terça-feira, 3 de setembro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Brecha para excluir terceirizados da LRF cria ameaça fiscal

O Globo

Senado precisa barrar projeto aprovado na Câmara que cria exceção na lei para facilitar contratações

A Câmara aprovou na semana passada um projeto que muda a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para excluir dos limites dos gastos com pessoal as despesas com o pagamento de funcionários terceirizados. A proposta, que será ainda submetida ao Senado, cria no Orçamento a rubrica “Outras despesas com pessoal”, em que abriga uma espécie de folha de pagamentos paralela. O risco de descontrole fiscal é evidente, por isso os senadores precisam derrubá-la.

A mobilização política no Congresso para facilitar a contratação de terceirizados coincide com o início do entendimento entre estados e União para renegociar dívidas. Caso o Projeto de Lei seja aprovado no Senado, as despesas com pessoal tenderão a crescer, pondo em risco, além do equilíbrio fiscal, a própria operação de socorro financeiro.

As despesas de União, estados e municípios com a folha dos servidores estão na faixa dos 9% do PIB, acima do que gastam Peru (6,2%), Chile (6,8%) e países ricos como Alemanha (5,9%), França (8%) ou Reino Unido (7,3%). A LRF estabelece que os gastos com salários não podem ultrapassar 50% da receita corrente líquida federal e 60% da estadual ou municipal. Essas barreiras de contenção serão demolidas se o projeto for aprovado pelo Senado.

Míriam Leitão - Os ruídos em torno da transição no BC

O Globo

A cada declaração de diretores do Banco Central, o mercado tenta comprovar sua tese de divisão no colegiado. Com isso, juros e dólar futuro oscilam

Há um fato afetando preços no mercado financeiro, principalmente nos juros futuros, que é artificial, gerado por interpretações. Não há conflito nem duplo comando no Banco Central. O presidente atual, Roberto Campos Neto, é quem comandará as próximas três reuniões e, apesar de muitos analistas terem visto uma posição branda de Campos Neto e outra mais dura de Gabriel Galípolo, eles têm dito a mesma coisa. Não haverá pré-indicação do que acontecerá em setembro, nem nas reuniões seguintes. Portanto, sem forward guidance.

Merval Pereira - Direitos ameaçados

O Globo

Várias empresas já procuraram ministros alegando haver ordens que aparentemente não se justificam e que não recebem as explicações legais para o desligamento compulsório das contas.

Sem entrar diretamente na questão envolvendo a rede social X, do multibilionário Elon Musk, e o relator dos relatores do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, há uma preocupação real dos ministros com o potencial de influência que as redes, não apenas o antigo Twitter, têm sobre os cidadãos, sem que haja regulamentação que limite suas atividades.

A ministra Cármen Lúcia, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), lançou ontem seu livro “Direitos de/para todos” na Academia Brasileira de Letras (ABL). O livro é uma visão humanista, quase poética, sem juridiquês, da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU. Como Austregésilo de Athayde, presidente da ABL durante 34 anos, foi o brasileiro que participou da redação do documento, o lançamento não poderia ter sido em local mais apropriado. Inevitavelmente, a ministra, uma defensora da liberdade de expressão, falou sobre a questão atual, mostrando que estudos de neurociência revelam que há quatro “vês” que marcam a atuação das redes sociais: velocidade, verossimilhança, volume e viralização.

Pedro Doria - O espírito da democracia

O Globo

No momento em que Elon Musk escolheu parar de acatar decisões judiciais, plataforma não poderia mais operar no país

A decisão de fechar o X é uma tragédia. Vinte milhões de brasileiros com contas ativas na plataforma foram privados do espaço onde discutiam regularmente sobre toda sorte de assunto. Tecnologia, ciência, celebridades, futebol e, sim, política. Quando uma democracia cassa o direito de 10% da sociedade conversar no ambiente que escolhe, três liberdades essenciais, cláusulas pétreas da Constituição, são extirpadas: o direito à livre expressão, à livre associação e, se considerarmos que o ambiente digital é um espaço real, a ir e vir. A decisão do ministro Alexandre de Moraes, ratificada pela Primeira Turma do STF, era esperada. Nem por isso é menos grave.

