segunda-feira, 13 de maio de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Política de habitação agrava efeito das enchentes

O Globo

Programas do governo incentivam construções em áreas de risco ou manancial nas periferias

A tragédia das enchentes no Rio Grande do Sul e a sucessão de desastres naturais que tem fustigado as cidades brasileiras nos últimos anos, amplificada pelas mudanças climáticas, deveriam levar a sociedade — em especial a classe política — a refletir sobre os modelos de ocupação equivocados e as políticas habitacionais erráticas que têm contribuído para agravar os efeitos de eventos climáticos extremos inexoráveis.

O Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden) informou no ano passado, com base em dados antigos do IBGE, que 8,3 milhões de brasileiros viviam em áreas suscetíveis a enchentes ou deslizamentos. Estima-se que esse número já ultrapasse 10 milhões. Pelo menos 2,5 milhões se concentram em locais de “alto risco” e “muita vulnerabilidade”. Em Salvador, 45,5% da população vive em áreas de risco. Em Belo Horizonte, 16,4%. No Recife, 13,4%.

Fernando Gabeira - O cavalo subiu no telhado

O Globo

Não se trata apenas de tempestade. Há o aumento do calor, a alta do nível dos mares, tema que que nos atinge seriamente

Durante muitos anos, falei em aquecimento global, preparação das cidades, resiliência, essas coisas. Muito mais eficaz que todos os meus argumentos é a imagem de um cavalo de 350 quilos no telhado de um bairro inundado de Canoas, no Rio Grande do Sul. A imagem de Caramelo — esse é o nome que lhe deram nas redes sociais — emocionou muita gente, até pelo delicado resgaste realizado pelos bombeiros.

Destaco essa imagem na tragédia porque ela tem a força de desarrumar um pouco nossa lógica, provocar um rápido curto-circuito mental e, consequentemente, abrir a cabeça para a realidade que não conseguimos ver.

Escrevi um longo artigo sobre as mudanças climáticas para a revista da Academia Brasileira de Letras e usei como título o verso de Bob Dylan: Alguma coisa está acontecendo, mas você não sabe o que é. A imagem do cavalo no telhado economizaria dramaticamente meus argumentos.

Demétrio Magnoli - O risco de repetir Jane Fonda

O Globo

Black Power foi substituído por políticas identitárias oficialistas, articuladas nas reitorias e nos gabinetes parlamentares

A foto, de autoria anônima, correu mundo em julho de 1972. Jane Fonda, sentada numa bateria antiaérea norte-vietnamita, tornou-se “Hanói Jane”. Mais tarde, a protagonista de “Barbarella” (1968) pediria desculpas pela imagem “que me machucará até eu morrer”. Na Rússia de Putin, empregar a palavra “guerra” para fazer referência à invasão imperial da Ucrânia pode dar cadeia. Nas democracias, não é proibido criticar o próprio governo, e até a própria nação, mesmo fazendo propaganda de um inimigo.

A história da foto começou no início de 1968 com a Ofensiva do Tet, no Vietnã, que galvanizou o movimento antiguerra nos Estados Unidos, seguida pelo assassinato de Martin Luther King, em abril, fonte direta da rebelião negra no Harlem e indireta da ocupação estudantil do Hamilton Hall, na Universidade Columbia. Foi durante o ápice da agitação universitária, mas sem conexão com ela, que o palestino Sirhan Sirhan assassinou Robert F. Kennedy, estreitando a disputa pela indicação democrata ao vice Hubert Humphrey e ao candidato antiguerra Eugene McCarthy.

Carlos Pereira - Depois da tormenta, a negociação

O Estado de S. Paulo

De protagonista a incentivador de saídas negociadas: um Supremo que estimule acordos

Duas decisões recentes do Supremo geraram a necessidade da busca de soluções negociadas numa direção clara de pacificação política entre os poderes.

