terça-feira, 3 de novembro de 2015

Judiciário tomou para si o papel da redenção moral, diz Werneck Vianna

Por Cristiane Agostine – Valor Econômico

CAXAMBU (MG) - O Judiciário tomou para si o papel de redenção moral do país. Os responsáveis por investigações recentes de casos de corrupção, como a Operação Lava-Jato, assumiram um discurso de "saneamento ético" e é preciso que haja um "auto-limite" para evitar que o papel desse Poder seja colocado em xeque. A análise é do sociólogo Luiz Werneck Vianna, professor-pesquisador da PUC-Rio.

Para Werneck Vianna, ao mesmo tempo em que é positivo o fato de o Judiciário mostrar-se independente de pressões e "controles espúrios", é necessário que os representantes desse Poder evitem a "arrogância institucional" e fujam, sobretudo, "do papel messiânico de salvar o país".

"O Judiciário tomou para si o papel da redenção moral", afirmou o sociólogo, durante uma mesa redonda sobre a crise e a judicialização no sistema político brasileiro, no 39º encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), em Caxambu (MG), na semana passada. Em entrevista ao Valor, Werneck Vianna diz que "isso está presente na retórica dos juízes envolvidos na Lava-Jato", por exemplo. "Eles não acham que estão enfrentando apenas um caso técnico. Acham que estão envolvidos numa missão de saneamento ético-moral do país, assim como ocorreu com a Operação Mãos Limpas, na Itália", afirma.

Para o sociólogo, se não houver uma "auto-contenção" do próprio Judiciário, há riscos de "perder tudo", com possíveis contestações sobre as investigações e punições determinadas pelos juízes nos casos recentes de corrupção.

A "judicialização da política" e o fortalecimento do Judiciário são um "fenômeno mundial", analisa o sociólogo. Na história brasileira, esse Poder se fortaleceu nos últimos anos ao tomar decisões no lugar do Legislativo, como o reconhecimento da união homoafetiva e a proibição do financiamento empresarial de campanha, pelo Supremo Tribunal Federal (STF). "O crescimento, nessa escala, do Judiciário deve-se em boa parte ao fato de as instituições republicanas terem se enfraquecido. À medida que o Legislativo deixou esse vácuo, o Judiciário ocupou", diz Werneck Vianna, lembrando, em seguida, que o próprio Legislativo passou a recorrer ao Judiciário para recorrer a questões internas do Congresso.

Em caso recente, o Executivo recorreu ao Supremo para questionar o rito a ser seguido pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), em um eventual processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. "Os outros Poderes estão legitimando essa presença assustadora do Judiciário na vida do país", diz o sociólogo.

Mesmo com o enfraquecimento do Executivo com a crise política, Werneck Vianna evita projetar os cenários mais pessimistas tanto para o governo Dilma quanto para o PT. A pressão pelo impeachment se arrefeceu neste momento, com a resistência de parte do PSDB em apoiar o afastamento da presidente, e ainda não foram criadas condições políticas para o "day-after" de uma eventual queda de Dilma. O PT, com integrantes investigados na Operação Lava-Jato, tende a perder força e espaço nas prefeituras nas eleições de 2016, mas não será aniquilado. "Partidos são instituições longevas, difíceis de morrer", diz.

No entanto, o sociólogo critica o PT por aderir a "práticas patrimonialistas" e por ter se envolvido em graves escândalos de corrupção, como o mensalão e o "petrolão" em busca de um novo mandato na Presidência a qualquer preço. Ao contrário das previsões que fez em 2012, quando analisou que o mensalão poderia servir para o PT se modernizar, Werneck Vianna diz que os desvios de recursos na Petrobras são ainda mais letais do que o escândalo de dez anos atrás e mostraram que o partido da presidente Dilma se perdeu na "volúpia" por manter-se no poder.

Os escândalos de corrupção, com os desvios éticos, diz, afetam o futuro da esquerda no país e são um risco até mesmo para a democracia brasileira. "É muita denúncia. É perigoso para a democracia brasileira. As instituições são fortes, mas não invencíveis. Se forem muito pressionadas podem ruir", diz.

A repórter viajou a convite da Anpocs

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