quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Ricardo Noblat: A intervenção desarmada

- Blog do Noblat | Veja

O risco de tutelar o governo

Celebrem os comandantes militares se suas fardas saírem apenas levemente manchadas das eleições prestes a terminar. E se acautelem para que o pior não esteja por vir.

Pode ter colado até um dia desses a história de que o entusiasmo pela candidatura do capitão Jair Bolsonaro era coisa da tropa rude e ignara, jamais de oficiais com patente elevada.

Não cola mais. Oficiais da reserva de alto coturno assessoram Bolsonaro e participarão do governo caso ele se eleja. E às sombras, oficiais da ativa colaboraram com o candidato e torcem pelo seu sucesso.

O bolsonarismo infiltrou-se nas Forças Armadas como se fosse um vírus poderoso, e é. O sonho de um governo tutelado discretamente pela farda deixou de ser um sonho e está à vista de quem sabe enxergar.

Relatórios de inteligência produzidos por órgãos do governo e das três armas ajudam Bolsonaro a planejar seus movimentos de campanha e a selecionar futuros auxiliares. Nada de parecido havia acontecido até hoje.

A intervenção desarmada só servirá para enfraquecer a democracia submetida por aqui a estresses tão duros desde que foi restaurada há somente 33 anos.

Mesmo que ela resista a mais um teste, o eventual fracasso de um governo como o que se anuncia poderá causar estragos à imagem dos seus patrocinadores ocultos, dissimulados ou assumidos.

As Forças Armadas são a instituição de maior prestígio no país ao lado de outras poucas. Não há por que correr o risco de jogar fora o que conquistou com tanto empenho e sacrifício.

Cala a boca, Bolsonaro!
Um pouco de emoção faz bem

Quem se limitava a contar sem disfarçar o tédio os dias que faltavam para que o deputado Jair Bolsonaro (PSL) se elegesse presidente da República agora não poderá mais se queixar. Pelo menos até sábado, quando o Ibope divulgará sua última pesquisa de intenção de votos, haverá espaço para alguma emoção. Menos mal.

A pesquisa Ibope conhecida ontem só trouxe más notícias para o candidato que tinha a faixa presidencial ao alcance da mão. Sua vantagem sobre Fernando Haddad (PT) caiu quatro pontos percentuais. Aumentou a rejeição de Bolsonaro. E diminuiu o percentual dos que com certeza diziam que votariam. Não é nada, não é nada, mas pode ser.

Eleição só acaba quando acaba, cansam de repetir os que já acompanharam de perto muitas delas. Livros contam histórias de eleições que foram tratadas como decididas de véspera e que tiveram um desfecho surpreendente. Mas isso não quer dizer que Bolsonaro possa estar perto de perder seu favoritismo. Longe disso.

Bolsonaro tem tudo para vencer no próximo domingo, e com folga. Que ninguém se surpreenda se ele bater o recorde de Lula que em 2002 se elegeu com 62% dos votos válidos. Todos os fatores que impulsionaram sua candidatura ladeira acima permanecem vivos e em bom estado. Só o acaso poderia aprontar uma surpresa.

O acaso – ou melhor: a imprevidência – pode explicar o eventual freio na trajetória ascendente de Bolsonaro. Teve a denúncia de que notícias falsas poderão tê-lo beneficiado no esforço de se eleger direto no primeiro turno. Teve o vídeo de um dos filhos sobre como fechar o Supremo Tribunal Federal. E teve a fuga de Bolsonaro aos debates.

É impossível medir o efeito de cada um desses episódios sobre o desempenho do candidato. Mas algo de negativo aconteceu para que ele parasse de crescer. Certamente não foi nada que se possa atribuir a Haddad, um candidato de pouco brilho e, ainda por cima, sabotado dentro do próprio partido por aqueles que preferiam outro nome.

O mais recomendável seria que Bolsonaro fechasse a sua e a boca dos que o cercam para que nada saia dali de impróprio até o início da noite de domingo. A essa altura, Bolsonaro só perderá para Bolsonaro, ou para os filhos intrépidos, ou para os Mourões da vida. Por falar nisso, quando será preso o coronel que no YouTube prega o golpe?

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