Eliane Cantanhêde - Deboche de um lado, teimosia do outro

O Estado de S. Paulo

Com excessos, STF contribui para confundir o que é patriotismo, democracia e liberdade de expressão

Ao apoiarem por unanimidade a suspensão do X (ex-Twitter), os cinco ministros da Primeira Turma do STF rechaçaram energicamente o descumprimento de decisões judiciais por Elon Musk, mas... houve ressalvas às decisões do relator Alexandre de Moraes e sinais favoráveis a negociações tanto com X quanto com a Starlink, outra empresa do grupo, buscando saídas para o impasse.

Assim, o julgamento reforçou a união do Supremo contra ataques externos, mas deixou no ar o incômodo de parte dos ministros com a teimosia de Moraes, que, segundo um colega, “não gosta de ser controlado, mas quer controlar todo mundo” e tem imensa dificuldade para recuar, mesmo quando extrapola e enfraquece a imagem do STF.

Carlos Andreazza - Barroso indeterminado

O Estado de S. Paulo

A jurisdição xandônica surge do inquérito das Fake News, onipresente e infinito. Tudo bem para Barroso

 Luís Roberto Barroso deu entrevista à Folha. Aula de indeterminação, ou não teria meios de defender-avalizar o colega. Informou-nos de que “vazamento é vazamento”. Não é, não. Alexandre de Moraes não “está investigando um vazamento” – não um de que se possa omitir o complemento. Está investigando o vazamento de mensagens em que assessores seus articulam como esquentar ordens suas, instrumentalizado o poder de polícia do TSE. O vazamento de mensagens em que é a voz – o delegado – que se ocultava, em proteção ao juiz-total. Ele, Moraes.

Luiz Gonzaga Belluzzo - Linguagem e economia

Valor Econômico

Linguagem dos mercados financeiros contemporâneos não descreve e muito menos “analisa objetivamente” um determinado estado de coisas, mas produz imediatamente significados “reais”

No livro “Power”, publicado em 1938, o filósofo e matemático Bertrand Russel observou: “A economia como uma ciência separada é irrealista e enganosa, se tomada como um guia na prática. É um elemento - um elemento muito importante, é verdade - de um estudo mais amplo, a ciência do poder”.

Entre os poderes da economia, brilha de forma intensa o Poder Performático da Linguagem. Apoiado no linguista John Austen, Christian Marazzi em seu livro “Capitale e Linguaggio” cuida das marchas e contramarchas da finança dos últimos 40 anos. Marazzi sublinha a natureza performativa da linguagem do dinheiro e dos mercados financeiros, indicando que a linguagem dos mercados financeiros contemporâneos não descreve e muito menos “analisa objetivamente” um determinado estado de coisas, mas produz imediatamente significados “reais”.

Bertrand Benoit - Populismo cresce na Europa também pela falta de confiança nos governos

Dow Jones / Valor Econômico

Pesquisadores e analistas acreditam que um dos principais motivadores subjacentes para os eleitores é a diminuição da confiança nos seus governos

populismo antiestablishment está em ascensão na Europa, alimentando não só pela migração e temores com economia e segurança, mas também por uma tendência mais profunda: a corrosão da confiança na capacidade dos governos de superar esses desafios.

Na Alemanha, no domingo, a Alternativa para a Alemanha (AfD), o partido de extrema direita, e um novo partido populista de extrema esquerda obtiveram quase metade dos votos no Estado da Turíngia, e juntos também conseguiram mais de 40% na vizinha Saxônia. Na Turíngia, o AfD terminou em primeiro lugar, na primeira vez que um movimento de extrema direita vence uma eleição estadual na Alemanha desde a Segunda Guerra.

Na França, uma eleição legislativa que resultou em um parlamento sem maioria absoluta e deu ao Reunião Nacional, de extrema direita, quase um quarto de todas as cadeiras — um aumento de mais de 50% em relação à última eleição — e ainda não produziu um governo dois meses depois.

