quinta-feira, 13 de junho de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Não dá mais para cumprir meta fiscal ampliando receitas

O Globo

É urgente desvincular os benefícios do INSS do salário mínimo e as despesas com saúde e educação da arrecadação

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, faz bem em levar medidas de contenção de despesas para apreciação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. É urgente controlar os gastos públicos. Sem isso, a credibilidade já desgastada do arcabouço fiscal aprovado há menos de um ano continuará a deteriorar-se.

Duas ideias deveriam ser prioridade. Primeiro, desvincular do salário mínimo os benefícios temporários pagos pelo INSS. Desde o ano passado, o mínimo passou a ser regido por uma lei que pressupõe aumento real, acima da inflação, semeando alta descontrolada nas contas da Previdência. Segundo, é preciso voltar a desvincular do aumento das receitas os gastos constitucionais obrigatórios com saúde e educação. Essa é mais uma fonte de crescimento acima da inflação, e gastos obrigatórios como esses pressionam todas as demais despesas discricionárias, de investimentos em infraestrutura a verbas para combater tragédias climáticas.

Merval Pereira - O futuro, agora

O Globo

O país tem um desafio fiscal não resolvido e gasta em torno de 12% do PIB com Previdência Social

Quando, em maio, a ministra do Planejamento, Simone Tebet, aventou a possibilidade de desvincular as aposentadorias e os benefícios previdenciários do salário mínimo, a reação negativa dos políticos, especialmente da base do governo, foi imediata. Como vem acontecendo nos últimos anos, sempre que se fala em reforma previdenciária, pontos fundamentais para alcançar o equilíbrio fiscal das contas públicas são deixados para depois, por pressão política.

É o caso do papel do salário mínimo no custo previdenciário, que deixaria de ser repassado automaticamente ao piso de benefícios, como previsto na Constituição. Essa e outras alterações fazem parte do livro “A reforma inacabada — o futuro da Previdência Social no Brasil”, recém-lançado por dois dos maiores estudiosos do tema, Paulo Tafner, diretor-presidente do Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social (IMDS), e Fabio Giambiagi, pesquisador associado da FGV/Ibre e colunista do GLOBO.

Malu Gaspar - A frente ampla pelas máfias

O Globo

Em meio ao tratoraço operado pela oposição contra o governo no Congresso, brotou uma pauta que uniu o sistema político como a frente ampla de Lula não foi capaz: o projeto proibindo que se fechem acordos de delação premiada com réus presos, alterando uma lei aprovada em 2013, durante o governo Dilma Rousseff.

O texto foi apresentado por um deputado aliado do presidente da Câmara dos DeputadosArthur Lira (PP-AL), e apensado a uma proposta protocolada em 2016 pelo petista Wadih Damous.

Se lá atrás o objetivo era blindar o governo Dilma de uma possível delação do senador e líder do governo Delcídio do Amaral, preso em flagrante dias antes, agora a iniciativa poderia servir para anular a delação do ex-ajudante de ordens de Jair BolsonaroMauro Cid — ou ainda invalidar o testemunho de Ronnie Lessa, assassino confesso de Marielle Franco, que apontou como mandantes os irmãos Domingos e Chiquinho Brazão.

A manobra colocou o governo Lula numa saia justa e fez os petistas se apressarem a acusar os bolsonaristas de oportunismo — como se a proposta original não tivesse sido, ela mesma, oportunista.

Luiz Carlos Azedo - Quanto mais Lula reza, mais assombrações aparecem

Correio Braziliense

Segundo relatório da CGU, em mais um exemplo de patrimonialismo oligárquico, 80% da estrada custeada pela emenda beneficiou propriedades de Juscelino e de seus parentes

O ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil), foi indiciado ontem pela Polícia Federal (PF), por crimes como corrupção passiva, fraude em licitações e organização criminosa. A denúncia é mais uma dor de cabeça para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mal o governo acabou de anular um leilão para compra emergencial de estoques de arroz por suspeitas de fraude. É mais uma assombração que aparece.

