- O Globo
A escolha do tamanho do estrago e dos prejuízos ao bem-estar da humanidade ainda está em nossas mãos
Terminando a semana do meio ambiente, vale a pena bagunçar um pouco a mente e pensar fora da caixa. Em primeiro lugar, não existe isso de “meio ambiente”. Ou mesmo “ambiente”. Ou environment em inglês e o mesmo em todas as línguas ocidentais. Todas essas palavras expressam “ao redor”, isto é , nós, os humanos e o “ao redor”, a natureza.
Essa separação não existe. Nós somos parte da natureza e vivemos na biosfera com o mesmo grau de dependência do fato de vivermos na atmosfera. Apenas como exemplo, dentro de cada um de nós, há centenas de trilhões de outros seres vivos, e nossa saúde, humor e até capacidades mentais dependem dessa interação.
Cada um de nós é um ecossistema e para muitos pesquisadores essa é uma fronteira da medicina moderna tão promissora quanto as células-tronco, a engenharia de tecidos orgânicos.
Em segundo lugar, embora a humanidade tenha logrado obter imensos poderes, ao ponto de a ciência estar a discutir denominar a nossa era geológica de antropoceno (sobre isso, vale muito uma visita ao Museu do Amanhã, na Zona Portuária do Rio de Janeiro), isso é verdade apenas no nosso tempo, o tempo humano, insignificantemente curto frente à imensidão do tempo da natureza. Estamos degradando severamente a natureza do nosso tempo. Crises e custos muito elevados decorrentes das mudanças climáticas, da crise de biodiversidade e outros “Limites do Planeta” já estão contratados. Já não são mais evitáveis mesmo nos cenários mais otimistas.
Atenção: a escolha do tamanho do estrago e dos prejuízos ao bem-estar da humanidade ainda está em nossas mãos, corações e mentes. Entre fazer uma revolução e conseguir que o aquecimento global, até o final do século, fique em 2 graus Celsius (algo já muito custoso em vidas, sofrimento, bem-estar e dinheiro, o mesmo dinheiro que é necessário para educação, saneamento, saúde, segurança etc.), ou 5 graus Celsius se nada for feito, a diferença no tamanho da tragédia é abissal.
O mesmo se aplica à crise de biodiversidade, à extinção das espécies. Já não é mais evitável a extinção de mais de 20% das espécies vivas até pouco depois da metade do século. Se esse processo não for interrompido drasticamente, será muito mais.
Esqueçamos a visão simplista e enganosa de que a natureza tem um problema. No tempo dela, de muitos milhões de anos, o estrago que a humanidade está causando não passa de um piscar de olhos do qual ela facilmente se recupera.
A questão não é “meio ambiente” ou desenvolvimento. A questão é que não haverá desenvolvimento, nem econômico, nem social, sem que a humanidade altere a forma como consumimos e produzimos.
Quem tem um problema com a degradação que estamos provocando é a natureza do nosso tempinho curto. Essa maravilhosa biodiversidade que amamos. E quem tem um gigantesco problema somos nós, sete bilhões de humanos hoje e 10 amanhã.
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Sérgio Besserman Vianna é presidente do Instituto Jardim Botânico do Rio de Janeiro
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