segunda-feira, 25 de junho de 2018

Opinião do dia: Fernando Henrique Cardoso

• Na sua avaliação, por que o candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, tem um desempenho fraco nas pesquisas se comparado às pesquisas do mesmo período desde 1994?

Porque a sociedade mudou muito, os novos meios de comunicação estão à disposição do eleitorado e o momento é difícil para quem está no governo. Entretanto, é cedo para avaliar. O jogo eleitoral para o povo começa mesmo quando a televisão e o rádio entram.

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Fernando Henrique Cardoso, sociólogo, foi presidente da República. Entrevista: ‘Crise moral pôs todos partidos longe das ruas, O Estado de S. Paulo, 24/6/2018.

José Eduardo Faria*: Políticos e juízes, entre o destino e a tragédia

- O Estado de S.Paulo

Ao contrário das novas gerações, as mais antigas podiam ser menos informadas, mas sabiam operar com modelos capazes de sinalizar caminhos e antever cenários, mesmo que sombrios

Entre as consequências da velocidade do processo de destruição criadora, da financeirização dos capitais e da interconexão global dos mercados, destacam-se a erosão das certezas, a dificuldade de identificar as questões mais importantes e desorientação na formulação de respostas. Ao contrário das novas gerações, as mais antigas podiam ser menos informadas, mas sabiam operar com modelos capazes de sinalizar caminhos e antever cenários, mesmo que sombrios. As gerações atuais vivem um paradoxo: quanto mais informações recebem, mais ficam indecisas, revelando-se incapazes de fazer as indagações necessárias à compreensão do momento atual.

Uma dessas indagações é saber como proceder na interpretação de fatos, narrativas e teorias. Outra diz respeito ao tema da legitimidade: na democracia, quem tem a autoridade para impor obrigações aos cidadãos? Como interpretar declarações de políticos que, perplexos com a atuação da Justiça, passaram a perguntar quem manda – se os juízes de primeiro grau ou o presidente da República. “No mundo persa ou grego, o destino era uma atribuição dos deuses. Quando Roma inventou a política, deu o destino – e a tragédia – nas mãos dos homens. Às vezes tenho a impressão de que essas corporações querem substituir os deuses antigos”, afirma um desses políticos.

Num período em que a desorientação resulta do aumento das possibilidades de ação, o denominador dessas indagações se traduz pela incapacidade dos políticos de compreender a política a partir de seus componentes básicos – as relações de força, autoridade, mando e obediência. Outro denominador é a ideia de que os prognósticos com relação ao futuro são inversamente proporcionais ao seu conhecimento. Quanto mais se fala do futuro, menos se sabe sobre ele. Um modo de compreender esse cenário de dubiedades é retomar um ponto da obra de Max Weber, para quem os processos civilizatórios podiam ser vistos como processos de racionalização, como os que forjaram o mundo moderno. Uma das características da modernidade está na crise de seus fundamentos nos planos do conhecimento, da moral e da política. A angústia despertada no homem moderno após a libertação dos laços feudais, dizia Weber, levou-o a uma busca obstinada por calculabilidade e previsibilidade, valorizando a impessoalidade nas relações de dominação e uma ordem jurídica elaborada racionalmente.

Marcus Pestana: O Brasil que queremos

- O Tempo (MG)

Estamos a três meses e meio das eleições de 2018. Depois de um período turbulento, estaremos frente a frente com a mais decisiva e misteriosa eleição das últimas décadas. Vivemos de tudo um pouco nos últimos anos: recessão, Lava Jato, crise fiscal, impeachment, denúncias contra o presidente, desalento social, desarranjo institucional. O bom na democracia é que, de quando em quando, o poder político se reencontra com sua fonte original: a soberania popular.

Há uma curiosa e instigante contradição na relação entre representantes e representados. Ninguém chega a Brasília ou Belo Horizonte por decreto. A representação política e a correlação de forças nascem da vontade expressa do eleitorado. São espelho da vontade da sociedade. Mas, em momentos como os que vivemos, a população olha no espelho e não gosta do que vê.

Surge, assim, uma legítima aspiração por mudança e renovação. Oxigenar o sistema político é sempre positivo. Mas a experiência acumulada também é central. O novo pelo novo não diz muita coisa, mas velhas práticas precisam ser mudadas radicalmente.

Marcus André Melo: Voo sob neblina

- Folha de S. Paulo

Eleitorado pune e premia o desempenho e a probidade de governantes

Na teoria convencional da democracia, os eleitores escolhem representantes alinhados com suas preferências e que implementarão um conjunto de ações que expressam a vontade geral.

Essa visão convencional, que teve suas contradições criticadas por Joseph Schumpeter (1883-1950) há quase 80 anos e suas inconsistências técnicas expostas por Kenneth Arrow em 1951, vem sendo substituída por uma visão mais realista da democracia.

Nas democracias velhas e novas, quem governa conta com o apoio da maior minoria, não de uma maioria. O comparecimento às urnas é em geral da ordem de 65% e onde adotam-se distritos uninominais, como a Inglaterra, o ganhador das eleições conta com o apoio eleitoral de pouco mais de 50% desse percentual, ou seja, pouco mais de um terço do eleitorado. Este último percentual é ainda menor onde a representação proporcional é utilizada.

Mesmo no Brasil, onde o voto é obrigatório, em torno de 20% do eleitorado se abstém e pouco menos de 10% anula o voto. Em 2014, no segundo turno, Dilma Rousseff recebeu 54,5 milhões de votos, ou seja, 38,1% do eleitorado de 142,8 milhões.

Mais problemático para a visão tradicional da democracia é o fato de que o eleitorado não tem preferências formadas sobre a vasta maioria dos itens da agenda pública, para além das chamadas “valence issues” —questões sobre as quais há consenso quanto aos objetivos, mas não aos meios, como é o caso de melhor atenção à saúde.