Maranhense, Juscelino Filho tem 40 anos e assumiu o cargo desde o início do governo Lula, como parte do acordo com o União Brasil. Responde pela política de telecomunicações, radiodifusão e serviços postais do governo (Correios). É deputado federal desde 2014, tendo sido reeleito em 2018 e 2022.

Maria Hermínia Tavares - As escolas reprovadas

Folha de S. Paulo

Não é o que se vê com a lei aprovada em SP sobre escolas cívico-militares

Para cada problema complexo a extrema direita tem a proverbial resposta: simples e errada.

É o caso do Programa Escola Cívico-Militar, que o bolsonarismo, com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, à frente, conseguiu transformar em lei em fins de maio último.

Destinado às escolas públicas do estado que a ele queiram aderir, o tal programa prevê atividades que caibam no figurino, complementares ao currículo escolar.

A gestão da coisa caberá à Secretaria de Segurança; a execução a PMs da reserva, promovidos a monitores. Os colégios que aderirem ao esforço patriótico receberão apoio financeiro para executá-lo. Professores civis e monitores militares embolsarão adicionais à sua paga: afinal, ninguém é de ferro.

Bruno Boghossian - Campos Neto veste a camisa

Folha de S. Paulo

Hipótese de dobradinha com Tarcísio é traçada enquanto chefe do Banco Central ainda está na cadeira

Quando apareceu para votar com uma camisa da seleção brasileira, Roberto Campos Neto tinha a certeza de que continuaria no cargo mesmo que seu candidato favorito perdesse a eleição. A autonomia do Banco Central foi criada para dar estabilidade ao presidente da instituição, mas também abriu margem para certos atrevimentos particulares.

Campos Neto nunca demonstrou a intenção de esconder seus aliados, amigos e afinidades partidárias. Sem subordinação formal ao governo desde 2021, almoçava rotineiramente com Paulo Guedes e participava de um grupo de WhatsApp com a equipe de Bolsonaro. Na eleição, segundo a revista Piauí, preparou um modelo matemático para ajudar a campanha do então presidente.

Philippe Legrain* - A Europa deve enfrentar a extrema direita

Valor Econômico

Risco da complacência ou da acomodação é que a extrema direita coopte a centro-direita, em vez do contrário

Partidos de extrema direita tiveram um desempenho excepcional nas eleições para o Parlamento Europeu. Ganharam quase 25% dos assentos, pouco atrás da centro-direita.

Diante de uma Europa já cambaleante com a guerra na Ucrânia, a ameaça de um retorno de Donald Trump nos EUA, a estagnação dos padrões de vida, o sobrecarregamento dos sistemas de bem-estar social e eventos climáticos extremos, os nacionalistas representam grave ameaça. Esses partidos nutrem simpatia por Vladimir Putin e são abertamente hostis às políticas verdes, aos migrantes e às instituições da União Europeia.

Maria Cristina Fernandes - O governo dentro da panela de pressão

Valor Econômico

Lula não menciona ao PT a perspectiva de o seu partido ter que se dobrar a um ajuste

Um presidente pode esfriar crises ao viajar ou levá-las a bordo. Luiz Inácio Lula da Silva decolou rumo a Genebra desincumbido de ambas as tarefas. O impacto de sua ausência, depois da humilhação causada pela devolução de uma medida provisória, é quase nulo.

Lula associou-se ao gesto desde a véspera, quando conversou sobre a MP do PIS/Cofins com o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Prosseguiu na toada ao antecipar a devolução da MP ao presidente da CNI, Ricardo Alban, e ao autorizar seu líder no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), a aplaudir o gesto do presidente da Casa.