A primeira foi a interpretação da Corte de que a chamada “Lei das Estatais” é constitucional, restringindo assim a nomeação de políticos para os conselhos de administração e diretorias das empresas estatais. Mas, como o próprio Estadão chamou em seu editorial (11/05/2024), criou uma “esdrúxula inconstitucionalidade temporária”. Ou seja, decidiu que os políticos que já haviam sido nomeados para tais cargos e conselhos não teriam seus mandatos destituídos, pois estavam protegidos pela decisão liminar do ex-ministro Ricardo Lewandowski concedida nas vésperas de sua aposentadoria do STF.

Bruno Carazza - Os extremos que nos distanciam como país

Valor Econômico

Livro de Pedro Fernando Nery desbrava as fronteiras da desigualdade brasileira

“Não faz diferença se você é preto ou branco, se é menino ou menina”, cantou Madonna no palco em Copacabana, para delírio de mais de um milhão e meio de pessoas. “Você é um superstar, sim, isso é o que você é, você sabe disso”!

Lançada em 1990 e um dos maiores hits da carreira de Madonna, “Vogue” é uma celebração de um estilo de dança da cultura gay de Nova York nos anos oitenta, em que os artistas emulam poses e movimentos de modelos na passarela.

Sergio Lamucci - Incertezas monetárias se juntam às dúvidas fiscais

Valor Econômico

Com a decisão dividida do Copom na semana passada sobre a Selic, intensificaram-se as dúvidas sobre os rumos da política monetária

As incertezas em relação às contas públicas ganharam uma companhia preocupante na semana passada. Com a decisão dividida do Copom do Banco Central (BC) sobre a Selic, intensificaram-se as dúvidas sobre os rumos da política monetária. Cinco integrantes votaram por uma queda de 0,25 ponto da Selic, para 10,5% ao ano, e quatro - todos indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva - por uma baixa de 0,5 ponto. Num momento em que o cenário externo é mais nebuloso, com a perspectiva de que os juros americanos demorem mais para cair e recuem menos, a combinação de incertezas fiscais e monetárias aumenta as pressões sobre o dólar e os juros de longo prazo no Brasil, o que pode diminuir o espaço para redução da Selic e prejudicar o crescimento da economia.

Dani Rodrik - Não se inquiete com subsídios verdes

Valor Econômico

As políticas industriais verdes da China foram responsáveis por algumas das vitórias mais importantes até hoje contra as mudanças climáticas

Uma guerra comercial sobre tecnologias limpas está chegando no ponto de ebulição. Os Estados Unidos e a União Europeia, preocupados com que subsídios chineses ameacem suas indústrias verdes, alertaram que responderão com restrições à importação. A China, por sua vez, apresentou uma queixa à Organização Mundial do Comércio (OMC) sobre regras discriminatórias contra seus produtos sob a histórica legislação climática do presidente dos EUA, Joe Biden, a Lei de Redução da Inflação.

Numa viagem recente à China, a secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, alertou diretamente a China de que os EUA não ficariam parados diante do “apoio governamental em larga escala” da China a setores como energia solar, veículos elétricos e baterias. Lembrando seu público de que a indústria siderúrgica dos EUA já havia sido dizimada pelos subsídios chineses, ela deixou claro a determinação do governo Biden de não permitir que as indústrias verdes sofressem o mesmo destino.

Marcus André Melo - Desastres e eleições

Folha de S. Paulo

Os incentivos políticos favorecem ações mitigadoras e não preventivas

Como o presidente e o governador serão afetados eleitoralmente pela calamidade no Rio Grande do Sul? Um exemplo ilustra a questão. O sucesso de Herbert Hoover, que liderou com grande visibilidade a resposta do governo federal à "enchente do século", do rio Mississipi, levou-o a se tornar candidato nas eleições presidenciais americanas de 1928. No entanto, nas áreas afetadas ele perdeu algo como 10% dos votos, segundo o estudo Disasters and elections.

