terça-feira, 2 de julho de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Aposta de Macron contra extrema direita fracassou

O Globo

Com desempenho sem precedente em eleição legislativa, partido de Marine Le Pen pode chegar ao poder

Apenas daqui a uma semana ficará claro o tamanho do avanço do Reunião Nacional (RN), de extrema direita, nas eleições legislativas francesas. Mas desde já é possível afirmar que não será pequeno. Na França, a disputa pelas 577 cadeiras da Assembleia Nacional ocorre em dois turnos. No domingo, 37 candidatos do RN obtiveram mais de 50% dos votos e foram eleitos. A Nova Frente Popular, coalizão dominada pela extrema esquerda, elegeu 32, e a aliança centrista do presidente Emmanuel Macron só dois.

Embora haja um movimento nacional pela união de forças republicanas — um conceito elástico que pode abranger da centro-direita à extrema esquerda — contra o RN na derradeira votação de domingo pelas cinco centenas de vagas que seguem em disputa, é praticamente inevitável seu crescimento inédito. Projeções sugerem que o partido poderá ficar com uma fatia entre 230 e 280 cadeiras (hoje tem 88). Para assumir o cargo de primeiro-ministro, o presidente do partido, Jordan Bardella, impôs como condição a conquista da maioria absoluta (289 cadeiras), uma meta tangível. Mas, ainda que fique aquém dela, é certo que o RN criará todo tipo de problema aos projetos de Macron.

Paulo Fábio Dantas Neto* - Longe e tão perto assim: o drama da política na França, nos EUA e nos nós do Brasil

Se a vida política pudesse transcorrer num mundo ideal, o debate ocorrido, essa semana, entre o presidente Biden e seu desafiante nas próximas eleições norte-americanas teria sido assistido por todos os cidadãos e cidadãs dos países democráticos com o mesmo interesse dispensado a um debate eleitoral decisivo que se desse em seu próprio país. Num mundo ideal, em que a informação política circulasse de maneira ampla, verídica no conteúdo factual e comunicada de modo veraz, não seria preciso esforço maior de argumentação para que se tomasse consciência pública das implicações internacionais do resultado dessas eleições. A consciência viria da própria experiência compartilhada do público com a política. Como esse mundo ideal não existe, é preciso repetir o que seria óbvio: que uma eventual vitória de Donald Trump em novembro será uma ameaça para a democracia no planeta. Essa razão explica a apreensão com a performance insegura do presidente e candidato democrata no debate.

Talvez seja uma consciência tardia, visto que as eleições já estão na porta. A essa altura, a força de inércia de automatismos sistêmicos da competição eleitoral e da diversidade de preferências políticas, talvez sem tempo de serem conciliadas numa candidatura unitária, poderá bloquear gestos mais largos, como o da retirada da candidatura pelo próprio Biden. Essa hipótese, enfaticamente veiculada, há três dias, pela imprensa e várias fontes de opinião democratas, não aparenta ser muito realista, pelo menos na visão destes olhos não treinados por um entendimento maior do contexto norte-americano. Ou melhor, realista ela é, em sentido amplo, de quem procura enxergar além da pequena política. Mas esse é um tipo de realismo que anda escasso em mercados políticos consolidados, onde rotinas se impõem.

Merval Pereira - A direita se move

O Globo

Eleitorado quer mudar radicalmente a situação, e Macron dificilmente conseguirá reverter esse ambiente

A direita política colheu uma série de vitórias nos últimos dias na França e nos Estados Unidos, que repercutem na direita brasileira. A decisão da Suprema Corte americana de dar a Donald Trump uma imunidade parcial nos processos a que responde favorece-o na corrida presidencial, afastando a possibilidade de vir a ser julgado antes das eleições de novembro.

Além desse efeito prático, a maioria conservadora da Suprema Corte deu argumentos à visão da direita internacional, especialmente aos bolsonaristas, que identificam na decisão a confirmação de que o ocorrido no Brasil pode não ter sido uma tentativa de golpe, mas uma ação presidencial dentro de suas prerrogativas.

Assim como Trump tinha direito de pedir ao secretário de Estado da Georgia que “encontrasse” mais votos para ele em sua região, Bolsonaro também poderia ter “consultado” ministros e assessores sobre reações à vitória de Lula na eleição presidencial.

Andrea Jubé - PT e MDB: na eleição, a ocasião faz a aliança

Valor Econômico

Presidente não vai para o confronto para não se indispor com o aliado

Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comparou, recentemente, a eleição para a Prefeitura de São Paulo a “uma verdadeira guerra”, usou um tom acima em relação ao que pretende adotar com o MDB, um de seus principais aliados, na campanha eleitoral. Porque se o MDB - que comanda três ministérios no governo federal - é adversário do PT em palcos relevantes como São Paulo e Porto Alegre (RS), as duas siglas caminharão juntas em outras capitais e grandes municípios no pleito de outubro.

