terça-feira, 21 de maio de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Adiar eleição abre precedente perigoso

O Globo

Apesar da tragédia no Sul, medida só deveria ser tomada em casos excepcionais, por razões logísticas

Enquanto o Rio Grande do Sul conta mortes e prejuízos das enchentes que afetaram 90% de seus municípios, pode parecer prematuro discutir o adiamento das eleições para prefeito e vereador marcadas para 6 de outubro. Mas o debate é inexorável devido ao tempo exíguo para tomar as decisões. O calendário eleitoral já está aí. Em junho, começa a pré-campanha. No mês seguinte, entre 20 de julho e 5 de agosto, partidos e federações realizarão suas convenções. A propaganda começa em 16 de agosto.

Entre os políticos, não há consenso. “Ainda é um pouco cedo, mas também não vai poder retardar muito a discussão. Junho já é momento pré-eleitoral, e em julho se estabelecem as convenções”, afirmou ao GLOBO o governador gaúcho Eduardo Leite (PSDB). Ele argumenta que a troca de governo nos municípios e o próprio debate eleitoral podem atrapalhar a reconstrução. O prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), é mais reticente. Diz que um eventual adiamento precisa ser avaliado com critério, apenas quando tiver passado o auge da catástrofe e for possível avaliar seus impactos. O presidente do PL gaúcho, Giovani Cherini, defende o reagendamento do pleito para o primeiro semestre de 2025, depois que a população voltar para suas casas. Outras lideranças gaúchas são favoráveis ao adiamento argumentando que muitos locais de votação, como escolas, foram destruídos e que não há ambiente para a campanha eleitoral.

Míriam Leitão – Unindo as forças pelo Rio Grande

O Globo

Exército fazia um exercício de prontidão em Santa Maria quando a chuva caiu como uma parede. A missão real começou imediatamente

No dia 30 de abril, o comandante do Exército, Tomás Paiva, estava em Santa Maria (RS), onde serviu no início da carreira. Ele estava lá por acaso. Havia chegado com o ministro José Múcio no dia 29, para acompanhar um exercício militar na Brigada de Santa Maria. Este específico exercício tem o nome de “Apronto Operacional da Força de Prontidão”. Nele, 1.500 militares simularam a preparação para uma missão iminente. Na ida, quando estavam chegando, caiu um raio no avião. Não houve maiores problemas, mas quando isso acontece a aeronave tem que ser enviada para manutenção e substituída. Logo após o exercício militar, a chuva caiu como se fosse uma parede, descreve quem estava lá. Ficou claro que não era uma chuva normal. O avião que pegaria o ministro e o comandante teve dificuldade de pousar na tarde daquele dia. A missão para a qual as tropas haviam se preparado, em simulação, começaria imediatamente.

Felipe Krause* - A esquerda é vítima do próprio sucesso?

O Globo

O PT não conseguiu processar um fato: muitos que se beneficiaram de suas políticas têm valores conservadores

No dia 4 de março, o presidente Lula enviou ao Congresso um ambicioso Projeto de Lei para regulamentar o trabalho por meio de aplicativos de transporte, o PL dos Aplicativos. O texto contém dispositivos sobre salário mínimo, jornada de trabalho, sindicalização e contribuições para a Previdência. Ao anunciar o projeto, o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, afirmou que os motoristas sofrem de “falsa sensação de liberdade”, e que são “escravizados por longas jornadas e baixa remuneração”.

A reação do público-alvo do PL, no entanto, revelou uma realidade mais complexa. Motoristas realizaram protestos em várias cidades, e o projeto enfrenta uma batalha difícil no Congresso. Os manifestantes alegam que as novas medidas são dispensáveis e provavelmente prejudiciais. Embora reconheçam as difíceis condições de trabalho, são céticos quanto à introdução pelo Estado de novas regras que podem, no final das contas, afetar seus ganhos.

Andrea Jubé - Negar a crise do clima pode custar caro

Valor Econômico

Um oceano separa a catástrofe climática que atingiu o Rio Grande do Sul do comício do partido espanhol Vox, com lideranças da ultradireita internacional, como Javier Milei, realizado em Madri nesse domingo (19). A verdade, contudo, é que a distância entre esses dois eventos, um geográfico, outro político, é tão estreita que seria possível cruzar esse oceano com uma pinguela.

