terça-feira, 29 de agosto de 2017

Por que aprovar a TLP? Eliminar privilégios | José Márcio Camargo *

- O Estado de S.Paulo

A mudança é mais um passo na direção de eliminar os entulhos que persistem na legislação brasileira herdados da era Vargas

A Medida Provisória 777, que substitui a TJLP pela TLP como a taxa de juros que remunera os empréstimos concedidos pelo BNDES às empresas, teve seu texto principal aprovado pela Câmara, faltando ainda três destaques para serem votados. Nesta semana e na próxima, deverá ser analisada pelo Senado.

Várias são as vantagens da TLP em relação à TJLP. Entre outras, podemos destacar as seguintes. Primeiro, a TJLP é uma taxa definida arbitrariamente pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), constituído pelos ministros da Fazenda, do Planejamento e pelo presidente do Banco Central. Não tem relação com nenhum parâmetro de mercado e não segue uma regra específica conhecida pela sociedade. Esta taxa remunera os empréstimos do BNDES, que correspondem a 46% de todos os créditos para empresas no País.

Já a TLP é a taxa paga pelo governo para financiar sua dívida (título NTN-B de cinco anos). Ao substituir a TJLP pela TLP, o CMN perde seu poder discricionário. Isso já seria suficiente para justificar a medida. É sintomático que as corporações empresariais prefiram ficar nas mãos discricionárias do CMN a seguir as regras de mercado. Indica a expectativa de poder das corporações, para conseguir privilégios do Estado.

Segundo, quanto maior a taxa de inflação, menor a TJLP deflacionada pela taxa de inflação, ou seja, menor a taxa real de juros paga pelos empréstimos obtidos com o BNDES. Este fato tem duas consequências: as empresas se tornam “sócias” da inflação, quanto maior a inflação melhor; e torna o BNDES um “inimigo” do Banco Central.

Quando a inflação sobe, o BC precisa aumentar a Selic para reduzir a demanda por bens e serviços e diminuir a pressão sobre os preços. Ao mesmo tempo, como a taxa real de juros do BNDES cai, aumenta a busca por recursos no BNDES para financiar investimentos, o que gera aumento de demanda e, portanto, mais pressão inflacionária. O resultado é que a Selic, e todas as taxas de juros da economia, necessária para atingir a meta para a inflação aumenta, punindo toda a sociedade, exceto aqueles que têm acesso aos empréstimos do BNDES. A adoção da TLP vai acabar com esse privilégio.

Terceiro, como a TLP é igual ao custo para o Tesouro Nacional de financiar sua dívida, ao definir um valor da TJLP menor que esta taxa, o BNDES dá um subsídio implícito às empresas. Este subsídio não aparece no Orçamento da União, não disputa espaço com outros gastos públicos no Orçamento e, portanto, aqueles que dele se apropriam estão em situação privilegiada em relação ao restante da sociedade.

Não importa de onde vêm os recursos para financiar este subsídio. O importante é que eles poderiam ser utilizados para pagar a dívida pública, cujo custo é a taxa da NTN-B de cinco anos, em lugar de serem emprestados pelo BNDES à TJLP. A diferença é quanto o governo está deixando de “ganhar” ao utilizar o dinheiro de determinada forma em lugar de fazê-lo de uma forma alternativa.

Nossos cálculos indicam que, nos últimos dez anos, este subsídio atingiu a cifra de R$ 446 bilhões, ou seja, aproximadamente R$ 45 bilhões por ano.

Quarto, com essa substituição, o BNDES passará a remunerar o FAT pela TLP, em lugar da TJLP. Como o FAT hoje é deficitário, essa mudança irá reduzir o déficit do FAT e o déficit primário do governo.

A substituição da TJLP pela TLP é mais um passo na direção de eliminar os entulhos que persistem na legislação brasileira herdados da era Vargas. Ao aprovar este conjunto de reformas, que inclui o teto dos gastos públicos, a Reforma Trabalhista, a Terceirização, a Reforma do Ensino Médio, a TLP, entre outras, estaremos criando as condições para que o País possa entrar em uma nova era, com redução de privilégios a grupos específicos, mais democracia, menos poder para as corporações e menos dependência do Estado. Uma era de mais eficiência, mais crescimento, menos pobreza e desigualdade.
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* Professor do Departamento de Economia da PUC-Rio, é economista da Opus Gestão de Recursos

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