Denis Lerrer Rosenfield*: Eleições e reformas

- O Estado de S.Paulo

Surpreende que, as eleições se aproximando, o País se encontre na quase ausência de um debate sério sobre o seu futuro

Surpreende que, as eleições se aproximando, o País se encontre na quase ausência de um debate sério sobre o seu futuro. Diferentes propostas populistas surgem dos mais diferentes recantos, revelando que a herança lulopetista não foi ainda exorcizada. Ideias das mais simplórias ganham a cena, como se os graves problemas nacionais pudessem ser equacionados sob as mais variadas formas de “vontade política”. Até parece que o Brasil nada aprendeu. Expressão disso são os altos índices de intenção de voto no ex-presidente Lula, hoje um presidiário que pretende apresentar-se como a solução de todos os problemas que estão aí, fórmula mágica usada para encobrir seus próprios erros e crimes.

Acontece que a sociedade está anestesiada ideologicamente, embora se tenha mostrado ativa politicamente. As pesquisas mostram que ela se manifesta contra a agenda reformista do presidente Michel Temer, confundindo-a com a imoralidade que contaminou membros do seu governo, além de o próprio ter sido atingido em sua imagem por duas denúncias ineptas. As reformas visam ao bem e ao futuro do País, não podem ser confundidas com a pauta da luta contra a corrupção, que tomou conta da opinião pública. Age-se como se essa luta fosse uma espécie de salvação nacional.

O Brasil apenas esboça a saída de uma grave crise, com o PIB se recuperando, inflação pequena, juros em baixa, emprego crescendo e um controle fiscal inédito nestes últimos anos. De terra arrasada, o País começa a apresentar números alentadores, porém nada disso é percebido pela sociedade, com um setor importante seu ainda atrelado a um eldorado lulopetista que nunca existiu. O País perdeu, a mensagem petista continua vingando.

Paradoxalmente, a sociedade clama por mudanças, porém age conforme parâmetros atrasados e ultrapassados. Combate a corrupção e pede mais intervenção estatal, como se esta não fosse a causa estrutural de desvio de recursos públicos. Quanto maior a presença do Estado, mais espaço é aberto para a corrupção e os seus agentes.

Fernando Limongi: O golpe do voto impresso

-
Valor Econômico


STF perdeu a chance de pôr uma pá de cal sobre as suspeitas

No início desse mês, por meio de uma decisão liminar, o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu a impressão dos votos na eleição de 2018. Como de costume, o STF adiou a decisão definitiva e, ao fazê-lo, deixou de se pronunciar sobre o que estava de fato em jogo, a saber, se procedem ou não as suspeitas sobre as urnas eletrônicas. Os ministros parecem não ter se dado conta da seriedade da questão que tinham diante de si.

Aprovado na reforma eleitoral de 2015, o artigo da lei posto no limbo é de autoria do deputado Jair Bolsonaro e visa, segundo seu autor, contribuir para a lisura do processo eleitoral. A premissa do artigo, portanto, é a de que restam dúvidas sobre a apuração dos votos no Brasil. Para ser mais claro: os defensores do voto impresso não confiam nas urnas eletrônicas. Não confiam é, na verdade, um eufemismo, estão certo de que as urnas abrem brechas para fraudes.

A despeito dessa certeza, os defensores do voto impresso nunca apresentaram provas ou fatos objetivos em defesa de sua tese. O argumento é tortuoso: como as urnas não são auditáveis, não há certeza que os votos dados são os contados. E por que não se dá essa certeza? Ora, porque assim se deixaria a porta aberta para a fraude. Mais um passo e se chega à conclusão de que a oportunidade seria necessariamente aproveitada. Assim, da suspeita se deriva a certeza. As garantias oferecidas pelo sistema são desconsideradas de forma olímpica. Vale a teoria da conspiração, que Bolsonaro reafirmou: a decisão do STF provaria o que vem dizendo faz tempo, que há um conluio entre TSE e Datafolha para fraudar as eleições de 2018.

Ricardo Rangel: Insanidade, esperança e despedida

- O Globo

No Brasil, quando uma experiência dá errado, é repetida até dar certo. Apesar disso, aos trancos e barrancos o Brasil avança

A polícia invadiu a Maré com blindados e helicópteros para cumprir 22 mandados de prisão. No fim do dia, nenhum mandado havia sido cumprido, mas jaziam no chão sete corpos sem vida, incluindo o de Marcos Vinícius, de 14 anos, vitimado em seu uniforme de escola por tiros disparados de um blindado.

A principal promessa da intervenção era a depuração da polícia e uma mudança em seus métodos, substituindo o confronto pela inteligência. Passados quatro meses (três do assassinato ainda não resolvido de Marielle), não se vê traço de inteligência, e a polícia continua idêntica. O que mudou foram os helicópteros, que agora cospem fogo.

Dois dias após o incidente na Maré, Jair Bolsonaro prometeu retirar o país da Comissão de Direitos Humanos da ONU, que “não serve para absolutamente nada”. E, de novo, elogiou o coronel-torturador Brilhante Ustra, com o argumento de que “guerra é guerra”. O Brasil insensível anda de mãos dadas com o Brasil brutal: Bolsonaro é o favorito para o posto de presidente da República.

O capitão desconhece a Convenção de Genebra, o código internacional que regula a guerra — e do qual o Brasil é signatário —, que proíbe maus-tratos a prisioneiros desde 1864. Parece não haver “absolutamente nada” que Bolsonaro não desconheça.