A aliança entre PT e MDB é tão antiga, que remonta aos anos 80, quando Lula e Ulysses Guimarães compartilhavam segredos entre os comícios das “Diretas Já”, e o atual presidente da sigla, Baleia Rossi, ainda estava concluindo o ensino fundamental.

Em 1984, Lula revelou a Ulysses - até hoje, o principal símbolo do MDB - o fogo amigo em curso contra ele. Os emedebistas de São Paulo armavam a traição ao “Senhor Diretas”, articulando apoio a Tancredo Neves para a Presidência da República, com o PT na aliança. Lula disse a Ulysses que os paulistas referiram-se a ele como o “Winston Churchill” do MDB, que dera o que tinha de dar.

Segundo o relato do episódio, que consta de “A história de Mora” (livro de memórias sobre Ulysses do jornalista Jorge Bastos Moreno), o emedebista histórico viu-se acuado e rendeu-se, tornando-se coordenador da campanha de Tancredo.

Pedro Doria - O Real funcionaria hoje?

O Globo

Democracias só resolvem problemas grandes se sociedades são capazes de se unir num projeto comum

Duas políticas públicas definem a Nova República, aquilo que a democracia brasileira melhor construiu desde o fim da ditadura. Foram o Plano Real e o Bolsa Família. Passamos as últimas semanas celebrando os 30 anos da primeira, mas pouco falamos de um dos elementos essenciais para seu sucesso: a imprensa. Porque, para além do instante de brilho da ideia dos economistas Persio Arida e André Lara Resende, no coração do Real estava a necessidade de ele ser bem compreendido pela sociedade. O Plano Real deu certo porque foi bem explicado, e isso ocorreu nas páginas de jornais e revistas, no rádio e, principalmente, nas telas de televisão. Compreender esse aspecto da história é importante porque ela nos impõe uma pergunta: será que seria possível hoje? Provavelmente a mesma ideia, hoje, não daria certo.

Míriam Leitão - Por que lembrar o Plano Real?

O Globo

Na tumultuada história monetária brasileira, existe o antes e o depois do Plano Real. E, por isso, este marco de 30 anos deve ser relembrado

Quando pedi a entrevista a Edmar Bacha sobre o real, na preparação de um documentário, ele perguntou: “O que deu no Brasil? O real fez 1,5, 15, 29 anos e tudo bem. Faz 30 e todo mundo quer falar disso?” Verdade. Isso pode indicar que o Brasil é cauteloso. Quer ter certeza antes de comemorar. Nessas três décadas, houve momentos de perigo em que a inflação ficou em dois dígitos, mas acabou voltando a ser controlada. Em qualquer pesquisa de opinião pública, quando perguntada, a grande maioria da população responde que está preocupada com a inflação. A atitude de permanecer vigilante é parte desse sucesso.

Luiz Carlos Azedo - Lula desafia o “instinto animal” do mercado

Correio Braziliense

O ministro Haddad tenta manter a ancoragem da economia, mas o que não faltam no PT são vozes discordantes. Os petistas vibram com as diatribes econômicas de Lula

Há 30 anos, no governo Itamar Franco, quando foi lançado o Plano Real, repórter do jornal O Globo em São Paulo, perguntei ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), então o candidato favorito à Presidência nas eleições de 1994, se ele torcia para o plano dar certo ou para dar errado? Lula se enrolou, disse que torcia para o plano dar certo, mas, infelizmente, achava que daria errado. Era a avaliação de seu vice, Aloizio Mercadante, e a da também da economista Maria da Conceição Tavares, recentemente falecida.

Como no samba Feitio de Oração, de Noel Rosa, em economia, quem acha vive se perdendo. É preciso fazer contas. O plano deu certo, e Fernando Henrique Cardoso, ex-ministro da Fazenda e candidato do governo à Presidência, acabou vencendo as eleições no primeiro turno. Foi uma campanha na qual o PT já havia cometido outros erros, entre os quais não apoiar o governo Itamar nem aceitar uma aliança com o PSDB, que implicaria ceder a vice e apoiar Mario Covas, em São Paulo, como desejava o então governador do Ceará, Tasso Jereissati.

Luiz Gonzaga Belluzzo - Nada de novo sob o sol: dólar x real

Valor Econômico

Sucessão de episódios de valorização/desvalorização cambial demostra que a almejada correção dos chamados desequilíbrios globais vai exigir regras não compatíveis com sistema atual

A continuada desvalorização do real nas últimas semanas deflagrou uma avalanche de opiniões a respeito do fenômeno monetário-financeiro internacional. Peço licença ao eventual leitor para sublinhar monetário-financeiro e internacional.

