Valor Econômico
Elo entre o Planalto e os acampamentos,
general Mario Fernandes coloca Bolsonaro dentro do 8/1
Os autos da Operação Contragolpe, deflagrada
pela Polícia Federal na terça, relatam a preparação de um golpe de Estado
dentro do Palácio do Planalto em atos que vão da ousadia do envenenamento de um
presidente eleito ao amadorismo de um atentado contra ministro do Supremo
Tribunal Federal por um agente que se deslocava de táxi.
O eixo da operação é o general de brigada Mario Fernandes. A recuperação de seus diálogos e das planilhas do golpe que lhe foram atribuídas mostra a degradação a que chegou o Exército nos anos que precederam a chegada do ex-presidente Jair Bolsonaro ao poder. O descompromisso com a institucionalidade foi de um oficial que comandou o batalhão de Operações Especiais, um grupo de elite do Exército, destinado a missões de alto risco.
Secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência, primeiro cargo que exerceu depois de passar para a reserva, Fernandes continuou a comandar oficiais egressos das Forças Especiais, desta vez, para operações golpistas. Por derradeiro, as ações nas quais se envolveu não apenas jogam a anistia aos golpistas do 8/1 para as calendas, como contribuirão para minar as resistências a uma reforma do sistema social dos militares.
Três meses antes da eleição, Fernandes tentou
convencer o ex-presidente Jair Bolsonaro a se antecipar a uma eleição que já
davam por fraudada. “É 64 de novo? É uma junta de governo? É um governo
militar? É um atraso de tudo o que se avançou no país? Porque isso vai
acontecer. O país vai ser todo desarticulado.” A pressão por um decreto
presidencial fechando o regime revelava o mal-estar com o Alto Comando do
Exército. Nas suas contas, dos 16 generais do colegiado, cinco resistiam ao
golpe, três “querem muito” e os demais estariam na “zona de conforto”.
O regime que surgiria de uma quebra da
institucionalidade determinada pelo comandante-em-chefe estaria a cargo de
generais de pijama a partir de um gabinete de crise integrado pelo então
ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno Ribeiro,
e pelo ex-ministro da Casa Civil Walter Braga Netto. Num dos diálogos
reportados pela Polícia Federal, Mario Fernandes mostra-se determinado a
convencer Bolsonaro de que Braga Netto deveria voltar para o Ministério da
Defesa com vistas a dobrar as Forças Armadas rumo ao golpe.
Os relatos de Fernandes, que tinha acesso direto à Presidência da República, sobre a falta de paciência dos acampados com a lerdeza do golpe, joga por terra a linha de defesa de que Bolsonaro, da Flórida, para onde viajou em 31 de dezembro, estava alheio à invasão dos Poderes em 8 de janeiro.
A proximidade entre Fernandes e Braga Netto,
em casa de quem foi realizada uma das primeiras reuniões preparatórias ao
golpe, também sugere que o ex-ministro da Casa Civil não custará a ser atingido
pelas próximas operações. Outro general que tem tido sua atuação nos atos
preparatórios ao golpe preservada, mas é abertamente citado no relatório da PF,
é o general Estevam Cals Theophilo de Oliveira. Á época dos fatos descritos,
Theophilo estava à frente do Comando de Operações Terrestres (Coter), unidade responsável
pelo emprego direto de tropas no caso de uma intervenção militar. Nesta
condição, integrava o Alto Comando do Exército. Permaneceu no cargo até o fim
de 2023. Seu irmão, Guilherme Theophilo, foi secretário de Segurança Pública
sob Bolsonaro e candidato ao governo do Ceará pelo PSDB em 2018.
Já o então comandante do Exército, general
Freire Gomes, é reiteradamente citado como fonte de resistência às manobras
golpistas. Em 7 de dezembro, por meio do coronel Mauro Cid, ex-ajudante de
ordens de Bolsonaro, Fernandes encaminha um vídeo para o general Freire Gomes.
Tanto no vídeo quanto nas conversas com o ex-presidente, o esforço do general é
o de provar que a presença dos movimentos antidemocráticos nas ruas indicava a
possibilidade de se perder o controle da situação, o que exigiria uma ação rápida.
A PF descreve a pressão exercida por Fernandes como decorrente da aproximação
de 20 de dezembro, prazo em que o comando das Forças Armadas seria passado para
militares indicados pelo governo eleito, a que as mensagens se referem como
“governo do presidiário”. Esses diálogos foram captados no celular de Mauro Cid
por meio de um sistema israelense que permite a decodificação de mensagens
apagadas. As informações levaram à revisão da delação premiada do ex-ajudante
de ordens porque evidenciam que ele não contou tudo que sabia.
Se há elementos de sobra para comprovar este
planejamento, as lacunas aparecem no monitoramento do ministro Alexandre de
Moraes, também supervisionado por Fernandes. Mauro Cid e o coronel Marcelo
Câmara, ex-assessor de Bolsonaro que já foi preso e hoje está em regime de
liberdade condicional com tornozeleira eletrônica, trocam mensagens sobre o
tema. Se há dias em que o monitoramento tem a placa de veículos utilizados, há
outros, como o 15 de dezembro de 2022, que a polícia traz como a data em que
“possivelmente seria realizada a prisão/execução do ministro Alexandre de
Moraes” em que o agente envolvido ficou, literalmente, a pé.
Esta ação teve celulares habilitados em nomes de terceiros com codinomes. Uma das pessoas, Arão Edmundo da Silva (“Gana”), deixa seu ponto de observação próximo à residência de Moraes a pé porque não conseguiu encontrar um táxi. Ele foi instruído a deixar o local depois do adiamento, pelo Supremo, da votação sobre o chamado orçamento secreto. O monitoramento também se mostra amador porque quando o ministro se desloca para São Paulo, no segunda quinzena de dezembro, os agentes desconhecem seu endereço, informação disponível até na imprensa.
Um comentário:
Onde está o papagaio bolsonarista que ficava repetindo lorotas sobre a Direita neste blog? Será que a PF vai chegar nele?
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