Diz-se que fazer a mesma coisa repetidas vezes esperando diferentes resultados é a definição de insanidade. Simonsen, conhecedor da insanidade brasileira, dizia que, aqui, quando uma experiência dá errado, ela é repetida até dar certo. Talvez daí a insistência numa “guerra às drogas” que dá sempre o mesmo resultado.

A defesa de Lula, que não desiste de tentar a mesma coisa, pediu novamente sua libertação — felizmente, o resultado foi o mesmo.

Celso Rocha de Barros: Haddad e o discurso petista

- Folha de S. Paulo

Se o PT tiver um plano B, espero que também tenha uma retórica B

Desde que Fernando Haddad derrotou José Serra na eleição para prefeito de 2012, tornou-se presidenciável, e isso foi um dos problemas de sua prefeitura. Projetos que tinham sua assinatura foram criticados de modo completamente desproporcional, porque criticar Haddad era criticar o futuro candidato do PT a presidente. As faixas para ônibus, por exemplo, também foram introduzidas no Rio de Janeiro na administração Eduardo Paes, sem tanta controvérsia. Discussões sobre grafite e limpeza pública, ou sobre bicicletas, sempre foram debates sobre em quem votar para presidente.

De qualquer forma, com Lula fora do páreo, essa seria uma boa hora para Haddad começar a lucrar com a reputação de presidenciável, que até hoje só lhe causou problemas.

O ex-prefeito vem se mexendo. Na semana passada, entrou para a tendência “Construindo um Novo Brasil” (a antiga “Articulação”), grupo majoritário dentro do PT liderado por Lula. Até então, Haddad era próximo à “Mensagem para o Partido”, de Tarso Genro e José Eduardo Cardoso. Foi um movimento de candidato.

E Haddad tem seus trunfos. Sua administração combateu a corrupção, teve políticas bem avaliadas (em geral, muito mais bem avaliadas do que seu mandato) e foi fiscalmente responsável. Não há muito mais gente entre os quadros petistas de primeira linha que tenha esse currículo.

Mas aí é que está: se for para lançar Haddad com o discurso atual do PT, essas vantagens serão desperdiçadas. Porque o discurso atual do PT é uma porcaria.

Ricardo Noblat: Falta combinar com Marina e Meirelles

- Blog do Noblat

A incansável busca por um candidato de centro vencedor

É tamanha a desconfiança de que a candidatura de Geraldo Alckmin (PSDB) à presidência da República possa decolar, e a certeza de que a candidatura de Henrique Meirelles (PMDB) não irá a lugar algum, que nos laboratórios do governo testam-se as fórmulas mais exóticas para barrar o que por lá mais se se teme – uma eventual vitória do deputado Jair Bolsonaro (PSL) ou de um nome da esquerda.

A mais recente: Meirelles para vice na chapa de Marina Silva, candidata da REDE à vaga do presidente Michel Temer. Assim haveria a união do social (Marina) com a condução bem comportada da economia (Meirelles). E o PMDB garantiria a Marina tempo de propaganda eleitoral no rádio e na televisão que ela simplesmente não tem dado ao raquítico tamanho do seu partido.

Os mais entusiasmados com a ideia lembram que em 2004, Lula chegou a indicar Meirelles para vice de Dilma, candidata à reeleição. Foi ela que não quis. Uma vez que Dilma se reelegeu, Lula sugeriu o nome de Meirelles para Ministro da Fazenda. Dilma rejeitou. Hoje em campanha, Meirelles usa sua proximidade com Lula como argumento à caça de apoios.

A Executiva Nacional do PMDB se reunirá amanhã em Brasília para discutir se mantém ou não a candidatura de Meirelles. Discussão haverá, decisão ficará para meados do próximo mês. A candidatura de Meirelles é moeda de troca para o PMDB, não passa disso. Será trocada por outra ou por nenhuma, o que liberaria o partido para apoiar em cada Estado o candidato a presidente que quisesse.

Paulo Fábio Dantas Neto -De luta e de labuta: em memória do político Waldir Pires

O desaparecimento do ex-governador Waldir Pires enseja um sentimento de consternação que, ultrapassando o campo de seus familiares, amigos, correligionários e aliados atinge, inclusive, adversários. Ao lado disso, também é geral o sentimento de perda compartilhado por todos os baianos e brasileiros minimamente informados sobre quem ele foi e sobre o fecundo e exemplar papel que cumpriu em momentos cruciais de nossa história contemporânea.

Em linha com esses sentimentos difusos afloram merecidas menções à integridade moral do seu caráter e ao sentido ético de sua conduta política, seja pela coerência ideológica, seja pelo respeito ao interesse e patrimônio públicos. A todas essas manifestações junto-me apenas como mais um.

Peço, contudo, licença para externar uma interpretação sobre dois traços de natureza política que me parecem relevantes na sua longa vida pública e que, a meu juízo, não têm merecido tanto destaque nas homenagens que se tem feito à sua memória. Ao lado do lutador nunca deixou de estar o homem de diálogo e, ao lado das convicções, sempre esteve nele a responsabilidade para com as consequências de suas decisões, inclusive quando as primeiras mostraram equívocos nas segundas.

Entre suas campanhas ao governo da Bahia (a derrotada de 1962 e a vitoriosa de 1986) Waldir aprendeu a não refugar alianças que viabilizassem a vitória da causa democrática. Em 62 chegou perto dela. A distância talvez fosse vencida com alianças mais diversificadas e afirmativas na capital (Virgildásio Sena a prefeito, não só Osório Vilas Boas) e um pouco mais de concessões veniais à política tradicional no interior, tendo Luís Viana Filho como opção mais realista ao Senado. O equilíbrio dos dois temperos baianos ajudou a eleger a dupla de candidatos de sua chapa ao Senado (Balbino e Josaphat Martinho) mas a escassez de alianças ao governo ajudou seu adversário populista, aliás apoiado pelo Presidente Jango. O hiato entre o bom, mas não bastante, desempenho eleitoral de Waldir e seu relativo isolamento na sociedade política antecipava, no cenário baiano, o impasse da estratégia nacional popular, cujo avanço nas eleições de 62 e no plebiscito de 63 em vez de inibir atiçou ânimos golpistas até a crise terminal do regime da Carta de 46.

