domingo, 2 de setembro de 2018

Míriam Leitão: Na economia há pontos em comum

- O Globo

Há convergência nas propostas econômicas dos principais candidatos para temas sensíveis e polêmicos na economia. O risco mora nos detalhes

Nesta eleição com tantos conflitos e tanta incerteza há uma saudável convergência entre algumas propostas econômicas. Elas não são iguais, contudo, e o risco mora nos detalhes. Todos podem fazer afirmações parecidas, mas se referindo a medidas diferentes entre si. Os candidatos mais competitivos, e seus economistas, têm falado da reforma da Previdência, em criar uma taxação sobre dividendos e em reduzir as renúncias fiscais.

De todos os cinco partidos com maior percentual de intenção de votos nas pesquisas, só o PT não defende uma reforma na Previdência que inclua a idade mínima. O partido fala muito superficialmente sobre o assunto e não dá ao tema a urgência que ele deve ter.

Ciro, Marina, Alckmin e Bolsonaro admitem que é preciso fazer uma reforma da Previdência que tenha, em algum momento, a mudança para o regime de capitalização. A diferença entre eles é quando o novo regime de contas individuais de aposentadoria começa a valer. Ciro Gomes propõe uma redução do atual teto do INSS para quem está contribuindo com indenização através de um título resgatável no futuro e quer que essa travessia de um para outro sistema comece a ser feita. A dúvida sempre foi o custo dessa travessia. Sabe-se que é alto e crescente. Mas esse assunto, que sempre foi considerado tóxico para uma campanha eleitoral, entrou no debate. Como, quando e de que forma trabalhar pelo reequilíbrio do sistema de pensões e aposentadorias não está claro.

O Brasil não cobra imposto na distribuição de dividendos aos acionistas, e as campanhas de Marina, Ciro, Alckmin e PT defendem passar a cobrar. Para não aumentar a carga tributária seria recomendável, na opinião até do Ministério da Fazenda, que houvesse a redução do IRPJ e do CSLL pagos pelas empresas. Porém, nem todos falam com a mesma ênfase na redução desses impostos. Os programas dos cinco candidatos com mais chance de estar no segundo turno defendem a redução da renúncia fiscal. Uma conta que aumentou muito, principalmente nos governos do PT. Ciro propõe um corte linear de 15%. Bolsonaro tem proposta mais radical. Alckmin e Marina falam em analisar os programas para reduzir o gasto tributário.

O pior problema dessa despesa é que ela é crescente e vários programas se eternizam sem qualquer tipo de fiscalização ou avaliação de desempenho. Alckmin não defende o aumento do imposto sobre herança porque no quadro jurídico atual cabe aos estados a decisão sobre esse imposto. A maioria cobra 4%, mas alguns já elevaram para até 8%. O imposto sobre herança e doações é baixo no Brasil, em comparação com outros países, mas para o governo federal passar a ter uma fatia dessa arrecadação só se criasse um imposto a nível nacional. Isso não consta do programa de Alckmin, mas está na proposta de Ciro que quer fazer uma forte elevação desse imposto. Bolsonaro também não defende esse tributo, porque alega que conseguirá fazer seu ajuste com privatizações, cortes de gastos e venda de imóveis.

O detalhe é que o programa do PSL fala em R$ 1 trilhão com venda de imóveis. De fato esse é o valor calculado no balanço dos bens da União, mas tudo incluído, dos parques nacionais ao Palácio do Planalto. Os disponíveis para venda, apesar de vários deles terem contenciosos, estão avaliados em R$ 200 bilhões. Ainda na tributação, Marina defende a criação de um imposto para a descarbonização da economia. Todos os candidatos dizem que é preciso aumentar a competição entre os bancos para a redução do spread. A reforma trabalhista é criticada parcialmente por Marina, seria revogada por Ciro e PT e seria mantida por Alckmin. Bolsonaro fala em criar uma outra carteira de trabalho não submetida à CLT.

Acham urgente o reequilíbrio das contas públicas Alckmin, Bolsonaro, Marina e Ciro. O candidato do PSL diz que vai resolver em um ano. Os outros três defendem dois anos para zerar o déficit. O PT considera que basta indicar que no futuro haverá equilíbrio. Há uma convergência sobre a necessidade de enfrentar o déficit e o crescimento da dívida pública.

Há candidatos que propõem uma coisa e falam o contrário. Bolsonaro defendeu recuperar o valor em salário mínimo das aposentadorias, o que elevaria os custos na Previdência. Por isso, é preciso atenção ao que eles falam e escrevem. O risco mora nos detalhes.

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