Uma série de crises que vão da imigração à inflação e a guerra na Ucrânia, ajudou os populistas a obter vitórias eleitorais na Itália, Holanda, Suécia e Finlândia nos últimos anos. Para alguns pesquisadores e analistas, no entanto, crises não são novidade. O que há de novo é a confiança cada vez menor dos eleitores de que os governos eleitos podem resolver essas crises.

Maria Cristina Fernandes - Entre STF e Starlink, disputa sobe de patamar

Valor Econômico

Moraes vai precisar desse respaldo da Primeira Turma numa decisão que agora atinge o setor real da economia e da vida das pessoas

A recusa da Starlink em cumprir a determinação do Supremo Tribunal Federal de bloquear o acesso de seus usuários ao X mostrou que o fio puxado pelo ministro Alexandre de Moraes era do bigode de um elefante. Ao contrário do X, que nem publicidade mais dispõe, a Starlink tem 224 mil contratos - desde navios da Marinha na Antártica a cidades-símbolo do agronegócio (Sinop-MT) ou turismo (Fernando de Noronha-PE).

A unanimidade de Moraes na Primeira Turma respalda a decisão do ministro mas não conduz ao bloqueio da empresa. Se concorrentes do X, como Bluesky ou Threads, já se arvoram a conquistar ex-tuiteiros, a substituição da empresa que lidera a banda larga por satélite no país, com 42% do mercado, não se faz em dois cliques.

A disputa é gigante mas paquidérmica. A recusa da Starlink foi comunicada por WhatsApp ao presidente da Anatel, Carlos Baigorri, que tem até a sexta-feira para receber a notificação formal da recusa ou verificar, in loco, o descumprimento. Só então fará a comunicação oficial ao STF que, por enquanto, bloqueou as contas, mas não a operação.

Gideon Rachman - Elon Musk é um míssil geopolítico descontrolado

Financial Times / Valor Econômico

Apesar de toda sua riqueza e inegável brilhantismo como engenheiro e empreendedor, Musk continuará sujeito à lei dos países nos quais opera. Isso explica a crescente fúria de seus ataques verbais contra o Brasil e qualquer outro que ouse ficar em seu caminho.

Grandes empresas e bilionários costumam ficar loge de controvérsias políticas. Se exercem o poder, preferem fazê-lo nas sombras. Elon Musk é diferente.

Nas últimas semanas, ele manifestou seu apoio a Donald Trump e fez uma entrevista em tom amigável com o ex-presidente dos EUA no X, a plataforma de relacionamento social on-line pertencente a Musk. Também está envolvido em uma briga pública com o Supremo Tribunal Federal do Brasil, que na semana passada suspendeu o X. Recentemente, ele sustentou que uma guerra civil no Reino Unido é inevitável e reagiu à prisão de Pavel Durov na França com a seguinte publicação: “POV [ponto de vista]: É 2030 na Europa e você está sendo executado por curtir um meme”.

Luiz Carlos Azedo - Turma do Supremo endossa medidas contra Musk

Correio Braziliense

O referendo ocorreu em sessão extraordinária virtual nesta segunda-feira, por unanimidade. No julgamento, Moraes disse que tomou a decisão depois de realizar todos os esforços possíveis para que as ordens judiciais fossem cumpridas pelo X

A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou decisão do ministro Alexandre de Moraes que suspendeu a plataforma X, antigo Twitter, em todo o território nacional. O referendo ocorreu em sessão extraordinária virtual nesta segunda-feira, por unanimidade. No julgamento, Moraes disse que tomou a decisão depois de realizar todos os esforços possíveis para que as ordens judiciais fossem cumpridas pelo X, como o pagamento das multas.