Roberto Freire: A desnecessidade do voto impresso

- Diário do Poder

Recebo questionamentos sobre a lisura das urnas eletrônicas, que seriam sanados com o voto impresso.

As suspeitas partem de duas origens.

Algumas pessoas percebem o erro em que incorriam, após os devidos esclarecimentos.

Outros têm dolo.

Após o voto ser depositado na urna, reza nossa Constituição, ele não pode ser identificado, para nenhum propósito.

Essa interpretação acaba de ser confirmada, acertadamente, pelo Supremo Tribunal Federal.

Para que as diversas fases da votação, transmissão, apuração e proclamação dos resultados fossem fraudadas, seria necessário um monumental esquema, que abrangesse todos os juízes do Tribunal Superior Eleitoral, todos os juízes dos Tribunais Regionais Eleitorais, todos os funcionários públicos envolvidos no sistema eleitoral, todos os peritos técnicos indicados pelos partidos para fiscalizar os mecanismos eletrônicos, enfim, todas as instituições envolvidas antes, durante e depois das eleições.

Enviamos dados altamente sigilosos do nosso imposto de renda por processos eletrônicos; toda a movimentação financeira do país, estatal e privada, dá-se no mundo digital; as pessoas adquirem bens e serviços por cartão de crédito e débito ou por boletos, eletronicamente pagos; todas as peças dos processos que tramitam no STF – e nos tribunais superiores e em tribunais de outras instâncias – estão no mundo digital, com as devidas assinaturas eletrônicas.

Almir Pazzianotto Pinto: A cristianização de Geraldo Alckmin

- Diário do Poder

Um dos momentos mais nebulosos da política brasileira ocorreu nas eleições de presidenciais de 3 de outubro 1950, tendo como personagem central e vítima o mineiro Cristiano Machado.

Presidia a República o general Eurico Gaspar Dutra, eleito pelo Partido Social Democrático (PSD) em dezembro de 1945. Concorreria, pela União Democrática Nacional (UDN), o brigadeiro Eduardo Gomes, por ele derrotado naquela ocasião. Confinado em São Borja, Getúlio Vargas aguardava a evolução dos acontecimentos. Em silêncio estimulava o lançamento da sua candidatura pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Sabendo que era a grande liderança popular da política nacional, planejava, como hábil jogador de pôquer, a volta triunfal ao Palácio do Catete.

No dia 15 de junho Ademar de Barros, governador de São Paulo, em comício no Vale do Anhangabaú lançou o nome de Vargas como candidato à presidência pelo Partido Social Progressista (PSP). No dia seguinte o PTB homologou a candidatura do ex-presidente. Veja-se o que relata Hélio Silva, nesse sentido, no livro 1954: Um Tiro no Coração “ (Civilização Brasileira, 1978, pág. 75).

Cida Damasco*: Sem gol salvador

- O Estado de S.Paulo

Governo tenta chegar vivo às eleições, mas são consegue sair da defesa

Não fossem os dois gols no finalzinho do jogo contra a Costa Rica e o “dream team” do futebol brasileiro estaria crucificado. Principalmente Tite, incensado como símbolo da renovação dos técnicos, capaz de domar os rompantes de Neymar e recuperar alguns jogadores que haviam sucumbido àquele 7 a 1 de triste memória.

Não fosse a certeira cobrança de falta de Kroos, no último momento da partida contra a Suécia, e a campeã Alemanha quase com certeza seria despachada ainda na primeira fase da competição. Ainda vêm por aí muitas emoções, mas, por enquanto, a provável sobrevivência das equipes do Brasil e da Alemanha deve-se às vitórias dramáticas da sexta-feira e do sábado.

Na economia, pelo visto, o governo também parece à espera de um gol salvador. Inicialmente festejado pelos mercados e pelos setores produtivos por sua ação econômica, apesar da gigantesca impopularidade, Temer só se preocupa agora em chegar vivo às eleições. Tudo indica que mudanças de posicionamento e/ou jogadas de efeito não conseguirão mudar o resultado da partida.

O cenário externo continua instável, oscilando conforme o andamento da economia americana e as disputas no Oriente Médio. Internamente, o Congresso não faz outra coisa senão criar embaraços à gestão da economia, principalmente em termos de pressão sobre o caixa. Só na semana passada, deu passagem a novos benefícios fiscais a transportadoras e permitiu a venda direta das usinas para os postos de combustível, como mostrou a edição de sábado do Estadão.

Angela Bittencourt: Eleições, Lava-Jato e BC aceleram agenda

- Valor Econômico

As "condições financeiras" por Bradesco, Itaú, UBS

O primeiro semestre do ano termina nesta semana. Além do relevante calendário contábil, de fechamento de balanços de bancos, empresas e grandes investidores, neste 2018 julho abre a agenda eleitoral e uma maratona a pré-candidatos e partidos políticos interessados em disputar para valer a presidência da República em outubro. A maratona se estende ao governo que, em seus três níveis federal, estadual e municipal, se apressa a executar sobretudo transferências de recursos nos próximos 15 dias. A partir de 7 de julho, a administração pública estará impedida, pela Lei Eleitoral, de gastar mais do que o pré-contratado e justificado, demitir e admitir servidores.