Isso porque no mesmo dia em que os principais nomes da extrema direita mundial reuniram-se na Espanha para reforçar, entre outras pautas, o negacionismo climático, os brasileiros - do outro lado do Atlântico - assistiam, estarrecidos, à fúria das águas arrastando carros, móveis, pessoas, animais, sobre cidades inundadas, um cenário de guerra, uma atmosfera de desespero e desalento. Tão longe, e tão perto.

Daniela Chiaretti - A Mata Atlântica, o desastre no Sul e as velhinhas suíças

Valor Econômico

É preciso um olhar integrado para todos os biomas brasileiros, para zerar o desmatamento e priorizar a restauração -ou as crises do clima e da biodiversidade continuarão a se intensificar

Ao menos 70% da população brasileira vive na Mata Atlântica. Metade da comida que se come no Brasil é produzida no bioma. Um quarto do rebanho bovino do país está ali. Um quarto da produção de soja brasileira, também. A Mata Atlântica permite a produção de brócolis, couve, tomate, bananas, além de commodities como café e açúcar. Uma grande parte do PIB do agro está na região. É ali que o país vai alcançar o desmatamento zero primeiro -porque é o bioma que os brasileiros mais destruíram, onde os serviços ecossistêmicos mais fazem falta, onde as tragédias ambientais estão acontecendo com maior intensidade e onde a restauração só trará ganhos.

Rana Foroohar - Nem todas as tarifas nascem iguais

Valor Econômico

A pandemia, a guerra na Ucrânia, a ameaça de conflito em torno de Taiwan, as interrupções no transporte no Mar Vermelho e os vários desastres naturais que provocaram caos nas cadeias de suprimentos não mostraram que é péssima ideia para o mundo manter todos os seus ovos de produção em uma única cesta?

Há diferentes tipos de americanos. E há diferentes tipos de estratégias de tarifas. Essa é a principal mensagem a ser tirada das novas tarifas de importação do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, sobre várias mercadorias chinesas. Embora alguns as vejam como uma prova de que esta Casa Branca quer uma desglobalização tão rápida quanto a desejada pelo governo Trump, nada poderia estar mais longe da verdade.

Trump usou as tarifas como uma ferramenta de força, em uma estratégia com um uma única frente, a de reduzir o déficit comercial dos EUA com a China. Para Biden, no entanto, elas fazem parte de um plano muito mais amplo. O plano almeja não apenas combater o mercantilismo chinês, as suas repercussões econômicas e políticas no mundo e a incapacidade do sistema comercial existente para resolver isso, mas também expandir a capacidade produtiva em áreas fundamentais, como as de semicondutores e tecnologia limpa.

É uma estratégia comercial que também almeja construir uma verdadeira aliança democrática - entre ambientalistas e sindicatos, tanto em Estados republicanos quanto em democratas e, em última análise, entre aliados no exterior, em torno à transição para energia limpa. Tudo isso é algo que a Europa e outras democracias liberais não apenas deveriam apoiar, mas também imitar.

Pedro Doria - A IA está quase humana

O Globo

O que chama mais a atenção é o GPT 4o, capaz de conversar como se fosse gente

OpenAI e Google lançaram as novas versões de seus modelos de inteligência artificial (IA) na semana passada, e em ambos os casos representam um novo salto. O que chama mais a atenção é o GPT 4o, capaz de conversar como se fosse gente. Pois é: ficou difícil se comunicar com Alexa, Google Assistente e Siri. Ficaram primitivas demais num estalar de dedos. Mas, do ponto de vista técnico, o relevante é que os dois modelos agora são multimodais. Mais uma palavra importante para nosso vocabulário neste mergulho que a humanidade está dando, agora de mãos dadas com IAs.

Hélio Schwartsman - Pessoas imaginadas

Folha de S. Paulo

Pessoas jurídicas se assemelham às naturais em muitos aspectos, mas há situações em que o elemento humano é irredutível

Contra fake news, o governo Lula processa um influenciador de direita por ofensa à honra da União. A pergunta é se o Estado tem honra que possa ser ofendida ou se essa palavrinha que já causou tantas brigas, homicídios (pense nos duelos) e até guerras se aplica apenas a humanos?

