos unir o formal e o costumeiro

O ano que formalmente acabou de acabar, mas está colado a este que se inicia, foi pródigo em assinalar nossa fragilidade diante de uma doença mortal e contagiosa. Este 2021 baliza, espero, a etapa da vacina e da cura. Uma vacina lamentavelmente politizada, sabotada, burocratizada e, por isso, irracional e desumanamente postergada entre nós.

O mais doloroso numa doença contagiosa é que ela não coloca ninguém acima de qualquer suspeita e, com isso, sacode axiomas sociais pouco discutidos. Por exemplo: pode o amor de mãe contaminar? Nossa casa pode ser um ninho virulento? Como festejar sem o contato físico e o abraço amoroso? A vacina deve seguir a velha hierarquia social ou as necessidades médicas dos grupos de risco?

Doenças de contágio são fatos sociais totais: elas nos atingem biológica e culturalmente. Matam anônimos e entes queridos, em paralelo, condenam gestos e hábitos que fazem parte do nosso arsenal de carinho. O contágio maltrata o cerne de nossas vidas porque somos seres sociais e, como tais, dependemos e somos constituídos de relações. Sem elas, entramos no reino das orfandades, cujo lar é o espaço em que os elos se desfazem: o mundo da rua.

O que pensa a mídia: Opiniões / Editoriais

Uma candidatura constrangedora – Opinião | O Estado de S. Paulo

É um acinte que a Câmara, cuja atual legislatura foi eleita sob o anseio de novo patamar de moralidade na vida pública, tenha sua presidência disputada pelo deputado Arthur Lira

É embaraçosa a normalidade com que tem sido aceita a candidatura do deputado Arthur Lira (Progressistas-AL) para a presidência da Câmara. Com o histórico do parlamentar, já é um tanto estranho que ele continue sendo líder do partido na Câmara. No entanto, nesses estranhos tempos, nada parece ser capaz de ruborizar seus apoiadores. Como se sabe, o seu mais ilustre apoiador é o presidente Jair Bolsonaro.

A proximidade do deputado Arthur Lira com questões penais vem de longa data. Em 2012, seu assessor parlamentar Jaymerson José Gomes foi detido pela Polícia Federal no Aeroporto de Congonhas, depois de passar pelo aparelho de raio X, com dinheiro escondido embaixo da roupa. Em relação a tais fatos, a Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciou o deputado em 2018 por lavagem de dinheiro e corrupção.

Noutro caso, Arthur Lira foi acusado pelo Ministério Público Federal de chefiar na Assembleia Legislativa de Alagoas um esquema milionário de “rachadinha”, em que parte do salário dos funcionários do gabinete era destinada ao parlamentar. Segundo revelou o Estado, documentos indicam desvios da ordem de R$ 254 milhões, entre 2001 e 2007.

A Arthur Lira, a “rachadinha” teria gerado um rendimento mensal de R$ 500 mil. Recentemente se revelou que a Receita Federal, já em 2009, havia cobrado R$ 1,9 milhão do deputado relativo a impostos não pagos sobre recursos de origem desconhecida, precisamente no período em que o Ministério Público o acusa de operar o esquema de “rachadinha” em Alagoas.

Música | Zeca Baleiro - Samba do Approach

 

Poesia | Graziela Melo - Pardos dias

Pardos dias
que se vão
ao longo
do meu viver

O entra
e sai
da agonia,

olhando
a casa
vazia

desde
a noite
ao sol nascer!

Os sons
longínquos
da alma,

exíguos
e já
rarefeitos,

se assemelham
aos tristes
sinos

que badalam
na solidão,

quando o sol
já vai fugindo,

e o céu
se avermelha
antes da
escuridão