Também neste fim de semestre, a Operação Lava-Jato acena com uma nova etapa, a partir da homologação do acordo de delação firmado entre Antonio Palocci e a Polícia Federal anunciada na sexta-feira. Palocci teve participação decisiva nas eleições dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e sua sucessora Dilma Rousseff ao Palácio do Planalto, comandou o Ministério da Fazenda de Lula e a Casa Civil de Dilma. E conquistou o setor privado tornando-se o ministro do Partido dos Trabalhadores (PT) com maior prestígio junto a empresários e banqueiros por mais de uma década.

O ex-ministro está preso desde 2016 e é um dos expoentes do PT que melhor conhece as mudanças que podem ocorrer em consequência de uma sucessão presidencial e num momento único da história do país. O momento é único pela judicialização da política, pela possibilidade de radicalização entre direita e esquerda no 2º turno de votação ao comando da República, pela péssima avaliação que os brasileiros fazem do atual governo e do presidente Michel Temer e também pela dificuldade de a economia brasileira engrenar um ciclo de crescimento.

PSDB chega aos 30 e passa de adversário a celeiro ruralista

Fortalecimento do agronegócio, porém, não garante apoio do setor à legenda

Thais Bilenky | Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - De adversário dos ruralistas na Constituinte, o PSDB passou a celeiro do agronegócio 30 anos depois de sua fundação.

A mudança de perfil, no entanto, não tem sido suficiente para garantir apoio do eleitorado do campo, que hoje flerta com a candidatura de Jair Bolsonaro (PSL).

Essa dificuldade é uma das facetas da crise por que passa o PSDB, que completa nesta segunda-feira (25) 30 anos.

O partido nasceu em 25 de junho de 1988 defendendo, entre outros pontos, a reforma agrária. O manifesto de fundação urgia por uma redistribuição de terra que combinasse tributação progressiva com desapropriação.

Naquele período, o então líder do PMDB no Senado e fundador do PSDB, Mario Covas, travou duro embate com o hoje senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), à época o principal articulador da UDR (União Democrática Ruralista).

O antagonismo tratou de colocar tucanos e ruralistas em lados opostos da disputa política.

A radiografia da bancada do PSDB na Câmara hoje mostra uma transformação nesse aspecto. Quase 40% dos deputados (18 em 49) têm atuação simpática aos interesses do agronegócio.

O líder, Nilson Leitão, é um dos mais ativos membros da bancada ruralista no Congresso. Ele é autor, entre outros projetos, de um que tipifica um crime específico para invasão de propriedade. Se aprovado, inibirá ações do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).

Ele também apresentou, no bojo da reforma trabalhista, no ano passado, uma proposta que permitiria que trabalhadores rurais recebessem "remuneração de qualquer espécie", o que daria margem para a troca de salário por moradia ou alimentação. Atacado, recuou.

O deputado federal ambientalista Ricardo Tripoli (SP) disse que o PSDB se afastou de seus princípios fundantes.

"Realmente, não é uma postura que vai ao encontro daquilo que o PSDB sempre almejou", disse.

"Não que a gente seja contra o agronegócio. O setor hoje tem uma postura razoável. Não vemos surtos de radicalismo ruralista na bancada, mas, que há uma divisão nítida, há."

‘Aécio não vai definir sozinho sua candidatura’, diz Anastasia

Entrevista com Antonio Anastasia, senador (PSDB-MG)

Postulante tucano ao governo de Minas afirma que senador vai ouvir PSDB antes de decidir sobre disputa ao Senado

Pedro Venceslau e Jonathas Cotrim | O Estado de S. Paulo

BELO HORIZONTE - Pré-candidato ao governo de Minas Gerais, o senador Antonio Anastasia (PSDB) disse ao Estado que o senador Aécio Neves, seu padrinho político, vai ouvir o partido antes de decidir se vai disputar o Senado nas eleições 2018. Candidato à Presidência da República em 2014, Aécio se afastou dos antigos aliados depois que veio a público áudio em que ele pede R$ 2 milhões ao empresário Joesley Batista, dono da JBS. Ele ainda não definiu seu futuro político.

• A prisão do ex-governador Eduardo Azeredo coloca o PSDB na vala comum da corrupção?

Ele sempre teve um conceito de um homem correto, mas tem de cumprir a pena. Não podemos adular as pessoas condenadas.

• É uma mancha que pode constranger o partido na eleição em Minas Gerais?

Não acho mancha, nem que constrange o partido. Azeredo é considerado uma pessoa que foi vítima de uma circunstância. E o candidato (ao governo de Minas) sou eu.

• Ele deve ser expulso do PSDB?

Não sinto o sentimento de necessidade dessa medida.

• O senador Aécio Neves ainda não decidiu se disputa ou não o Senado. Essa é mesmo uma decisão pessoal dele ou do partido?

Eu recebi uma carta branca para a montagem das questões relativas ao partido. Temos que aguardar um pouco. Ele vai tomar essa decisão, e não deve demorar muito, sobre ser candidato ou não. E, se for, para qual cargo. Os prazos estão afunilando.

• O sr. quer que ele seja mesmo candidato?

Nesse momento, ele próprio pondera sobre as dificuldades que teria em uma candidatura majoritária, do sim e do não. Mas temos que respeitar a decisão que ele tomar.

• Até o ex-governador Geraldo Alckmin, que preside o partido e tem a prerrogativa de vetar candidatos, deixou claro que não gostaria que Aécio disputasse o Senado.

Ele (Aécio) vai ouvir os companheiros na hora de tomar a decisão. Não tomará uma decisão isolada. Ele está dedicado à sua defesa e em mostrar o que foi alegado, que foi vítima de uma armadilha.

• Aécio se elegeria?

As pesquisas o colocam com uma votação positiva, mas em uma eleição a gente nunca sabe. Nem sei quem são os candidatos ao Senado. Há notícia de que Dilma (a presidente cassada Dilma Rousseff) seria candidata, mas isso não se confirma.

