segunda-feira, 2 de julho de 2012

Governo dá incentivo fiscal, mas empresa contrata menos

Setores abriram mais vagas antes de receber estímulos oficiais

Apesar de terem recebido incentivos do governo, como redução do IPI e desoneração da folha de pessoal, diversos setores reduziram o ritmo de contratações de funcionários este ano. A indústria de automóveis, por exemplo, abriu só 1.197 novos postos de trabalho entre janeiro e maio, número 74% menor que o registrado no mesmo período de 2011. Já no segmento de confecções, o saldo entre contratações e demissões caiu 61%. Analistas dizem que esses setores poderiam estar pior se não fossem os incentivos, mas questionam a eficácia desse modelo.

Menos imposto, menos emprego

Setores reduzem ritmo de contratação de funcionários em até 74% mesmo após receberem incentivos do governo

Paulo Justus, Lino Rodrigues

SÃO PAULO - Mesmo após receber incentivos fiscais do governo federal, muitos setores registraram queda de até 74,49% no ritmo de abertura de novos postos de trabalho nos primeiros cinco meses deste ano, na comparação com o mesmo período de 2011. Os quatro setores que, desde o fim do ano passado, já usufruem da desoneração da folha de pagamentos (couro e calçados, call centers, tecnologia da informação e confecções), por exemplo, estão contratando menos. O mesmo acontece com os fabricantes de automóveis, que desde o fim de 2011 ganharam as barreiras tarifárias contra os importados, e ainda tiveram o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) reduzido, novamente, a partir do mês de maio.

- Os incentivos via desoneração da folha de pagamentos ainda são muito novos e demoram para surtir efeito. Mas as medidas ajudam a minorar o avanço do desemprego - avalia Júlio Gomes de Almeida, consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).

No caso do setor de confecções, por exemplo, que teve a folha desonerada, as contratações superaram as demissões em 3,9 mil entre janeiro e maio deste ano, enquanto no mesmo período do ano passado, a diferença foi de 10,3 mil empregos, de acordo com os números do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho. Para a Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (ABIT), a queda no ritmo de contratações indica que parte do setor não achou vantajosa a troca da contribuição patronal de 20% sobre a folha de pagamentos pela alíquota de 1,5% sobre o faturamento bruto, que passou a vigorar em 15 de dezembro.

- Nossas contas indicavam que o número correto seria 0,8% sobre a receita bruta. Mas foi adotada uma alíquota de 1,5%. O resultado é que a indústria está muito travada e perdendo produção nesses cinco primeiros meses de 2012, mas ainda assim está contratando - diz o diretor-superintendente da Abit, Fernando Pimentel.

Setor de autopeças corta 5,5 mil vagas

Segundo ele, o emprego deve melhorar a partir de agosto, quando a segunda fase da desoneração entrar em vigor e a alíquota sobre o faturamento cair a 1% do faturamento. Nessa fase, outros 11 setores também terão o benefício.

Outro setor que espera melhoras é o de calçados, que também terá a correção da alíquota sobre o faturamento bruto em agosto, de 1,5% para 1%. Até o momento, o setor está entre os que criaram menos postos em 2012 do que no ano passado. De janeiro a maio, abriu 14 mil postos, menos que os 15 mil gerados no ano passado.

- Apesar dos bons incentivos para mercado interno, o setor sofre com a queda das exportações, o que levou muitas fábricas a fecharem as portas neste ano - diz Paulo Grings, vice-presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados) e presidente da Piccadilly.

Mesmo a cadeia automotiva, que novamente foi contemplada pela redução do IPI, gerou menos postos de trabalho: 1.197 de janeiro a maio de 2012, contra 4.692 nos mesmos meses do ano passado.

A situação mais grave, porém, é a do setor de autopeças, que, apesar de favorecido indiretamente pelos incentivos dados às montadoras, amargou o fechamento de 5,5 mil postos de trabalho nos cinco primeiros meses do ano. No mesmo período de 2011, as contratações haviam superado as demissões em 12,8 mil.

O cenário de desaceleração do emprego já é motivo de apreensão entre os representantes dos trabalhadores. O Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, no Vale do Paraíba, estima que a fábrica da General Motors na cidade já fechou 1,2 mil postos de trabalho desde abril de 2011. - Embora não tenha sido demissão, foram vagas que não foram repostas. Isso continua mesmo com os incentivos dados pelo governo - diz Antonio Ferreira dos Santos, presidente da entidade.

Em abril, a GM lançou um Programa de Demissão Voluntária (PDV) que teve 186 adesões. O programa foi reaberto há duas semanas em São José dos Campos e estendido à fábrica de São Caetano, no ABC paulista. Segundo a montadora, o PDV foi levado a São Caetano a pedido do sindicato e os fechamentos de postos em São José dos Campos se devem à eliminação de um dos turnos nas linhas de produção do Corsa, Meriva, Zafira e Classic, modelos que estão com o ritmo de vendas em baixa. A empresa informou ainda que está contratando mais pessoal nas outras unidades, em Gravataí (RS), onde está ampliando a fábrica, e em São Caetano, por conta da produção de novos modelos.

Capacidade de consumo se esgota

Os demais setores beneficiados pela redução do IPI neste ano tiveram uma leve melhora nas contratações. Os fabricantes de fogões, máquinas de lavar e secar, que ganharam mais dois meses de imposto reduzido na sexta-feira, contrataram 851 funcionários a mais do que demitiram no período, revertendo o fechamento de 384 postos de trabalho nos cinco primeiros meses de 2011. A indústria de móveis contratou 6 mil funcionários entre janeiro e maio, mais que os 5,8 mil admitidos no mesmo período do ano passado.

- Esperávamos um crescimento de 8% nas vendas no trimestre, mas tivemos uma alta de apenas 2,5% - afirmou José Luiz Diaz Fernandez, presidente da Associação Brasileira das Indústrias do Mobiliário (Abimóvel).

Segundo Márcio Salvato, coordenador de Economia do Ibmec, o desempenho abaixo do esperado das reduções do IPI indica que há um esgotamento do modelo de incentivo ao consumo.

- Estamos chegando a um limite da capacidade deste consumo responder aos incentivos. O crédito já se expandiu bastante e a inadimplência também está em alta, o que indica que a capacidade de consumo das famílias está se esgotando - afirma.

Salvato diz que os incentivos concedidos a setores específicos têm o inconveniente de serem dados por um prazo determinado e adiantarem o consumo. Isso faz com que seus benefícios em termos de geração de empregos sejam limitados.

- O empresário prefere produzir mais usando horas extras do que contratando novos funcionários. Ele sabe que essa demanda é momentânea. Seria mais interessante dar reduções fiscais que fossem amplas e permanentes - diz.

Para José Silvestre Prado de Oliveira, coordenador de relações sindicais do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), os incentivos estão na direção correta. O fato de haver uma desaceleração nas contratações dos setores beneficiados pelas medidas é apenas mais um sinal de que essas indústrias precisavam de apoio.

- As medidas visam a manutenção dos empregos. Sem elas, os setores estariam pior.

Entre os que não receberam incentivos, o comércio teve queda de 88,97% no ritmo de contratações entre janeiro e maio deste ano. Já o de construção civil, intensivo em mão de obra, teve aumento de 31,06%.

FONTE: O GLOBO

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