segunda-feira, 29 de julho de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Desmatamento amplia escassez de água no Brasil

O Globo

Faltam políticas eficazes para a proteção das nascentes dos rios e das reservas de água doce do país

Conhecido por concentrar 12% da água doce do mundo, incluindo dois dos maiores aquíferos do planeta (Guarani e Alter do Chão), o Brasil começa a enfrentar escassez crônica de água onde antes ela era abundante. O principal motivo é o desmatamento.

Quando chove, o solo sob as árvores funciona como uma esponja. “Cria-se uma gigantesca caixa- d’água debaixo das florestas”, escreveu em artigo recente no jornal O Estado de S. Paulo o economista Cláudio de Moura Castro. “Essa caixa vaza, lentamente, abastecendo os lençóis freáticos. Em algum lugar, esses lençóis viram nascentes que, ao longo do ano, fluem para os rios.” Sem as árvores, “a água da chuva escorre célere, pois o terreno pelado não a absorve”. As nascentes e lençóis freáticos secam aos poucos.

Fernando Gabeira - Biden, política e velhice

O Globo

Num sistema econômico que valoriza o vigor e a beleza, há forte tendência a marginalizar os velhos

A desistência de Joe Biden me fez refletir sobre a velhice. Não preciso dele; afinal, é dois anos mais novo que eu. Usaria o caso num debate sobre o tema de que participei no Museu do Amanhã. A mesa tinha um título atraente: “Quantas vidas há numa vida?”. Sugeria que podemos nos inventar muitas vezes. Comecei me distanciando um pouco do título, pois acho a velhice ativa uma exceção na sociedade moderna. Concordo com as teses básicas do melhor livro escrito sobre o tema: “A velhice”, de Simone de Beauvoir.

Num sistema econômico que valoriza o vigor e a beleza, há uma forte tendência a marginalizar os velhos. O vigor se vai com os anos, e nos tornamos fisicamente invisíveis, como se a vida fosse uma longa viagem no metrô de Londres. Biden fez bem em deixar o páreo. A campanha giraria em torno de sua idade e capacidade cognitiva. Agora, isso virou um problema de Trump.

Miguel de Almeida - O futuro que esquerda e direita mal enxergam

O Globo

Agenda brasileira permanece em sua contumaz esquizofrenia entre moderno e arcaico

Não é de estranhar que os bolsonaristas incentivem memes contra Fernando Haddad. Desde já percebem de onde surgem indícios de uma política pública alternativa à polarização — e com resultados. Estranho seria se os alvos fossem Sonia Guajajara ou Anielle Franco, com suas práticas datadas. O ótimo livro de Daron Acemoglu e Simon Johnson “Poder e progresso”, ao mergulhar na história das tecnologias e de seus reflexos sociais, escancara como a agenda brasileira permanece em sua contumaz esquizofrenia entre moderno e arcaico. Calma, o Brasil não é personagem da obra, porque nossa vocação extrativista é antes um fenômeno sociopatológico, jamais econômico. Nas páginas, encontram-se até pistas para compreender o retrocesso chamado Trump. Ou Bolsonaro, seu êmulo (até nos muitos casamentos).

Bruno Carazza - Contagem regressiva para Trump e Kamala

Valor Econômico

Em pouco mais de um mês, a eleição nos Estados Unidos virou de ponta à cabeça várias vezes. O debate presidencial de 27 de junho, seguido pelo atentado a Donald Trump em 13 de julho, a desistência de Joe Biden no dia 21 e o subsequente endosso do seu partido à vice Kamala Harris levaram a diversas mudanças nas perspectivas de vitória para republicanos e democratas.

Faltando cem dias para os americanos irem às urnas, não apenas a política, mas também a economia, os costumes, a geopolítica, a geografia e o dinheiro assumem papel determinante para definir quem será o 47º presidente da nação mais poderosa do mundo.

Alex Ribeiro - Fiscal alivia, mas dólar põe pressão no Copom

Valor Econômico

Os ruídos diminuíram depois que o presidente Lula parou de falar sobre juros

Com o mercado financeiro precificando altas de juros ainda neste ano, é grande a expectativa sobre se o Comitê de Política Monetária (Copom) vai indicar em reunião nesta semana que isso não seria preciso, pelo menos nas condições atuais - e se vai dizer que considera equilibrados os riscos negativos e positivos no seu cenário inflacionário.