A literatura sobre eleições e desastres naturais (que discuti na coluna aqui) divide-se em duas explicações rivais. A primeira afirma que eles geram emoções negativas que levam a uma punição nas eleições. Este argumento (conhecido como "retrospecção cega") foi desenvolvido em trabalho clássico sobre efeitos de ataques de tubarão. Os eleitores punem governantes por eventos externos aleatórios, pelos quais eles não são responsáveis. Aconteceu com Hoover.

Camila Rocha - Políticos ignoram urgência climática

Folha de S. Paulo

Se nada mudar, presenciaremos também a emergência de revoltas

As mudanças climáticas saíram dos livros e se tornaram realidade. A afirmação, feita pelo secretário-executivo do Observatório do Clima, Márcio Astrini, reflete a percepção da população brasileira sobre a tragédia no Rio Grande do Sul.

De acordo com uma pesquisa da Quaest, realizada nos dias 5 e 6 de maio, 99% dos brasileiros associam as mudanças climáticas com as enchentes no Sul do país, sendo que 64% apontam que os fenômenos estão totalmente relacionados, e 30% consideram que estão parcialmente relacionados. Além disso, para 70% a tragédia poderia ter sido evitada.

Ruy Castro - Vidas e memórias na correnteza

Folha de S. Paulo

No Rio Grande do Sul, enquanto as câmeras registram o presente, o passado está sendo levado pelas águas

Já devem estar em dezenas de milhares as imagens da tragédia das cheias no Sul. Todas ficarão para sempre —as que vimos e as que não vimos, mas que outros viram e jamais esquecerão. Poucas desgraças terão sido tão documentadas ao vivo e em tempo real quanto esta —a morte levando vidas, bens, seres de estimação e economias de uma vida inteira, diante das lentes impotentes, capazes, no máximo, de registrar, alertar e transmitir os pedidos de socorro. Não é muito, mas melhor do que as outras tecnologias que falharam criminosamente: os escoamentos, drenagens e prevenções. Sem falar no maior dos crimes, o abuso do planeta.

Entrevista | Michel Temer: “Pacificação não se deu por falta de vontade de Lula e da oposição"

Por Monica Gugliano e Eliane Cantanhêde / O Estado de São Paulo

“A polarização é sempre uma coisa útil, porque se usa a palavra polarização para o conflito de ideias, de programas, sistemas. Mas, o que há no país é radicalização.”

Três vezes presidente da Câmara dos Deputados e presidente da República após um conturbado processo de impeachment presidencial, o segundo em 25 anos no Brasil, Michel Temer acreditava que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ia fazer uma espécie de redenção nacional durante seu terceiro mandato, unindo um País que vem sofrendo com um rompimento social desde 2013. Não foi isso o que aconteceu, lamenta o político.

Apesar da decepção, Temer reconhece que a falta de vontade política não ficou apenas na conta do atual detentor da cadeira mais importante do terceiro andar do Palácio do Planalto. “Foi a oposição que radicalizou? Eu não saberia dizer. Mas acho que foi. Faltou vontade política de um lado e do outro”, analisou o ex-presidente em entrevista exclusiva ao Estadão.

Ao longo da conversa, Temer destaca a importância da oposição para o exercício da democracia.

“A oposição existe para ajudar a governar na democracia. Por que ela ajuda a governar? Porque ela critica, observa, contesta, contraria”, diz, lamentando, porém, que o conceito de oposição foi radicalizado: “Aqui no Brasil nós temos a ideia de que cada governo que chega precisa destruir os governos anteriores, tanto que o vocábulo herança maldita se incorporou ao vocabulário político do País”.

O ex-mandatário também defende que é preciso por fim à disputa entre Poderes: “Cada um ficando no seu quadrado ajuda muito o País porque as pessoas têm que ter ciência e consciência da posição que ocupam”..

Poesia | Ah! O Amor, de Mário Quintana

 

Música | Os Cariocas - Telefone