PT pode reeditar estratégia usada por Perón para voltar ao poder

Por Andrea Jubé | Valor Econômico

BRASÍLIA - O fenômeno eleitoral que marcou o retorno do peronismo ao poder na Argentina há 45 anos é a proeza que o PT tentará repetir nas eleições de outubro, prolongando ao limite do prazo legal a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com o líder argentino Juan Domingo Perón proscrito havia 18 anos, um candidato apoiado por ele - de seu exílio na Europa - venceu a eleição presidencial. No Brasil, com Lula detido, o partido quer tentar reproduzir a façanha com um nome ungido por ele, proclamando "eu sou o Lula" nos comícios país afora.

Era 1973, e Perón, aos 78 anos, duas vezes presidente da República, articulava o seu retorno à Argentina, sonhando com um terceiro mandato. Vislumbrou a oportunidade no apoio a um aliado do passado, o ex-presidente da Câmara Héctor Cámpora, em um ambiente onde os argentinos temiam a ascensão dos socialistas. Respaldado pela juventude peronista, Cámpora percorreu o país apresentando-se como o candidato de Perón. Era chamado de "El Tío", porque era considerado irmão de "el padre Perón". O lema de sua campanha era "Cámpora no governo, Perón no poder". Acabou vitorioso com quase 50% dos votos.

O exemplo de Héctor Cámpera corre à boca miúda entre petistas do núcleo mais próximo de Lula. Parafraseando a campanha argentina, o grupo formula slogans como "PT no governo, Lula no poder", considerando os 30% dos brasileiros que declaram intenção de voto no ex-mandatário, segundo o último Datafolha.

A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, reafirma que o partido levará o nome de Lula até as urnas no dia 7 de outubro, em uma campanha de protesto contra sua prisão: ele cumpre pena de 12 anos e um mês em regime fechado em Curitiba. Mas o que se articula nos bastidores é sustentar o nome do ex-presidente até o limite para assegurar a transferência de votos.

Após o registro, no dia 15 de agosto, a Justiça Eleitoral arguirá a inelegibilidade de Lula, com base na Lei da Ficha Limpa. A partir daí, o PT deverá intensificar a "vitimização" do candidato, enfatizando a retórica do "preso politico". No prazo legal, entretanto - a 20 dias do pleito -, o PT revelará o nome do potencial herdeiro dos votos.

Um escândalo sem fim: Editorial | O Estado de S. Paulo

Não cessa de render frutos, dos mais amargos, o escândalo da delação premiada do sr. Joesley Batista. E, a cada nova informação que surge, a cada notícia que alcança as manchetes, pior fica a imagem da Procuradoria-Geral da República nesse lamentável caso, que tanto mal causou ao País.

No mais recente desdobramento, a Polícia Federal (PF) indiciou o ex-procurador da República Marcelo Miller por corrupção passiva. Segundo a investigação, Miller, ainda na condição de procurador da República e lotado na equipe dedicada à Operação Lava Jato, assessorou o escritório de advocacia que trabalhou para os irmãos Joesley e Wesley Batista na negociação do acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral, em março de 2017. Miller só deixaria o cargo em abril – para trabalhar de vez no escritório de advocacia que prestava serviços para a JBS, a empresa dos irmãos Batista.

De acordo com o relatório da PF, Miller recebeu R$ 1,8 milhão em “vantagens indevidas” por parte do escritório de advocacia – que, segundo a investigação, tinha plena ciência do vínculo de Miller com a Procuradoria-Geral e pretendia explorar esse trunfo para favorecer seus clientes, os irmãos Batista. Por essa razão, conforme o relatório, duas advogadas desse escritório, que participaram das tratativas com Miller e com os donos da JBS, também foram indiciadas por corrupção passiva. Para reforçar esse vínculo triangular, a PF informa que a atuação de Miller ocorreu “comprovadamente” desde 6 de março de 2017, data da assinatura do contrato do tal escritório de advocacia com a JBS.

Uma postura laica: Editorial | O Globo

O julgamento no Supremo é chance para que se jogue luz sobre um tema objeto de muita manipulação

Assunto em que se misturam aspectos morais, éticos e religiosos, o aborto desafia a necessidade de equilíbrio na abordagem do tema, principalmente por agentes públicos que atuam em um Estado constitucionalmente laico, obrigado a ficar equidistante de credos. Este é o entendimento racional da questão, mas, infelizmente, nem sempre é assim que transcorrem os debates.

Em agosto, haverá mais uma oportunidade no Supremo de reflexão sobre o assunto, a partir de uma audiência pública convocada pela ministra Rosa Weber, relatora de ação impetrada pelo PSOL em favor da descriminalização do aborto. O partido contesta a parte do Código Penal que pune o procedimento.

O desafio é o da racionalidade, sem abrir mão de conceitos em defesa dos direitos humanos. No caso, da mulher. É positivo que o Supremo tenha experiência em discussões neste campo, tendo tomado decisões realistas, conectadas à vida real, como deve ser no laicismo, blindadas contra pressões religiosas.

Álcool livre: Editorial | Folha de S. Paulo

Possibilidade de venda direta de etanol da usina para os postos favorece o consumidor

Foi correta a decisão do Senado de permitir a venda direta de etanol dos produtores para os postos de combustível no varejo. Ao eliminar a intermediação obrigatória por parte de uma distribuidora, a medida visa aumentar a concorrência na comercialização e reduzir preços para o consumidor.

Em tese, a mudança pode abrir caminho para que tal procedimento alcance mais de 40 mil estabelecimentos —o álcool anidro, adicionado à gasolina, continuará passando pelos intermediários, que dispõem de condições técnicas para realizar essa mistura.

