• Nelson Barbosa, considerado fundamental para gestão tentar recuperar credibilidade na economia, é novo foco de preocupação
João Villaverde - O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA - O pagamento das pedaladas fiscais pelo governo Dilma Rousseff não foi suficiente para afastar o fantasma das manobras em 2016. O novo foco de preocupação do Palácio do Planalto no Tribunal de Contas da União (TCU) é o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa.
Até março, o TCU vai realizar a última parte do julgamento do caso e definir, portanto, a atribuição de responsabilidade para cada uma das 17 autoridades do governo arroladas no processo. Entre as penas que o tribunal pode atribuir estão desde multas até a inabilitação para o serviço público, o que exigiria a demissão imediata dos condenados. Barbosa é considerado fundamental para o plano do governo de recuperar credibilidade na área econômica neste início de ano e o Palácio do Planalto já trabalha por sua preservação no caso das pedaladas.
Uma eventual condenação do novo titular do Ministério da Fazenda jogaria, na avaliação do governo, mais insegurança e incerteza no mercado.
Segundo apurou o Estado, Nelson Barbosa deve usar a seu favor o ofício assinado pelo procurador Júlio Marcelo de Oliveira, do Ministério Público de Contas, que isentou o vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB), de responsabilidade na edição de decretos com a liberação de gastos.
Conforme o procurador, Temer não pode ser culpado por ter assinado decretos idênticos aos de Dilma e que estão citados no processo de impeachment na Câmara dos Deputados, uma vez que ele apenas seguiu a diretriz estabelecida pela presidente. O vice alega que a política econômica é definida pela chefe de Estado. Foi a mesma lógica apontada pelo procurador, destacando que Temer assinou como presidente interino.
Os dois pontos – a edição desses decretos e as pedaladas fiscais – fazem parte do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff aberto na Câmara dos Deputados e que será analisado a partir do mês que vem.
Lista. Também são alvo dos processos os presidentes do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, do Banco Central, Alexandre Tombini, e da Petrobrás, Aldemir Bendine (ex-presidente do Banco do Brasil), além do ex-presidente da Caixa, Jorge Hereda, hoje secretário de Desenvolvimento Econômico na gestão do governador petista Rui Costa, na Bahia. Estão citados ainda a ministra do Desenvolvimento Social, Tereza Campelo, e o ministro da Integração Nacional, Gilberto Occhi.
O procurador Júlio Marcelo de Oliveira é, também, o responsável pelo processo das pedaladas. Ele será o encarregado pelo pedido de punições. Caberá ao relator do processo, ministro José Múcio, definir se seguirá ou não os pedidos de Oliveira, que devem ser apresentados até o fim de fevereiro.
Múcio apresentará seu voto em plenário e os demais ministros da corte podem seguir ou não. Será a última parte do julgamento, que começou em abril do ano passado, quando os ministros condenaram as pedaladas de forma unânime.
O governo vai fazer uma força-tarefa junto a Múcio para evitar uma condenação grave de seus ministros, o que envolveria um constrangimento para a equipe econômica e poderia dificultar ainda mais as negociações com o Congresso para medidas do ajuste fiscal. Para a Advocacia-Geral da União, os atos não eram considerados ilegais quando praticados, entre 2013 e 2014, no primeiro mandato de Dilma.
Decisão dramática. O novo julgamento das pedaladas será dramático, avalia o Palácio do Planalto, pelo potencial de aumentar a temperatura do processo de impeachment, que poderá estar sob análise durante o mesmo período, mas na Câmara dos Deputados.
O afastamento da presidente Dilma Rousseff é pedido pela oposição com base nas pedaladas, que teriam constituído crime de responsabilidade.
As negociações com o TCU esbarram na jurisprudência criada pelo próprio tribunal. Depois que o Estado revelou as pedaladas, no primeiro semestre de 2014, o Ministério Público de Contas abriu requerimento solicitando auditoria da equipe econômica. A inspeção foi realizada e as pedaladas foram comprovadas.
O julgamento começou em abril de 2015, quando os ministros do TCU condenaram a manobra, de forma unânime, ao considerar que elas infringiram a Lei de Responsabilidade Fiscal. O governo entrou com recurso, rejeitado pelos ministros novamente de forma unânime.
Resta, agora, somente a atribuição de responsabilidade para que o julgamento seja concluído. No meio do caminho, as pedaladas ensejaram também a reprovação das contas federais de 2014. Foi a primeira vez em 78 anos que a Corte rejeitou contas de um presidente da República.
Trunfos. O governo, no entanto, avalia ter “trunfos” a seu favor. Segundo afirmou ao Estado o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, a zeragem das pedaladas, com o pagamento integral de todas as dívidas do governo no BNDES, Banco do Brasil, Caixa e FGTS, “demonstra” que o governo segue as orientações do TCU. O pagamento ocorreu no fim de 2015, depois de concluída a análise técnica pelo tribunal de contas.
Outro ponto favorável ao governo é o parecer do senador Acir Gurgacz (PDT-RO), relator do processo de análise das contas de 2014 na Comissão Mista de Orçamento. Diferentemente do TCU, que recomendou ao Congresso a rejeição das contas por causa das pedaladas, Gurgacz decidiu aprovar o balanço federal, em parecer apresentado há duas semanas. A decisão final caberá ao Congresso.
No Planalto, a avaliação é que o TCU deve concentrar as condenações no ex-secretário do Tesouro Arno Augustin, responsável direto pelas pedaladas, e seu braço direito, Marcus Aucélio, além do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega.