quarta-feira, 21 de junho de 2017

Sem Temer, mas com sua coalizão | Cristiano Romero

- Valor Econômico

Muda-se o presidente, mas não a política econômica do governo

O Brasil vive uma longa agonia. O país não cresce há três anos, está em recessão desde o segundo trimestre de 2014 e tudo indica que, apesar da melhora ocorrida no primeiro trimestre, terminará este ano com expansão próxima de zero. Quando a economia deu sinais de que começava a melhorar, o humor dos empresários, os responsáveis por tomar a decisão de investir e assim acelerar a atividade, foi abatido, em meados do mês passado, pela crise que ameça o mandato do presidente Michel Temer.

A reação dos mercados à crise foi imediata: a bolsa fez rápida correção nos preços dos ativos, o dólar se moveu e os juros de curto e longo prazo dos contratos futuros subiram. Apesar da correção, não houve pânico. Nas semanas seguintes, o que se viu foi uma acomodação à espera de notícias de Brasília. O cenário externo, mais favorável, ajudou a amortecer a queda do real.

De certa forma, a expectativa predominante há um mês era a de que Temer não conseguiria se manter no cargo. Seguindo o rito constitucional, o presidente não resistiria à delação dos sócios da JBS e renunciaria ao mandato ou então o perderia por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que deliberaria pela cassação da chapa Dilma-Temer. A deposição via TSE seria a saída honrosa de Temer.

Com o presidente deposto, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) assumiria o posto interinamente e convocaria eleição indireta para escolher o substituto. Para o pleito, os mais cotados a vencer seriam o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), o ex-ministro Nelson Jobim, que é filiado ao PMDB, e, correndo por fora (na verdade, por dentro), o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, além do próprio Rodrigo Maia, hoje personagem central da base aliada de Temer.

Esse roteiro foi idealizado por quem acredita que o Brasil não aguenta mais tanta turbulência. É um cenário em que muda-se o presidente, mas não a política econômica. Em 2014, último ano do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu mísero 0,5%, resultado da sucessão inacreditável de equívocos cometidos pelo governo desde 2011 - entre outros, redução dos juros na marra, desvalorização forçada do real, elevação descontrolada do gasto público, intervenção nos preços dos combustíveis e de energia, maquiagem das contas públicas, pedaladas fiscais, desoneração da folha de pessoal sem avaliação dos riscos fiscais e tolerância com inflação alta.

O crescimento anêmico de 2014 foi a senha do que estava por vir. Em 2015, o PIB recuou 3,8% e, no ano passado, caiu mais 3,6%. Em três anos, a renda per capita recuou 11%. Empresários suspenderam investimentos; milhões de trabalhadores perderam seus empregos; dezenas de empresas entraram em regime de recuperação judicial; Estados - dentre os mais ricos - quebraram, passando a atrasar o pagamento de salários de seus servidores; a miséria e a violência escalaram nas grandes cidades e também no interior: este é o saldo, até agora, da crise produzida por um governo que concluiu que o receituário econômico - que, inclusive, o levou ao poder - estava errado!

Temer assumiu em maio do ano passado sob enorme desconfiança. O máximo que se esperava dele era uma política feijão-com-arroz que levasse o país até 2018. O presidente percebeu, porém, que havia uma chance para tirar da gaveta uma agenda ousada de reformas. Em momentos de crise aguda, há sempre a oportunidade de se fazer algo, atribuindo ao descalabro encontrado a justificativa das mudanças.

O presidente montou um governo "congressual" ao colocar na esplanada dos ministérios políticos capazes de somar votos no Congresso. E nomeou uma equipe econômica de alta qualidade, com excelentes serviços prestados à nação. Com essa retaguarda, apresentou rapidamente propostas de reforma ao Legislativo. Em um ano de mandato, aprovou a criação de um teto para as despesas públicas e começou a passar a esperada reforma da previdência, para citar os itens mais relevantes da agenda.

O que se viu nesse período foi a forte recuperação da confiança tanto dos empresários quanto dos consumidores, que andavam deprimidos com as perspectivas do país. A retomada da confiança não trouxe crescimento imediato, mas o roteiro estava dado. Quando perceberam que o propósito do governo em levar adiante as reformas era sério, os empresários começaram a preparar o terreno para a volta do crescimento.

No último trimestre do ano passado, muitas empresas, depois de renegociarem dívidas, foram ao mercado captar recursos, um movimento típico de quem começa a acreditar na recuperação. Depois do vazio dos anos de crise, as ofertas iniciais de ações (IPO, na sigla em inglês) voltaram com força. Paralelamente, as aquisições e fusões de empresas também aceleraram, outro sinal de posicionamento de grupos empresariais perante a retomada.

O único senão desse cenário benigno seria Temer ser atingido por uma "hecatombe", isto é, por denúncias de malfeitoria investigadas pela Operação Lava-Jato. Não foi exatamente isso o que ocorreu, mas o efeito das conversas embaraçosas que o presidente teve com o empresário Joesley Batista foi o mesmo. No Brasil atual, e isso é muito positivo, a maioria da sociedade não aceita mais que um governante suspeito de corrupção permaneça no cargo.

O que não se esperava era que Temer fosse resistir tanto para ficar no cargo, além de não renunciar. Neste momento, ele trava um duelo perigoso com o procurador geral da República, Rodrigo Janot. A principal arma do presidente é a economia, por isso, ele segue tentando aprovar as reformas no Congresso. Os mercados, depois da correção inicial, devolveram dois terços da alta dos juros e a bolsa, quase toda a perda, o que indica não otimismo, mas a crença de que Temer pode até cair, mas a coalizão conservadora que o apoia seguirá no comando das ações em Brasília.

"Os mercados estão 'standstill' (parados) porque a coalizão deve ficar", diz um economista com experiência em Brasília e São Paulo. "Evidentemente, essa situação só é possível porque a presença do Henrique Meirelles [ministro da Fazenda] e do Ilan Goldfajn [presidente do Banco Central] é a garantia de que não tem besteira na área econômica." Nesse caso, sinônimo de "besteira" é: medida irresponsável para estimular o crescimento da economia a qualquer preço, prática tão comum na gestão Dilma que levou o país à ruína.

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