terça-feira, 19 de dezembro de 2017

A via chilena: Editorial/Folha de S. Paulo

Assim como boa parte da América Latina, o Chile viveu seu período de redemocratização entre o fim dos anos 1980 e início dos anos 1990. Passados quase 30 anos, mantém-se em uma trajetória singular, destoando dos vizinhos por apresentar estabilidade política e uma orientação inequívoca à economia de mercado.

Prova de que o país continua a percorrer esse caminho ocorreu no último domingo (17), com a volta ao poder de Sebastián Piñera.

À frente do governo entre 2010 e 2014, o empresário de centro-direita obteve triunfo robusto no segundo turno, com 54,6% dos votos, contrariando pesquisas que lhe davam apertada vantagem sobre o rival, Alejandro Guillier.

A recondução do ex-presidente ao Palácio de La Moneda confirma um processo de alternância de forças políticas quase impensável sob os padrões do subcontinente.

Após a ditadura de Augusto Pinochet, uma coalizão de centro-esquerda governou o Chile até 2010, quando terminou o primeiro mandato de Michelle Bachelet. Sem direito à reeleição imediata, ela deu lugar a Piñera; este devolveu o cargo a Bachelet em 2014 e, agora, retoma dela a Presidência.

Esse revezamento transcorreu sem sobressaltos, muito pela convergência das forças para o centro. Discordâncias partidárias, quando existentes, não afetaram os fundamentos da política econômica. Daí a impressão de que para os chilenos tanto faz quem esteja no comando, pois a condução do país não será alterada na essência.

Piñera venceu, porém, com um discurso de "correção de rumo". Com efeito, o pacote de reformas adotado por Bachelet não trouxe o efeito esperado. Fracassou, em especial, a decisão de elevar a taxação sobre empresas para aumentar a arrecadação tributária e, com isso, financiar um sistema de ensino superior público e 100% gratuito.

O sistema produtivo, como se podia prever, reagiu mal à mudança. Investimentos caíram e a geração de empregos estagnou, também em decorrência de uma reforma trabalhista que desagradou ao empresariado por ter ampliado poderes de negociação dos sindicatos.

Prejudicaram a atual mandatária, cumpre dizer, as baixas cotações do cobre durante seu segundo governo —o produto responde por cerca de 45% das exportações chilenas. A tendência agora é de alta, o que deve facilitar a tarefa de Piñera de retomar os níveis de crescimento de seu primeiro governo.

Diante dos recentes percalços, parece natural o retorno de um governante associado à atração de negócios e à busca por competitividade. O país oscila rumo ao liberalismo, sem que a esquerda moderada tenha saído de cena.

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