Lidamos aqui com o que talvez seja a maior realização da linguagem, que é criar realidades imaginárias compartilhadas por tantas pessoas que se tornam instituições altamente motivadoras. Estamos falando de coisas como religião e dinheiro (a maior parte da moeda em circulação não existe nem como pedaço de papel, apenas como registros contábeis digitais). Estamos também falando de entes públicos, organizações, empresas e tudo aquilo a que chamamos de pessoas jurídicas.

Dora Kramer - Duas faces do flagelo

Folha de S. Paulo

Disputa política na tragédia gaúcha tem o lado A, da luz, e o lado B, na treva

São recorrentes, por inevitáveis, as comparações da catástrofe no Rio Grande do Sul com a calamidade da recente pandemia. Em vários aspectos, inclusive os efeitos político-eleitorais, muito menos dramáticos porque não implicam perdas de modo direto e imediato.

Em decorrência da crise sanitária, deu-se mal o governante agressivamente negacionista. Jair Bolsonaro pagou com a derrota o preço da insensibilidade. Mas tampouco deu-se bem o governador que, diligente, providenciou o primeiro lote de vacinas contra a Covid-19João Doria foi visto como excessivo na propaganda do feito.

Joel Pinheiro da Fonseca - Mudanças climáticas são prioridade?

Folha de S. Paulo

Insuficiência de investimentos é geral e agenda também parece distante de grandes debates de política econômica

"Estudos alertaram, mas o governo também vive outras agendas", respondeu Eduardo Leite quando indagado sobre a falta de investimentos para o combate de enchentes no Rio Grande do Sul, cuja necessidade já era apontada por estudos. A sinceridade brutal que ele mostrou ali cobra seu preço, mas seria verdadeira em diversos estados brasileiros. Estamos mal adaptados à mudança climática.

No discurso, ela é prioridade para variados lados do espectro ideológico. A real divisão atual entre liberais e a esquerda é se o Estado, ao incorporar essa agenda ambiental, tem que fazer escolhas e priorizar o que é mais importante ou se pode simplesmente gastar mais sem nenhum limite a cada nova necessidade que se apresenta. Mas isso é uma discussão teórica.

Eliane Cantanhêde - Verdade nua e crua

O Estado de S. Paulo

Acusações contra a Lava Jato e montanhas de provas não se anulam, se confirmam

Depois de semanas dedicadas à tragédia gaúcha, a pauta desta terça-feira, 21/5, em Brasília, está voltada para a Lava Jato, no Supremo, no TSE e na Câmara dos Deputados. Lembram da Lava Jato? Sim, essa mesma, a que já foi considerada a maior operação de combate à corrupção no Brasil e uma das maiores no mundo, mas sofreu uma reviravolta estonteante e caiu em desgraça. Todos os acusados já estão soltos, mas a Lava Jato continua pairando no ar.

No dia seguinte à decisão do ministro Flávio Dino de manter o afastamento dos desembargadores Carlos Eduardo Thompson Flores e Loraci Flores de Lima, do TRF-4, que atuaram em processos da Lava Jato, o Supremo deve julgar hoje um pedido do ex-presidente do PT José Dirceu para a extinção da pena por corrupção passiva no contexto da Lava Jato.

Carlos Andreazza - Dilma III

O Estado de S. Paulo

O dinheiro escasseia. Não está mais tão barato arrancá-lo; nada fácil fabricá-lo

O Ministério do Planejamento entrou na clandestinidade. O aparelho está por cair; seus técnicos conspirando contra as indexações-vinculações que agravam a subordinação do Brasil ao império do gastar o que não pode. Flertam os conjurados com a ideia perigosa de fazer escolhas. Ameaçam difundir que grana não dá em árvore.

E então sussurram o óbvio, os traidores da Pátria: as contas não fecham. O dinheiro escasseia. Não está mais tão barato arrancá-lo; nada fácil fabricá-lo. Avançado já o segundo ano de governo... O mundo real se impõe.