Se pretendia deixar claro que a devolução da medida tinha no ministro da Fazenda seu único responsável foi bem sucedido, mas o gesto não aproxima seu governo de uma solução. A MP foi enviada ao Congresso durante viagem de Fernando Haddad ao exterior sem que os ministros dos setores mais atingidos por seus efeitos tivessem tido conhecimento de seu teor.

Míriam Leitão - Tensão fiscal no meio do caminho

O Globo

O debate fiscal é polarizado e o economista Bráulio Borges aponta que existe caminho do meio no tema que ontem agitou mais uma vez a economia

O governo não sabe de onde virá o ajuste das suas contas. Essa convicção do mercado é uma das razões da alta do dólar, que ontem bateu em R$ 5,40, um salto no ano de 11,38%. Parte da tensão veio do sinal dado pelo FED de que os juros terão apenas um corte até o fim do ano, mas a parte brasileira da preocupação veio de uma declaração do presidente Lula de que o equilíbrio das contas públicas viria do aumento da arrecadação e da queda dos juros. Coube à ministra Simone Tebet avisar que os gastos obrigatórios do orçamento são insustentáveis. Como resolver?

Vinicius Torres Freire - Governo Lula 3, primeira parte: fim

Folha de S. Paulo

Tumulto com Haddad, déficit, juros, dólar, Congresso etc. tem origem antiga

A confusão em que se meteu o governo de Luiz Inácio Lula da Silva parece agora apenas uma crise centrada na desconfiança na capacidade de Fernando Haddad levar adiante um plano crível qualquer de conter a degradação das contas públicas.

Mas esse é apenas o resultado crítico de um acúmulo de equívocos que começam no governo de transição. É possível consertar estragos, mas Lula já perdeu apoio e tempo políticos para fazer governo bem melhor.

Primeiro, Lula optou por desconsiderar parte seu slogan: "União e Reconstrução". A "união" possível seria pouca, dado o conflito raivoso no país. Ainda assim, Lula poderia manter aquele pequeno centro que o ajudou a vencer a eleição e obter algum apoio adicional, além do pessoal que aderiu à "frentinha ampla".

William Waack – Expectativas frustradas

O Estado de S. Paulo

Setores variados da economia estão rompendo publicamente com o governo Lula 3

Não existe “o” empresariado que fale com uma voz, a não ser quando o governo Lula 3 provoca algum tipo de unanimidade entre setores que têm interesses às vezes antagônicos, vivem fases distintas de expansão e rentabilidade e dependem em diferentes graus do poder público.

Foi o caso com a MP que alterava regras do sistema tributário, parte da qual acabou devolvida pelo Congresso depois de repúdio unânime vindo dos mais variados segmentos da economia (e da política). A questão é saber como Lula e seu círculo político mais próximo entenderam a natureza dessa “unanimidade”.

Eugênio Bucci - Sobre a ignorância artificial

O Estado de S. Paulo

O que temos agora não é mais a ignorância da vacuidade, mas uma outra, a da overdose, a ignorância fabricada por algoritmos gelados e por tentáculos de silício

Quando alguém tenta imaginar o que seja a ignorância, a primeira imagem que lhe ocorre é o vazio. De fato, enquanto o saber tem para nós o aspecto de casa cheia e feliz, o não saber é seu oposto: um lugar macambúzio, desocupado e triste. O conhecimento lembra uma constelação de fagulhas inspiradoras, como um salão de janelas amplas, ensolaradas, cheio de gente bonita indo de um lado para o outro; a estultice é sombra e mutismo, um galpão deserto, escuro, sem ninguém e sem utilidade. O espírito dos sábios cintila em signos vibrantes, representações abstratas e sensibilidade de muitas claves; a massa cinzenta de quem não sabe nada é só um pedaço de carne amorfa, incapaz de qualquer contemplação. Portanto, é com acerto que temos o costume de dizer que as pessoas cultas têm uma vida interior rica e ativa, ao passo que os boçais têm a cabeça oca. Nada mais justo. Nada mais preciso. Nada mais óbvio.