O pedido ao leitor deita raízes na sobrecarga de opiniões que se derramam em queixas que atribuem à irresponsabilidade fiscal os sucessivos e intensos declínios de valor do nosso Real diante do patrono do sistema monetário internacional, mister dólar.

Incursões na história: começamos com a estagflação dos anos 1970 do século passado. Naqueles tempos, a continuada desvalorização do dólar foi enfrentada com a elevação da policy rate deflagrada por Paul Volker em 1979. A elevação dos juros foi apresentada, então, como uma medida destinada a alcançar o objetivo doméstico de controle da inflação, mas o efeito mais relevante para a economia internacional foi a recuperação do papel do dólar como moeda-reserva.

Lula atribui alta do dólar a especulação e diz que governo tem de fazer "alguma coisa"

Por Fabio Murakawa e Jéssica Sant’Ana / Valor Econômico

O presidente não revelou qual sua ideia, mas disse que terá uma reunião na quarta-feira (3) sobre o assunto

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou nesta terça-feira que a alta do dólar o preocupa, mas disse que o movimento é fruto de uma especulação. Ontem, a moeda americana atingiu R$ 5,65, o maior valor desde janeiro de 2022, fruto do cenário externo e das incertezas sobre a política fiscal do governo.

"Obviamente que me preocupa essa subida do dólar. Há uma especulação, há um jogo de interesse especulativo contra o real nesse país. Não é normal o que está acontecendo", disse Lula em entrevista à Rádio Sociedade, durante visita na Bahia nesta terça-feira (2).

Dora Kramer - Síndrome de oposição

Folha de S. Paulo

Presidente age mais como oposicionista que como o chefe da situação

O político Lula fez carreira apontando o dedo da acusação ao alheio. Perdeu três eleições presidenciais, ganhou outras três e a terceira vitória à chefia da nação parece ter incutido no cidadão Luiz Inácio da Silva a certeza de que é dono do monopólio da razão.

Ele exibe a convicção de que seus argumentos são mais certeiros que os fatos, por mais que as palavras se contraponham aos atos da realidade.

Chama de cretinos os que relacionam as turbulências na economia às suas declarações contra o Banco Central autônomo. Menospreza a necessidade de o governo conter despesas em prol do equilíbrio das contas públicas.

Hélio Schwartsman - A aposta errada

Folha de S. Paulo

Antecipar eleições legislativas contando com reação de moderados foi grande erro de cálculo

Emmanuel Macron apostou alto ao convocar eleições legislativas antecipadas e perdeu. Ao que tudo indica, ele imaginava que a perspectiva de a ultradireita conquistar maioria na Assembleia Nacional mobilizaria os eleitores para impedir tal desfecho. Foi com base nessa lógica —evitar a eleição de Marine Le Pen— que o próprio Macron se consagrou duas vezes presidente da França. Mas, desta vez, não funcionou.

A caminho do desconhecido político

The Economist / O Estado de S. Paulo

Maioria de ultradireita no Parlamento testará Constituição concebida para dar estabilidade ao país

Uma nova era dramática começou na França no domingo, quando o partido de direita radical de Marine Le Pen assumiu uma liderança maciça na votação do primeiro turno para a Assembleia Nacional. Seu Reagrupamento Nacional (RN) nunca esteve tão perto de governar o país. O partido garantiu 33,1% dos votos, segundo dados oficiais.

Antes do segundo turno, no próximo domingo, isso o coloca no caminho para conquistar de 230 a 280 assentos na Assembleia Nacional, que tem 577 lugares, ante aos atuais 88, e se tornar facilmente o maior grupo no Parlamento. Um resultado na ponta superior dessa faixa colocaria o RN perto de uma maioria geral de 289.

A eleição foi marcada pelo maior comparecimento no primeiro turno desde 1997. Os candidatos do RN ficaram em primeiro lugar em centenas de distritos eleitorais em todo o país: em seus antigos centros geográficos, como o chamado cinturão da ferrugem (industrial) no nordeste do país e no sul da França, bem como em lugares historicamente com pouco apoio, como a Bretanha. Em seu próprio distrito eleitoral em torno de Hénin Beaumont, na região de mineração do norte, Le Pen foi eleita no primeiro turno.

Eliane Cantanhêde - Barbas de molho

O Estado de S. Paulo

Se Lula replicar o enfraquecimento de Biden e Macron, quem lucra no Brasil?

