quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

Míriam Leitão: O bom e o péssimo no mesmo governo

O Globo

Há expectativas positivas na economia, com o programa de Paulo Guedes, e fartos temores em outras áreas, como educação, índios e o meio ambiente

Há sinais bons de que a economia brasileira pode avançar com o programa do ministro Paulo Guedes. Um desses é que o custo do seguro contra o risco-país já caiu. Há fatos assustadores, como o desastre ambiental contratado com decisões e palavras que estimulam invasão de terra indígena ou levam à paralisia no Ministério do Meio Ambiente (MMA). Esses não são os únicos pontos de alívio e ou de preocupação, essa polaridade tem havido no governo Bolsonaro.

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, explicou sobre sua decisão de suspender todos os convênios do Ministério, que vai dar prioridade às análises dos contratos que “necessitem de medidas imediatas”. Segundo o ministro, “se estiverem em ordem serão prontamente liberados, caso contrário serão encaminhados para auditoria por parte da CGU”. É normal que um novo governo ao chegar avalie tudo o que está acontecendo e mude o que considera ser ruim. O problema é, numa penada, suspender tudo sem avaliar as consequências.

Há inúmeras ONGs, fundações, fundos que não usam dinheiro público, pelo contrário, transferem recursos para o poder público. O Fundo Amazônia, por exemplo, foi formado com dinheiro do governo da Noruega, doado ao país, e é gerido pelo BNDES, que decide onde os recursos devem ser aplicados. Há avaliações frequentes da eficiência das ações.

Há o Programa Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa), que é o maior programa de apoio à conservação das florestas tropicais. “Sem esse recurso, a conservação da biodiversidade, a fiscalização, proteção e diversas frentes de trabalho serão duramente prejudicadas”, me disse um funcionário do MMA. O Arpa foi formado com doações internacionais e de fundações. Não é dinheiro público.

O engenheiro florestal Tasso Azevedo, do Observatório do Clima, disse que dependendo da dimensão dessa suspensão pode ser dramático para as organizações locais de apoio às Unidades de Conservação e lembrou que atinge também as organizações que fornecem dados para dar suporte ao governo.

— Nós criamos uma ferramenta para pegar cada alerta de desmatamento gerado pelo Deter/Inpe e pelo Sad/Imazon e avaliar em alta resolução quando e onde exatamente aconteceu o desmatamento, é o MapBiomas Alerta. Tudo foi desenhado em colaboração com o governo e o Ministério Público e temos um acordo de cooperação técnica que não envolve recursos. Isso vai entrar em operação em março —diz Tasso.

Como eles não dependem do governo, vão rodar os dados. Mas essas informações são úteis para ter aviso antecipado de todos os biomas sobre o local do desmatamento. São ações assim que podem ser vistas por qualquer pessoa que vá a campo para entender o trabalho de proteção ambiental. Ligado à questão ambiental, está o grave risco indígena. Tenho alertado, como fiz no blog ontem, que já começou a haver invasão de terra indígena. Pode aumentar quando chegar o período de menos chuva, a partir de maio.

Na área econômica, trabalha-se com foco e pressa. Neste momento, todas as atenções estão voltadas para a reforma da Previdência, e o deputado Rogério Marinho, secretário especial para Previdência e Trabalho, montou uma boa equipe com especialistas no assunto, como Solange Vieira, que fez o fator previdenciário, e vários integrantes da equipe de Marcelo Caetano, ex-secretário da Previdência. Tem consultado economistas, falado com políticos e integrantes do governo para preparar o projeto e trabalhar para que ele seja bem recebido. Tem aparado as arestas dentro do governo sobre o assunto. São muitas.

Os juros futuros despencaram desde a eleição do presidente Bolsonaro, o seguro contra a dívida brasileira, o CDS, está no melhor momento desde março de 2018. O CDS reflete a avaliação feita pelos investidores estrangeiros sobre a economia brasileira. Estava em 307 pontos e caiu para 182 pontos. Isso é aposta de que o governo vai aprovar a reforma e reduzir a crise fiscal. O presidente argentino, Maurício Macri, que visitou o Brasil ontem, assumiu com expectativa ótima junto ao mercado, mas sua opção por soluções graduais trouxe a desconfiança e a crise de volta. Esse erro não se pode cometer.

Mesmo num cenário de acerto na economia, se o governo errar em outras áreas como meio ambiente, educação, política indigenista, o custo para o país pode ser muito alto.

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