domingo, 2 de setembro de 2018

Vinicius Torres Freire: Emprego, Lula, Bolsonaro e 'Cirina'

- Folha de S. Paulo

Perda de empregos na recessão e violência ajudam a pensar o potencial de votos

Lula da Silva (PT) tem mais votos quanto mais pobre o eleitorado; Jair Bolsonaro (PSL) é o avesso. É o que todo mundo sabe muito bem, até este início da propaganda na TV e no rádio.

Mas é plausível dizer que a perda de empregos na recessão ou o nível de violência de um estado também sejam indícios importantes de voto nessas personagens.

Pesquisas nacionais e regionais indicam ainda que uma entidade chamada "Cirina" teria perfil de votação parecido com o de Lula. "Cirina" é a soma dos votos de Marina Silva (Rede) e Ciro Gomes (PDT) quando o petista sai das pesquisas (26%, contra 22% de Bolsonaro, no mais recente Datafolha).

Trata-se apenas de especulação aritmética, é claro. No caso remoto de haver união de candidaturas, não saberíamos quantos votos "Cirina" perderia (haveria desafetos de Marina ou Ciro em cada eleitorado).

Onde há pesquisas consideráveis, observa-se que Lula tem mais voto quanto menor a renda média de uma região ou estado. Não é o caso de Bolsonaro, que tem votação mais bem distribuída nesse quesito.

Lula tem mais voto quanto mais um estado ou região perdeu empregos nesta crise (entre 2014 e 2017).

O caso de Bolsonaro é exatamente o contrário.

Quanto mais violentos a região ou os estados (pela taxa de homicídios), mais Lula tem voto, ao contrário de Bolsonaro.

Bolsonaro vai melhor, pois, nos estados do Centro-Oeste, região que menos perdeu emprego. Vai bem nos estados sulistas, que em termos proporcionais perderam quase tantos empregos (população ocupada) quanto o Sudeste, embora o Sul tenha tradicionalmente taxa de desemprego mais baixa.

Quanto aos demais candidatos, a estatística não permite dizer grande coisa.

Quando Lula não está na parada, há migração relevante de votos de Lula para Marina Silva (Rede) e Ciro Gomes (PDT), como se sabe. Quando se combinam os votos de Marina e Ciro nessa entidade que chamamos de "Cirina", surge um eleitorado de perfil mais parecido com o da votação de Lula, embora com uma diferença menos marcada de votação entre classes de renda. "Cirina" fica mais parecido com Lula nas votações por estados e regiões.

O que importa "Cirina"?

Indica um tanto do gosto dos eleitores órfãos de Lula. Quem quer encorpar sua candidatura tem de pensar em "Cirina". Isso vale tanto para o sucessor eventual de Lula quanto para os "liberais" Geraldo Alckmin (PSDB), Alvaro Dias (Pode), João Amoêdo (Novo) e Henrique Meirelles (MDB) (somados, têm 17%).

Regiões mais amenas do país em termos de renda, emprego, violência, desigualdade e sofrimento na recessão são algo mais bolsonaristas.

As terras onde as dificuldades são ou ficaram maiores tendem ao lulismo ou, na ausência deste, a "Cirina".

E daí?

A perda de emprego explica a baixa da renda e o aumento da desigualdade nos últimos três ou quatro anos; os programas sociais continuaram lá, a atenuar o desastre.

É sempre óbvio um candidato tratar de emprego na campanha, ainda mais nesta recessão excepcional. Mas uma conversa genérica, a mesma para qualquer parte do país e suas diferentes crises, deve chover no molhado ou soar como demagogia ignorante das condições locais. Vale o mesmo na falação sobre violência.

Há também mais indecisos nas terras da violência e do massacre do emprego. Falar de modo específico com essas pessoas pode render votos que faltam para um segundo turno.

Óbvio? Mas o que temos ouvido a respeito?

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