Celso Ming - Lula e seu jogo fiscal temerário

O Estado de S. Paulo

Sede de gastança do presidente Lula tem pressionado o dólar e empurrado o ministro Haddad para a fritura pública

Até há algumas semanas, via-se que, além de não ter estratégia, o presidente Lula enveredava para o caminho da gastança.

Embora às vezes dê a entender que preze a responsabilidade fiscal e se comprometa com o equilíbrio das contas públicas, parece convencido de que essas coisas não são para ser levadas a sério: “A gente não cuida do pobre se ficar olhando política fiscal” – já disse ele. É ponto de vista que ignora a lógica de que é só com as contas em ordem que se pode cuidar da política social.

As condições políticas em que se deram a rejeição da medida provisória que metia a mão nos créditos de PIS-Cofins das empresas de modo a garantir recursos extras de R$ 29,3 bilhões para cobrir a perda de arrecadação com a desoneração de alguns setores e das prefeituras estão agora encurralando o presidente Lula.

Alvaro Gribel - Lula insiste no erro

O Estado de S. Paulo

Dólar chega a passar de R$ 5,40, se aproximando da maior cotação do atual governo após Lula ignorar agenda de redução de despesas

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não se cansa de errar na economia. Ele, diretamente, ou seus assessores mais próximos, que elaboraram um discurso completamente inapropriado para o momento atual dos mercados de câmbio e juros.

O resultado da fala desta quarta-feira, 12, em evento no Rio de Janeiro – que, em outro momento, poderia ter pouco impacto – foi mais uma disparada do dólar, que chegou a bater em R$ 5,42, se aproximando do pior momento de seu governo, R$ 5,48, logo nos primeiros dias de 2023.

Cláudio Carraly* - Revolução Permanente no Sistema Educacional Brasileiro

Na atualidade, em meio à revolução da informação e da tecnologia, a educação se depara com um dilema premente: persistir em métodos seculares ou abraçar uma transformação indispensável para preparar os alunos aos desafios contemporâneos. Exploramos aqui a urgência de reformar o sistema educacional, apresentando ideias inovadoras e exemplificando experiências bem-sucedidas globalmente, além de evidenciar iniciativas no cenário educacional brasileiro. Ao longo de séculos, o modelo educacional tem resistido à mudança, mantendo-se, em diversos aspectos, vinculado a estruturas e métodos que já não conseguem atender às demandas de uma sociedade em constante evolução, o desafio consiste em superar a inércia de uma tradição arraigada e repensar os fundamentos da educação.

Fernanda Torres - Sejamos conservadores, até o tsunami passar

Folha de S. Paulo

A indignação que tomou Paris em 1968 hoje lota a Paulista para pedir a volta da ditadura

Quando jovem, o imortal Antônio Cícero decidiu estudar filosofia na Europa. Maio de 1968 mal completara um ano e o moço sonhava ser aluno de Gilles Deleuze, na Universidade de Vincennes, em Paris.

Proibido pelo pai de se meter no epicentro do movimento estudantil, que sacudia a tradição acadêmica da época, o poeta, a contragosto, se inscreveu na Universidade de Londres. Enquanto esperava pela aprovação da matrícula, Cícero quis ver de perto o que o zelo paterno lhe negara e foi escondido à cidade luz.

A visita foi o oposto do esperado. A faculdade parisiense, trincheira da revolução juvenil, lhe pareceu pecar pela falta de rigor, fervilhando em assembleias, reivindicações e banheiros quebrados para abolir a divisão de gêneros. Cícero voltou para Londres aliviado. Lá, teve a sorte de usufruir o melhor dos dois mundos. De um lado, a convivência com os tropicalistas exilados, do outro, a austeridade do juízo analítico.

Poesia | O mar e o canavial, de João Cabral de Melo Neto

 

Música | Alceu Valença, Elba Ramalho, Geraldo Azevedo - Frevo Mulher