Joel Pinheiro da Fonseca - O Supremo mina sua legitimidade

Folha de S. Paulo

Um ministro julga ser a própria lei, e o povo paga a conta do cabo de guerra

Aconteceu. Desde a meia-noite de domingo eu e milhões de brasileiros perdemos acesso à rede X. Não havia lugar melhor para sentir o pulso instantâneo do debate público e ver as reações imediatas de todos os lados. O povo pagou a conta de um cabo de guerra entre um bilionário megalomaníaco que se julga acima da lei brasileira e um ministro do Supremo que julga ser a própria lei.

Esse desfecho era juridicamente inevitável dado o passo imediatamente anterior: a desobediência reiterada de decisões judiciais, o não pagamento das multas e o fim de qualquer representação no país.

Alvaro Costa e Silva - Quem 'vai de arrasta', Moraes ou Musk?

Folha de S. Paulo

Armadilha do bilionário é fabricar uma convulsão política em cima do ministro

Foi divertido acompanhar a expectativa que antecedeu a suspensão do Twitter dentro das redes sociais —e principalmente dentro do próprio Twitter. A zoeira, que antes da invasão de comentários, mentiras e ódios relacionados à política era a atividade preferida dos usuários, voltou com tudo, enchendo de graça o momento que muita gente considera uma tragédia sem precedentes, algo como a destruição da biblioteca de Alexandria, durante séculos o maior provedor de conteúdo do mundo antigo.

Dora Kramer - Queridos zeladores

Folha de S. Paulo

Para o eleitor municipal vale mais a zeladoria das cidades que a guerra ideológica

eleição em São Paulo galvaniza atenções porque mobiliza emoções políticas. Fator importante, senão crucial, nas disputas nacionais. Ambiente que a Luiz Inácio da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) interessa atrair para o âmbito municipal.

Ou melhor, interessava ao menos no caso de Lula. Na semana passada, deu um passo atrás em entrevista a uma rádio da Paraíba: disse que pretende reduzir sua participação em campanhas devido à pesada agenda presidencial.

O recuo tático em relação à ideia de que a disputa de 2024 deveria ser vista como uma prévia de 2026 provavelmente se deu em função das pesquisas. Elas indicam baixa adesão do eleitorado aos ditames dos padrinhos de candidatos que também atraem rejeição.

Cláudio Carraly - Reforma do Conselho de Segurança da ONU: Adaptação às Demandas Globais

O Conselho de Segurança das Nações Unidas, estabelecido em 1945 após os horrores da Segunda Guerra Mundial, emergiu como uma instituição central na promoção da estabilidade e paz internacionais. Composto por cinco membros permanentes - Estados Unidos, Rússia, Reino Unido, França e China - e dez membros não permanentes, o Conselho foi encarregado da responsabilidade vital de zelar pela paz e segurança globais. No entanto, ao longo dos anos, a estrutura do Conselho tem sido desafiada pela evolução do cenário geopolítico e pelas demandas emergentes do século XXI.

À medida que avançamos, o Conselho de Segurança enfrenta uma série de desafios que destacam a inadequação de seu modelo atual. A ascensão de novos atores globais, incluindo economias emergentes e potências regionais, tem ampliado a disparidade entre a composição do Conselho e a distribuição real do poder. Países com influência significativa, mas não representados permanentemente, sentem-se sub-representados no órgão de decisão mais importante da ONU.

Além disso, a natureza dinâmica das ameaças à paz e à segurança internacional exigiu uma resposta mais ágil e flexível do Conselho. Questões como terrorismo, mudança climática, pandemias e conflitos internos demandam abordagens multifacetadas e soluções inovadoras, muitas vezes impossíveis dentro do atual quadro institucional do Conselho de Segurança. Por exemplo, a crise climática, que está se tornando cada vez mais urgente, requer a cooperação internacional em níveis sem precedentes, no entanto, o Conselho, com sua estrutura rígida, muitas vezes lutou para oferecer respostas eficazes e abrangentes a essas ameaças, sem obter sucesso.

Poesia | Leonardo Bigio - Morte e Vida Severina, de João Cabral de Melo Neto

 

Música | Moacyr Luz - Apoteose ao Samba / Meu Drama / Aquarela Brasileira