O mundo anda tão louco que o presidente Emmanuel Macron convocou a antecipação das eleições parlamentares na França, para perder feio, assim como o presidente Joe Biden desafiou Donald Trump para um debate e para ser massacrado, a meses da eleição nos EUA. Só antecipa eleição e propõe debate quem sabe que vai ganhar e era evidente que eles iriam perder. Ou Macron e Biden têm uma estratégia supersofisticada, ou estão mal assessorados, ou fora da realidade ou, simplesmente, desesperados. A resistência internacional à extrema direita se enfraquece, assim como Macron, principal interlocutor do presidente Lula.

Carlos Andreazza - Nem ovo nem galinha

O Estado de S. Paulo

Dane-se a cronologia. Se Lula falou antes ou depois de o dólar ganhar mais corpo. Fala sempre

Não sei o que veio antes, o ovo ou a galinha. Sei que apalavra de presidente resulta. Em matéria econômica, faz preço. Tanto mais se acumulado o verbo. Lula sabe. “O problema não é que tem que cortar. Problema és aber se precisa efetivamente cortar ouse precisa aumentara arrecadação .”

Nem ovo nem galinha. Danes e acronologia. Se falou ante sou depois de o dólar ganhar mais corpo. Fala sempre. Antese depois. Quando provocado a tratar de corte de gastos. É como reage. Eleito o presidente do Banco Central (um exibido) como o adversário. E o dólar a expandira mordida.

Paulo Hartung - A urgência da segurança pública

O Estado de S. Paulo

Já passou da hora de agirmos efetivamente para enfrentar esse problema que é histórico, mas ganhou uma dimensão sem precedentes entre nós

Questões estruturais de nossa sociedade, a violência e a criminalidade acompanham o redesenho da vida nacional desde que migraram do antigo cotidiano rural para o dia a dia urbano. Também recrudesce como consequência crescente a sofisticação operacional, com articulações cada vez mais amplificadas e engenhosas. O crime organizado avança a tal ponto entre nós que se projeta como um poder paralelo e fora de controle.

Apesar de histórica, essa questão nunca entrou na agenda prioritária do País. No pós-redemocratização, enfrentamos desafios importantes como na saúde (SUS), educação (Fundeb), hiperinflação (Real) e renegociação da dívida externa. A segurança pública, seja na agenda dos Poderes, seja na academia, seja nas organizações da sociedade, ficou excluída dos debates e ações centrais. No entanto, não dá mais para esperar.

Jorge J. Okubaro - O mundo além do Copom

O Estado de S. Paulo

A alta do dólar em junho parece sintetizar em cifras um mês em que as coisas andaram mal para Lula e para seu governo

A cotação do dólar em R$ 5,59 no fechamento dos negócios na sextafeira, a mais alta desde janeiro de 2022, foi interpretada por muitos como o sinal mais óbvio de quanto o presidente Lula da Silva prejudica a economia. Ainda que disputas naturais no encerramento do semestre, cujos resultados podem balizar a liquidação de contratos futuros, tenham excitado o mercado e impulsionado o câmbio, Lula foi apontado como o responsável. Tornou-se alvo fácil nas últimas semanas.

A alta do dólar em junho, de 6,5% (de mais de 15% no ano), parece sintetizar em cifras um mês em que as coisas andaram mal para Lula e para seu governo. Derrotas num Congresso que foge de questões relevantes, ações da Polícia Federal contra um ministro de Estado, tentativas da direita (felizmente obstadas pela sociedade) de aprovar medidas retrógradas, ataques ao Banco Central (BC) são alguns eventos do mês.

Antônio Fausto Nascimento* - O tenentismo - um século do segundo cinco de julho

Na madrugada de 5 de Julho de 1924, tropas rebeladas do Exército, em São Paulo, se deslocaram ao quartel da Força Pública estadual, no bairro da Luz, onde instalaram o Estado Maior, sob comando do general Isidoro Dias Lopes. Começava a Revolução de 1924, mais sangrento episódio das revoltas tenentistas, que culminaram na Revolução de Trinta.

Em poucas horas, tropas federais, deslocadas de navio ao porto de Santos, tomaram a estrada de ferro São Paulo Railway, conseguindo chegar à estação de São Caetano, ainda pequena localidade paulista.

A noite, primeiro confronto entre rebeldes e legalistas na estação do Ipiranga, prosseguindo noutros pontos da Capital. Durante 23 dias de inverno rigoroso, a cidade de São Paulo e seus subúrbios sofreram a tragédia da guerra civil.

Poesia | Ode ao dois de julho, de Castro Alves

 

Música | Casuarina e Wilson Moreira - Senhora Liberdade