Entretanto apenas uma minoria das unidades varejistas deve se valer da nova possibilidade, dado que boa parte do mercado é ocupada pelos postos com bandeira, vinculados a redes que tem contratos com grandes distribuidoras.

Ainda que o efeito prático possa se revelar menor que o esperado, a alteração legislativa dá uma opção a mais aos varejistas.

Congresso não respeita regra constitucional ao criar despesa: Editorial | Valor Econômico

Na semana passada, o país foi surpreendido com a informação de que a Emenda Constitucional 99, aprovada em dezembro do ano passado, obriga a União a criar linha de crédito subsidiada para os Estados e municípios pagarem precatórios judiciais. É mais uma despesa a ser arcada pelo governo federal, que, desde 2014, registra déficits primários elevados em suas contas, isto é, não consegue arrecadar o suficiente em impostos para bancar os gastos e, por essa razão, tem recorrido ao aumento explosivo da dívida pública.

O ministro do Planejamento, Esteves Colnago, disse que o governo percebeu que a medida seria aprovada pelo Congresso em dezembro, mas não conseguiu evitar o movimento dos parlamentares realizado no encerramento do ano legislativo. Na verdade, as lideranças do governo na Câmara e no Senado orientaram suas bancadas a aprovar a medida, como mostram os mapas de votação das duas Casas. Pelas declarações do ministro, pode-se concluir que, mais uma vez, o governo apoiou suas bancadas contra as recomendações da equipe econômica.

Na votação em segundo turno na Câmara, a emenda recebeu 390 votos favoráveis e nenhum contrário. No Senado, também não houve voto contrário. Naquela Casa, a medida foi aprovada no primeiro e segundo turnos no mesmo dia.

O dispositivo que prevê a linha de crédito subsidiada foi incluído por um deputado, pois não constava da proposta original do senador José Serra (PSDB-SP). As mudanças feitas pela Câmara na emenda voltaram ao Senado e foram rapidamente aprovadas.

A Emenda 99 determina que, no prazo de seis meses, o governo crie a linha de crédito. No entanto, o tema ainda não foi regulamentado e tudo leva a crer que a equipe econômica fará um esforço para adiar a aplicação da medida.

Gilvan Cavalcanti diz que Brasil precisa aglutinar frentes democráticas para superar os extremismos políticos na eleição

-Assessoria FAP/Germano Martiniano

'Herdamos um processo de despolitização da sociedade e a corrupção sistêmica'

Em plena Copa do Mundo, é quase impossível não falar de futebol, mesmo que o País se encontre em um turbilhão politico com a proximidade das eleições presidenciais. Gilvan Cavalcanti de Melo, editor do blog Democracia Política e Novo Reformismo, aceitou o desafio de relacionar política e futebol. Ele é o entrevistado desta semana da FAP Entrevista, série que está sendo publicada aos domingos com intelectuais e personalidades políticas de todo o Brasil, com o objetivo de ampliar o debate em torno do principal tema deste ano, as eleições.

“Sou suspeito para falar sobre essa distinção – política e futebol-, desde criança gostava de futebol, joguei no infantil do principal time da minha cidade, no interior de Pernambuco. Depois, cheguei a jogar no juvenil do Sport Recife, fomos campeões invictos sem levar um só gol”, conta.

Gilvan Cavalcanti foi militante do PCB (Partido Comunista Brasileiro). Lutou contra a ditadura, foi exilado no Chile e em Cuba e fez parte da fundação do PPS (Partido Popular Socialista), em janeiro de 1992. Uma das grandes curiosidades da vida política dele foi a prisão do filho, Gilvan Filho, o Giba, durante o período ditatorial. “Nosso filho tinha um ano e quatro meses de idade e era deficiente físico dos membros inferiores, por isso, precisou ficar com a mãe na cela”, relembra Gilvan.

O panorama politico brasileiro neste ano eleitoral e os extremismos políticos do momento também foram temas tratados por ele nesta entrevista à FAP. “Para superar o quadro atual é necessário um esforço de todas as forças democráticas reformistas e aglutinar um bloco amplo que consiga iniciar um novo governo em 2019”, enfatizou Gilvan Cavalcanti na entrevista a seguir.

• FAP Entrevista – Gilvan, não tem como fugir da pergunta: o senhor está assistindo os jogos da Copa? Está gostando do desempenho do Brasil até aqui?

Gilvan Cavalcanti de Melo – Sim, estou acompanhando muitos jogos. O Brasil precisa melhorar muito, ter um futebol mais solidário.

• O senhor está na militância política há muito tempo. Em 1970 o Brasil foi campeão mundial e no país vivia uma ditadura, com Médici no poder. Como era essa relação entre futebol, militância, torcida, nacionalismo e política na época?

Na época, o tema gerou muita polêmica. As posições políticas das oposições contra a ditadura tentaram vincular a Seleção de futebol com a política. Os grupos que se autoproclamaram defensores da política de confronto direto, via sequestros, assaltos a bancos, etc., defendiam a tese que o futebol era um instrumento de propaganda do governo autoritário, portanto, faziam chamados para torcer contra a seleção. E acusavam os grupos que trabalhavam com a política de frente democrática de adesistas ao regime militar. A história é conhecida. Demonstrou a falsidade da teoria do confronto direto sem política.

• É possível fazer uma relação entre futebol e política no Brasil, ou são coisas distintas? O senhor faz parte do “time” que pensa que o futebol é um fator de alienação em nossa sociedade?

