Há erros na condução da macroeconomia, mas existem falhas cometidas por meio de regulações e normas setoriais que também causam grandes estragos
O campo minado da economia à frente do próximo presidente da República não se limita ao espaço fiscal, onde estão montadas armadilhas conhecidas. Além da Previdência, a maior delas, há a indexação de gastos ditos sociais, existe um Orçamento engessado em despesas carimbadas, que limitam quase todo o poder de decisão do administrador público, entre tantas outras. Mas as distorções acumuladas por políticas econômicas enviesadas não se esgotam na macroeconomia. Incontáveis regras setoriais também geram resultados negativos importantes para o país.
Há um conjunto delas no comércio exterior. Isoladas, podem não dizer muito, mas juntas apontam na direção do atraso, porque estão invariavelmente contaminadas da ideologia do protecionismo, da substituição de importações, que acompanha o Brasil desde sempre.
Pratica-se, às vezes de maneira escamoteada, a ideia equivocada de que barreiras à importação estimulam a produção interna daquilo que se quer comprar no exterior. Não se questiona se é viável, em custos e qualidade, a substituição do bem ou serviço importado. Na maioria dos casos, é melhor, para o conjunto da sociedade, importar.
Estudo recente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) sobre as barreiras à importação de serviços — consultorias, aluguel de máquinas, serviços advocatícios, manutenção de equipamentos, entre outros — denuncia uma dessas barreiras protecionistas dissimuladas que prejudicam a capacidade de a indústria brasileira competir no exterior. Torna-se, na prática, inviável a importação de serviços — em outras palavras, tecnologia —, porque o empresário brasileiro paga entre 41% e 51% de impostos nessas operações. São serviços que aumentam a competitividade das empresas no mercado internacional.
A dificuldade não se encontra apenas na carga tributária — Espanha, Argentina e França cobram mais. Porém, no Brasil, há também uma sobreposição de impostos que ergue um muro quase intransponível para o importador de serviços. Em outros países, impostos sobre essas operações geram créditos para serem abatidos em gravames posteriores. Não no Brasil, o único dos 16 países estudados na pesquisa que aplica cinco ou seis impostos nessas importações. A Índia e a China, três; a maioria, até dois; Coreia, Alemanha e Estados Unidos, apenas um.
É decorrência desse protecionismo que, em 2015, os serviços representaram 64,5% do valor adicionado da produção industrial do país, mas apenas 9% foram importados. É prejudicada a indústria brasileira, cuja produtividade não avança como deveria. O sepultamento do delírio dos anos 70 de se produzir um “computador nacional”, por exemplo, já deveria ter exorcizado o fantasma da substituição de importações, principalmente em segmentos específicos em que a qualificação de outros países é imbatível. É chavão, mas tem validade: não se aconselha reinventar a roda. Melhor comprá-la.
As barreiras quase invisíveis erguidas contra a importação de serviços inspiram-se numa visão nacionalista arcaica que resiste a integrar o Brasil a cadeias globais de produção. Mesmo que o nacional-populismo trumpista e da direita europeia resista, a globalização é irreversível.
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