terça-feira, 3 de novembro de 2015

O impacto social da crise – Editorial / O Estado de S. Paulo

Os sinais de deterioração do mercado de trabalho, com o aumento do número de brasileiros sem ocupação e a queda da renda real dos que continuam empregados, só começaram a surgir algum tempo depois de a crise ter afetado duramente a produção e as vendas. Mas, quando surgiram, logo deixaram claro que estava em curso um persistente e rápido processo de piora do quadro. O mais amplo indicador de emprego do País – a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua, elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – não deixa dúvidas quanto a isso. O desemprego no trimestre encerrado em agosto alcançou 8,7%, o índice mais alto desde janeiro de 2012, quando essa pesquisa começou a ser feita, e 1,8 ponto porcentual maior do que o de igual trimestre do ano passado.

Essa taxa de desocupação, como o índice de desemprego é apresentado pelo IBGE, significa que, no período, havia 8,8 milhões de pessoas sem trabalho no País. É um contingente pouco menor do que a população da Suécia, equivalente à de países como Áustria, Suíça e Honduras, e quase 30% maior do que a do Paraguai. Isso dá uma ideia mais precisa da dimensão social do problema, que se agrava rapidamente. Em apenas um ano, o número de pessoas desempregadas cresceu 2 milhões.

Por abranger 3.464 municípios, a Pnad Contínua traz o retrato mais preciso do desemprego no País. Ela confirma – com outros números, por causa da diferença de metodologia – o que outras pesquisas já vinham mostrando. A Pesquisa Mensal de Emprego (PME), também do IBGE, mostra, como a Pnad, a alta contínua da taxa de desocupação desde o final do ano passado. Mais restrita, a PME mede o desemprego nas regiões metropolitanas de Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre. Em setembro, a desocupação medida pela PME alcançou 7,6%, ante 4,9% em setembro do ano passado. A tendência das duas pesquisas é de convergência para a mesma taxa.

A pesquisa mais ampla do IBGE constatou que, entre 2014 e 2015, o número de empregados com carteira de trabalho assinada diminuiu 1,1 milhão. Esses dados praticamente coincidem com os do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mantido pelo Ministério do Trabalho, que registra a variação do emprego formal no País. De acordo com o Caged, entre setembro de 2014 e setembro de 2015, o País perdeu 1,24 milhão de vagas no mercado formal. Os empregos com carteira assinada são os de melhor qualidade, pois asseguram aos trabalhadores os direitos previstos em lei, como férias proporcionais, proteção do sistema de previdência, 13.º salário e outros benefícios.

Nesse cenário, o crescimento do trabalho doméstico em 2015 é um indicador desfavorável, como observou o coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE, Cimar Azeredo, pois é consequência de demissões ou de falta de oportunidades em outras atividades, em geral mais bem remuneradas.
A abertura de 189 mil postos de trabalho em todo o País entre 2014 e 2015 constatada pela Pnad Contínua igualmente está muito longe de representar alívio. No mesmo período, uma quantidade muito maior de brasileiros passou a procurar emprego. Ingressaram na população ativa 2,2 milhões de pessoas que estavam há tempos sem trabalho, mas foram forçadas pelo agravamento da crise a procurar uma fonte de renda. Mas a economia não está gerando empregos na velocidade necessária, razão pela qual esse contingente ajudou a engordar também o número de desempregados, daí resultando o aumento da taxa de desemprego.

Depois de ter alcançado seu maior valor no último trimestre do ano, mantendo-o no primeiro trimestre deste ano, o rendimento médio real habitualmente recebido pelas pessoas ocupadas passou a cair. A queda no ano é de cerca de 2%. Em resumo, muitos perderam o emprego e os que conseguiram mantê-lo têm de se conformar com renda menor. O pior é que não há sinais de melhora no horizonte próximo.

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