Sou suspeito para falar sobre essa distinção. Desde criança gostava de futebol, joguei no infantil do principal time da minha cidade, no interior de Pernambuco. Depois, cheguei a jogar no juvenil do Sport Recife. Fomos campeões invictos sem levar um só gol. O goleiro era o Manga que, depois, veio para o Botafogo do Rio e da seleção Brasileira. Esse lado futebolístico em nada me impediu de fazer política, organizando grêmios escolares. Depois, o lado da política venceu e abandonei muito cedo o futebol. Fiz grandes amigos no juvenil do Sport e nos demais clubes do Recife. Na época da ditadura foram solidários comigo.

• O senhor teve um filho que também foi preso durante a ditadura. Como foi essa história?

A história foi a seguinte: com o golpe militar de 1964 eu e minha mulher, Graziela, fomos presos. Nosso filho Gilvan Filho (Giba) tinha um ano e quatro meses de idade e era deficiente físico dos membros inferiores. Minha mãe e minha sogra começaram a fazer pressão, via d. Helder Câmara para libertar Graziela. Mais ou menos em junho/julho houve muitas denúncias de torturas em Recife, publicadas na imprensa carioca, principalmente, no jornal Correio da Manhã. O general Ernesto Geisel, então ministro da Casa Militar de Castelo Branco, foi visitar as prisões de Recife. Num dia de visita normal, minha mãe levou nos braços o Giba. Nesse dia o general apareceu por lá e se deparou com a pressão de minha mãe. Em vez de libertar Graziela, autorizou o Giba ficar na cadeia, na cela, com Graziela. O Giba também foi anistiado e recebeu desculpas formais do estado brasileiro.

• O senhor também esteve exilado em Cuba. Como era o País na época?

Meu exilio em Cuba ocorreu em virtude do golpe que derrubou o governo de Salvador Allende. Pedimos asilo na Embaixada do Panamá e no Chile. Lá estavam muitos brasileiros, entre os que me recordo: Betinho, Theotonio dos Santos, Marco Aurélio Garcia, Emir Sader, etc. Do Panamá fui para Cuba. Lá trabalhei em Mariel e depois em Havana. Era uma vida difícil, apesar da solidariedade e do carinho da população. Fiquei por lá até dezembro de 1978, quando vim embora para o Brasil, antes da anistia, quando percebi o movimento de abertura do regime militar.

• Atualmente, o senhor continua na militância política por meio do seu blog, o Democracia Política e Novo Reformismo. Ou seja, o senhor aderiu a uma linha da esquerda menos dogmatizada, mais atualizada aos novos tempos. Para o senhor, militante do PCB na ditadura, exilado em Cuba e no Chile, quando foi que percebeu que era hoje de mudar, de atualizar-se?

Essa é uma história muito longa. Em primeiro lugar minha formação cultural política sempre foi muito “ocidental”. Desde jovem meus amigos já me chamavam de “reformista” “revisionista”, etc. Na época eram conceitos agressivos, quase um palavrão. Acho que o ponto de ruptura se deu no processo da Primavera de Praga (1968). Colocaram-me o carimbo de “italianista” e “antissoviético” e depois “eurocomunista’.

• Como o senhor avalia o nosso panorama político atual, com as proximidades das eleições presidenciais?

É conhecida a profunda crise na qual vivemos. Um legado do período da administração comandada pelo PT. Além da crise econômica, com inflação, juros altos, recessão e uma alta taxa de desemprego herdamos um processo de despolitização da sociedade, o aparelhamento das agências estatais e a corrupção sistêmica.

• O senhor acredita que o centro emplacará uma candidatura? O Brasil será comandado por algum político extremista?

Para superar o quadro atual é necessário um esforço de todas as forças democráticas reformistas e aglutinar um bloco amplo, que consiga iniciar um novo governo em 2019. É primordial que se trabalhe para que esse bloco vença as eleições de 2018. A chave é unir essas forças, derrotar o atraso estatista e autoritário, fugindo da armadilha binária. O país é muito mais complexo e não cabe nesse simplismo dicotômico: esquerda x direita.

Lançamento livro de Luiz Werneck Vianna


Tom Jobim - João Ninguém (Noel Rosa)

Carlos Drummond de Andrade: Pombo-correio

Os garotos da Rua Noel Rosa
onde um talo de samba viça no calçamento,
viram o pombo-correio cansado
confuso
aproximar-se em vôo baixo.

Tão baixo voava: mais raso
que os sonhos municipais de cada um.
Seria o Exército em manobras
ou simplesmente
trazia recados de ai! amor
à namorada do tenente em Aldeia Campista?

E voando e baixando entrançou-se
entre folhas e galhos de fícus:
era um papagaio de papel,
estrelinha presa, suspiro
metade ainda no peito, outra metade
no ar.

Antes que o ferissem,
pois o carinho dos pequenos ainda é mais desastrado
que o dos homens
e o dos homens costuma ser mortal
uma senhora o salva
tomando-o no berço das mãos
e brandamente alisa-lhe
a medrosa plumagem azulcinza
cinza de fundos neutros de Mondrian
azul de abril pensando maio.

3235-58-Brasil
dizia o anel na perninha direita.
Mensagem não havia nenhuma
ou a perdera o mensageiro
como se perdem os maiores segredos de Estado
que graças a isto se tornam invioláveis,
ou o grito de paixão abafado
pela buzina dos ônibus.

Como o correio (às vezes) esquece cartas,
teria o pombo esquecido
a razão de seu vôo?
Ou sua razão seria apenas voar
baixinho sem mensagem como a gente
vai todos os dias à cidade
e somente algum minuto em cada vida
se sente repleto de eternidade, ansioso
por transmitir a outros sua fortuna?

Era um pombo assustado
perdido
e há perguntas na Rua Noel Rosa
e em toda parte sem resposta.

Pelo quê a senhora o confiou
ao senhor Manuel Duarte, que passava
para ser devolvido com urgência
ao destino dos pombos militares
que não é um destino.