quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

Ricardo Noblat: O silêncio do capitão

- Blog do Noblat | Veja

Macri falou o que Bolsonaro não pôde

De duas, uma: ou o capitão Jair Bolsonaro está sob freios dos seus auxiliares para que não se manifeste sobre certos temas com a intempestividade que fazia quando era apenas candidato e duvidava da própria vitória, ou sua moderação desde que ocupa o cargo decorre do choque de realidade a que é submetido todo aquele que chega um dia à presidência da República por obra do destino.

O que disse ontem, em Brasília, o presidente argentino Maurício Macri a respeito da ditadura de Nicolás Maduro na Venezuela poderia ter sido dito com igual propriedade e satisfação por Bolsonaro, seu anfitrião. Afinal, é o que o capitão pensa e disse muitas vezes durante a recente campanha eleitoral. Mas Bolsonaro, de público, limitou-se apenas a ouvir Macri. Teve boas razões para isso.

A fronteira do Brasil com a Venezuela se estende por mais de dois mil quilômetros e é pouco patrulhada. Até abril do ano passado, segundo relatório da Organização Internacional para Migrações (OIM), agência das Nações Unidas, cerca de 50 mil venezuelanos já haviam se refugiado no Brasil para escapar da crise econômica que assola o seu país e que se agravou a partir de 2015.

Assim mesmo, o número de refugiados que aportaram por aqui é bem menor que o recebido por países que sequer fazem fronteira com a Venezuela. Até julho do ano passado, o Peru recebeu 354 mil venezuelanos, o Chile, 105 mil e a Argentina 95 mil. Estima-se que 3 milhões de venezuelanos já migraram. Tudo o que o governo brasileiro não quer é que aumente o fluxo dos evadidos para cá.

Maduro sabe disso, e essa é uma arma que ele sempre terá à mão para retaliar as pressões do Brasil contra seu regime. Se não bastasse, ele dispõe de outra: é venezuelana a energia que ilumina Roraima. O Brasil paga caro por ela, mas não tem como dispensá-la tão cedo. A produção de energia local é insuficiente. Só no ano passado houve 65 blecautes em Roraima contra 34 em 2017.

Embora diga que não reconhece o novo mandato presidencial de Maduro e pregue sua substituição imediata no cargo, o Brasil não rompeu relações diplomáticas com a Venezuela como fizeram a Argentina e o Paraguai. Nem mesmo fechou sua embaixada em Caracas, embora o embaixador tenha deixado o país por exigência de Maduro que o acusou de conspirar para derrubá-lo.

O discurso de Macri contra Maduro lavou a alma do capitão que seria capaz de assiná-lo com todo prazer, mas que por razões de Estado preferiu o silêncio.

Auxílio-mudança para quem não se muda

Coisas do Brasil

Entre as muitas mordomias que o Congresso oferece a seus ocupantes está um salário extra pago a título de auxílio mudança em todo início e fim de legislaturas – no caso da Câmara a cada quatro anos, e do Senado, ao término do mandato de oito anos de cada senador.

Com muita boa vontade, o pagamento só se justificaria se o deputado ou senador estivesse de chegada ou de saída de Brasília. Mas uma vez que renovou seu mandato, não tinha por que receber auxílio por uma mudança que não fará. Mas todos ou quase todos recebem.

Jair Bolsonaro recebeu no final de dezembro R$ 33,7 mil a título de auxílio-mudança embora o que mais que tivesse de levar para Brasília depois de ter morado ali nos últimos 28 anos fosse ser transportado por conta do seu novo emprego de presidente da República.

A mesma importância, como informe o jornal Folha de S. Paulo, foi recebida pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) que mora em Brasília há quatro anos e que agora apenas se reelegeu. País rico é assim. E políticos decentes, é assim também.

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