Se isso ocorrer, de certa forma será um repeteco do que o comitê disse na reunião de junho: de um lado, reafirmar que os juros no patamar atual, de 10,5% ao ano, são suficientes para colocar a inflação na meta; de outro, avisar mais uma vez que está pronto para agir, se for preciso apertar mais.

Maduro é declarado vencedor na Venezuela com 51,2% dos votos

Valor Econômico / Por Agências internacionais

Segundo autoridade eleitoral do país, o candidato da oposição recebeu 44,2%; EUA pedem divulgação do relatório da apuração

Nicolás Maduro, 61 anos, foi declarado o vencedor da eleição presidencial na Venezuela realizada ontem, com 51,2% dos votos, com 80% dos votos apurados, segundo informou a autoridade eleitoral do país na madrugada desta segunda-feira (29).

O principal candidato da oposição, Edmundo González, um ex-diplomata de 74 anos, ficou com 44,2% dos votos, segundo anunciou Elvis Amoroso, presidente do Conselho Nacional Eleitoral (CNE). Ele atribuiu o atraso na divulgado dos resultados a um problema de “agressão” no processo eleitoral, mas sem entrar em detalhes. Amoroso também indicou que a taxa de participação dos venezuelanos foi de 59%.

Diogo Schelp - Vizinho precisa deixar de ser um ‘país-problema’

O Estado de S. Paulo

Os interesses brasileiros e o contexto geopolítico envolvendo a Venezuela mudaram

O teatro eleitoral venezuelano não se encerra quando as urnas são fechadas. A fase mais angustiante para os milhões de cidadãos que almejam mudança em um país castigado por 25 anos de regime chavista começa agora. A posse presidencial se dará apenas em 10 de janeiro e, até lá, há de se esperar muita contestação, intimidação e tensão política. Esse é o momento propício para o governo Lula promover uma reorientação profunda em sua política externa. A Venezuela precisa deixar de ser um “país-problema” para o Brasil.

Thomas Friedman - Um líder pequeno para o momento

New York Times / O Estado de S. Paulo

Acordo de cessar-fogo espera decisão de Netanyahu, que teme agir sem aval da extrema direita

Quando penso no discurso do primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu, na quarta-feira, em uma reunião conjunta do Congresso dos EUA, a primeira coisa que me vem à mente é um famoso ditado: “Há décadas em que nada acontece, e há semanas em que décadas acontecem”. Esta é uma daquelas semanas para Israel, os Estados Unidos e o Oriente Médio. Uma década está pronta para acontecer – ou não.

Por puro acidente, a semana passada marcou a sobreposição de um conjunto de pontos de virada entre guerra ou paz que nem Tolstoi poderia imaginar. Na sequência da decisão de Biden de colocar seu país à frente de seus interesses pessoais e ceder o poder, Netanyahu – que consistentemente faz o oposto – chegou a Washington. E enfrentou duas decisões que poderiam proporcionar a Biden um enorme legado de política externa e, ao mesmo tempo, transformar o legado de Netanyahu – ou não.

André Gustavo Stumpf - A luta contra a direita

Correio Braziliense

Apareceu a novidade Kamala Harris, com seu sorriso aberto e o sopro de juventude numa eleição dividida entre dois velhos com ideias antigas. Ela representa o novo

França e Estados Unidos mantêm um curioso caso de influência política recíproca. Quando os norte-americanos proclamaram a independência das 13 colônias da Inglaterra, em 1776, seguiu-se uma guerra que durou até 1781. O governo francês auxiliou os rebeldes da América com navios de guerra, munições e soldados. A independência da antiga colônia inglesa se antecipou e assimilou os princípios políticos da repartição do poder que seriam consolidados na Revolução Francesa de 1789. Os laços entre os dois países são antigos e tradicionais, tanto que Alexis de Tocqueville, francês, escreveu, no início do século 19, seu célebre A democracia na América.

Oliver Stuenkel - Os riscos que Trump corre com seu vice

O Estado de S. Paulo

Conservador nos costumes, vice pode afastar centristas, fundamentais para vencer eleição

As primeiras duas semanas de J.D. Vance como vice da chapa de Trump dificilmente poderiam ter sido piores. A tarefa principal de qualquer político que se apresenta no palco nacional pela primeira vez, como Vance o fez durante a convenção republicana, é construir uma imagem clara e uma narrativa convincente que fortaleça as chances da chapa.