Jorge J. Okubaro - Vulnerabilidades e indiferença

O Estado de S. Paulo

Diante das mudanças do clima, o que precisa ser feito no Brasil são planos de médio e longo prazos, sobre os quais poucos pensam

A tragédia do Rio Grande do Sul mostra dramaticamente que, mesmo sendo abençoado por Deus, como nos ensinou há décadas Jorge Benjor, este é um país tropical frágil diante das forças da natureza. “O Brasil é um país muito vulnerável à mudança do clima”, disse ao jornal Valor a secretária nacional de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente, economista e doutora em Ciência Política Ana Toni. A extensão e a persistência dos efeitos das inundações não deixam dúvida de que devemos levar a sério o conselho da secretária de Mudança do Clima para que mudemos nossa percepção sobre as transformações que ocorrem no planeta em razão de ações humanas: “Essa ficha tem de cair”.

Luiz Carlos Azedo - Um dilúvio às vésperas das eleições gaúchas

Correio Braziliense

O governador Eduardo Leite propõe adiar as eleições municipais para não perder o foco na reconstrução do estado. Não é uma ideia sem sentido

Na quarta semana de dilúvio no Rio Grande do Sul, que deixou 461 dos 497 municípios gaúchos debaixo d'água, um mar de lama e montanhas de entulhos tomam conta das cidades gaúchas onde as águas já baixaram. Não se sabe ainda quanto será o custo total nem o tempo necessário para reconstrução do estado. Enquanto as águas do Guaíba, acima da cota de inundação, descem muito lentamente, a Lagoa dos Patos ainda sobe e ameaça cidades vizinhas, entre as quais, Pelotas.

A imagem faz todo sentido. O Dilúvio é o nome do evento bíblico (Gênesis 7 e 8), que começou no ano de 2516 a.C. e continuou por 12 meses lunares e 10 dias, ou exatamente um ano solar. Segundo a Bíblia, foi um castigo divino provocado pela corrupção e pela violência, na nona geração de Adão. Deus, então, decidiu purificar a Terra. Havia apenas uma família fiel a Deus, a de Noé, "um homem justo e íntegro".

Cristovam Buarque - Barrar o antissemitismo

Correio Braziliense

Apoiar a luta contra o terror e barrar o antissemitismo é tarefa de todo humanista, daí a obrigação de respeitar a história milenar dos judeus e denunciar os crimes do atual governo de Israel

Em 1961, o serviço secreto de Israel descobriu a presença de Adolf Eichmann em Buenos Aires, escondido por dezenas de nazistas argentinos. Era a chance de vingar o assassinato de 6 milhões de judeus sob a coordenação daquele monstro. Em vez de bombardear o bairro onde ele morava para assassiná-lo, o primeiro-ministro Ben-Gurion optou por capturá-lo, tirá-lo da Argentina, fazer julgamento público, condená-lo à morte e enforcá-lo na madrugada de 1° de junho de 1962. Foi um grande risco, poderia não ter dado certo, mas Israel saiu fortalecido moralmente, suas forças de defesa e seus serviços de informação mais respeitados, o sionismo cresceu e o antissemitismo diminuiu.

Cláudio Carraly* - E se o SUS não existisse?

O SUS não existe! A omissão dos parlamentares durante a Assembleia Nacional Constituinte de 1988, influenciada pelo poderoso lobby da saúde privada, gerou repercussões profundas e marcou indelevelmente a estrutura do próprio país. Esta lacuna não apenas privou milhões de brasileiros de acesso à saúde, mas também moldou dinâmicas sociais, econômicas e políticas por décadas. A ausência do Sistema Único de Saúde exacerbou as desigualdades sociais e de saúde existentes, sem um sistema de saúde universal, os que possuíam recursos financeiros acessavam cuidados médicos de qualidade, enquanto os menos favorecidos enfrentavam negações constantes ou limitações severas ao seu direito inalienável à saúde. Os mais afetados por essa desigualdade eram os grupos vulneráveis, como os pobres, idosos, pessoas com deficiência e portadores de doenças crônicas, todos esse foram relegados à margem do sistema de saúde nacional, e viraram cidadãos de segunda classe.

Poesia | Canção do Amor Imprevisto, de Mario Quintana

 

Música | Chico Buarque | Que tal um samba? com Hamilton de Holanda