domingo, 20 de fevereiro de 2011

O Rio – continuação::João Cabral de Melo Neto

Ou
relação da viagem
que faz o Capibaribe
de sua nascente
à cidade do Recife

Conversa de rios

Só após algum caminho
é que alguns contam seu segredo.
Contam porque possuem
aquela pele tão espessa;
por que todos caminham
com aquele ar descalço de negros;
por que descem tão tristes
arrastando lama e silêncio.
A história é uma só
que os rios sabem dizer:
a história dos engenhos
com seus fogos a morrer.
Nelas existe sempre
uma usina e uma bangüê:
a usina com sua boca,
com suas várzeas o bangüê.

A usina possui sempre
uma moenda de nome inglês;
o engenho, só a terra
conhecida como massapê.
E o que não pode entrar
nas moendas de nomes inglês
a usina vai moendo
com muitos outros meios de moer.
A usina tem urtigas,
a usina tem morcegos,
que ela pode soltar
como amestrados exércitos
para ajudar o tempo
que vai roendo os engenhos,
como toda já roeu
a casa-grande do Poço do Aleixo.

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