No caso de Vance, porém, os democratas reagiram de forma mais ágil à indicação e inundaram as redes com vídeos de Vance compartilhando ideias vistas como controversas por eleitores indecisos. Um deles é um clipe de 2021, no qual Vance alertou que os EUA estavam sendo governados por “um bando de mulheres sem filhos, infelizes com suas próprias vidas”.

Denis Lerrer Rosenfield - A extrema esquerda

O Estado de S. Paulo

O Lula que emerge das eleições não era o do seu primeiro mandato, conciliador. Não. O novo presidente adotou uma ideologia cada vez mais esquerdista

Há embustes ideológicos em coberturas e análises, quando não mero desconhecimento dos fatos e da História, ao nos debruçarmos sobre o significado de palavras como esquerda, extrema esquerda, direita e extrema direita (ou direita radical ou ultradireita como alguns preferem, na ausência de uma caracterização melhor). Mais precisamente, a extrema esquerda vem sendo vista como “democrática”, como se se confundisse com uma “social-democracia”, e a direita logo tida por “fascista”. A confusão é total, fazendo com que a luta política fique obscurecida, fortalecendo o totalitarismo e o autoritarismo, e enfraquecendo a democracia.

Ana Cristina Rosa - 200 anos de desigualdades

Folha de S. Paulo

Imigração alemã é uma oportunidade para refletir sobre o passado e repensar o futuro

Os 200 anos da imigração alemã para o Brasil são uma oportunidade para refletir sobre o passado e repensar o futuro. A data da chegada dos 39 primeiros colonos a São Leopoldo (RS), berço da imigração alemã, é 25 de julho, também Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha e Dia Nacional de Tereza de Benguela (líder quilombola).

Por ironia, a celebração da história de esperança e superação de um povo estrangeiro que fugiu de guerras e da pobreza em busca de uma vida melhor expõe as desigualdades perpetradas pelo Estado com o racismo institucional e o massacre indígena no Novo Mundo.

Marcus André Melo - Equívocos da polarização

Folha de S. Paulo

A geometria política vai além de questões convencionais de extremos e centro

Há pelo menos três graves equívocos no debate sobre polarização. O primeiro é supor que ela exige algum grau de simetria entre posições polares. Alguns argumentam que não há polarização nos EUA porque Biden é centrista. A confusão origina-se na falta de compreensão quanto ao conceito de mediana, muitas vezes entendida como centro.

A mediana de uma distribuição de preferências políticas pode estar ou não no valor central, digamos 5 em uma escala de 1 a 10 (onde 10 é extrema direita e 1, extrema esquerda). Não importa a escala —se baseada no auto posicionamento ou métricas objetivas— a mediana é o ponto que divide o eleitorado em duas partes iguais: metade à esquerda deste ponto e metade à direita.

Vladimir Safatle – ‘Pós-judeus’, identidade e trauma

Folha de S. Paulo

Em novo livro, intelectuais judeus buscam resgatar um sentido emancipatório da judaicidade, cada vez mais silenciado por um Estado israelense militarizado que se coloca como guardião de uma história secular de perseguição. A partir desse caso dramático, "O Judeu Pós-judeu" reflete sobre os limites e os riscos de perspectivas que recorrem às noções de identidade e trauma social para lidar politicamente com legados de opressão

"Em certos momentos, face a acontecimentos públicos, sabemos que devemos recusar [...]. Há uma razão que não aceitamos, há uma aparência de razoabilidade que nos causa horror, há uma oferta de acordo e de conciliação que não mais escutaremos."

Essa é uma afirmação de Maurice Blanchot que abre "O Judeu Pós-judeu: Judaicidade e Etnocracia" (n-1 edições), de Bentzi Laor e Peter Pál Pelbart. Ela expressa nitidamente a natureza desse livro recém-lançado, tão singular quanto necessário.

A escrita da obra nasce de uma recusa. Dois intelectuais judeus, um morando no Brasil —conhecido como um dos grandes nomes da filosofia nacional, leitor rigoroso de Deleuze, Foucault, Nietzsche, editor com intervenções políticas maiores nesses últimos anos— e outro morando em Israel —dividindo seu tempo como engenheiro com atuação no setor de alta tecnologia e ativista ligado a ONGs de defesa de palestinos.

Poema | Desesperança, de Manuel Bandeira

 

Música | Moacyr Luz - Atravessado